Licenciamento compulsório de patentes e o impacto nas vacinas para combate à Covid-19

Com as primeiras notícias sobre vacinas contra a Covid-19 iniciou-se também o debate sobre a “quebra das patentes” como uma das formas de combate à pandemia.

Fonte: Silvia Moreira Taketsuma Costa

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Imagem de torstensimon por Pixabay

Com as primeiras notícias sobre vacinas contra a Covid-19 iniciou-se também o debate sobre a “quebra das patentes” como uma das formas de combate à pandemia. Tema de longas conversas e inúmeras argumentações, no Brasil a discussão chegou ao Senado com o Projeto de Lei (PL) 12/2021 de autoria do senador Paulo Paim (PT-RS), que busca alterar artigos da Lei de Propriedade Industrial Nº 9279/1996 (LPI) e agilizar o processo de concessão de licenças compulsórias. O projeto foi aprovado no plenário do Senado em 11/08 e agora segue para sanção presidencial.


Independente do PL ser sancionado ou não, a Lei de Propriedade Industrial (LPI) Nº 9279/1996 já prevê, em seus Artigos 68 a 74, a possibilidade de solicitar o licenciamento compulsório para sanar eventuais abusos cometidos pelo detentor da patente ou quando o mesmo não explora o objeto da patente e é incapaz de atender a demanda interna. Estes mecanismos da LPI, inclusive, já foram usados em uma outra situação de emergência na saúde pública, tendo sido fundamentais para o único licenciamento compulsório solicitado pelo governo federal até hoje. Foi o caso do medicamento Efavirenz, decidido em 2007, que possibilitou que o tratamento da AIDS pelo Sistema Único de Saúde (SUS) fosse concretizado.


Cabe salientar que tanto o procedimento de licenciamento compulsório já previsto na LPI quanto o proposto pelo PL 12/2021 não podem ser tratados como “quebra de patente”, como é popularmente noticiado, uma vez que o detentor dos direitos da tecnologia continua como titular da patente, sendo inclusive remunerado por isso.


Por conta da crise humanitária causada pela pandemia, um dos pontos que o PL 12/2021 prevê é que alguns procedimentos precisam ser mais objetivos e os prazos mais curtos em relação ao disposto na LPI. As principais mudanças são:


- passa a ser considerado não só a emergência nacional como fator desencadeador da licença compulsória, mas também a emergência internacional, ou seja, mesmo em situações em que o Brasil não seja diretamente afetado;


- passa a ser possível solicitar a licença compulsória de pedidos de patente, ou seja, ainda pendentes de decisão do INPI sobre a concessão ou não; que teriam seus exames acelerados;


- uma lista de patentes ou de pedidos de patente de tecnologias potencialmente úteis ao enfrentamento da emergência nacional seria publicada no prazo de até 30 (trinta) dias após a declaração de emergência ou de interesse público, ou do reconhecimento da calamidade pública. Patentes e pedidos de patente objetos de acordos de transferência da tecnologia de produção ou de licenciamento voluntário capazes de assegurar o atendimento da demanda interna, não seriam afetados;


- qualquer instituição pública ou privada passaria a poder apresentar pedido para inclusão de patente ou de pedido de patente na referida lista; sem necessariamente comprovar que tenha capacidade técnica e econômica para a produção do objeto da patente ou pedido de patente;


- passa a ser obrigatório que o titular da patente ou do pedido de patente forneça informações necessárias à efetiva reprodução do objeto a ser licenciado compulsoriamente, bem como os resultados de testes, sob pena de declaração de nulidade da patente;


- a remuneração do titular da patente ou do pedido de patente objeto de licença compulsória passa a ser fixada em 1,5% sobre o preço líquido de venda do produto. Na LPI esta remuneração era negociada de forma a considerar as circunstâncias de cada caso, levando-se em conta, obrigatoriamente, o valor econômico da licença concedida.


A aprovação não é unanimidade e já há ressalvas de diversos setores do Governo Federal. Entende-se, por exemplo, que a falta de vacina em diversos países do mundo não ocorre por falta de direitos, mas sim pela capacidade produtiva. Ou seja, a licença compulsória pode não ser a melhor alternativa quando se fala em aumentar a produção de vacinas. Especialistas alertam ainda sobre o risco de insegurança jurídica que pode representar uma hesitação por parte de empresas investidoras.


Por fim, deve-se ressaltar que o altíssimo investimento em pesquisa e desenvolvimento das vacinas contra covid-19 em tempo recorde só foi possível devido a um consolidado sistema de proteção à propriedade intelectual, uma vez que haveria a garantia de retorno através da comercialização de novas tecnologias, dando assim continuidade ao ciclo virtuoso da inovação. Devemos esperar que a eventual sanção do Projeto de Lei 21/2021 represente uma melhoria para este sistema, incentivando mais investimentos em tecnologias para a saúde, além de riqueza e empregos no Brasil.


*Silvia Moreira Taketsuma Costa, Diretora de Serviços Técnicos da ClarkeModet Brasil

Palavras-chave: Licenciamento Compulsório Patentes Impacto Vacinas Covid-19

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