Quem manda, eis a questão

Mais uma vez o ministro da Fazenda desautoriza o presidente da República. Já se tornou uma constante a negação ostensiva e frontal de Antonio Palocci a cada vez que Lula ousa avançar alguma referência de política econômica.

Fonte: Folha de S. Paulo

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Mais uma vez o ministro da Fazenda desautoriza o presidente da República. Já se tornou uma constante a negação ostensiva e frontal de Antonio Palocci a cada vez que Lula ousa avançar alguma referência de política econômica. Vimos isso mesmo, há pouco tempo, a propósito de salário mínimo. Antes víramos a respeito de FMI, Orçamento, PIB, início do crescimento e, várias vezes, taxa de juros, além de outras menções. Agora é a vez do aumento disfarçado do Imposto de Renda, particularmente perverso com assalariados e aposentados.

A freqüência das desautorizações propõe uma pergunta cuja resposta, quando segura, talvez tenha alguma utilidade: quem é que manda, afinal de contas, neste governo? Lula já disse a parlamentares e governadores, não faz muito tempo, que as coisas não andam no governo porque suas ordens não são cumpridas. Não é só por isso que as coisas não andam, ou desandam, mas o desabafo vem da pessoa mais autorizada a falar da exótica autoridade presidencial na peculiar hierarquia do governo petista.

As freqüentes desautorizações feitas por Antonio Palocci, diretas, públicas, sem ao menos o cuidado caridoso de certa sutileza, não aceleram a pergunta apenas por serem o que são. Mas, sobretudo, porque os desdobramentos das divergências assumem, sempre, as formas coerentes com as palavras de Palocci, não com as de Lula.

A contraposição atual é mais complicada. Inquieto com as repercussões do desmascarante salário mínimo posto em vigor neste mês, no fim de abril Lula quis dar uma engambelada nos seus companheiros de tempos mais leais. Foi discursar aos metalúrgicos do ABC, segundo lhes disse, para levar "uma boa notícia": a tabela de deduções do Imposto de Renda e o limite de isenção "vão ser corrigidos pelo governo", como reivindicam as centrais sindicais e todos os que pagam o imposto com salário ou aposentadoria.

Desde 96, a tabela teve correção em um só ano, 2002. Se há inflação e não há correção da tabela, o efeito é aumento do imposto. Desde o governo Itamar Franco o limite para isentar de pagamento do imposto mantinha a média de R$ 1.350. Com a falta de correção apesar da inflação, deixaram de estar isentos os que ganham a partir de R$ 1.058. Ou seja, além de aumentar o imposto, o governo Lula aumentou muito o número dos obrigados a pagá-lo. Com o aumento também da Cofins, entende-se que o governo tenha batido todos os recordes de arrecadação em abril. E, no primeiro quadrimestre, a arrecadação tenha ficado R$ 1,6 bilhão acima do previsto pela Fazenda.

Mas a "boa notícia" da correção da tabela foi agora desautorizada por Palocci: se houver mudança na tabela, seria "para os próximos anos" e dependeria de discussões futuras.

A depender de decisão do governo, não há dúvida sobre qual das duas palavras prevalecerá, a de quem deu a "boa notícia" ou a de quem a retirou. Mas, à diferença do que houve em outras desautorizações, no caso da correção há projetos na Câmara. O PT os cozinha enquanto pode sem, no entanto, escapar às dificuldades. E, se conta com Luiz Marinho para moderar a CUT, já sabe que os metalúrgicos do ABC, com um dirigente firme e bem articulado, José Feijó, ameaçam cobrar a "boa notícia" a todo custo.

Se o problema é de Lula ou de Palocci, não é fácil saber. O problema, digamos, é de quem manda de fato, seja quem for. Mas uma coisa é certa: com tantas desautorizações a Lula, Palocci já está credenciado para trabalhar, quando um dia deixe o governo, no "New York Times".

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