Chilique[1] de General
Por Gisele Leite.
O
General Augusto Heleno, ex-ministro do Gabinete de Segurança Institucional (GSI)
criticou com palavrões a atuação da Relatora da CPI de Oito de Janeiro em
26.9.2023, a senadora Eliziane Gama. Acredito que o destempero das declarações
do General se deve à sua elevada faixa etária e por inúmeras contradições e
silêncio perpetrados. Nem as orientações de seu advogado presente, Dr. Matheus
Mayer Milanez, adiantaram. Já diante da Deputada Jandira Feghali, pediu
respeito.
A Relatora
da CPI, que é um colegiado, foi a primeira integrante a questionar os depoentes
na reunião. O imbróglio surgira mediante a pergunta, se na opinião do
depoente, as eleições brasileiras agora em 2022 foram fraudadas?
Ao que
o General respondeu que: - Já tem o resultado das eleições. Já tem um novo
presidente da República. Pô, não posso dizer que foram fraudadas. Foram
examinadas". Foi quando a Relatora aduziu: - "Certo, o senhor mudou
de ideia, né.".
E,
então o depoente explodiu de forma castrense: - Ela, ela fala as coisas que
acha que está na minha cabeça. Porra, é para ficar puto né, puta que
pariu". (grifo meu)
Cabe
lembrar que o crime de desacato previsto no art. 331 do Código Penal brasileiro
tem como base o ato de desacatar, que significa ofender, humilhar, agredir,
desprestigiar o funcionário público, que é sujeito passivo, não sendo
necessário que o funcionário se ofenda, bastando que a conduta seja capaz de
causar dano à sua honra profissional.
Trata-se
de crime da competência dos juizados especiais criminais. Art. 331 - Desacatar
funcionário público no exercício da função ou em razão dela: Pena: detenção, de
seis meses a dois anos, ou multa.
Com a
aplicação da Lei 10.259/01, esse crime passou para a competência dos juizados
especiais criminais, podendo o réu, nas condições do artigo 76 da Lei 9.099/95,
ser beneficiado com o instituto da transação penal (HC 22.881). Isso significa
que o réu pode fazer um acordo para o processo criminal não seguir, desde que
cumpra determinadas condições estabelecidas em juízo.
De
acordo com o artigo 58, parágrafo 3º da Constituição Federal Brasileira vigente,
as CPIs possuem poderes de investigação próprios das autoridades judiciais.
Sobre a prisão em flagrante, de acordo com o art. 301 do CPP, qualquer um
poderá prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.
Isto
é, a CPI tem o poder, assim como qualquer pessoa, de prender quem se encontre
em flagrante delito. Considerando flagrante, pelo art. 302 do CPP, quem esteja
cometendo ou tenha acabado de cometer a infração penal”.
Lembremos
que a testemunha ao depor tem o compromisso de dizer a verdade e o General
Heleno ao negar que o ex-ajudante de ordem não participava de reuniões, mentiu,
pois existe farto material fotográfico que evidencia a presença dele e do ex- ajudante
de ordem, na mesma reunião.
As
condutas criminosas consistem no ato de mentir ou deixar de falar a verdade
quando as referidas pessoas estiverem em juízo, processo administrativo,
inquérito policial ou em juízo arbitral.
Para
que o crime seja considerado como consumado, basta a realização de qualquer das
atividades referidas no artigo e não há necessidade de o ato ter produzido
consequências.
Se o
acusado de falso testemunho desistir da mentira e contar a verdade, no processo
que ele mentiu e/ou omitiu, o crime deixa de existir. Mas a retratação deve
ocorrer antes da sentença.
“Art.
342. Fazer afirmação falsa, ou negar ou calar a verdade como testemunha,
perito, contador, tradutor ou intérprete em processo judicial, ou
administrativo, inquérito policial, ou em juízo arbitral: (Redação dada pela
Lei nº 10.268, de 28.8.2001).
Pena - reclusão, de 2 (dois) a 4 (quatro) anos
e multa. (Redação dada pela Lei nº
12.850, de 2013).
§ 1º As
penas aumentam-se de um sexto a um terço, se o crime é praticado mediante
suborno ou se cometido com o fim de obter prova destinada a produzir efeito em
processo penal, ou em processo civil em que for parte entidade da administração
pública direta ou indireta. (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001).
§ 2º O fato deixa de ser punível se,
antes da sentença no processo em que ocorreu o ilícito, o agente se retrata ou
declara a verdade. (Redação dada pela Lei nº 10.268, de 28.8.2001)”.
Conclui-se
que a CPI não pode decretar a prisão preventiva de um investigado ou mesmo
testemunha, pois, embora tenha poderes próprios das autoridades judiciais, a
decretação da prisão preventiva é protegida pela cláusula de reserva de
jurisdição que exige autorização judicial para tanto.
A CPI
que dispõe de competência constitucional para ordenar a quebra do sigilo
bancário, fiscal e telefônico das pessoas sob investigação do Poder Legislativo
– somente poderá praticar tal ato, que se reveste de gravíssimas consequências,
se justificar, de modo adequado e sempre mediante indicação concreta de fatos
específicos, a necessidade de adoção dessa medida excepcional. Precedentes. Frise-se
que a fundamentação da quebra de sigilo há de ser contemporânea à própria
deliberação legislativa que a decreta.
Sublinhe-se,
ainda, que a exigência de motivação que há de ser contemporânea ao ato da CPI
que ordena a quebra de sigilo – qualifica-se como pressuposto de validade
jurídica da própria deliberação emanada desse órgão de investigação
legislativa, não podendo ser por este suprida, em momento ulterior, quando da
prestação de informações em sede mandamental. (MS 23.868, Rel. Min. Celso de Mello, j.
30-8-2001, P, DJ de 21-6-2002).
Na
mesma fatídica CPI sobre os Atos de Oito de Janeiro, a Suplente do Ministro
Flávio Dino, Ana Paula Lobato (PSB-MA) chamou Ernesto Geisel de
"Gêizel", o ocorrido virou meme nas redes sociais. Afirmou o
honrado General, publicamente, que se considera ser o Poder Moderador. Sinceramente, o tosco Imperador Dom Pedro I
deve ter se virado no túmulo em protesto.
Enfim,
a referida CPI, depois da oitiva do General Heleno, ocasião em que bradou
palavrões e depois guardou silêncio sobre o questionamento a respeito da
participação de Bolsonaro com o hacker Walter Delgatti sobre a tentativa
de invasão das urnas eletrônicas.
Em
verdade, a testemunha depoente revelou bem mais ao calar do que ao falar. Afinal,
quando guardou silêncio sobre certas perguntas, acreditou que estaria criando
prova contra si mesmo... Isso sim, é assaz revelador...
Nota:
[1]
A origem da palavra chilique é obscura. Poderá ser formada a partir de formação
expressiva, ou seja, a partir de uma linguagem oral, improvisada, baseada nos
sons da fala.