Multa por descumprimento de decisão pode ser aumentada contra devedor de grande capacidade econômica

Se o único motivo para o descumprimento de decisão judicial é o descaso do devedor, justifica-se o aumento da multa diária.

Fonte: STJ

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Se o único motivo para o descumprimento de decisão judicial é o descaso do devedor, justifica-se o aumento da multa diária. E dispondo o devedor de grande capacidade econômica, esse valor será naturalmente elevado, para que a coerção seja efetiva. O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que aumentou a multa imposta à Bunge Fertilizantes S/A de cerca de R$ 480 mil para aproximadamente R$ 10 milhões, mais correção.


O processo originou-se de uma ação revisional de contrato de confissão de dívida agrícola na qual se suspendeu a exigibilidade do instrumento contratual e se determinou a não inscrição do autor em cadastros de inadimplentes até o julgamento final. Não obstante, a Bunge ajuizou ação de execução fundada no contrato de confissão de dívida, cuja exigibilidade estava suspensa por ordem judicial, o que ocasionou a inclusão do nome do agricultor em cadastro restritivo de crédito.


Para a ministra Nancy Andrighi, a multa diária por descumprimento de decisão judicial não é um fim em si mesma, mas funciona como mecanismo de indução – mediante pressão financeira –, a compelir o devedor ao cumprimento da obrigação e da própria ordem judicial”. Por isso, seu valor deve ser apto a influir concretamente no comportamento do devedor, diante de sua condição econômica, capacidade de resistência, vantagens obtidas com o atraso e demais circunstâncias.


Porém, segundo jurisprudência do STJ, a multa não pode resultar em enriquecimento ilícito do credor. No caso, mantida a multa inicialmente fixada, a cada cem dias ela alcançaria o valor do próprio contrato originário da controvérsia. Além disso, a multa não deve possuir o caráter indenizatório que recebeu do juízo da execução. A ministra lembrou que a reparação pelos danos por inscrição no cadastro de inadimplentes poderia ser buscada pelo agricultor em ação própria – o que poderia resultar em dupla “premiação” pelos mesmos danos.


Por outro lado, a redução deve ser rejeitada se o único obstáculo ao cumprimento da decisão for o descaso do devedor. Para a ministra, a análise sobre o excesso ou adequação da multa não deve ser feita na perspectiva de quem olha para os fatos já consolidados no tempo. Assim, não se deve procurar razoabilidade atual quando a raiz do problema existe justamente em um comportamento desarrazoado da parte.


No caso específico, a Bunge, mesmo não cabendo mais recurso, ainda segue descumprindo a determinação de não incluir – ou, a essa altura, retirar – o nome do autor de cadastros de restrição de crédito. Mesmo após ver recusada a execução, o que comprovou ter ponderado mal seu direito, a Bunge não tentou realizar a baixa da inscrição.


Para a ministra, a decisão do Tribunal de Justiça de Goiás (TJGO) de reduzir a multa de cerca de R$ 300 milhões para R$ 480 mil acabaria por premiar a insubordinação e o comportamento reprovável da Bunge, que – destacou – ainda não cumpriu a ordem judicial. Segundo a relatora, se a empresa não atendeu à determinação quando a multa atingiu valores “multimilionários”, não seria com a fixação de um valor abaixo de R$ 500 mil que a penalidade alcançaria sua função coercitiva, “intimidando uma empresa com atuação mundial do porte da Bunge”.


A ministra também ressaltou que não existe, no STJ, precedente no sentido de reduzir o valor das multas diárias enquanto ainda persiste o descumprimento da ordem judicial.


Histórico


O agricultor havia obtido decisão favorável em ação de revisão de contrato, determinando a suspensão da exigibilidade das dívidas e vedando o lançamento do seu nome em cadastros de restrição ao crédito, como Serasa e SPC. A decisão valeria até o julgamento final da ação, e, em caso de descumprimento, seria aplicada multa diária de 2% do valor contratado, estimado à época em R$ 11,5 milhões.


A Bunge recorreu dessa decisão. Inicialmente, o agravo recebeu efeito suspensivo, mas acabou não sendo apreciado pelo TJGO por ter sido apresentado fora do prazo. O entendimento foi mantido na admissão do recurso especial e também no próprio STJ, em agravo de instrumento ao qual igualmente se negou seguimento.


No julgamento do mérito, a sentença foi favorável ao agricultor. A Justiça goiana alterou os prazos de vencimento da dívida, anulou cláusulas abusivas do contrato e manteve os efeitos da liminar. A apelação da Bunge não foi bem-sucedida no TJGO, que não admitiu o recurso especial contra essa nova decisão. Atacada por outro agravo de instrumento, este não foi conhecido pelo STJ, pela falta de peças indispensáveis.


Paralelamente, depois da decisão liminar suspendendo a exigibilidade da dívida, a Bunge iniciou ação de execução contra o agricultor. A ação levou à inclusão do nome do fazendeiro em cadastro restritivo de crédito. A sentença extinguiu a execução, por inexigibilidade do título. Essa decisão foi mantida na apelação ao TJGO. O recurso especial interposto contra esse acórdão não foi admitido na origem, tendo sido interposto agravo de instrumento, o qual não foi conhecido pelo STJ também por falta de peças.


O agricultor então ingressou com ação pedindo a execução da multa por descumprimento da decisão. Segundo seus cálculos, o valor alcançaria R$ 293 milhões – devendo ainda ser acrescidos 10% referentes a honorários advocatícios.


A ação foi impugnada pela Bunge, que obteve no TJGO a redução do valor da multa. Para o tribunal estadual, a condenação deveria ser ajustada a valores razoáveis ao caso. Segundo a Justiça goiana, isso significaria R$ 12 mil por mês de atraso.


Dessa decisão o agricultor recorreu ao STJ, onde obteve a decisão favorável. O recorrente sustentou que a multa imposta pelo TJGO seria insuficiente para coagir o devedor relutante.

 

Palavras-chave: Multa Diária Devedor Capacidade Econômica Decisão Judicial

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3 Comentários

Enio uiz Magosso aposentado23/10/2010 10:56 Responder

Muito bem!!! Porem, pergunto, por que esta medida não é aplicada tambem ao poder executivo? Os Estados, principalmente o de São Paulo, não cumpre decisões judiciais desde décadas, como por exemplo temos o pagamento de precatórios, tanto os alimentares c omos os não alimentares, resultante de desaproprição e outros em que o cidadão por longos e dificultoso tempo lidou junto aos tribunais para fazer valer e ver seus direitos reconhecidos pela nosa justiça. E depois como prêmio, recebe um amaldiçoado precatório que nada mais é que um simples papel sem valor algum, pois para a satisfação de seu crédito, depende exclusivamente da vontade política do Executivo, que atualmente se empenha em não cumprir estas decisões da nossa justiça e vai empurrando para a frente esse compromisso, e sempre argumentando, ou, falta de recursos ou prioridade de aplicação em outras áreas ou prioridades.

josé giovannetti advogado23/10/2010 16:24 Responder

Somos todos iguais perante a Lei. Portanto, eu não acredito nesta aberração ora noticiada.

eli advogada24/10/2010 17:07 Responder

texto excelente.

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