Poder diretivo do empregador e a proteção da propriedade privada
Apesar de ainda serem incertos os precisos limites aplicáveis ao poder diretivo do empregador bem como o devido controle exercido pelo ordenamento jurídico brasileiro a matéria do teletrabalho, assédio moral e físico entre outros temas abrem margens para diversas interpretações, principalmente, tendo em vista a preservação da função social do contrato de trabalho em harmonia com o respeito a preservação da dignidade humana, e ainda, a proteção da propriedade e a empresa. Importante é que durante a execução do contrato laboral os direitos de personalidade do empregado, abrangendo sua intimidade, vida privada, honra e imagem, além da legislação trabalhista, os acordos e convenções coletivas e cláusulas contratuais sejam respeitados.
O debate a respeito dos
limites do poder diretivo do empregador não deixa de causar divergências e
suscitar paradoxos. Afinal, seguindo-se uma ordem legal e principiológica, há
nítida distinção entre as faces existentes no vínculo de trabalho, a saber: o
poder diretivo do empregador e o seu direito de proteção à propriedade privada,
bem como os direitos fundamentais do empregado, sendo esses, expressas
limitações para referido poder.
A relevância do trabalho como
atividade que serve de sustento da sociedade de forma genérica e que constitui
o fim de assegurar a existência digna e, cediço que os fundamentos da República
Federativa do brasil, tem-se, dentre outros, a dignidade da pessoa humana e os
valores sociais do trabalho.
Considerando-se a economia de
mercado e o sistema capitalista contemporâneo que aponta para as relações de
trabalho e emprego voltadas à busca de crescente lucro e de bens patrimoniais,
gerando enfraquecimento das relações humanas. Assim, é trivial que o empregador
venha se exceder em seu poder diretivo empresarial e, usando deste, e do direito
de propriedade, venha a ofender e violar os direitos de seus empregados.
Em análise do contrato de
trabalho e a previsão de prerrogativa do poder diretivo conferido ao empregador
e, a incidência de direitos fundamentais nas relações trabalhistas, encerrando
com a abordagem das limitações do poder diretivo, com especial destaque aos
princípios fundamentais e, prescrutando, também, a legislação, o entendimento
doutrinário e jurisprudência sobre a temática.
Inicialmente, cumpre discorrer
sobre o contrato de trabalho, âmbito de incidência do poder diretivo e, segundo
Vólia Bomfim, o contrato de trabalho é o acordo bilateral entre empregado e
empregador e, portanto, caracteriza-se em norma pessoal, concreta e específica
e criadora de obrigações. (CASSAR, 2015, p.89).
De cunho mais abrangente,
Maurício Godinho Delgado esclarece que contrato de trabalho se refere a todas
as relações jurídicas caracterizadas por terem sua prestação essencial centrada
em uma obrigação de fazer consubstanciada em labor humano. (...)
A expressão relação de
trabalho englobaria, desse modo, a relação de trabalho eventual, de trabalho
avulso e outras modalidades de pactuação de prestação de labor (DELGADO, 2014,
p.285).
No direito positivo brasileiro
nos artigos 442 e 443 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que o contrato
individual de trabalho seria, justamente, esse acordo, tácito ou expresso,
verbal ou escrito, por prazo determinado ou indeterminado, correspondente à
relação de emprego.
Assim, o contrato de trabalho
é negócio jurídico responsável por determinar as condições de prestação do
trabalho, no qual empregado e empregador irão ajustar quais são os direitos e
obrigações de cada um, sendo negócio jurídico, o ato jurídico que crie,
modifique, conserve ou extingue direitos.
A respeito do poder
empregatício segundo o artigo 2º da CLT nos remete ao poder de controle
empresarial, definindo empregador como a empresa, individual ou coletiva, que,
assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a
prestação pessoal de serviços. (Brasil, 1943).
O doutrinador Ricardo Resende
esclarece sobre o poder empregatício que decorre do contrato de trabalho e
consistente no conjunto de prerrogativas conferidas ao empregador no sentido da
direção da prestação dos serviços. Portanto, o fundamento do poder empregatício
é, para a doutrina amplamente majoritária, o próprio contrato de trabalho,
consubstanciado em um acordo de vontades que origina a relação empregatícia e,
a partir desta, faz surgir direitos e deveres para os contratantes (empregador
e empregado). (RESENDE, 2014, p. 308).
O poder diretivo se apresenta
como sendo o poder de comando e de gestão do empregador através do qual ele
organiza a estrutura da empresa e a prestação do serviço, determinando a gestão
e direção do negócio. E, ainda, de acordo com Maurício Godinho, o poder
empregatício pode ser conceituado como conjunto de prerrogativas com respeito à
direção, regulamentação, fiscalização e disciplinamento da economia interna à
empresa e correspondente a prestação de serviços (DELGADO, 2014, p. 684).
O poder diretivo empresarial
do empregador pode ser encarado como sendo gênero do qual integram os poderes
regulamentar, fiscalizatório e o disciplinar[1]. E, referente a essas
outras dimensões do poder empregatício, afirma-se que o poder regulamentar
refere-se ao privilégio do empregador de fixar regras gerais a serem cumpridas
na empresa e, se consolida por meio de memorandum, circulares, instruções e
regulamentos internos que irão estruturar o trabalho, porém, sempre respeitando
o disposto na CLT.
O poder fiscalizatório poderá
ser entendido como a prerrogativa do empregador de fiscalizar, acompanhar e
vigiar as atividades desenvolvidas pelo empregado. Por meio do controle de
horário, de frequência e de portaria, por exemplo, o empregador consegue
verificar se as atividades estão sendo prestadas conforme as exigências e o
contrato de trabalho.
E, ainda, quanto o poder
disciplinar[2]
que cuida da aplicação de sanções aos empregados quando descumprem suas
obrigações contratuais ou realizam infrações trabalhistas. E, Mantovani Júnior
definiu poder diretivo como aquele que permite ao empregador comandar e
controlar todos os aspectos do desenvolvimento da atividade por ele
desenvolvida. (JÚNIOR apud ALVARENGA, 2014, p.44).
Em atenção aos fundamentos dos
poderes do empregador, Segundo Alice Monteiro de Barros aduz que: “Mais
consistente é a teoria que fundamenta a existência dos poderes do empregador no
contrato de trabalho. Esses poderes são consequência imediata da celebração do
ajuste entre empregado e empregador, o qual coloca sob a responsabilidade deste
último a organização e a disciplina do trabalho realizado na empresa”. (BARROS,
2013, p. 460).
Reginaldo Melhado explica: “Os
institucionalistas vislumbram o fundamento dos poderes diretivos do empregador
já não mais no contrato, mas agora na própria substancialidade interna da
empresa organizada enquanto uma comunidade em que se fundem interesses
particular, sociais e estatais. A criação das normas de comportamento
obrigatório já não é atribuída ao contrato, senão ao dado objetivo de pertencer
a uma empresa”. (MELHADO, 2010, p. 59).
Frise-se que os direitos
fundamentais no âmbito das relações trabalhistas e que garantem a proteção do
indivíduo diante do Estado, e positivados na Constituição Federal brasileira
vigente, e integram o âmbito normativo interno do país.
Os direitos fundamentais,
propriamente, ditos são na essência, os direitos do homem livre e isolado, os
direitos que possui em face do Estado e, nesse sentido o Ministro do STF Alexandre
de Moraes discorre sobre as funções dos direitos fundamentais, in litteris:
“A função de direitos de defesa dos
cidadãos sob uma dupla perspectiva: constituem, num plano jurídico objetivo,
normas de competência negativa para os poderes públicos, proibindo
fundamentalmente as ingerências destes na esfera jurídica individual, e em
segundo, implicam, num plano jurídico subjetivo, o poder de exercer
positivamente direitos fundamentais (liberdade positiva) e de exigir omissões
dos poderes públicos de forma a evitar agressões lesivas por parte dos mesmos
(liberdade negativa)”. (MORAES, 2013, p. 28).
Doutrinariamente entende-se
que os direitos fundamentais podem ser de primeira, segunda, terceira, quarta e
quinta geração ou dimensão, sendo que tal classificação representa um marco
histórico, dando azo ao surgimento de novos direitos com a evolução temporal e
espacial e, a necessidade histórica de cada época.
Os de primeira geração são os
direitos da liberdade, ligados aos direitos individuais que garantam uma
abstenção estatal, enquanto os direitos da segunda geração são os da igualdade,
abrangendo direitos da coletividade como um todo, como resposta ao cenário de
um Estado Social, possuidor de inúmeras novas atribuições.
Existem, também, a terceira
geração de direitos, que se traduz nos direitos relativos à espécie humana de
modo geral, tendo, como exemplo, o direito ao meio ambiente, à paz e à autodeterminação
dos povos.
De acordo com Paulo Bonavides,
“é direito de quarta geração o direito à democracia, o direito à informação e o
direito ao pluralismo. Deles depende a concretização da sociedade aberta do
futuro [...]” (BONAVIDES, 2008, p. 571). Por fim, para alguns, existem ainda os
direitos de quinta geração, a exemplo do “direito à paz”.
A Constituição Redentora e
Cidadã[3], ou seja, a CRFB de 1988,
foi a primeira a dar maior e efetivo destaque aos direitos fundamentais e a
instituir ostensivamente o Estado Democrático de Direito, pautado no princípio
da dignidade da pessoa humana, onde o homem é o centro convergente de direitos.
E, assim, todos os direitos fundamentais do homem deverão orientar-se pelo
valor-fonte da dignidade.
Muito relevante é observar que
tais direitos fundamentais igualmente se projetam sobre todos os vínculos
laborais e as relações de trabalho, de modo que, além da proteção patrimonial
do empregador, deve ser resguardado igualmente o respeito do empregado enquanto
ser humano.
Eis que tais direitos
fundamentais são também direitos humanos, porém, previstos em tratados e
convenções internacionais. E, por direitos humanos são entendidos aqueles
direitos fundamentais que o homem possui pelo simples fato de ser homem, por
sua própria natureza humana, pela dignidade que lhe é inerente.
São direitos humanos aqueles
previstos na Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 consagra
diversos direitos, tal como a garantia à vida, dignidade, trabalho, liberdade,
dentre outros.
E, ademais, no que se refere
aos direitos humanos, no âmbito de proteção ao trabalho foi criado em 1919, a
Organização Internacional do Trabalho (OIT), que visa incrementar as soluções
sobre a cooperação internacional de todos os Estados nas relações de trabalho [...]
visar à melhoria das condições de vida dos trabalhadores em geral e à harmonia
entre o desenvolvimento econômico e o respeito à dignidade da pessoa humana.
Tem-se, ainda, os direitos da
personalidade, também oponíveis nas relações de trabalho. Tais direitos possuem
o objetivo de assegurar a preservação da integridade física, psíquica e moral
do empregado, se voltando à proteção de suas qualidades e tributos.
Nesse sentido, o julgado:
DANO MORAL[4]. RESTRIÇÃO AO USO DO
BANHEIRO.
01. É certo que o empregador detém
o poder diretivo, que abrange o poder de fiscalização ou de controle, composto
por um conjunto de prerrogativas que autorizam o acompanhamento da prestação
laboral no meio ambiente de trabalho. Todavia, tal poder não tem caráter
absoluto, não podendo aniquilar os direitos dos empregados, em especial os
direitos existenciais que decorrem da dignidade da pessoa, tais como os
direitos da personalidade, sob pena de configurar-se abuso de direito.
02. É inconcebível que um ser humano
não possa utilizar o banheiro, durante a jornada de trabalho, a seu bel-prazer,
conforme suas necessidades. Qualquer condicionante deste aspecto biológico
inerente à espécie humana representa agressão psicofísica que, por afrontar a
dignidade do trabalhador, causa-lhe dano moral que deve ser compensado.
(BRASIL, 2016b).
De fato, o empregador possui
prerrogativas que concentram em si o poder de dirigir a prestação dos serviços
e, não é absoluto ou ilimitado e, tampouco o empregado deve cumprir toda e qualquer
ordem ou comando emanado do empregador. O poder diretivo deve desenvolver-se
sempre de forma razoável, de modo a não contrariar a boa-fé objetiva[5], os direitos da
personalidade do trabalhador e a dignidade da pessoa humana.
Curial é entender que o poder
diretivo do empregador encontra seus limites na própria Constituição Federal
brasileira vigente, pois os direitos e princípios fundamentais ali
estabelecidos tutelam também essa relação de trabalho, partindo-se da proteção
da dignidade humana, da intimidade e da privacidade.
Igualmente, a Convenção 111 da
OIT ratificada pelo Brasil, que aborda a discriminação no emprego e na
profissão e o artigo 170 da atual Constituição Federal brasileira, que
disciplina a ordem econômica e a valorização do trabalho humano como
pressupostos para uma existência digna, in litteris:
TÍTULO
VII DA ORDEM
ECONÔMICA E FINANCEIRA
CAPÍTULO I DOS PRINCÍPIOS GERAIS DA ATIVIDADE ECONÔMICA
Art. 170. A ordem econômica, fundada na
valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a
todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os
seguintes princípios [...] (BRASIL, 1988).
Nessa perspectiva, prossegue
Rúbia Zanotelli:
“A subordinação jurídica do empregado não o
sujeita ao poder diretivo ilimitado do empregador, na verdade, este poder
encontra limites nos direitos da personalidade que compõem as liberdades
públicas salvaguardadas pela Constituição Federal de 1988, que veda ao empregador:
discriminar o trabalhador (incs. I e VIII); obrigá-lo a fazer ou a não fazer
algo expressamente previsto em lei (inc. II), submetê-lo a tortura e a
tratamento desumano ou degradante (inc. III); impedir a manifestação do seu
pensamento (inc. IV); violar sua liberdade de consciência e crença (inc. VI);
além de sua intimidade, imagem, honra e vida privada (inc. X), entre outras
liberdades públicas”. (ALVARENGA, 2014, p. 66).
O poder diretivo do empregado
pode sofrer restrições por meio das chamadas heterolimitações, cláusulas
impeditivas de abusos, constantes de acordos e convenções coletivas de
trabalho, e da legislação trazida pela CLT, que por exemplo, em seu art.483,
proíbe excessos:
CAPÍTULO V - DA RESCISÃO
Art. 483 - O empregado poderá considerar rescindido
o contrato e pleitear a devida indenização quando
forem exigidos serviços
superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou
alheios ao contrato; for tratado pelo empregador ou por seus superiores
hierárquicos com rigor excessivo; correr perigo manifesto de mal considerável; não
cumprir o empregador as obrigações do contrato; praticar o empregador ou seus
prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa
fama; o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de
legítima defesa, própria ou de outrem; o empregador reduzir o seu trabalho,
sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância
dos salários.
§ 1º - O empregado poderá suspender a
prestação dos serviços ou rescindir o contrato, quando tiver de desempenhar
obrigações legais, incompatíveis com a continuação do serviço. [...] (BRASIL,
1943).
Caso essas normas sejam
descumpridas pelo empregador, o empregado terá direito a rescindir seu contrato
de trabalho, por meio da chamada “rescisão indireta”, conforme dispõe o artigo
acima, que poderá ainda, ser cumulada a uma indenização por danos morais,
demonstrando mais uma limitação aos poderes do empregador.
Ademais, considerando-se a
realidade na qual muitas vezes o empregador se aproveita de seu poder de
direção, exercendo-o de forma abusiva, é possível que o empregado não se
sujeite a tais condições, colocando em prática seu direito de resistência, ou
seja, se recuse a cumprir ordens arbitrárias e ilegais.
Conforme o entendimento de
Maurício Godinho: “[...] é válida e juridicamente protegida a resistência
obreira a ordens ilícitas perpetradas pelo empregador no contexto empregatício.
O chamado direito de resistência é parte integrante do poder empregatício.”
O direito de resistência
também diz respeito a negativa de cumprimento de ordens injustas que possam
causar danos à saúde e segurança do trabalhador, a exemplo de realizar
determinada atividade sem os devidos equipamentos de proteção individual, levando-se
em consideração o princípio da dignidade humana e demais direitos fundamentais.
Portanto, o direito de
resistência do empregado surge da indignação e vontade de reagir, podendo
chegar a manifestações externas como uma resistência coletiva ou em grupo, já
que a união entre os trabalhadores encoraja e fortalece, devendo ser garantida
sua efetividade, como condição de efetiva proteção ao emprego.
Eis o entendimento da
jurisprudência:
RECURSO
ORDINÁRIO. DIREITO DE RESISTÊNCIA DO EMPREGADO. SUSPENSAO DISCIPLINAR. O
direito de resistência do empregado deriva diretamente do uso irregular do
poder diretivo patronal não gerando, assim, falta trabalhista ao obreiro.
Restando demonstrado nos autos que foi legítima a recusa do reclamante em não
realizar viagem ao Baixo Purus, por não ter condições de transporte de vacinas,
resta nula a suspensão aplicada. Recurso conhecido e improvido. (BRASIL, 2010).
Também neste contexto se
insere a problemática das revistas íntimas realizadas nos trabalhadores. Torna-se
evidente, nestes casos, espécie de conflito entre princípios constitucionais,
estando, de um lado, o direito à propriedade, e de outro, o direito à
intimidade ou à dignidade da pessoa humana.
Apesar da importância de
ambos, é respeitável a noção de que o fato de o empregado adentrar a empresa e
prestar serviços não lhe retira direitos fundamentais, além de que a dignidade
da pessoa humana constitui verdadeiro alicerce do Estado Democrático de
Direito, sendo um princípio de maior relevância.
Frise-se que é plena a
incidência dos direitos fundamentais nas relações trabalhistas. Sob essa ótica,
adentraremos em alguns desses direitos fundamentais que, de forma específica,
explicitam óbice ao exercício do poder diretivo empregatício.
Afirma o doutrinador José
Afonso da Silva que: “a dignidade da pessoa humana é um valor supremo que atrai
o conteúdo de todos os direitos fundamentais do Homem, desde o direito à vida”
(SILVA, 2013, p. 117).
Desta forma, a dignidade da
pessoa humana, fundamento central da Constituição de 1988, também se aplica às
relações laborais, devendo ser o suporte de qualquer trabalho ou emprego,
garantindo que seja prestado mediante condições dignas e decentes.
Conforme aludido
anteriormente, a Constituição vigente foi a primeira a trazer o princípio da
dignidade humana como um fundamento da República e do Estado Democrático de
Direito e, em seu art. 170, como um fim da ordem econômica, vez que aborda a
valorização do trabalho humano como meio de se assegurar a todos uma existência
digna.
Desta forma, o ilustre
Maurício Godinho, quanto à CRFB de 1988, nos ensina que:
[...] a Magna Carta, de forma sábia,
percebeu que a valorização do trabalho é um importante veículo de valorização
do próprio ser humano, tendo em vista que é pelo trabalho que uma soma de
indivíduos se mantém e se afirma na desigual sociedade capitalista. (DELGADO,
2004, p. 32).
Essa proteção constitucional
deve ser utilizada visando a eliminar toda e qualquer conduta que possa ferir a
dignidade do trabalhador, uma vez que esta deve ser preservada também no
desenvolvimento de atividades laborativas, pois, antes de ser trabalhador, é
também uma pessoa.
Conforme a doutrinadora Rúbia
Zanotelli de Alvarenga:
“Cabe ao empregador a obrigação de prover
o trabalho adequadamente e possibilitar a execução dos serviços de forma
harmoniosa, respeitando, sempre, a integridade física, psíquica, moral, e
intelectual do trabalhador. Esta constitui a razão de destaque quando se trata
da valorização do trabalho e da preservação da dignidade do trabalhador, visto
que são eles que revelam os atributos inerentes e indissociáveis da pessoa
humana”. (ALVARENGA, 2014, p. 101).
Ressaltando que a
cristalização do princípio da dignidade humana, no Direito do Trabalho,
“consiste em assegurar condições existenciais mínimas a uma vida plenamente
saudável” (ALVARENGA, 2014, p. 101).
Assim, deve ser assegurado a
todos um local de trabalho isento de qualquer humilhação ou desrespeito, no
qual sejam designadas tarefas do nível da qualificação profissional de cada um,
além das necessárias condições protetivas capazes de impedir acidentes de
trabalho e doenças que provoquem danos à pessoa do empregado.
Nesse sentido:
“TRT-PR-15-05-2012
VIOLAÇÃO À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA CONFIGURADA. DANO MORAL DEVIDO. Na
hipótese dos autos, é inconteste o não fornecimento de banheiro, água potável e
abrigo para se proteger das intempéries climáticas alheias ao trabalho do
Autor. O trabalho tem por finalidade, essencialmente, conferir dignidade ao ser
humano, traduzindo-se em uma das formas de exteriorização da cidadania, não se
podendo considerá-lo apenas em seu aspecto econômico. Inegável que a Ré relegou
as condições de trabalho do Reclamante a segundo plano, ao deixar de oferecer
condições mínimas e dignas de higiene e saúde, atingindo-o como pessoa e
trabalhador. Esse fato autoriza a indenização por danos morais ao empregado.
Não observou os princípios fundamentais estabelecidos na Carta Magna, mormente
a prevalência da dignidade da pessoa humana e do valor social do trabalho
(inciso III e IV do art. 1º), sem olvidar o enaltecimento dos direitos humanos
(inciso II do art. 4º). Não se tem o labor externo como caracterização do ato
ilícito, mas o não fornecimento de meios para o Autor atender suas necessidades
básicas. Recurso da Reclamada a que se nega provimento, no particular”.
(BRASIL, 2012).
O direito à intimidade,
supramencionado, também é garantido constitucionalmente e pode ser entendido
como um direito da personalidade, que diz respeito à garantia que todas as
pessoas têm de que seus pensamentos, sentimentos, bem como outros aspectos
íntimos, não sejam revelados ou cheguem ao conhecimento de terceiros.
No mesmo sentido, Nilson
Nascimento sustenta que o direito à intimidade “consiste na prerrogativa que
tem a pessoa de estar só e de evitar que pessoas estranhas se intrometam em sua
vida ou tenham acesso sobre fatos e coisas de seu foro íntimo e privado”
(NASCIMENTO, 2009, p. 87).
O direito à intimidade garante
ao empregado, assim como a qualquer pessoa, sua liberdade de opção sexual,
religiosa, política, liberdade de pensamento, desejos e preferências, ou de
forma equivalente, o direito de preservar e guardar segredo em relação a isso.
Na dicção de Manoel Jorge e
Silva Neto, “o direito à intimidade expressa a esfera recôndita do indivíduo. A
intimidade, corresponde, assim, ao conjunto de informações, hábitos, vícios e
segredos pertencentes ao seu titular” (SILVA NETO, 2005, p. 57).
E ainda, ensina Barbosa Júnior
que a intimidade “integra a esfera íntima do indivíduo, sendo o repositório dos
segredos e das particularidades, cuja mínima publicidade poderá constranger”
(BARBOSA JÚNIOR, 2008, p. 60).
O direito à privacidade também
se encontra protegido pela Constituição de 1988, em seu artigo 5º, inciso X:
TÍTULO II
Dos Direitos e Garantias Fundamentais
CAPÍTULO I
DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E
COLETIVOS
Art. 5º Todos são iguais
perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos
brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito
à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos
seguintes:
[...]
X - são invioláveis a
intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o
direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;
(BRASIL, 1988).
E também na Declaração
Universal dos Direitos Humanos:
XII- Ninguém será sujeito a
interferências na sua vida privada, na de sua família, no seu lar ou na sua
correspondência, nem a ataques à sua honra e reputação. Toda pessoa tem direito
à proteção da lei contra tais interferências ou ataques. (ORGANIZAÇÃO DAS
NAÇÕES UNIDAS, 1948).
A privacidade compreende, por
exemplo, os acontecimentos na vida do trabalhador, enquanto ser humano, bem
como seus relacionamentos com familiares e amigos, constituindo informações que
também se deseja excluir do conhecimento público.
Segundo Nilson Nascimento, o
direito à vida privada “é o conjunto de atributos que cada pessoa elege para
fazer parte de sua vida privada e mantê-la a salvo de intromissões indesejadas
de estranhos” (NASCIMENTO, 2009, p. 290).
O notável professor e
doutrinador Arion Sayão Romita ensina que:
“A esfera da vida privada sobrepõe-se à da
intimidade, porque possui raio maior que ela. Por privacidade, deve-se entender
a faculdade assegurada ao empregado de excluir o empregador do acesso a
informações e de impedir a divulgação de informações capazes de afetar sua
sensibilidade”. (ROMITA, 2009, p. 89).
Tendo em vista a proximidade
da intimidade com a privacidade, Leda Silva as distingue, esclarecendo que o
direito à intimidade “abrange fatos da vida pessoal do indivíduo que até mesmo
sua própria família pode desconhecer, como, por exemplo, suas preferências
sexuais, hábitos, vícios, dentre outros” (SILVA LEDA, 2005, p. 123).
E continua, em relação à
privacidade: “enquanto o que diz respeito à vida privada já abrange suas
relações familiares e com terceiros, como interferir em empréstimos feitos
junto aos seus familiares ou obter informações sobre o saldo bancário do
empregado” (SILVA LEDA, 2005, p. 123).
De forma semelhante, a
doutrina de direito civil brasileiro também faz a distinção:
“A privacidade não se confunde com a
intimidade, mas esta pode incluir-se naquela, por integrarem ambas o direito à
vida privada. Por isso, as tratamos de modo diverso, apesar de a privacidade
voltar-se a aspectos externos da existência humana - como recolhimento em sua
residência sem ser molestado, escolha do modo de viver, hábitos, comunicação
via epistolar ou telefônica etc. - e a intimidade dizer respeito a aspectos
internos do viver da pessoa, como segredo pessoal, relacionamento amoroso,
situação de pudor, diário íntimo, respeito à enfermidade ou à dor pela perda da
pessoa querida”.
Portanto, nas relações de
trabalho, o empregador não pode questionar ou intrometer-se nos laços de
amizade e de relacionamentos do empregado, cabendo somente a este decidir sobre
sua vida pessoal.
Tendo em vista,
principalmente, o princípio da dignidade humana, em que pese se encontrar o
trabalhador subordinado ao patrão, detentor da prerrogativa do poder diretivo,
que lhe permite organizar a estrutura de sua empresa e a prestação do serviço,
este poder não é ilimitado, tampouco absoluto.
A Constituição brasileira
vigente, já no artigo primeiro, assegura constituir o país em Estado
Democrático de Direito, sendo esse o que possui como vértice axiológico a
dignidade da pessoa humana, bem como a ascendência dos direitos fundamentais,
que também se aplicam nas relações de trabalho, servindo como limitação ao
poder supramencionado.
Em qualquer hipótese, a
realização do trabalho não deve se dar somente como fonte produtiva e
enriquecimento do empregador, mas também como valorização e subsistência
daquele que o presta, assegurando sua existência digna.
Os limites[6] externos ao poder diretivo
são aqueles previstos na Constituição, nas leis, nos acordos e convenções
coletivas de trabalho, regulamentos internos da empresa e no contrato de
trabalho firmado entre as partes; ao passo que os limites internos são pautados
pela boa-fé objetiva das partes e o exercício regular de direito.
A forma de execução do
trabalho, seja ela na modalidade presencial ou remota, não retira do empregado,
a proteção de seus direitos e garantias fundamentais assegurados, e é diante
destes fatos que o estudo acerca dos limites do poder diretivo em regime de
teletrabalho tem maior relevância, uma vez que esta modalidade vem crescendo
cada vez mais, e, portanto, tem a necessidade de um aprofundamento teórico.
A CLT em seu artigo 75-B,
determinou que o teletrabalho é a prestação de serviços preponderantemente fora
das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e
de comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo. teletrabalho consiste no trabalho a distância,
seja ele de forma parcial ou integral, em outros termos, aquele realizado pelo
empregado fora das dependências da empresa. Contudo, ao empregado basta o
acesso remoto de trabalho, razão pela qual as atividades por ele desempenhadas
não se limitam a execução em seu domicílio.
Acerca deste regime, conceitua
o renomado autor Oliveira Neto (2017, p. 96):
O teletrabalho pode ser conceituado como
trabalho prestado, ao menos em parte à distância, fora da sede da organização
empresarial, mediante uso da telemática, com flexibilidade de jornada laboral[7], e ausência de fiscalização
direta, empoderando o teletrabalhador diante da auto-organização e autonomia de
gestão do tempo, e em certa medida de suas atividades.
Essa flexibilização dos
contratos de trabalho, de certa forma limita as proteções e garantias do
empregado, diante disto, visando uma relação contratual harmônica e
equilibrada, prezando pela qualidade de vida junto a uma boa produtividade do
empregado, há a necessidade de um aprofundamento teórico a fim de limitar o
poder diretivo do empregador e evitando por seguinte, o abuso deste poder.
Conforme se interpreta os §§
1º e 2º do artigo 75-C da CLT, o legislador ao utilizar o termo “expressamente”
no caput do referido artigo pretendeu exigir o registro escrito nos contratos
para a adoção deste regime.
Ainda, o empregado que exerce
suas funções de forma remota não sofre qualquer alteração salarial em
decorrência deste regime, ainda, a eles são assegurados os mesmos direitos
trabalhistas que os demais colaboradores da empresa contratante.
Conforme previsto no artigo 6º
da CLT, supracitado, o fato de exercer as atividades laborais em local distinto a sede
da empresa, não tira do empregado a condição
de igualdade de direitos trabalhistas daqueles que laboram de forma presencial, tais como: registro em carteira de
trabalho (CTPS), pagamento de
remuneração mensal, descanso semanal
remunerado, décimo terceiro salário, férias acrescidas do 1/3 constitucional, recolhimento do Fundo
de Garantia Por Tempo de Serviço (FGTS),
e aviso prévio em caso de rescisão contratual.
Acerca do controle de jornada
e intervalos, muitas são as controvérsias, o fato de os empregados em regime de
teletrabalho, laborarem longe de qualquer supervisão e controle direto do
empregador, dificulta o controle de sua jornada de trabalho e intervalos, tal
qual é o entendimento do artigo 62 da CLT.
Ocorre que, em contrapartida
ao entendimento do artigo 62 da CLT (BRASIL, 1943), o parágrafo único do artigo
6º desta mesma consolidação traz que: “Os meios telemáticos e informatizados de
comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação
jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do
trabalho alheio”.
Analisado caso a caso, se
enquadram na hipótese do artigo 62 da CLT, apenas aqueles que não tem a possibilidade do
controle de jornada, porém, atualmente,
com o avanço da tecnologia da informação, o controle de jornada como subordinação jurídica no teletrabalho é
plenamente possível e pode ser realizado por diversos meios, aplicativos, programas e
sistemas online os quais permitem a utilização pontos digitais, sistema de logon
e logoff, relatórios de atividades realizadas, entre outros, sendo assim, deve o
empregador utilizar de toda e qualquer meio
tecnológico para facilitar o controle de jornada de seu empregado.
Ainda neste aspecto, este é
entendimento do doutrinador Ricardo Resende (2020, p. 429) “[...] se não restar
comprovada a impossibilidade de controle de ponto do teletrabalhador,
evidenciando-se apenas o desinteresse do empregador em manter o controle de
jornada, estará afastada a incidência do inciso III do art. 62”.
O controle de jornada de
trabalho é de suma importância, uma vez que visa a proteção do empregado contra
jornadas extenuantes, preservando sua saúde física e mental, bem como, garante
ao empregado pagamento das horas extras devidas e adicional noturno, se devido.
Seguindo os ditames da lei
suprema brasileira, em seu artigo 7º, inciso XIII, estabelece que a duração do
trabalho diário do empregado não deve ser superior a oito horas e quarente
quatro horas semanais, sendo essa a regra aplicada também aos empregados em
regime de teletrabalho.
No que diz respeito ao
intervalo intrajornada, como norma de ordem pública, o artigo 71 da CLT, prevê a obrigatoriedade da
fruição diária deste intervalo, sendo este um direito indisponível pelas
partes, sendo assim, conforme a própria redação do artigo, em qualquer trabalho contínuo, o
empregado, mesmo que em regime de teletrabalho[8], tem direito a fruição
deste intervalo, com total desvinculação de suas atividades laborais, a depender de uma análise
de sua carga horária de trabalho diária,
seguindo as mesmas regras do artigo acima citado.
Esclareça-se que o
não-trabalho aqui referido não é visto no sentido de não trabalhar
completamente e sim no sentido de trabalhar menos, até o nível necessário à
preservação da vida privada e da saúde, considerando-se essencial esta
preocupação (de se desligar, concretamente, do trabalho) exatamente por conta
das características deste mundo do trabalho marcado pela evolução da tecnologia
[...].
Embora não possua matéria
consolidada no ordenamento jurídico brasileiro, o direito à desconexão possui
fundamento constitucional com valor de direito fundamental, eis que fora
fundado no direito social ao lazer e ao descanso, conforme interpretação de
Oliveira Neto (2017, p. 85).
O fato de o empregado trazer o
trabalho para dentro de sua casa, não significa que este permaneça à disposição
de seu empregador a qualquer tempo, portanto, se necessário a execução de
qualquer atividade durante o período de descanso do trabalhador, este tempo
deve ser contado como hora extra, destacando-se o fato de o teletrabalho não se
distinguir daquele realizado de forma presencial.
Frise-se a importância do
controle de jornada e respeito a fruição dos intervalos intrajornada e
interjonada, a fim de evitar a sobrecarga injusta de labor.
Quanto a responsabilidades
pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos e infraestrutura, a Lei nº 13.467
de 2017, ao inserir o capítulo II-A, “do teletrabalho” à CLT, trouxe o artigo 75-D, o
qual dispõe que deverá estar previsto em contrato escrito quanto a quem recai à
responsabilidade, empregado ou empregador,
pela aquisição, manutenção ou fornecimento dos equipamentos tecnológicos, como computadores e celulares, e
da infraestrutura necessária e adequada
à prestação do trabalho remoto, neste caso o acesso à internet e a energia elétrica, bem como ao reembolso de
despesas arcadas pelo empregado
No tocante as doenças e
acidentes de trabalho, a CLT dispõe em seu artigo 75-E que é dever do
empregador treinar e orientar seus empregados, de maneira expressa e ostensiva,
quanto às precauções a serem tomadas a fim de evitar doenças e acidentes de
trabalho, garantindo ao empregado melhor qualidade e bem-estar no exercício de
suas funções, consequentemente evitando prejuízos a sua saúde física e mental.
Por exercer suas atividades
longe do monitoramento natural do empregador, o empregado em teletrabalho tem a
obrigação de assinar um termo de responsabilidade, no qual se compromete a
seguir as instruções fornecidas por seu superior, de acordo com o exposto no
parágrafo único do artigo supracitado.
Diretamente ligado ao direito
fundamental do empregado a um ambiente de trabalho seguro e saudável, sendo
esta responsabilidade do empregador, o enfoque maior destas instruções, estão
ligadas principalmente a ergonomia física na execução das atividades e uso dos
equipamentos de trabalho pelo empregado, ideia trazida por Oliveira Neto (2017,
p.156).
O artigo 75-E da CLT ao usar
as seguintes expressões “de maneira expressa e ostensiva”, propõe a elaboração
de um documento por escrito, com as devidas orientações, de maneira clara e
objetiva acerca da execução do trabalho e seus possíveis riscos.
Evidente que,
independentemente do regime de trabalho, a qualquer tempo, o empregado pode
adoecer por causas naturais, nestes casos, a regra continua a mesma, deve o
obreiro buscar a ajuda médica e caso lhe seja recomendado o afastamento do
labor, este deve ser devidamente comprovado por documento médico, o qual deve
ser entregue ao empregador para justificação e abono de suas faltas.
No tocante ao descanso anual
devido, a fruição das férias relaciona-se também ao direito à desconexão, em
seu artigo 6º, a Constituição Federal brasileira garante ao empregado, o
direito ao descanso e ao lazer, sendo assim, como para todos os empregados,
qualquer que seja seu regime de trabalho, as férias anuais são asseguradas, nos
moldes do capítulo IV da CLT.
Devidamente fruído o período
de 12 meses, à data em que o empregado tiver o direito adquirido, poderá ser
concedido as suas férias, as quais poderão ser usufruídas em até três períodos,
conforme disposto no artigo 134, §1º da CLT, sendo pago ao empregado o salário
das férias acrescido do adicional de 1/3 constitucional, a serem pagos até dois
dias antes do início das férias.
Por fim, no que diz respeito a
proteção de dados pessoais do empregado, a Lei Geral de Proteção de Dados[9], que entrou em vigor no
mês de setembro de 2020, com a finalidade de proteção de dados pessoais
envolvendo direitos fundamentais de liberdade e de privacidade de pessoas
físicas ou jurídicas, não trouxe matéria específica legislada acerca de matéria
trabalhista, porém, ao se interpretar a LGPD, essa é aplicada também no âmbito
trabalhista.
Em regra, a empresa é quem
possui a responsabilidade pelo armazenamento sigiloso dos dados de seus
funcionários, tendo o dever de proteger e guardar estas informações, sendo
assim, para evitar qualquer risco de ser penalizado, este deve agir de forma
cautelosa, sempre seguindo os padrões legais.
Sendo o empregado pessoa
física, insere-se na regra geral da LGPD, sendo garantido a proteção e
preservação de seus dados pessoais, o qual é titular, conforme dispõe o artigo
5º, V da referida lei.
A aplicação da LGPD se vê
fundamental nas relações trabalhistas tendo em vista a eventual necessidade,
por determinação legal, do empregador compartilhar dados de seu empregado com
terceiros.
O empregado que labora
remotamente, está mais suscetível a sofrer de vazamento de dados até mesmo por
ataques hackers, neste caso, cabe ao empregador orientar seus funcionários
acerca destes riscos.
Diante do exposto, ao
empregado será devido apenas o fornecimento daqueles dados necessários e
suficientes para a relação contratual, devendo o empregador, na posse destes
dados, o manterem em sigilo.
O poder de comando do
empregador deve ser limitado, a fim de buscar um equilíbrio entre uma boa
qualidade de vida laboral e melhor produtividade do empregado em teletrabalho.
Este ponto de equilíbrio deve ser traçado tendo por base os princípios da
proporcionalidade e da racionalidade, evitando por conseguinte, prejuízo às
partes.
Farta é a doutrina acerca
deste assunto, o autor Carlos Henrique Bezerra Leite (2021, p. 121) atenta
sobre isso, in litteris:
“Ademais, é preciso atenção para os
modos de controle e vigilância do trabalho em domicílio (ou a distância ou em
regime de teletrabalho) levados a efeito pelo empregador, pois em nenhuma
hipótese poderá haver lesão ou ameaça aos direitos fundamentais de privacidade,
imagem e intimidade do empregado, máxime porque a sua proteção em face da
automação também é considerada um direito fundamental social (CF/1988, art. 7º,
XXVII)”.
Não há dúvidas que a
intensificação deste regime nos últimos tempos trouxe uma sequência de
dificuldades e obstáculos para as partes envolvidas.
Dessarte, esta flexibilização
dos contratos de trabalho, de certa forma limita as proteções e garantias do
empregado, diante disto, visando uma relação contratual harmônica e
equilibrada, prezando pela qualidade de vida junto a uma boa produtividade do
empregado, há a necessidade de um aprofundamento teórico a fim de limitar o
poder de comando do empregador e evitando por seguinte, o abuso deste pode.
Os direitos de personalidade
estabelecidos pela Constituição Federal brasileira e demais dispositivos não
representam um rol taxativo, uma vez que, a sociedade está em constante
evolução, as normas devem se adaptar, sempre em respeito ao mínimo já
existente.
Diante disto, são direitos de
personalidade do empregado: primeiramente a dignidade da pessoa humana, sendo o
maior limitador do poder diretivo. Expresso na Constituição Federal logo em seu
artigo 1º, inciso III, o qual garante uma vida digna a todos os seres humanos,
incluindo nas relações de trabalho.
Considerado o maior patrimônio
da humanidade, a dignidade da pessoa humana é um princípio fundamental que norteia
a Constituição Federal. Neste aspecto, Oliveira Neto (2015, p. 53) afirma:
“Significa dizer que a nação brasileira elegeu a dignidade da pessoa humana
como fundamento da República, de tal arte que todas as ações do Estado e dos
particulares devem observar o respeito a dignidade da pessoa humana.”
A Consolidação das Leis do
Trabalho (BRASIL, 1943) trouxe em seu artigo 444, a seguinte disposição:
“As relações contratuais de trabalho podem
ser objeto de livre estipulação das partes interessadas em tudo quanto não
contravenha às disposições de proteção ao trabalho, aos contratos coletivos que
lhes sejam aplicáveis e às decisões das autoridades competentes”.
Conforme acima transcrito, a
legislação trabalhista autoriza as partes, a livre estipulação quanto as
relações contratuais de trabalho, as quais podem ser realizadas por meio de
acordo individual ou até mesmo pelo próprio contrato individual de trabalho.
Essa ferramenta é utilizada como uma forma de flexibilização da relação entre
empegado e empregador, contudo, as condições determinadas possuem limitações.
Apesar das lacunas
legislativas acerca do teletrabalho, o preenchimento destas pelo empregador,
deverá ser realizada de forma cautelosa, a fim de evitar cláusulas abusivas que
desfavoreçam o empregado.
O desrespeito aos limites do
poder diretivo e a violação aos direitos e garantias do empregado, quando
recorrentes no dia a dia, podem acarretar diversas emoções negativas no
trabalhador, causando prejuízos a sua saúde mental, violando diretamente seu
direito a intimidade, tendo em vista a impossibilidade de gozar, integralmente,
dos momentos de descanso, desconectando-se física e mentalmente das obrigações
laborais.
Sendo assim, demonstrada a
existência do abuso de direito, do dano sofrido pelo empregado e do nexo de
causalidade entre eles, surge o dever da responsabilização civil, a fim de
reparar o dano causado. Diversos diplomas legais disciplinam a responsabilidade[10] de quem de qualquer forma
causa danos a terceiros, como o disposto nos artigos 186 e 187 do Código Civil.
Ademais, o direito à reparação
por danos morais, por ofensa aos direitos da personalidade encontra fundamento
no artigo 5º, incisos V e X da Constituição Federal (BRASIL, 1998
Ressalta-se que o exercício do
poder diretivo se estende inclusive aos prepostos, superiores hierárquicos,
administradores, entre outros dirigentes responsáveis pela ordem e fiscalização
de determinada empresa, sendo assim, o artigo 932, inciso III, do Código Civil
(BRASIL, 2002) menciona que são também responsáveis pela reparação civil: “III
- o empregador ou comitente, por seus empregados, serviçais e prepostos, no
exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele.”
Atente-se que são pertinentes
os recentes precedentes de nossos Tribunais do Trabalho, que já tendem a
promover uma limitação do Poder Disciplinar do empregador, remetendo inclusive
ao sindicato a notícia da sanção aplicada, como refletem os entendimentos abaixo
colacionados, in verbis:
“Precedente Normativo nº 26 do
TRT3 – Advertência ou Suspensão – Comunicação Por Escrito – “As advertências[11] e suspensões só poderão
ter eficácia jurídica quando comunicadas por escrito ao empregado, com menção
expressa dos motivos da pena disciplinar. Faculta-se ao empregador remeter à
entidade sindical representativa da categoria profissional cópia do comunicado
da dispensa nos casos de recusa do empregado em recebê-la, salvo se houver
conselho paritário de empresa no estabelecimento, a quem será dada ciência do
fato”.
“Precedente Normativo nº 75 do TRT15 – Suspensão – Comunicação Por Escrito – Defere-se o pleito de presumir-se injusta a suspensão de empregado, quando não lhe forem informados os motivos determinantes, por escrito. Cláusula-Padrão: Presumir-se-á injusta a suspensão de empregado, quando não lhe forem informados os motivos determinantes, por escrito”.
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Notas:
[1] Ao aplicar sanções disciplinares, o empregador há de observar os seguintes requisitos: Atualidade da punição: a sanção ao empregado deve ser imediata ao ato faltoso. A mora na aplicação da penalidade pode caracterizar o que se conhece como "perdão tácito" por parte do empregador. Todavia, em se tratando de causas complexas, até por precaução, é admitido o decurso de certo período, destinado à apuração dos fatos ocorridos, assim como das responsabilidades, para só então aplicar a medida cabível; Unicidade da pena: a falta cometida pelo empregado enseja ao empregador o direito de aplicar, apenas, uma determinada penalidade, impedindo-se o bis in idem. Por conseguinte, não se pode aplicar uma advertência e, posteriormente, uma suspensão, por uma única falta cometida. Convém, no entanto, que o empregador faça referência a penalidades já anteriormente aplicadas para se caracterizar a reiteração do ato faltoso ensejando, pela reincidência, uma pena mais severa; Proporcionalidade: entre a penalidade e a falta cometida deve haver proporcionalidade, isto é, o empregador deverá atentar à dosagem de pena merecida pelo empregado, considerando: a condição pessoal do empregado (grau de instrução, por exemplo); o passado funcional (se o empregado cometeu outras faltas); os motivos que determinaram a prática da falta (falta de equipamento, falta de treinamento em determinada atividade, entre outras). O rigor excessivo na aplicação da sanção ou o emprego de meios vexatórios (advertir o empregado humilhando-o na presença de colegas ou clientes, por exemplo) implicam falta grave pelo empregador, ensejando rescisão indireta do contrato de trabalho; Prazo de duração: a suspensão do empregado pode ser de, no máximo, 30 dias corridos. Caso a falta cometida enseje mais de 30 dias de suspensão, certamente é tão grave que provavelmente possa ser enquadrada como justa causa, conforme dispõem os motivos previstos no artigo 482 consolidado.
[2]
Empresa pode verificar e-mail corporativo de funcionário. O acesso da
empresa ao correio eletrônico institucional do empregado não caracteriza
violação de privacidade. Se o trabalhador quiser sigilo garantido, deve criar o
próprio e-mail. Tendo em vista o início de vigência da Lei Geral de
Proteção de Dados (LGPD), que garante, mesmo no âmbito trabalhista, a proteção
dos dados dos trabalhadores e o dever de guarda consciente e eficiente dessas
informações pelos empresários. A LGPD representa um significativo avanço,
considerando a precariedade global no que diz respeito à matéria legislativa
para fins de controles de dados, principalmente das informações que existem no
"mundo virtual". Mas o instituto não representa um salvo-conduto, no
sentido de que as ações realizadas em meio digital não estão isentas de fiscalização
ou controle, independentemente da concordância dos envolvidos.
[3]
Em 1986 durante a Presidência da República de José Sarney quando houve as
eleições para o Congresso Nacional e, então, 559 eleitos formaram a Assembleia
Constituinte que elaborou a nova Constituição entre 1987 a 1988. Foi chamada de
Constituição Cidadã pois trouxe uma série de avanços nos direitos dos cidadãos
brasileiros entre estes, Educação e Saúde para todos. desde a independência do
Brasil em 1822, é a sétima constituição que nosso país tem – e a sexta desde
que somos uma República. Foi resultado do esforço político pela
redemocratização e símbolo do fim do autoritarismo dos militares. A
Constituição brasileira de 1988 é o texto-base que determina os direitos e os
deveres dos entes políticos e dos cidadãos do nosso país.
[4] Dano moral é aquele que repercute no íntimo de uma pessoa, sendo provocado por ação ou omissão de outrem e que causa dor ou qualquer sentimento possível de gerar efeitos sobre o estado psicológico da pessoa. No direito do trabalho está previsto o assédio moral, uma vez que se trata do ramo do Direito destinado a regular as relações entre empregados e empregadores, sendo princípio basilar a proteção jurídica do trabalhador, que deve ter sua dignidade humana preservada e reparada em caso de violação. Assim, a obrigação de indenizar surge toda vez que o patrimônio moral – quer do empregado, quer do empregador – reste desrespeitado e/ou agredido; toda vez que se verificar ofensa ou lesão à dignidade, ou qualquer outro valor íntimo, de qualquer das partes do contrato de trabalho, havendo inequívoca relação de causa e efeito entre o ato ilícito (ação ou omissão) e o dano experimentado.
[5]
Função social do contrato de trabalho é exercida na prática do dia a dia das
relações entre empregados e empregadores, dado o caráter diuturno de trato
sucessivo desse negócio jurídico. Assim, atendendo à sua finalidade
teleológica, o direito da parte economicamente mais fraca será protegido e
revestir-se-á de legitimação e eficácia, com arrimo nos mais altos preceitos da
função social do contrato e da propriedade, desde que não venham ferir ou lesar
os interesses das partes menos privilegiadas e atentem para o aperfeiçoamento
dos direitos fundamentais da pessoa humana. É primordial, portanto, que, para o
devido cumprimento dessas obrigações num contrato a longo prazo, as partes
atuem de boa-fé.
[6]
Assédio moral é um tipo de assédio, conhecido como mobbing (molestar)
nos Estados Unidos, bullying (tiranizar) na Inglaterra, harcèlement
(assédio moral) na França, murahachibu (ostracismo social) no Japão ou,
ainda, manipulação perversa, terrorismo psicológico. Caracteriza-se por ser uma
conduta abusiva, de natureza psicológica, que atenta contra a dignidade
psíquica do trabalhador, de forma repetitiva e prolongada, e que expõe o mesmo
a situações humilhantes e constrangedoras, capazes de causar ofensa à
personalidade, à dignidade ou à integridade psíquica, e que tenha por efeito
excluir a posição do empregado no emprego ou deteriorar o ambiente de trabalho,
durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções. Segundo
Marie-France Hirigoyen: “o assédio moral no trabalho é toda e qualquer conduta
abusiva manifestando-se sobretudo por comportamentos, palavras, gestos,
escritos que possam trazer dano à personalidade, à dignidade ou à integridade
física ou psíquica de uma pessoa, pôr em perigo seu emprego ou degradar o
ambiente de trabalho”.
[7]
Horário flexível consiste em permitir que funcionários tenham mais liberdade na
escolha de seu expediente: desde a hora em que começarão a trabalhar até o
local em que farão suas atividades. A iniciativa segue a premissa de que
existem horas a serem cumpridas diariamente, mas sem especificação de horário e
lugar. Existem três modalidades de trabalho flexível que a empresa pode aderir,
de acordo com o perfil de cada profissional. O horário fixo variável, no qual o
funcionário opta por horários alternativos propostos pelo empregador. O horário
variável, no qual o colaborador é quem decide sua jornada de trabalho, mas com
uma carga diária a se cumprir. E o horário livre, no qual o profissional possui
um período para entregar um projeto, por exemplo, e decide como irá conduzir a
produção.
[8] A previsão legal para o teletrabalho aparece
no artigo 6º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), que afasta as
distinções entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o
executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que
estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego. O parágrafo único
do dispositivo, introduzido em 2011, estabelece que “os meios telemáticos e
informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de
subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e
supervisão do trabalho alheio”. A Reforma Trabalhista (Lei 13.467/2017)
introduziu um novo capítulo na CLT dedicado especialmente ao tema: é o Capítulo
II-A, “Do Teletrabalho”, com os artigos 75-A a 75-E). Os dispositivos definem o
teletrabalho como “a prestação de serviços preponderantemente fora das
dependências do empregador, com a utilização de tecnologias de informação e de
comunicação que, por sua natureza, não se constituam como trabalho externo”.
Assim, operações externas, como as de vendedor, motorista, ajudante de viagem e
outros que não têm um local fixo de trabalho não são consideradas teletrabalho.
[9]
Princípios jurídicos assim considerados pela LGPD em relação ao
tratamento: i) finalidade; ii)
adequação; iii) necessidade; iv) livre acesso; v) qualidade dos dados; vi)
transparência; vii) segurança; viii) prevenção; ix) não discriminação; e, x)
responsabilização e prestação de contas. A regra geral, portanto, trazida pela
LGPD, é não se realizar o tratamento; a exceção, ao reverso, é a de realizá-la,
se e quando o atingimento de determinada finalidade se mostrar relevante para
que o tratamento seja realizado.
[10]
É objetiva a responsabilidade civil do empregador por danos sofridos pelo
empregado em decorrência da execução do contrato de trabalho ou mesmo pela
cessação abrupta e inescusável do contrato, e que o dano pode ser aferido
tomando-se por foco também o interesse social.