O grito da morte

Por Gisele Leite.

Fonte: Gisele Leite

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Mediante gritos de "Aqui é Bolsonaro!", um agente penitenciário invadiu uma festa na noite de sábado em Foz de Iguaçu (Paraná) e assassinou o aniversariante, o guarda municipal Marcelo Aluísio da Arruda enquanto comemorava seu aniversário de cinquenta anos de idade, a festa tinha a temática do PT, usando bandeiras e cores do partido, além de uma fotografia do pré-candidato à Presidência Luiz Inácio Lula da Silva.

A vítima era tesoureiro do Partido dos Trabalhadores (PT).

Os disparos foram feitos pelo agente penitenciário Jorge José da Rocha Guaranho e que está internado, as informações divergem sobre o seu atual estado de saúde. Segundo o Boletim de Ocorrência, ao invadir a festa, Guaranho gritou "Aqui é Bolsonaro!"

Segundo um dos diretores da associação onde o evento acontecia, não era convidado e, aparentemente, não conhecia a vítima. O algoz esteve no local e, logo iniciou uma confusão e, ao sair, afirmou que voltaria e "mataria todo mundo".

E, preocupado, Arruda foi até seu carro e pegou sua arma. E, quando o agressor voltou atirando, mesmo baleado, a vítima retribuiu os tiros e, segundo seu filho, tal gesto impediu que o agressor ferisse outras pessoas no evento festivo.

O agente penitenciário está sob custódia em um hospital da cidade. Há uma gravação de câmeras de segurança que demonstra o exato momento do crime. Trata-se de cenas impactantes.

Segundo as redes sociais, Guaranho se define como cristão e conservador e publica mensagens de apoio ao atual Presidente da República.

 O assassinato provocou indignação no meio político. E, Lula lamentou a morte de Arruda, lembrando que o guarda municipal acabara de ser pai recentemente.

Já o presidente Jair Bolsonaro (PL), sem mencionar uma única vez a vítima ou sua família, disse dispensar o apoio de quem pratica violência, mas buscou responsabilizar a esquerda pelo clima de agressividade na campanha.

Acredito estar caracterizado o famélico crime de ódio.

No Brasil, as leis sobre crimes de ódio dão enfoque ao racismo, à injúria racial e ainda a outros crimes motivados pelo preconceito, tais como os assassinatos praticados por esquadrões da morte ou grupos de extermínio e o crime de genocídio em função de nacionalidade, etnia, raça ou religião. Tanto a morte por esquadrões da morte quanto o genocídio são legalmente classificados como “crimes hediondos”.

Os crimes de racismo e injúria racial, apesar de parecidos, são processados de forma levemente diferente.

O artigo 140, § 3º, do Código Penal brasileiro, estabelece uma pena de 1 a 3 anos de prisão (“reclusão”), além de multa, para as injúrias motivadas por “elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem, ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência”.

Por outro lado, a Lei 7716/89 abrange os “crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional”, também com pena de reclusão de 1 a 3 anos, mais multa.

No caso do crime de apologia ao nazismo (artigo 20), cuja pena é agravada para 2 a 5 anos de reclusão, mais multa e destruição do material apreendido.

Além disso, a vigente Constituição Federal brasileira define como “objetivo fundamental da República” (art. 3º, IV) o de “promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade, ou quaisquer outras formas de discriminação”.

A expressão "quaisquer outras formas" refere-se a todas as formas de discriminação não mencionadas explicitamente no artigo, tais como a orientação sexual ou a discriminação em razão da profissão, entre outras.

A questão ideológica e política também poderá caracterizar o crime de ódio.

No Estado de São Paulo, funciona desde 2006 a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância (Decradi), vinculada ao DHPP (Depto. de Homicídios e Proteção à Pessoa). Ela foi criada pelo decreto 50.594, de 22/03/2006.

Segundo o decreto (art. 4º), suas atribuições são amplas:  "reprimir e analisar os delitos de intolerância" decorrentes de infração originada em "posicionamento intransigente e divergente de pessoa ou grupo em relação a outra pessoa ou grupo, e caracterizados por convicções ideológicas, religiosas, raciais, culturais, étnicas e esportivas, visando a exclusão social.

Apesar de frequente e intensa crise institucional no Brasil, o atual Presidente da República estimula explicitamente armas à população. Já tendo inclusive falado que: "Tem que todo mundo comprar fuzil.", em 27.08.2021. E, ainda aduziu que: "Povo armado jamais será escravizado".


Gisele Leite

Gisele Leite

Professora Universitária. Pedagoga e advogada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Conselheira do INPJ. Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Consultora Jurídica.


Palavras-chave: CP Crime Discriminação Preconceito Reclusão CF

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