PGR defende direito fundamental da gestante de interromper gravidez de feto anencéfalo

PGR defende que os dispositivos do Código Penal violam preceitos fundamentais da Constituição ao proibir a antecipação voluntária da gravidez de anencéfalos

Fonte: MPF

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A Procuradoria Geral da República defende a possibilidade de antecipação terapêutica de parto nos casos de fetos anencéfalos, matéria que será objeto de análise pelo Supremo Tribunal Federal nesta quarta-feira, dia 11 de abril, a partir das 9 horas. A PGR concorda com os argumentos da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Saúde na arguição de descumprimento de preceito fundamental (ADPF 54), segundo a qual dispositivos do Código Penal violam preceitos fundamentais da Constituição ao proibir a antecipação voluntária da gravidez de fetos anencéfalos.


Segundo Deborah Duprat, que enviou o parecer em julho de 2009, quando exercia o cargo de procuradora-geral da República, a proibição de antecipar a gravidez de fetos com anencefalia vai contra o direito à liberdade, à privacidade e à autonomia reprodutiva, além de ferir o princípio da dignidade da pessoa humana e o direito à saúde. Ela salientou que não há violação do direito à vida nem aborto eugênico na antecipação terapêutica do parto e que a interrupção desse tipo de gravidez é direito fundamental da gestante.


“A antecipação terapêutica do parto na anencefalia constitui exercício de direito fundamental da gestante. A escolha sobre o que fazer, nesta difícil situação, tem de competir à gestante, que deve julgar de acordo com os seus valores e a sua consciência, e não ao Estado. A este, cabe apenas garantir os meios materiais necessários para que a vontade livre da mulher possa ser cumprida, num ou noutro sentido”, defendeu o parecer.


A Procuradoria Geral da República quer que o STF dê interpretação conforme a Constituição Federal dos artigos 124, 126, caput, e 128, I e II, do Código Penal, para declarar que tais dispositivos não criminalizam ou impedem a interrupção voluntária da gravidez em caso de anencefalia fetal, desde que a doença seja diagnosticada por médico habilitado, reconhecendo-se o direito da gestante de se submeter a esse procedimento sem a necessidade de prévia autorização judicial ou de qualquer outro órgão estatal.


Patologia – No parecer, a PGR explica que a anencefalia constitui patologia incurável, incompatível com o desenvolvimento da vida extra-uterina, que pode ser diagnosticada com 100% de certeza. “Trata-se de uma má-formação congênita, consistente em defeito do tubo neural, que resulta na não-formação do córtex e dos hemisférios cerebrais. O cérebro dos portadores desta patologia compõe-se apenas de resíduos do tronco encefálico, o que permite a manutenção de algumas funções vitais, como a respiração e o batimento cardíaco. Não há, porém, a formação do sistema nervoso central, que é responsável pela consciência, pela comunicação, pelo pensamento e pelas emoções.”


Ainda segundo o parecer, a maior parte dos fetos anencéfalos morre durante a gestação. “Aqueles que não falecem durante a gravidez têm curtíssima sobrevida, de natureza meramente vegetativa, em geral de poucos minutos ou horas.”


Para a Procuradoria Geral da República, o debate sobre a interrupção ou não de gravidez com feto anencéfalo só pode ser discutido a partir de argumentos jurídicos, éticos e científicos, devendo-se evitar argumentação de cunho religioso. “Num Estado laico e pluralista, que, por imperativo constitucional (art. 19, inciso I, CF), deve manter equidistância em relação às diversas confissões religiosas, as questões jurídicas submetidas ao crivo do Poder Judiciário não podem ser equacionadas, de forma explícita ou inconfessada, com base em dogmas de fé, mas apenas a partir de razões públicas, cuja aceitação não dependa da adesão a pré-compreensões teológicas ou metafísicas determinadas”, argumenta.


O parecer acrescenta que não significa que seja ilegítima a participação nos debates jurisdicionais de entidades religiosas, como ocorreu nesse caso. “Pelo contrário, numa democracia, não é legítimo excluir qualquer ator da arena de definição do sentido da Constituição. Contudo, para tornarem-se aceitáveis no debate jurídico os argumentos provenientes dos grupos neste quadro, é evidente que não se justifica, sob o prisma constitucional, a imposição de qualquer restrição, sobretudo de natureza penal, à liberdade da gestante de decidir se interrompe ou não a sua gravidez, abreviando o desfecho inexorável da morte do anencéfalo".


Avanços científicos - Segundo a Procuradoria Geral da República, a questão jurídica debatida nesse caso resulta do anacronismo da legislação penal brasileira, editada quando ainda não era possível diagnosticar a viabilidade da vida extra-uterina do feto. “Em 1940, quando foi promulgada a Parte Especial do Código Penal, a tecnologia então existente não permitia a realização de diagnóstico pré-natal da anencefalia. Porém, tal quadro se alterou radicalmente nas últimas décadas, por força dos avanços científicos na Medicina”.

Palavras-chave: Anencéfalos; Violação; Direitos; Gestante; Gravidez; Direitos; Aborto

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