Loucura Dissipada. O Alienista. A situação jurídica do doente mental no Brasil
O alienista procedeu a uma vasta classificação dos seus enfermos. Dividiu-os, primeiramente, em duas classes principais: os furiosos e os mansos; daí passou às subclasses, monomanias, delírios, alucinações diversas. Isto feito, começou um estudo aturado e contínuo; analisava os hábitos de cada louco, as horas de acesso, as aversões, as simpatias, as palavras, os gestos, as tendências; inquiria da vida dos enfermos, profissão, costumes, circunstâncias da revelação mórbida, acidentes da infância e da mocidade, doenças de outra espécie, antecedentes na família, uma devassa, enfim, como a não faria o mais atilado corregedor. Com o conto, passamos a analisar a situação jurídica no direito civil e no direito penal do doente mental e suas consequências. Também se analisou a Lei 13.146/2015 Estatuto da Pessoa com Deficiência.
Realmente, existem várias
possibilidades para se entender o estilo de Machado de Assis, foi escritor
dotado de variadas perspectivas, alguns estudiosos confessam que jamais seremos
capazes de compreender completamente o
estilo machadiano. No máximo se pode girar em torno dele. Não podemos ousar ter
a falsa ilusão de ter atingido seu significado último, de interpretá-los
inteiramente.
Nesses sucessivos giros,
lapidamos a ironia que esculpe a crítica social[1] seus personagens são
dotados de existência real dentro da sociedade brasileira, e, por essa razão o
autor conseguiu ser universal.
Abordou temas universais como
amor, adultério, cinismo, egoísmo, casamentos arranjados, casamentos por
interesses, apadrinhamentos e, também a loucura.
O conto intitulado "O
alienista" fora publicado em 1862 e integra a coletânea chamada
"Papéis Avulsos"[2]. Há a personagem Simão
Bacamarte que passa a observar todos os moradores da cidade e começa a
recolhê-los ao hospício, aberto por ele, Casa Verde, diante de qualquer sinal
mais idiossincrático presente nas personalidades destes.
O personagem principal, o
médico Simão é tomado de obstinação em encontrar a loucura em todos e gera
cômicas revoltas populares[3] que cumulam com o próprio
alienista se autodeclarando louco e se trancando no hospício para, enfim,
estudar a si mesmo.
A ironia sagaz desnuda a
sociedade típica do Segundo Reinado, é situada na fase realista de Machado de
Assis e procurou retratar a essência da sociedade, relativizando o significado
literal da mensagem.
Auspiciosamente, o autor em
seu conto procurou realizar crítica ao pungente cientificismo presente no
século XIX, vez que, naquela sociedade, as atenções estavam centradas para
realizações da ciência progressista, isto é, tudo que advinha a partir da
explicação científica.
Tanto que quando Simão
Bacamarte era questionado, respondia a ciência era a ciência. Assim, as ações
do personagem eram apoiadas a partir do caráter científico, isto é, mesmo
muitas das ações do médico não fazendo sentido algum, tornavam-se efetivas, apenas
por utilizar como explicação o aparato científico.
O questionamento a respeito de
quem detém o poder, revela que há uma busca incessante para se definir os
critérios para explicar o que seja o comportamento normal e o comportamento
patológico chamado de loucura.
Nas obras machadianas há
sempre sutil crítica que faz em razão, da sociedade, procurando como é a essência
humana diante da sociedade onde vive. No fundo, o autor se deparou com duas
poéticas, uma romântica e outra realista.
O rumo que estabelece para si
e se contrapunha a ambas, porque nenhuma se ajustava ao tipo de reflexão que
veio a desenvolver. O caminho real da poética romântica era o elogio da
subjetividade criadora. [...] Por via diversa, o mesmo limite afetava a poética
do realismo. Sua palavra-chave, estar atento à observação, punha o autor na
prisão do mundo perceptualmente tematizado (LIMA, 1981).
Ao contar a história de um
doutor que procura explicar, por meio de teoria, a loucura; Machado mostra uma
ciência que por si só é incerta, isto é, nos mostra o quanto somos frágeis
diante de certas situações, pois, se os médicos, que detém o conhecimento, não
conseguem explicações lógicas para certas ocorrências da vida, como poderia,
então, encontrá-las, os seres meramente “comuns”?
Dessa forma, a obra de Machado
consegue ultrapassar o seu tempo e está bem presente na atualidade, uma vez,
que ela permite a reflexão, mostra-nos a literatura como uma fonte de
consciência que nos leva ao questionamento dos desmandos cometidos por quem
detém o poder.
O protagonista do conto,
utiliza a ciência como única arma para explicar seus desmandas. In verbis:
"A ciência, disse ele a sua Majestade, é o meu emprego único; Itaguaí[4] é o meu universo"
(Assis, 2009). A obsessão de Simão em estudar e entender o estágio da loucura torna-se tão intensa que chega que a população
já não sabe mais definir quem estava louco ou são.
Assim, percebe-se o quanto a
situação era desesperadora, como que o terror circulava a pequena vila de
Itaguaí. O doutor passou a ser tão temido que muitos tentavam fugir, ou seja, a
resistência até aconteceu, porém, “Um desses fugitivos chegou a ser preso a
duzentos passos da vila”. Machado mostra, assim, como, na sociedade, acontecem
muitos “desvios” de poder.
Porém, não é apenas ao
cientificismo que Machado criticou, mas a toda uma sociedade burguesa, tanto é,
que o doutor do conto em questão, estuda na Europa e importa, segundo ele
mesmo, os conhecimentos para entender a relação entre a razão e a loucura
humana.
Uma questão é intrigante, em
que consiste a diferença entre ser razoável e parecer insano? A chave da ironia
destila o paradoxo e instaura espelhos distorcidos, em que as verdades do poder
e as práticas sociais prescindem dos fundamentos da razão, produzindo um jogo
entre deformação da imagem e corrosão da matriz[5].
O desfecho da narrativa sugere
que a racionalidade, cabe à Igreja o estabelecimento de padrões. E, o fio
condutor da ação destila o poder internacional da Igreja que pretendia
sobrepor-se ao do Imperador do Brasil.
Naquele tempo, ocorrera a
Questão Religiosa ou a Questão dos Bispos[6] quando circulou dois tipos
discursos contra a Igreja no Brasil, um tom sisudo, doutrinário representado,
sobretudo, pelos maçons, entre os quais destacavam o deputado Joaquim Saldanha
Marinho e o Visconde do Rio Branco, que é representado por provocante
caricatura em jornais, Revista Ilustrada, O Mosquito e a Vida Fluminense.
No conto, o Padre Lopes
corresponde ao estereótipo do vigário finório sempre pronto a ocultar as
próprias intenções, e só revela seu pensamento quando este reflete a hierarquia
e os dogmas da Igreja, em nome de quem fala e age.
A questão religiosa foi
conflito ocorrido em nosso país por volta de 1870, tendo iniciado o
enfrentamento entre a Igreja Católica e a maçonaria, acabou se tornando grave
questão de Estado.
É possível observar a
atualidade do escritor Machado de Assis ao unir temas tão presentes na
estrutura social brasileira e sem deixar de confirmar o seu relativismo
irônico, visto ter preferido, na obra O alienista, as nuanças da caricatura à
ortodoxia das doutrinas tão em voga no século XIX.
Por tudo o que foi exposto, a
leitura da obra machadiana depois de 1880 deve ser elucidada pelo viés da
crítica social e por isso atual, tendo em vista que a categoria da ironia
possibilita uma leitura menos corrosiva, mas sem deixar de evidenciar as marcas
de uma elite conservadora, escravocrata.
O capítulo terceiro contará com
uma proposta de leitura em sala de aula da obra O alienista enfatizando a crítica
social ao ressaltar a atualidade do texto, observando como a obra machadiana
adéqua a categoria da ironia como propulsora de uma leitura da realidade da
sociedade do Segundo Império pelo viés do pensamento conservador da elite
brasileira.
Com base no artigo 22 do
Código Penal Brasileiro, podemos ver que os doentes mentais são isentos de pena
e, por isso, a doença mental no Código de 1940 é considerada como uma causa de exclusão da culpabilidade: o
crime existe, mas não é efetivo em relação ao sujeito. Se está ausente a
culpabilidade elemento que liga o agente
ao crime, isso determina a inimputabilidade, de modo que não pode ser
juridicamente imputada a prática de um fato punível ao sujeito (De Jesus, 1988).
A responsabilidade penal, por
sua vez, relaciona-se com as consequências jurídicas decorrentes do ato
criminoso "é a obrigação de sofrer
o castigo, ou incorrer nas sanções penais impostas ao agente do fato ou omissão
criminosa" (Chaloub, 1981) e, para
que haja responsabilidade, é necessário a existência de imputabilidade.
As medidas de segurança surgem
para possibilitar ao direito penal um espaço de atuação frente aos
irresponsáveis e "semi-responsáveis", que, com base no código anterior, estavam fora
do âmbito das sanções penais.
Segundo o ministro Francisco
Campos (apud Oliveira e Silva, 1942), as medidas de segurança vieram
corrigir a anomalia presente no código de 1890, que, ao isentar de pena os
doentes mentais perigosos, não previa para eles nenhuma medida de segurança ou de
custódia, deixando-os completamente a cargo da Assistência a Alienados. Em que
se constitui a medida de segurança?
Questiona-se: Em que diferem
das penas? Por que e como são utilizadas no Brasil? Para responder a essas
questões, vamos reportar-nos à sua formulação primeira que se encontra no centro do desenvolvimento da
escola positiva de direito penal.
Segundo Hungria e Fragoso
(1978), pena e medida de segurança não diferem apenas por apresentarem
finalidades distintas, repressiva ou preventiva, mas, também, pelas causas,
condições de aplicação e modo de execução.
A pena aplica-se, exclusivamente,
aos responsáveis e funda-se na culpabilidade ou culpa moral do delinquente. É, por isso, de
cunho essencialmente ético e baseada na justiça. Além disso, é caracterizada
como uma sanção imposta a um fato
concreto e passado, o crime, de forma
retributiva, aflitiva e proporcional à gravidade.
No entanto, a pena visa também
promover prevenção geral e especial contra o crime. A medida de segurança, por
sua vez, aplica-se aos semi-responsáveis e irresponsáveis, tomando como
fundamento não mais a culpabilidade, mas
a periculosidade, "o provável retorno à prática de fato previsto como
crime".
Caracterizada como
"eticamente neutra" e fundamentada na sua utilidade, a medida de segurança serve
ao fim de "segregação tutelar" ou de readaptação individual, sendo
desprovida do caráter aflitivo da pena, pois "é assistência, é tratamento,
é medicina, é pedagogia. Se acarreta algum sacrifício ou restrição à liberdade
individual, não é isso um mal-querido como
tal ou um fim colimado, mas um meio indispensável à sua execução."
A doença mental, ou
desenvolvimento mental incompleto ou retardado, se aliada à falta de capacidade
de compreender o caráter ilícito do fato e de determinar-se de acordo com esse
entendimento, produz a inimputabilidade.
Três são os requisitos:
biológico (a causa, ou seja, a doença mental[7] etc.), psicológico (o
efeito, isto é, a supressão das capacidades de entendimento ou
autodeterminação) e temporal (ocorrência dos requisitos anteriores no exato
momento da conduta).
O sujeito que, nessa hipótese,
praticar um crime será absolvido. Trata-se de absolvição imprópria, pois a ele
se aplicará uma medida de segurança.
A verificação da doença mental
ou do desenvolvimento mental incompleto ou retardado depende de exame pericial.
Sempre que houver suspeitas a respeito da higidez mental do agente, deve o
juiz, de ofício ou mediante requerimento, determinar a instauração de um
incidente de insanidade mental (CPP, arts. 149 a 152).
No bojo do mencionado
incidente processual, dar-se-á a perícia psiquiátrica. Cumprirá ao expert verificar
se o agente é ou não portador de moléstia ou retardo mental. Sua conclusão,
evidentemente, não vincula o magistrado, o qual poderá decidir segundo sua
livre convicção (CPP, arts. 155, caput, e 182). Interessante anotar que
o perito pode chegar às seguintes conclusões:
1ª) que o agente não possui
qualquer doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado: nesse
caso, desde que o juiz concorde com a perícia, o agente será considerado
penalmente imputável;
2ª) que o sujeito possui
doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado, mas isto não
interferiu em sua capacidade de entendimento ou de autodeterminação (no momento
da conduta): em tal situação, e novamente desde que o magistrado esteja de
acordo com o resultado da perícia, o acusado será julgado como imputável;
3ª) que o réu é portador de
doença mental ou desenvolvimento psíquico incompleto ou retardado e teve sua
capacidade de entendimento ou de autodeterminação inteiramente suprimida, no
momento do fato: se o juiz concordar com o resultado do exame, o agente será
considerado inimputável, ficando sujeito a uma medida de segurança (desde que,
obviamente, comprove-se seja ele o autor do crime e que o fato praticado se
revestiu de tipicidade e antijuridicidade);
4ª) que o denunciado é
portador de doença mental ou desenvolvimento psíquico incompleto ou retardado e
teve sua capacidade de entendimento ou de autodeterminação diminuída, no
momento do fato: se o magistrado se convencer do acerto da perícia, o acusado
será considerado semi-imputável, ficando sujeito a uma pena diminuída (de um a
dois terços) ou a uma medida de segurança (desde que se demonstre seja ele o
autor do crime e que o fato praticado se revestiu de tipicidade e
antijuridicidade);
5ª) por derradeiro, pode o
perito constatar que o agente era, ao tempo da conduta, mentalmente são e,
posteriormente, se acometeu de alguma doença mental: nessa situação (estando o
juiz convencido do acerto da perícia), dar-se-á a superveniência de doença
mental, o que provocará a suspensão do processo penal, nos termos do art. 152
do CPP.
Interessante acrescentar que a
inimputabilidade por doença mental não pode acarretar absolvição sumária (CPP,
arts. 397 e 415), somente podendo ser decretada em sede de cognição definitiva,
isto é, quando do julgamento do mérito. Isto porque se trata de absolvição
(sumária) imprópria, a qual acarreta a imposição de uma sanção penal (a medida
de segurança).
Nossa lei penal prevê que a
doença mental ou desenvolvimento mental incompleto ou retardado possam
acarretar a supressão ou a simples diminuição das capacidades de entendimento
ou de autodeterminação.
Quando se der a redução das
capacidades mencionadas, aplicar-se-á o art. 26, parágrafo único, do CP. Diz-se
que, em tal hipótese, o agente é
considerado 'semi-imputável'. Deve-se destacar que a expressão 'semi-imputável'
se mostra dogmaticamente equivocada, embora
de uso corrente.
Isto porque a imputabilidade
não tem meio-termo: ou o agente é imputável, porque compreendeu bem a ilicitude
do ato e teve plenas condições de se autocontrolar, ou não. Aquele que tem
diminuída sua capacidade de compreensão é imputável, justamente porque tinha tal condição (embora
em grau menor). Não é correto, portanto, denominá-lo 'semi-imputável'.
Tanto é imputável o agente nesse caso que nossa lei comina-lhe uma
pena (reduzida). A inflição de uma pena, ainda que menor, revela
inequivocamente a presença da imputabilidade, fator essencial para se constatar
a culpabilidade do agente (lembre-se que sem imputabilidade não há
culpabilidade e, sem ela, não há
pena...).
Para aferir a imputabilidade[8] penal de um indivíduo, o
sistema adotado é o biopsicológico ou misto, pois tem critérios biológicos que,
por exemplo, é quando o sujeito é portador da perturbação mental, e critérios
psicológicos por se preocupar com o efeito, ou seja, quando a doença se
manifesta no momento do crime.
Conforme artigo 26 do Código
penal, verifica-se primeiramente se o agente tem desenvolvimento mental
incompleto ou retardado ou se o agente é doente mental, e caso positivo, será
considerado inimputável.
Caso negativo, será averiguado
se o agente era capaz de entender o caráter ilícito do seu ato, e se era capaz,
será finalmente verificado se ele tinha condições de determinar-se de acordo
com este entendimento, para então ser considerado imputável.
Os doentes mentais também
sofrem sanções diferenciadas, que no caso, são as chamadas de medidas de
segurança, referem-se as penalidades as quais o Estado impõe ao agente
infrator, e estão descritas claramente no artigo 96 do Código penal:
“I - Internação em hospital de
custódia e tratamento psiquiátrico ou, à falta, em outro estabelecimento
adequado;
II - sujeição a tratamento
ambulatorial.”
Nestes termos pode-se observar
que há previsão legal para a penalização dos agentes, entretanto há um
tratamento diferenciado ou específico.
A embriaguez, conforme
descrita no artigo 28, inciso II § 1º e 2º do Código Penal, também pode
apresentar como excludente de culpabilidade, tendo em vista que a mesma ocorreu
por caso fortuito, não tendo caráter ilícito.
A embriaguez fortuita ocorre
quando o agente no momento do crime, não tinha capacidade de entendimento do
que estava ocorrendo, podendo o juiz com base no artigo 28, no caso de
embriaguez completa, isentar de pena ou reduzir a pena de um a dois terços, em
se tratando de embriaguez incompleta.
A embriaguez é uma intoxicação
resultante do uso do álcool ou substâncias que impossibilitem a capacidade
motora do condutor, podendo ser classificada:
Preordenada: é
aquela em que o agente se embriaga de forma voluntária, e está descrita no artigo
61,inciso II, alínea L do Código Penal, tida como circunstância agravante.
Culposa:
ocorre quando o agente sem perceber, ou sem ter a pretensão, se embriaga de
forma imprudente, é um descuido, sem a intenção de embriagar-se. Conforme o artigo
28, inciso II do Código Penal, não se exclui a imputabilidade penal,
tendo em vista que o agente é responsabilizado pela conduta que pratica.
Fortuita ou acidental: é
aquela em que o agente ingere a bebida por força maior, ocorrendo quando em
casos fortuitos o agente se vê obrigado a se embriagar, sendo afastada a culpabilidade,
conforme previsto no §1º, inciso II do artigo 28 do Código Penal.
Para se caracterizar
embriaguez completa é necessário que não seja possível a comprovação dos
elementos vontade e consciência, para ser considerado responsabilidade objetiva
sem culpa, entretanto, segundo alguns doutrinadores não se pode eximir a
responsabilidade penal, mesmo que o agente tenha resíduos de consciência e
vontade não podendo ser desconsiderada a imputabilidade, tendo como base a
teoria actio libera in causa[9],
que significa imputabilidade penal por parte do agente, tendo ele
responsabilidade pelo ato praticado mesmo que de forma culposa, voluntária,
completa ou incompleta.
Com base no trecho
jurisprudencial do Supremo Tribunal de Justiça - STJ pode-se observar com mais
nitidez e concretude a teoria actio libera in causa:
“Sabe-se que a embriaguez –
seja voluntária, culposa, completa ou incompleta – não afasta a imputabilidade,
pois no momento em que ingerida a substância, o agente era livre para decidir
se devia ou não o fazer, ou seja, a conduta de beber resultou de um ato livre
(teoria da actio libera in causa). Desse modo, ainda que o paciente
tenha praticado o crime após a ingestão de álcool, deve ser responsabilizado na
medida de sua culpabilidade.” STJ, 6ª Turma, HC 180.978/MT, Relator Ministro
Celso Limongi, 09 fev. 2011.
A Lei 7.210/1994 denominada
Lei de Execução Penal, conforme previsto em seu artigo 184, determina que se
durante o cumprimento da pena privativa de liberdade o condenado apresentar
perturbação da saúde mental ou doença mental, o juiz poderá substituir a pena
por medida de segurança.
O sistema que rege as medidas
de segurança é chamado de vicariante ou unitário, tendo como objetivo a
aplicação de apenas uma sanção penal, que só pode ser aplicada diante dos
requisitos necessários que caracterizam o agente como doente mental, que se dá
pela prática de fato descrito como crime ou infração penal, e o juiz deverá se
convencer que o agente possui periculosidade social devido a condição de
inimputável, bem como não ter tido sua punibilidade extinta.
Já o doente mental e o direito
civil, admite outras ponderações. Inicialmente, deficiente mental[10] não é sinônimo de doente
mental. E a ausência de conhecimento sobre a terminologia gera repercussão na
rotina das famílias dos doentes mentais.
A leitura do referido artigo,
portanto, deve ser feita considerando que o foco está no exercício do múnus da
curatela, quando o indivíduo a ela submetido é um doente mental crônico, cuja
patologia atinge, de forma indiscutível, a capacidade de discernir, mas mantém
a capacidade de expressar vontade.
A capacidade civil pode ser
dividida de 02 (duas) formas: Capacidade de direito ou de gozo que é comum a
toda pessoa humana, inerente ao ser humano e que só se perde com a morte;
Capacidade de fato ou de
exercício está relacionada ao exercício dos próprios atos da vida civil e
decorre de condições biológicas e legais;
Dessa forma, pode-se inferir
que toda pessoa tem capacidade de direito, mas pode não ter capacidade para
exercer pessoalmente os atos da vida civil. Quando o indivíduo possui
capacidade de fato e direito, dizemos que a capacidade civil é plena.
Em contrapartida, o art. 3º,
do Código Civil de 2002, após as modificações trazidas pelo Estatuto da Pessoa com
Deficiência, prevê que são absolutamente incapazes de exercer pessoalmente os
atos da vida civil apenas os menores de 16 (dezesseis) anos, não havendo mais
menção aos enfermos e deficientes mentais sem discernimento para prática dos
atos da vida civil. Além disso, as pessoas que por causa transitória ou
definitiva não puderem exprimir a sua vontade passaram a ser relativamente
incapazes.
De acordo com art. 6º da Lei
13.146/2015, as pessoas com deficiência podem: casar-se e constituir união
estável, exercer direitos sexuais e reprodutivos, exercer o direito de decidir
sobre o número de filhos e de ter acesso a informações adequadas sobre
reprodução e planejamento familiar, conservar sua fertilidade, sendo vedada a
esterilização compulsória, exercer o direito à família e à convivência familiar
e comunitária; e exercer o direito à guarda, à tutela, à curatela e à adoção,
como adotante ou adotando, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas.
Em casos eventuais, as pessoas
com deficiência poderão fazer uso das medidas assistenciais, tais como: tomada
de decisão apoiada, curatela e interdição[11].
A doença mental está presente
em todas as sociedades, o que não deixa de evidenciar a fragilidade da mente
humana, e as adversidades que se propagam no interior do indivíduo. Apesar de cada cultura
e momento social lidar de forma distinta com esses indivíduos algo é comum nas
suas práticas: a marginalização e a
desumanização da pessoa com transtorno mental. Assim diante das mudanças
sociológicas, éticas, e culturais que a sociedade vem presenciando no último
século direcionam o pensar sobre esse grupo a um novo viés.
Nesse contexto, surgem valores
e direitos que antes não eram estendidos
a esse grupo. Direitos como direitos humanos, capacidade civil, autonomia da
pessoa, dignidade da pessoa humana, reinserção social de quem uma vez foi afastado da
dinâmica da sua comunidade, tratamento adequado ao seu diagnóstico são vários
aspectos do indivíduo médio que passam a
ser questionados quando frente a uma pessoa com transtorno mental.
A busca pela igualdade dos
direitos fundamentais a Convenção Interamericana de Direitos humanos - CIDH,
Pacto de São José de Costa Rica, e A Convenção Internacional Sobre o Direito
das Pessoas com Deficiência - CDPD são manifestos ímpar da sociedade
internacional que convergem no sentido de valorizar e dar eficácia aos direitos
referentes a estes indivíduos com transtorno mental.
Toda a pessoa, igualmente,
possui direito a ser respeitada por força do princípio da dignidade da pessoa
humana (Sanches, 2017), e uma pessoa mesmo que na esfera de proteção necessita
ser respeitada em sua autonomia individual, na sua dignidade, bem como, inclusa
e participativa na sociedade observando-se a igualdade de oportunidades e o
reconhecimento de que a deficiência é inerente da condição humana. dicotomia
entre deficiência e doença recorre-se a leitura da Lei 10.2016/2000 (lei que
será comentada mais adiante), na qual, em seu capítulo V do Código
Internacional de Doenças (CID10) encontra-se mais um conceito.
Na referida lei transtorno
mental é todas as alterações no funcionamento da mente que venham prejudicar o
desempenho das pessoas no âmbito da vida familiar, social, pessoal, no
trabalho, na compreensão de si mesmo, bem como na tolerância dos problemas.
Destaca-se, ainda, que a
conceituação acima não abrange somente os transtornos mentais de maior
gravidade (esquizofrenia e psicopatia), mas, também, à dependência química, a
depressão, mania ou ansiedade exagerada, pois nestes casos ainda que o indivíduo
tenha inteligência maior que a do homem média, mas já experimentou condições
que comprometam algumas das áreas já citadas, tem-se configurado o transtorno.
No Manual Diagnóstico
Estatístico de Transtornos Mentais - DSM está o descritivo dos distúrbios e doenças
mentais. Nele está relacionado às várias ordens de gêneros e espécies de
transtornos mentais, desde o mais simples até o mais complexo.
De modo que neste manual,
também, encontra-se uma definição para o termo transtorno mental:
“Um transtorno mental é uma
síndrome caracterizada por perturbação clinicamente significativa na cognição,
na regulação emocional ou no comportamento de um indivíduo que reflete uma
disfunção nos processos psicológicos, biológicos ou de desenvolvimento
subjacentes ao funcionamento. Destaca-se o teor da Convenção Americana de
Direitos Humanos, Pacto de São José da Costa Rica, que, em seu artigo 5o dispõe
que: “Toda pessoa tem o direito de que se respeite sua integridade física,
psíquica e moral.”
Aduziu, igualmente, que toda pessoa
deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano. A
Convenção internacional sobre os direitos das pessoas com deficiência, por sua
vez, destacou a condição de pessoa como o ponto capital na esfera de proteção,
enaltecendo a necessidade do respeito à autonomia individual, à dignidade, à
plena e efetiva participação e inclusão na Sociedade, consubstanciada na
igualdade de oportunidades e no reconhecimento da deficiência como uma das
características da condição humana.
No sistema jurídico brasileiro
a Lei nº 10.216/2001, Lei da Reforma Psiquiátrica (LRP)[12], que trouxe em seu corpo
as premissas de igualdade e garantia dos direitos fundamentais. Por meio dela
expressa-se “... claramente a inclusão do portador de sofrimento ou transtorno
mental no elenco daqueles a quem, pública e juridicamente, reconhecemos a
condição de titular do direito fundamental à igualdade...”.
Desse modo é nítida a inclusão
do portador de transtorno mentais no rol daqueles que devem ter suas condições
de titular de direitos fundamentais a igualdade.
Também, ganha destaque a Lei
nº 10.216 de 06 de abril de 2001, que fortalece a premissa de identidade e a
autonomia individual para construção da cidadania de pessoas que são
diagnosticadas com transtornos mentais (Sanches, 2017).
Outra referência positiva
fundamental para a garantia de direitos das pessoas com transtornos e
sofrimentos mentais foi a promulgação da
Lei Brasileira de Inclusão das Pessoas com Deficiência - EPD, Lei Federal nº
13.146/2015, em vigor desde 02 de
janeiro de 2016.
Do artigo 2º da lei pode-se
observar a preocupação em delimitar o transtorno mental no rol de pessoas com
deficiência a serem observados com mais atenção pelo ordenamento jurídico e
pelas políticas públicas[13] “Art. 2º. “considera-se
pessoa com deficiência aquela que tem impedimento de longo prazo de natureza
física, mental, intelectual ou sensorial”.
Outros pontos de suma
importância diretamente relacionados aos direitos humanos que se encontram
elencados no EPD, como por exemplo: o direito à liberdade (art. 14); prevenção
máxima da capacidade civil (art. 12); o direito de ser tratado em ambiente
menos restritivo (art. 19); o direito de viver e ser incluído na sociedade
(art. 19); a privacidade (art. 22); Integridade física e mental (art. 17).
Desde o advento do Código Civil de 2002 as pessoas que possuem
algum tipo de deficiência física mental sensorial ou intelectual não podem ser
tratadas a priori como incapazes, colocando-os como dependentes
condicionais da sua família ou do Estado. (Ferraz, 2015)
Diferente do que ocorria no Código
Civil de 2002 considerava-se absolutamente incapaz de exercer pessoalmente os
atos da vida civil os menores de 16 (dezesseis) anos, os que mesmo por causa
transitória não podem exercer sua vontade, e o que nos interessa, às pessoas
com enfermidade ou deficiência mental. No entanto, o Código de Civil de 2002 (art. 3º, CPC/2015)
expressa que os absolutamente incapazes de exercer os atos da vida civil os
menores de 16 anos.
De modo que no Princípio da
ASM (Princípios das Nações Unidas para a Proteção de Pessoas com Enfermidade
Mental e para a Melhoria da Atenção à Saúde Mental) contém alguns indicativos
que sobrestejam atos abusivos.
A restrição física ou
isolamento involuntário não deverá prolongar para além do período estritamente
necessário para esse propósito. Em todos os casos de restrição física ou
isolamento voluntário, as razões para os mesmos e seu caráter e extensão serão
registrados no prontuário médico do paciente.
O paciente restringido ou
isolado deverá ser mantido sob condições humanitárias e sob os cuidados e
estreita e regular supervisão de membros qualificados do quadro pessoal. Um
representante pessoal, se houver e caso seja relevante, deverá receber pronta
notificação de qualquer restrição física ou isolamento involuntário imposto ao
paciente.
Outro direito que confere um
pressuposto para a efetiva autonomia civil da pessoa com transtorno mental é o
direito saúde. Dallari (2010,) afirma que saúde é um bem-estar social e
psíquico, e não é um bem jurídico somente individual, mas também coletivo.
As leis estão bem enunciadas,
com conceitos, deveres e direitos bem claros. O que falta é o conhecimento e a
conscientização da sociedade sobre como agir com uma pessoa com transtornos
mentais. Principalmente, quando são atores da prática dos atos civis. Pois,
como explanado nem sempre uma pessoa que possui transtorno mental está incapaz
de realizar os atos da vida civil.
A Lei 13.146/2015, Lei
Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, também nomeada de Estatuto da
Pessoa com Deficiência, com vacatio legis de 180 (cento e oitenta) dias.
Traz o Estatuto diversas garantias para os portadores de deficiência de todos
os tipos, com reflexos nas mais diversas áreas do direito.
Um dos fatores de grande
impacto trazido pelo Estatuto é a importante mudança que provoca no regime das
incapacidades1do Código Civil brasileiro, no que toca ao portador de transtorno
mental.
Historicamente, no ordenamento
jurídico brasileiro, o portador de transtorno mental foi tratado como incapaz.
Com algumas variações de termos e grau, como se verá a seguir, assim foi até a
chegada do Estatuto acima apontado.
Sob a justificativa da sua
proteção[14]
foi o portador de transtorno mental rubricado como incapaz, com claro prejuízo
à sua autonomia e, muitas vezes, dignidade humana.
As duas grandes Codificações
Civis brasileiras, de 1916 e de 2002, ao contrário das legislações que foram
aplicadas anteriormente em solo pátrio, trouxeram de modo sistematizado a questão
da
incapacidade. Pode-se até
afirmar que, entre elas, mantiveram suas características de modo muito aproximado.
Na regulamentação das limitações da autonomia por incapacidade houve, nas duas codificações,
congruência na fundamentação, nas consequências e, de certa maneira, também no
rol dos incapazes.
Em ambas o fundamento para a
limitação via incapacidade foi o da proteção do incapaz. Isso é facilmente
constatável pela leitura da doutrina do tema nos manuais, que costuma se
referir ao incapaz como alguém mais vulnerável e, por conseguinte, merecedor de
proteção.
As consequências também foram
as mesmas, qual seja a limitação para a prática dos atos da vida civil, no caso
dos absolutamente incapazes, e para a prática de certos atos, no caso dos relativamente
incapazes.
Essa diferente redação para
cada um dos tipos de incapacidade reflete o fato de que as suas consequências,
em ambas as codificações, dividiram-se em dois graus, para tornar o ato
praticado pelo absolutamente incapaz nulo e o realizado pelo relativamente
incapaz anulável.
No que toca ao rol, algumas
diferenças são encontradas. Assim é que o Código Civil de 1916 elencava como
absolutamente incapazes, no seu art. 5.º: "São absolutamente incapazes de
exercer pessoalmente aos atos da vida civil:
I - Os menores de dezesseis
anos.
II - Os loucos de todo o
gênero.
III - Os surdos-mudos, que não
puderem exprimir a sua vontade.
IV - Os ausentes, declarados
tais por ato do juiz."
Há já quando da criação do
Código Civil de 2002 algumas diferenças no rol dos absolutamente incapazes.
Quanto ao menor, nada mudou, continuando os menores de dezesseis anos a serem absolutamente
incapazes, o que, aliás, aqui se critica.
Afinal, diante da redução da
idade para alcançar a capacidade plena com a maioridade aos dezoito, deveria
ter havido também proporcional redução da idade mínima para que se alcançasse a
incapacidade relativa.
Referente aos portadores de
transtornos mentais, note-se que, se nas Ordenações Filipinas havia referência
aos portadores de transtorno mentais com o uso dos mais diversos termos, seu
sucessor imediato optou por reuni-los numa única epígrafe: loucos de todo
gênero[15], que sempre foi alvo de crítica
doutrinária.
Mais do que isso, determinou, consoante já
enumerado, o estado de absolutamente incapaz para todos eles. Quanto a isso,
havia à época crítica indicando que a alusão tão somente aos loucos teria
deixado de regulamentar outros sujeitos como os "fracos de espírito"
e "psicopatas".
Sobre o tema, houve no Código
Civil de 2002 tratamento mais cuidadoso, de modo que na sua redação original
podem os portadores de transtorno mental ser considerados como absoluta ou relativamente
incapazes, a depender do grau de compreensão do mundo, de discernimento, que
lhes retire o transtorno que possuam.
Em que pese esta melhoria, os
termos adotados “enfermidades”, "deficiência mental" e
"excepcional sem desenvolvimento mental completo", continuaram sendo insuficientes
para explicar toda a gama de situações que pretende abordar, no que seria
melhor ter utilizado a expressão mais genérica e tecnicamente mais adequada
"portador de transtorno mental", como se vem fazendo no presente
texto, realizando ainda, por óbvio, a menção ao discernimento reduzido.
Excluiu-se no Código Civil de
2002 a referência direta aos surdos-mudos, adotando-se fórmula mais genérica em
que se determinou na originária redação a incapacidade absoluta de todos
aqueles que, ainda que por causa transitória, não possam exprimir sua vontade.
Por fim, de modo mais técnico,
foi excluído o ausente do rol dos incapazes, já que o problema que ocorre
quando da ausência não é igual aos anteriores de suposta debilidade do sujeito,
mas sim do seu desaparecimento, obrigando a que seja nomeado um curador para
atuar como representante dos seus interesses até que ocorra a sua volta ou se
decrete a sua morte de modo presumido.
Até a chegada do Estatuto da
Pessoa com Deficiência, a regra no ordenamento jurídico brasileiro foi pela
incapacidade do portador de transtorno mental. É, portanto, grande mudança a
que ele realiza, ao retirar os portadores de transtorno mental da condição de
incapazes, com a revogação de boa parte dos arts. 3.º e 4.º do CC/2002.
Assim, o fato de um sujeito
possuir transtorno mental[16] de qualquer natureza, não
faz com que ele, automaticamente, se insira no rol dos incapazes. É um passo
importante na busca pela promoção da igualdade dos sujeitos portadores de
transtorno mental, já que se dissocia o transtorno da necessária incapacidade.
Mas é também uma grande mudança em todo o sistema das incapacidades, que merece
cuidadosa análise.
A mudança apontada não
implica, entretanto, que o portador de transtorno mental não possa vir a ter a
sua capacidade limitada para a prática de certos atos. Mantém-se a
possibilidade de que venha ele a ser submetido ao regime de curatela. O que se
afasta, repise-se, é a sua condição de incapaz.
Esta determinação da nova lei,
aliás, reforça, sobre a necessária distinção entre transtorno mental,
incapacidade e curatela.
A avaliação de existência de
transtorno mental é algo que cabe ao campo médico, ou da psicanálise, sendo
mais comumente objeto de estudo da psiquiatria e da psicopatologia. Os
diagnósticos de transtorno mental na medicina costumam atualmente ser feitos
com base no Diagnostic and Statistic Manual of Mental Disorders (DSM),
documento formulado pela Associação Americana de Psiquiatria, que se encontra
atualmente na sua quinta edição (DSM 5), publicada oficialmente em 18.05.2013.
A incapacidade, por sua vez, é
categoria jurídica, estado civil aplicável a determinados sujeitos por conta de
questões relativas ao seu status pessoal. Pode decorrer tanto da simples
inexperiência de vida, como por conta de circunstâncias outras, tais como o
vício em drogas de qualquer natureza.
Dentre estas circunstâncias,
até a chegada do Estatuto que ora se discute, encontrava-se o transtorno
mental, sob as mais diversas denominações (enfermidade ou deficiência mental, excepcionais
sem desenvolvimento mental completo).
Independe a incapacidade de
decretação judicial. Enquadrando-se o sujeito numa das hipóteses previstas no
suporte fático normativo, é ele incapaz e, portanto, ao menos de algum modo
limitado na prática dos seus atos.
Já a curatela, que se
estabelece a partir do processo de interdição, visa determinar os limites da incapacidade
do sujeito para a prática de certos atos, bem como constituir um curador que
venha a representá-lo ou assisti-lo nos atos jurídicos que venha a praticar.
E é justamente sobre a
curatela[17]
e a interdição que se faz sentir grande reflexo na mudança do sistema das
incapacidades no Código Civil .
A chegada do Estatuto da
Pessoa com Deficiência traz profundas modificações não apenas à qualificação do
estado civil do portador de transtorno mental, mas também a toda a sua lógica protetiva.
Primeiro porque, ao reconhecer
a importância de favorecer a autonomia do sujeito portador de transtorno
mental, inaugura novo paradigma, que propicia que se torne ele ator da sua
própria vida.
Reflexos disso podem ser
sentidos não apenas nas modificações no que toca à curatela, mas também na
introdução no sistema brasileiro da tomada de decisão apoiada[18].
Com os movimentos
antimanicomiais, foi fechado uma infinidade de hospitais e a desinternação de
muitos pacientes, o Estado que deveria ter trabalhado para criar unidades
adequadas de atendimento, possibilitando a humanização dos tratamentos, não o
fez. Essa negligência tem como consequência a falta de leitos psiquiátricos,
com uma grande ocupação por alcoolistas, sem conseguir atender a demanda de
forma digna.
Grande parte dos pacientes não
se adaptam ao convívio com seus familiares e vice-versa, e acabam se tornando
moradores de rua. “A esquizofrenia está presente em 10% dos sem-teto e 90%
deles são alcoolistas”, afirmou Wagner Gattaz[19], professor titular e
presidente do conselho diretor do Instituto de Psiquiatria do Hospital das
Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Concluiu-se que nos casos de
doentes mentais infratores, deve ser realizada perícia, e caracterizando a
inimputabilidade por parte do agente que tenha praticado ato ilícito sem
possuir conhecimento e entendimento acerca do fato, será aplicado a ele, por
meio de sentença absolutória imprópria, uma sanção penal denominada medida de
segurança, prevista no artigo 386, parágrafo único, inciso III do Código de
Processo Penal.
Diante da periculosidade[20] do agente, deverá ser encaminhado
e internado em um hospital de custódia, ou na falta desse, poderá ser
encaminhado a um estabelecimento adequado que possua a mesma finalidade, ou
seja, possibilitar tratamento ao indivíduo, e por se tratar de doente mental,
perder a característica de investigado comum e passar a ser paciente.
O artigo 5º, inciso III da
Constituição Federal brasileira de 1988, dispõe que ninguém poderá ser
submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante, devendo ser
cumprida a pena em estabelecimentos distintos de acordo com a natureza do
delito, a idade e o sexo do apenado, devendo ser respeitada a sua integridade
física, mental e moral, o que se torna prioridade a partir da criação da Lei
Orgânica do Sus nº 8080/90, uma vez que cuidar da saúde mental é essencial e
para todos.
O doente mental que comete
crime, devido sua periculosidade, deve ser retirado da sociedade. Mas, também
não pode permanecer entre presos comuns, ignorando sua condição de paciente e
passando a ser tratado como um preso criminoso, desrespeitando dessa forma sua
dignidade humana.
Como paciente, ele deve
receber tratamento adequado em um manicômio judiciário[21] que funcione efetivamente
e proporcione melhora e possível convívio em sociedade. O doente mental não
pode ficar invisível aos olhos da sociedade, e percebidos somente diante do
cometimento de crimes que chocam.
O final de "O
Alienista" é impactante: vendo que suas teorias sobre loucura não
funcionavam e que ninguém ao seu redor era realmente louco, o Dr. Simão
Bacamarte acaba por se diagnosticar como louco, e decide trancar-se sozinho
pelo resto de sua vida na Casa Verde[22].
Depois de quatro teses não
confirmadas, o alienista percebe que o germe da loucura prospera porque já
habita em todos, sendo ele o único exemplar são da humanidade. E, como último
paradigma clínico, resolve internar-se fazendo de si próprio objeto na busca da
cura para a loucura.
Focada em sua crítica aos métodos da ciência no final do século XIX baseada na ética. Dessa forma, analisa-se o conceito histórico do diagnóstico da loucura[23] e seus métodos de definição do que seria um indivíduo doente mental. Analisam-se também diferentes textos analíticos da obra de Machado de Assis na ótica de vários autores citando-os como forma de enriquecer esta pesquisa e fundamentar a relação entre a ética e o comportamento do personagem principal, Dr. Bacamarte.
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Notas:
[1]
Machado de Assis, utiliza-se da ironia para criticar o cientificismo do século XIX
e, também, a toda uma sociedade burguesa, torna-se evidente que Machado de
Assis, apesar de ser de outro século, torna-se necessário e prazeroso
estudá-lo, não somente por obrigatoriedade para exames vestibulares, mas como
um autor que esteve à frente do seu tempo cujo legado de suas obras perpassa a
linha temporal, pois seus temas são bastante atuais e a sociedade da sua época
assemelha-se a de hoje.
[2]
Machado de Assis escreveu aproximadamente duzentos contos, estreando em pleno
romantismo com Contos Fluminenses (1869) e sofreu progressiva e significativa
mudança de perspectiva e de linguagem a partir de Papel Avulsos (1882), uma
obra que representa para o gênero conto a mesma ruptura que para o romance
significaram as Memórias Póstumas de Brás Cubas.
[3]
Em “O Alienista” (1881), Machado comparou a Revolução Francesa à Revolta dos
Canjicas em Itaguaí. Nessa rebelião, os cidadãos de Itaguaí pretendiam acabar
com o terror de encarceramentos na Casa Verde (“aquela Bastilha da razão
humana”) e matar o alienista Dr. Simão Bacamarte. Transcreve-se a respeito o
seguinte trecho: o sentimento era unânime, ou quase unânime, e os trezentos que
caminhavam para a Casa Verde – dada a diferença de Paris a Itaguaí – podiam ser
comparados aos que tomaram a Bastilha.
[4]
A origem do nome de Itaguaí seria a junção de duas palavras no vocabulário
Tupi: Ita = Pedra, e Guay = lago, ou seja, Lago entre Pedras.
[5]
As consequências dessas duas faces da precariedade do trabalho contemporâneo
podem ser vistas nas estatísticas de saúde.
Segundo a Organização Mundial de Saúde, os transtornos mentais chamados
menores atingem 30% dos trabalhadores ocupados
e os transtornos mentais graves, cerca de 5% a 10% (BRASIL, 2001). A
saúde mental (ou sanidade mental) é um termo usado para descrever um nível de
qualidade de vida cognitiva ou emocional ou a ausência de uma doença mental. Na
perspectiva da psicologia positiva ou do holismo, a saúde mental pode incluir a
capacidade de um indivíduo de apreciar a vida e procurar um equilíbrio entre as
atividades e os esforços para atingir a resiliência psicológica. A Organização
Mundial de Saúde afirma que não existe definição "oficial" de saúde
mental. Diferenças culturais, julgamentos subjetivos, e teorias relacionadas
concorrentes afetam o modo como a "saúde mental" é definida.
[6]
A Questão Religiosa foi um reflexo no Brasil da confrontação que se verificava
na Europa entre a Maçonaria e a Igreja Católica Romana. Além disso, envolveu a
autonomia da Igreja diante do poder civil, direito que foi tenazmente defendido
por D. Romualdo de Seixas, da Bahia, e D. Antônio Viçoso, de Mariana, e,
posteriormente, por D. Macedo Costa, do Pará, e outros bispos. O primeiro
incidente ocorreu quando o bispo do Rio de Janeiro, D. Pedro Maria de Lacerda,
lembrou ao padre Almeida Martins os cânones católicos contra a Maçonaria e
suspendeu o uso de ordens sacras por ter o sacerdote proferido um discurso em homenagem
ao Visconde de Rio Branco, em regozijo pela Lei do Ventre Livre, em março de
1872. Posteriormente, D. Vital Maria Gonçalves de Oliveira, bispo de Olinda, e
D. Antônio de Macedo Costa, bispo do Pará, determinaram que as Ordens Terceiras
e Irmandades excluíssem os seus membros que também pertencessem à Maçonaria.
Acostumadas à autonomia, elas desobedeceram, francamente, às determinações, e
D. Vital não teve dúvidas: lançou o interdito canônico sobre as capelas ligadas
àquelas entidades, as quais, inconformadas, apelaram ao Imperador, alegando
abuso de poder por parte do bispo. O Imperador acolheu o recurso das
irmandades.
[7] De acordo com a Organização Mundial de Saúde, doença é qualquer “ausência de saúde” acompanhada por alterações do estado de equilíbrio de uma pessoa em relação ao meio ambiente. Dessa forma, o termo “doença” engloba o prejuízo das funções da psique, de um órgão em específico ou do organismo como um todo, o que dá origem a sintomas e sinais característicos. Para que uma condição seja considerada uma doença, é preciso que ela atenda a três critérios: ter uma causa reconhecida; manifestar-se por meio de uma sintomatologia específica; e provocar alterações no organismo, sejam elas visíveis ou detectadas por meio de exames. As doenças podem tanto ser causadas por fatores externos, como infecções por vírus, bactérias e fungos, ou por fatores internos, como malformações ou disfunções. Alguns exemplos de doenças causadas por fatores externos são o resfriado, a gripe, as pneumonias e as micoses, enquanto as doenças causadas por fatores internos podem ser ilustradas com a diabetes, a osteoporose e a artrite reumatoide, entre muitas outras. Um transtorno é uma alteração na saúde que nem sempre está associado a uma doença propriamente dita, embora possam representar grandes incômodos para um paciente. Em sua maioria, os transtornos estão relacionados à ordem mental ou psicológica. Os transtornos mentais incluem qualquer quadro que possa comprometer a vida pessoal, familiar, social e profissional de um paciente, influenciando inclusive a forma como ele enxerga a si próprio e as pessoas e situações ao seu redor. Alguns exemplos de transtornos são a ansiedade, a depressão, a dependência de qualquer substância ou hábito, os distúrbios alimentares e a hiperatividade. Esses e outros transtornos mentais não apresentam uma única causa definida, podendo ser resultado de aspectos biológicos (como o déficit ou o excesso de produção de um neurotransmissor) e psicológicos (a forma como o paciente se comporta e interage com o ambiente). Algumas vezes, eles também são chamados de “distúrbios”.
[8] Antonin Artaud, citado por Cláudio Willer, em seu texto sobre Van Gogh: o Suicidado pela Sociedade, escreveu: "E o que é um autêntico louco? É um homem que preferiu ficar louco, no sentido socialmente aceito, em vez de trair uma determinada ideia superior de honra humana. Assim, a sociedade mandou estrangular nos seus manicômios todos aqueles dos quais queria desembaraçar-se ou defender-se porque se recusaram a ser seus cúmplices em algumas imensas sujeiras. Pois o louco é o homem que a sociedade não quer ouvir e que é impedido de enunciar certas verdades intoleráveis." Este texto, escrito por um louco, um marginalizado e incompreendido, enquanto viveu, revela-nos a interpretação de quem assistiu ao mundo de um outro prisma, do lado dos que para nós perderam a identidade. Com todo seu devaneio, Antonin Artaud é hoje uma importante referência. "Tudo que aos olhos de seus contemporâneos pareceu mero delírio e sintoma de loucura é hoje reconhecido nas mais avançadas correntes do pensamento crítico e criação artística nas suas várias manifestações: teatro, arte de vanguarda e criações experimentais, manifestações coletivas e espontâneas, poesia, linguística e semiologia, psicanálise e antipsiquiatria, cultura e contracultura." (Cláudio Willer- Escritos de Antonin Artaud).
[9] A teoria da actio libera in causa vem solucionar casos nos quais, embora considerado inimputável, o agente tem responsabilidade pelo fato. É o clássico exemplo da embriaguez preordenada, na qual a pessoa se embriaga exatamente para cometer o delito. Veja que, na hipótese, a pessoa é livre na causa antecedente, ainda que durante a prática do delito fosse considerada inimputável, ela é responsável porque se transfere para este momento anterior (livre na causa – quando a pessoa decide se embriagar para delinquir) a constatação da imputabilidade. A teoria da actio libera in causa é aquela em que o agente, conscientemente, põe-se em estado de inimputabilidade, sendo desejável ou previsível o cometimento de uma ação ou omissão punível em nosso ordenamento jurídico, não se podendo alegar inconsciência do ilícito no momento fatídico, visto que a consciência do agente existia antes de se colocar em estado de inimputabilidade. Essa teoria esboçada por Bartolo veio solucionar os casos em que há a culpabilidade de agentes que seriam considerados inimputáveis, especialmente nos casos de embriaguez.
[10]
Foi Jean-Étienne Dominique Esquirol que trouxe ao meio médico organicista
científico uma breve distinção entre doente mental e deficiente mental: O homem
louco é privado dos bens que outrora gozava: é um rico tornado pobre. O idiota
sempre esteve no infortúnio e na miséria. O estado do homem louco pode variar;
o do idiota é sempre o mesmo. Este tem muitos traços da infância, aqueles que
conservam muito da fisionomia do homem feito. Em ambos, as sensações nulas, ou
quase nulas, mas o homem louco, na sua organização e mesmo na sua inteligência
demostra qualquer coisa de sua perfeição de outrora; o idiota é o que sempre
foi, é tudo o que se pode ser, relativamente à sua organização primitiva... a
idiotia começa com a vida ou na idade que precede o desenvolvimento das
faculdades intelectuais e afetivas; os idiotas são o que virão a ser durante
toda a sua vida; neles, tudo revela uma organização imperfeita ou incompleta no
seu desenvolvimento. Não se concebe a possibilidade de alterar esse estado.
Nada será, pois, capaz de dar aos infelizes idiotas, por um instante que fosse,
um pouco mais de razão, um pouco mais de inteligência (Esquirol apud
Giordano, 2000). Jean-Étienne Dominique Esquirol (1772-1840) foi um psiquiatra
francês. Foi discípulo de Philippe Pinel, sucedendo seu mestre em 1811 como
chefe do Hospital de Salpêtriére, em Paris. Entre vários outros notáveis
trabalhos cunhou o termo alucinação. Esquirol diferencia demência (doença
mental) e amência (deficiência mental). É com Esquirol que a idiotia deixa de
ser considerada uma doença e o critério para avaliá-la passa ser o rendimento
educacional. O médico, em consequência, perde a palavra final no que diz respeito
à deficiência mental, abrindo as portas dessa nova área de estudo ao pedagogo.
[11]
Quando uma pessoa se mostra incapaz de medir as consequências de suas ações e
administrar seus bens seja por doença ou vício, os membros família podem solicitar uma interdição
judicial. Em geral, é com um laudo médico que se torna inequívoca a
incapacidade, permitindo ao juiz decretar a interdição e nomear um curador.
Conforme já destacamos, doenças mentais, dependência química, doenças
neurológicas, dentre outras, são hipóteses de cabimento de interdição. Art.
1.177. A interdição pode ser promovida: I - pelo pai, mãe ou tutor; II - pelo
cônjuge ou algum parente próximo; (vale qualquer parente – CC mais recente) III
- pelo órgão do Ministério Público.
[12]
A Lei da Reforma Psiquiátrica no Brasil completou 21 anos no mês de abril de
2022 em meio a conquistas e desafios. Também conhecida como Antimanicomial ou
Paulo Delgado, a lei tem como fundamento o tratamento mais humanizado dos
pacientes acometidos por doenças mentais, com o fechamento gradual de
manicômios e hospícios existentes no País. A diretriz é a internação do
paciente somente se o tratamento fora do hospital se provar ineficiente. Fonte:
Agência Câmara de Notícias
[13]
Após tomar a Câmara dos Vereadores, o líder dos canjicas, o barbeiro Porfírio,
fez a seguinte proclamação: Itaguaienses! Uma Câmara Corrupta e violenta
conspirava contra os interesses de Sua Majestade e do povo. (...) Significativo
que em nenhum momento da narrativa se houvesse mencionado corrupção da Câmara e
que, ao tomá-la, o primeiro argumento proclamado tenha sido sua corrupção.
[14] Durante este percurso histórico a pessoa com
deficiência sofreu todo o processo de segregação social que, “apoia-se no tripé
preconceito, estereótipo e estigma”. Para o citado autor, todos esses elementos
foram construídos a partir do desconhecimento que, segundo ele, é a
matéria-prima da “segregação”.
[15]
Qual é o alcance da expressão “louco de todo gênero”? Ou com o Código de 1890,
o alcance da expressão “completa privação de sentidos e de inteligência”? Em
segundo lugar, exigia-se adequação “moral” ao louco, bem como superação da
“patologia” do criminoso. Falava-se em Manicômio ou em seção especial no
Hospício para os “loucos-criminosos” e
presídios específicos para “reincidentes incorrigíveis”, ou seja, de certo
modo, a prisão se fez asilo e o asilo se fez prisão, guardando entre si a
característica das instituições totais.
[16]
Transtornos mentais são alterações do funcionamento da mente que prejudicam o
desempenho da pessoa na vida familiar, social, pessoal, no trabalho, nos
estudos, na compreensão de si e dos outros, na possibilidade de autocrítica, na
tolerância aos problemas e na possibilidade de ter prazer na vida em geral.
Isto significa que os transtornos mentais não deixam nenhum aspecto da condição
humana intocado. Os transtornos mentais,
em geral resultam da soma de muitos fatores, tais como: - Alterações no
funcionamento do cérebro; - Fatores genéticos; - Fatores da própria personalidade
do indivíduo; - Condições de educação; - Ação de um grande número de estresses;
- Agressões de ordem física e psicológica; - Perdas, decepções, frustrações e
sofrimentos físicos e psíquicos que perturbam o equilíbrio emocional.
[17]
Consoante explica Pablo Stolze Gagliano embora a tutela e a curatela sejam
institutos autônomos e distintos, ambos contam com uma finalidade em comum,
sendo ela, “propiciar a representação legal e a administração de sujeitos
incapazes de praticar atos jurídicos”. A distinção conceitual fundamental entre
ambos reside, ainda de acordo com o autor, em seus pressupostos: “enquanto a
tutela se refere à menoridade legal, a curatela se relaciona com situações de
deficiência total ou parcial, ou, em hipótese mais peculiar, visa a preservar
interesses do nascituro”. Como discorre Pablo Stolze (2017, p. 1.333, apud
Paulo Lôbo, Direito Civil: Famílias, 2. ed., p. 388) O fundamento comum da
tutela e da curatela é o dever de solidariedade que se atribui ao Estado, à
sociedade e aos parentes. Ao Estado, para que regule as respectivas garantias e
assegure a prestação jurisdicional. À sociedade, pois qualquer pessoa que
preencha os requisitos legais poderá ser investida pelo Judiciário desse múnus.
Aos parentes, porque são os primeiros a serem convocados, salvo se legalmente
dispensados. Lembra Tartuce (2017, p. 924) que O ECA (Lei 8.069/1990) consagra
no seu art. 28 que a tutela é uma das formas de inserção da criança e do
adolescente em família substituta. São Partes da tutela: o tutor, aquele que
exerce o múnus público; e o tutelado ou pupilo, menor a favor de quem os bens e
interesses são administrados. De acordo com exposição do art. 1.728, CC, as
causas da determinação da tutela são o falecimento de ambos os pais, a
ausência, e a perda ou suspensão do poder familiar em relação à criança ou
adolescente.
[18]
É um processo judicial criado pela Lei Brasileira de Inclusão para garantir
apoio à pessoa com deficiência em suas decisões sobre atos da vida civil e
assim ter os dados e informações necessários para o pleno exercício de seus
direitos. É um processo autônomo, com rito próprio, no qual a própria pessoa
com deficiência indica os apoiadores de sua confiança a serem nomeados pelo
juiz. Do processo judicial de tomada de decisão apoiada participam, além da
parte interessada e das duas pessoas apoiadoras, o juiz, que é assistido por
uma equipe multidisciplinar, e o Ministério Público.
[19]
O trabalho de Wagner Gattaz é reconhecido em suas áreas de atuação,
neurociência e doenças neuropsiquiátricas, a esquizofrenia e a depressão. As
homenagens reluzem a sua trajetória profissional. No dia 18 de setembro, o
professor receberá o Prêmio Internacional de Epidemiologia e Psiquiatria
Clínica, oferecido pela Universidade de Zurique, na Suíça.
[20]
Em 1982 (decisão n.139), o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que a
periculosidade social não poderia ser definida, de uma vez por todas, como um
atributo natural da pessoa. Ao contrário, deveria ser colocada em relação aos
contextos, à presença de oportunidades de tratamento e emancipação, que são
relativas à disponibilidade de recursos e serviços.
[21]
O Manicômio Judiciário é uma Divisão do Departamento Psiquiátrico II, da
Coordenadoria de Saúde Mental da Secretaria de Estado da Saúde, conhecido como
"Juqueri" e situado nos municípios de Franco da Rocha e Caieiras. O
Manicômio Judiciário é um hospital especializado para doentes mentais
criminosos e pessoas à disposição da Justiça, em fase de julgamento. De acordo
com um relatório divulgado pela Pastoral Carcerária de São Paulo em 2018, os
manicômios judiciários, hoje, funcionam da mesma forma como qualquer outra
prisão: “A cena que vemos com frequência são os presos perambulando pelo pátio,
sem atividades e muito medicalizados”, relata Cytrynowicz.
[22]
"De Gênio e Louco Todo mundo tem um pouco". Esse título é um romance
de autoria Augusto Cury, e tem relação com a série O Vendedor de Sonhos, posto
que tenha dois personagens que integram tal série: Bartolomeu e Barnabé. De
acordo com o filósofo francês Michel Foucault (1926-1984) o saber sobre a
loucura, que se encerra no discurso psiquiátrico, é extraído a partir de seu
Sitz in Leben (expressão alemã utilizada
na exegese de textos bíblicos. Traduz-se comumente por "contexto
vital"), o lugar de existência, a
saber: as instituições de controle do louco que são: família, igreja, justiça, hospital, etc., os
saberes a elas relacionados e as estruturas econômicas e culturais da época. Este lugar de
existência é o que constitui para Foucault a episteme de uma época.