Julgamento sobre reajuste de energia elétrica é interrompido por pedido de vista

Fonte: STJ

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O julgamento na Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (STJ) dos processos que discutem os reajustes de tarifas de energia elétrica nos estados de Pernambuco e do Rio Grande do Norte deve ser retomado no próximo dia 19. A análise dos casos foi interrompida com o pedido de vista do ministro Barros Monteiro, logo após o presidente do STJ, ministro Edson Vidigal, manifestar-se pela manutenção da decisão que havia tomado individualmente, no que foi seguido pelo ministro Nilson Naves.

As decisões do presidente do STJ foram tomadas no último dia 14 de setembro (SLS 161 e 162). O ministro Vidigal atendeu a pedido da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) para suspender as decisões que impediam a Companhia Energética de Pernambuco (Celpe) e a Companhia Energética do Rio Grande do Norte (Cosern) de cobrar tarifas de energia elétrica com reajuste definido pela agência.

O Ministério Público Federal contestou a decisão por meio de agravo regimental, um recurso interno que deve ser submetido aos ministros da Corte Especial. Como relator do processo, o ministro Edson Vidigal ratificou seu posicionamento anterior, mantendo a suspensão da liminar do Tribunal Regional Federal da 5ª Região que impedia o reajuste.

Para o ministro, não é possível substituir aleatoriamente a fórmula de reajuste pactuada desconsiderando critérios técnicos, porque estes são indispensáveis à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato. De outra forma, a mudança interferiria nos mecanismos de política tarifária aprovados pelo Conselho Nacional de Desestatização, "o que ofenderia a ordem pública administrativa".

O ministro Vidigal ainda ressaltou que o interesse público não se resume à contenção de tarifas, mas vai além, devendo primar pela continuidade e qualidade do fornecimento de energia. Por isso, a manutenção dos contratos celebrados com o poder concedente é essencial para viabilizar investimentos no setor, evitando um retrocesso à ameaça do "apagão", vivida há alguns anos pelos brasileiros.

O presidente do STJ também destacou que a suspensão de liminar não tem efeito retroativo e não pode ser confundida com recurso, porque "não revoga, não modifica, apenas suspende a eficácia de uma decisão". O ministro Vidigal ainda advertiu para o efeito de risco inverso que pode se instalar com a manutenção da liminar, a partir do momento em que se admitir a quebra do equilíbrio dos contratos firmados com o Poder Público, criando desconfiança jurídica.

Histórico

Os pedidos para impedir os aumentos foram feitos em ações civis públicas ajuizadas pelos Ministérios Públicos Federal e Estadual contra a Celpe e pelo Ministério Público em litisconsórcio com o Programa de Defesa do Consumidor do Estado do Rio Grande do Norte (Procon) contra a Cosern. O primeiro pedido foi deferido pelo juízo da 3ª Vara Federal da Seção Judiciária de Pernambuco, que determinou a fixação provisória, pela Aneel, de novos percentuais para as tarifas de energia elétrica fornecida pela Celpe e a desconsideração, nas faturas de energia, dos valores decorrentes da Resolução 112/2005 da Aneel, devendo ser mantidos os valores anteriores, até que fossem divulgadas as novas tarifas. Pela decisão, a Celpe deveria, ainda, substituir as faturas que já tivessem sido expedidas com o aumento.

Contra a Cosern, a tutela foi deferida parcialmente pelo juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária de Natal. "Defiro em parte a liminar para, com efeito erga omnes no Estado do Rio Grande do Norte, suspender imediatamente os efeitos da resolução homologatória nº 103 da Aneel e determinar à Cosern que efetue o reajuste tarifário de energia elétrica de 2005, aplicando tão-somente a variação do IGPM nos últimos doze meses (maio de 2004 a abril de 2005) no percentual de 11,1231%", afirmou o juiz.

Após terem sido negadas pelo presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região as suspensões das liminares, a Aneel recorreu ao STJ, alegando possibilidade de lesão ao interesse público, à ordem administrativa e à economia pública. "O desrespeito aos contratos não privilegia o nosso País como um país sério de cumprimento das avenças que pactuou", argumentou.

Segundo a Aneel, a manutenção das antecipações de tutela que limitaram em mais da metade o reajuste homologado pela própria Aneel ? após meticuloso trabalho elaborado pela sua área técnica ? culminará por destruir a credibilidade que o Governo vem tentando conquistar perante os investidores ao longo dos anos. Observou, ainda, que a ausência de investimentos no setor, conseqüência do não-reajustamento das tarifas, acarretará, em futuro próximo, lesão irreparável à economia do setor elétrico, não se afastando a possibilidade de nova crise nos moldes da ocorrida em 2001.

"Crise essa que fatalmente implicará racionamento e aumento de preços de energia", asseverou. "Perde o País, que deixa de crescer; perde o consumidor, que vai pagar mais caro por uma energia que sequer poderá consumir livremente, e perde-se eficiência na prestação do serviço público". Em parecer, o Ministério Público opinou pelo indeferimento da suspensão.

Sheila Messerschmidt, com reportagem de Regina Célia Amaral
(61) 3319-8593

Leia a íntegra das decisões:

"AgRg na SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA Nº 161 - RN (2005/0126738-7)


RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO EDSON VIDIGAL (Relator): Buscando a declaração de nulidade do reajuste de tarifa autorizado pela ANEEL ? Agência Nacional de Energia Elétrica através da Resolução Homologatória nº 103, de 18 de abril de 2005, bem como fosse a COSERN ? Companhia Energética do Rio Grande do Norte condenada a aplicar, como referencial no reajuste tarifário de energia para o ano de 2005, tão somente o percentual de 7,88%, correspondente à variação do IPCA ? Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) apurado nos últimos 12 meses, o Ministério Público Federal, em litisconsórcio com o PROCON/RN, ajuizou Ação Civil Pública cujo pedido de antecipação da tutela foi deferido pelo Juízo da 2ª Vara Federal da Seção Judiciária de Natal/RN, assim:

"DEFIRO em parte a liminar para, com efeito erga omnes no Estado do Rio Grande do Norte, suspender imediatamente os efeitos da resolução Homologatória n. 103 da ANEEL e determinar à COSERN que efetue o reajuste tarifário de energia elétrica de 2005, aplicando tão somente, a variação do IGPM nos últimos doze meses (maio de 2004 a abril de 2005), no percentual de 11,1231%". (fl.202).

Contra essa decisão a ANEEL interpôs agravo de instrumento e Pedido de Suspensão de Liminar, este negado pelo Presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, o que ensejou agravo regimental, não provido pelo pleno daquele Regional, restando mantida, por conseqüência, a liminar concedida pelo juiz da causa.

Com base na Lei nº 8.437/92 c/c Lei nº 9.494/97, pediu, aqui, a ANEEL, a suspensão da tutela antecipadamente concedida, para evitar lesões ao interesse público, à ordem administrativa e à economia pública.

Para tanto, sustentou que o ato impugnado pelos autores da ação civil pública está em conformidade com o ordenamento jurídico.

Sua manutenção, afirmou, ofende o legal exercício das funções da Administração pelas autoridades constituídas, podendo resultar impedimento à normal execução do serviço público, conforme previsto no processo de desestatização e Lei nº 8.987/95, que dispôs sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, bem como atribuiu ao Poder concedente, dentre outras, a incumbência de "homologar reajustes e proceder à revisão das tarifas na forma desta Lei, das normas pertinentes e do contrato" (artigo 29, V) (fl. 7), previsão essa que é decorrente do disposto no art. 9º, § § 2º, 3º e 4º.

Editou-se, também, a Lei nº 9.427/96, que disciplina o regime das concessões de serviços públicos de energia elétrica e instituiu a ANEEL, à qual foram cometidas a regulação e fiscalização da produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, estabelecendo, o art. 15, a forma de remuneração da prestação do serviço.

Afora a previsão da competência da ANEEL para fixar as tarifas resultantes de processo de reajuste nas Leis nºs 8.987/95 e 9.427/96, acrescentou, o Decreto nº 2.335/97 "regulamenta a competência da ANEEL para atuar, na forma da lei e do contrato, nos processos de definição e controle de preços e tarifas, homologando seus valores iniciais, reajustes e revisões, e criando mecanismos de acompanhamento de preços" (fl. 8). Por isso que, ao expedir ato homologando reajuste para as concessionárias distribuidoras de energia elétrica, a ANEEL o faz no exercício das prerrogativas que lhe foram atribuídas por leis regularmente emanadas do Poder Legislativo (fl. 8).

A composição das tarifas, aduziu, corresponde a um dos elementos que, de forma conjunta, constituem a política do Governo Federal para o setor energético brasileiro, prevista em leis emanadas do Congresso Nacional e nos contratos de concessão. Política essa que não legitima a atuação do Judiciário "para impedir a efetivação desta opção em vista da 'cláusula pétrea constitucional' de independência e harmonia entre os Poderes" (fl. 8).

Agiu a ANEEL nos estritos termos das competências legalmente a si atribuídas pelo Conselho Nacional de Desestatização ? CND, razão pela qual a decisão impugnada ofende a ordem administrativa e causa inegável estado de insegurança jurídica, além de ditar nova política para o setor elétrico, em prejuízo à competência conferida à ANEEL, como já decidido por esta Presidência nas SL 57/DF, SL 76/PR e SS 1.468/GO, pois, "o desrespeito aos contratos não 'privilegia o nosso País como um país sério de cumprimento das avencas que pactuou' " (fls. 9/10).

A lesão à economia pública, com risco de sério comprometimento do setor elétrico, veio pelo prisma de que o esgotamento da capacidade de geração de energia das hidrelétricas então existentes e a necessidade de novos e vultosos investimentos em momento de escassez de recursos foram fatores que, em 2001, acabaram por fazer eclodir crise sem precedentes no setor, exigindo do Governo a tomada de medidas urgentes e drásticas, dentre as quais o processo de desestatização, sendo certo que "a atração dos investidores para atuarem no setor elétrico, evitando-se a eclosão de nova situação de escassez de energia, não prescinde da demonstração de confiabilidade por parte do Governo, mormente no que se refere ao cumprimento dos contratos celebrados" (fl. 12).

A seu ver a manutenção da antecipação da tutela que limitou o reajuste homologado pela ANEEL ? após meticuloso trabalho elaborado pela sua área técnica para se chegar ao percentual necessário -, culminaria por destruir a credibilidade que o Governo tem tentado conquistar perante os investidores ao longo dos anos. E, mais, a ausência de investimentos, conseqüência do não reajustamento das tarifas, poderia acarretar, em futuro próximo, lesão irreparável à economia pública do setor elétrico, não se afastando a possibilidade de nova crise nos moldes da ocorrida em 2001. Crise essa que "fatalmente implicará racionamento e aumento de preços de energia, perde o País, que deixa de crescer, e perde o consumidor, que vai pagar mais caro por uma energia que sequer poderá consumir livremente" (fl. 13), perdendo-se eficiência na prestação do serviço público.

Discorreu, também, acerca da lesão ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão, componente que configura "um dos alicerces em que assenta a concepção jurídica da concessão de serviço público", pois, se não fossem previstas no contrato cláusulas que garantissem seu equilíbrio econômico-financeiro, certamente a Administração teria sérias e reais dificuldades em encontrar particulares interessados em com ela negociar.

Destacou que a situação se agrava com o fato de que 15, 368% dos 19,58% estabelecido como índice de reajuste, correspondiam a encargos que, ou não estão na esfera de discricionariedade da Concessionária, ou consistiam obrigações do consumidor (parcela A + Ajuste Financeiro do PIS e COFINS + Ajuste Financeiro Residencial Baixa Renda + Ajuste Financeiro do PERCE + Compensação do saldo positivo da CVA), ou seja, correspondiam a uma parcela de valores sobre os quais a Concessionária não tem ingerência, funcionando como mero agente arrecadador, repassando os valores arrecadados à União, à Eletrobrás, ao ONS, à ANEEL e aos agentes geradores de energia elétrica, e, quando exerce a função de arrecadadora de valores, a Concessionária não pode ser beneficiada ou prejudicada.

Realçou que a Concessionária tem que efetuar o repasse dos valores pontualmente, independentemente de estar recebendo efetivamente os valores correspondentes, e que esse repasse é fiscalizado pela ANEEL, que a considerará, intrasetorialmente, inadimplente, se descumprida a obrigação nos prazos de vencimentos assinalados. Por isso, "retirar da concessionária a correspondência entre a cobertura tarifária e a obrigação de repassar tais valores constitui medida ilegal, desarrazoada e temerária, vez que terá como único resultado o desequilíbrio econômico-financeiro" (fl. 21), situação reconhecida na SS 1.424/RJ.

Arrematou aduzindo que "a não aplicação do índice de reajustes autorizado pelo Poder Concedente significa para a concessionária perdas anuais de R$ 47.752.373,86 (quarenta e sete milhões, setecentos e cinqüenta e dois mil, trezentos e setenta e três reais e oitenta e seis centavos), aproximadamente R$3,979 milhões de reais/mês" (fl. 22), com conseqüente afetação da adequada prestação do serviço público, em prejuízo dos consumidores, e da higidez econômica da concessionária, com repercussões negativas no influente 'Risco Brasil', sendo também evidente o efeito multiplicador, que já vinha ocorrendo.

Instado a se manifestar o Ministério Público Federal pugnou pelo indeferimento do pedido, argumentando que na ação civil pública não se questionou a competência da ANEEL para homologar e proceder aos reajustes tarifários, mas, apenas, a legalidade dos índices de reajustes e os seus componentes de cálculo (fl. 402).

Sustentou a possibilidade de revisão, pelo Judiciário, dos atos administrativos, destacando que a competência atribuída à ANEEL não lhe permitia agir sem que haja fiscalização sobre a legalidade e razoabilidade de seus atos.

Esclareceu que a decisão impugnada não vedou o reajuste das tarifas, determinando, apenas, que a revisão observasse a variação do IGP-M nos últimos doze meses, "índice previsto no contrato de concessão" (fl. 404).

Disse que "a ANEEL não demonstrou concretamente que os valores oriundos da decisão impugnada geram prejuízos reais, pelo que não se faz presente qualquer prejuízo à ordem administrativa" (fl. 405).

Impróprio, também, para o Ministério Público, falar em lesão grave à ordem econômica por quebra do equilíbrio financeiro do contrato, porque a concessionária continuava a obter lucros.

Os valores das tarifas discutidos nos presentes autos, garantiu, foram fixados pela ANEEL, observando-se exclusivamente o interesse público secundário, isto é, o interesse da administração em apoiar o investimento do setor privado na ampliação e manutenção dos estoques de energia elétrica, desconsiderando o interesse primário dos consumidores do Estado do Rio Grande do Norte (fl. 406).

Concluiu destacando ser o consumidor a parte mais fraca na relação e garantindo que há perigo inverso causado pelo reajuste imediato das tarifas, porque o Estado do Rio Grande do Norte teria sua economia seriamente prejudicada, na medida em as empresas terão suas despesas aumentadas e o lucro diminuído, comprometendo a demanda, aumentando o desemprego e a inflação.

Deferi a suspensão requerida, por antever potencial lesivo na decisão impugnada, notadamente por entender que o descumprimento de cláusulas contratuais impedindo a correção do valor real da tarifa, nos termos em que previstos no contrato de concessão, causa prejuízos financeiros que podem afetar gravemente a qualidade dos serviços prestados e sua manutenção, implicando ausência de investimentos no setor, prejudicando os usuários, refletindo negativamente na economia pública e inspirando insegurança e riscos na contratação com a Administração, sobretudo nos contratos de longo prazo.

Sobrevém agravo regimental no qual o Ministério Público Federal pugna pela reforma da decisão, repetindo os argumentos já expendidos, aos quais acrescenta a alegação de utilização da suspensão como sucedâneo recursal e a inexistência de perigo ao investidor estrangeiro.

Tudo isto porque, na sua ótica, a decisão que limitou o reajuste tarifário não tem poder de afetar a estabilidade econômica do país com o aumento do chamado "Risco Brasil", sendo "por demais simplista creditar ao presente caso concreto a habilidade de provocar uma repercussão negativa na imagem do País" (fl. 455).

Assegura que "um reajuste menor do que aquele estabelecido pela ANEEL não importa diretamente na quebra do equilíbrio econômico-financeiro do contrato ou provoca risco à própria prestação do serviço, em razão da empresa concessionária de serviço público continuar a ferir lucro, mesmo com o percentual deferido", conforme demonstrativo anexado às fls. 475/490.

Conclui sustentando que a intervenção judicial na Ação Civil Pública em comento mostra-se legitima ao resguardar o interesse público dos consumidores afetados pela decisão da ANEEL. Pede, assim, a reconsideração da decisão agravada e o esclarecimento de que a suspensão de liminar tem efeito ex nunc, vedada a cobrança retroativa dos serviços públicos de energia elétrica.

Relatei.

AgRg na SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA Nº 161 - RN (2005/0126738-7)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO EDSON VIDIGAL (Relator): Senhores Ministros, já firmado nesta Corte e no STF o entendimento de que não cabe examinar, no pedido de suspensão de liminar, as questões de fundo envolvidas na lide, devendo a análise cingir-se, somente, aos aspectos concernentes à potencialidade lesiva do ato decisório, em face das premissas estabelecidas na Lei 8.437/92 (RTJ 143/23).

É certo que, no caso em exame, na oportunidade da celebração do contrato de concessão da distribuidora de energia elétrica, conforme autorizado pela legislação pertinente, inseriram-se cláusulas prevendo mecanismos de manutenção de seu equilíbrio econômico-financeiro, como o reajuste tarifário.

Nessa linha, constatei que a liminar em comento, ao determinar que a revisão tarifária observasse a variação do IGP-M, alterou a complexa fórmula estabelecida contratualmente para cálculo do reajuste das tarifas, na qual o IGP-M não é utilizado isoladamente, estando previsto apenas para possibilitar a identificação da parcela do IVI, que é um índice obtido pela divisão do índice do IGP-M (ou do índice que vier a sucedê-lo) do mês anterior à data do reajuste em processamento, pelo índice do IGP-M do mês anterior à "Data de Referência Anterior".

Digo isso para esclarecer que o IGP-M, adotado como índice de reajuste pela decisão impugnada, não é o índice previsto contratualmente, podendo, apenas, ser utilizado, juntamente com outros fatores, para conhecimento do IVI que comporá o cálculo final do IRT ? Índice de Reajuste Tarifário previsto no contrato.

Destaco que o reajuste tarifário contra o qual se insurgiu o agravante resultou de cálculo feito pela ANEEL, no exercício regular de sua competência legal como agência reguladora que é, sendo fixado, portanto, com base em critérios técnicos indispensáveis à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão vigente.

A substituição aleatória da fórmula de reajuste previamente pactuada pelo IGP-M ofende, portanto, a ordem pública administrativa, porque interfere nos mecanismos de política tarifária previamente aprovados pelo Conselho Nacional de Desestatização ? CND, e que são vitais para que a prestação do serviço público possa se dar em conformidade com os princípios constitucionais e legais incidentes, e que não só permitam, mas viabilizem a celebração de tais contratos entre o Poder Público e o particular que se disponha a negociar com a Administração, notadamente em se tratando de contratos de concessão com prolongado prazo de duração.

Tenho decidido, reiteradas vezes, pela necessidade de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, porque o interesse público não deve se resumir à contenção de tarifas, sendo evidenciado, também, na continuidade do fornecimento de energia, na manutenção do contrato de concessão do serviço público, de modo a viabilizar investimentos no setor, para que o país não volte à escuridão. Assim, o descumprimento do que foi legalmente pactuado, com a chancela do Judiciário, pode, a meu ver, afetar o seu equilíbrio econômico-financeiro, até porque não há como olvidar a real inflação do País a atingir a quem contrata a longo prazo.

O descumprimento de cláusulas contratuais, impedindo a correção do valor real da tarifa, nos termos em que previsto no contato de concessão, causa sérios prejuízos financeiros à empresa concessionária, podendo afetar gravemente a qualidade dos serviços prestados e sua manutenção, implicando ausência de investimentos no setor, prejudicando os usuários, causando reflexos negativos na economia pública, porquanto inspira insegurança e riscos na contratação com a Administração Pública, afastando os investidores, resultando graves conseqüências também para o interesse público como um todo, além, é claro, de repercutir negativamente no chamado "Risco Brasil".

Afirma o agravante ser por demais simplista creditar à decisão objeto da suspensão a habilidade de provocar repercussão negativa na imagem do País, quando a discussão de cláusulas contratuais junto ao Poder Judiciário é prática corrente em todo o mundo.

Não se está a negar a possibilidade de se discutir judicialmente cláusulas contratuais. O que se pretende evitar é que o Brasil seja visto como terra-de-ninguém, onde o compromisso só tem valor no momento da celebração do contrato, já idealizado para ser descumprido.

Entendo, assim, que a decisão em comento, sequer proferida em cognição exauriente, ameaça a economia pública, na medida em que afeta gravemente o equilíbrio econômico-financeiro do contrato firmado com a administração pública, comprometendo a qualidade e a continuidade dos serviços contratados.

Neste contexto, os documentos apresentados pelo agravante informando os lucros auferidos pela Concessionária no ano de 2004 em nada modificam este entendimento, sobretudo porque referem-se a período anterior à decisão que alterou o índice de reajuste tarifário e nada garante que tais resultados possam ser repetidos acaso mantidos os efeitos da mesma. Aliás, em sendo mantida a decisão impugnada, maior é a possibilidade de que estes resultados não mais possam se repetir.

Não antevejo perigo inverso tal como alegado pelo agravante. Reconheço-o, sim, no fato de que se afinal julgado improcedente o pedido dos autores da ação civil pública, maior dano causará o reajuste com os acréscimos pelo atraso, do que o contrário, a devolução aos consumidores do valor eventualmente pago a maior em face do reajuste.

Quanto à utilização desta via como sucedâneo recursal esclareço que esta Corte já decidiu que a suspensão de liminar tem efeito "ex nunc" e não pode, nem deve ser confundida com recurso, eis que não revoga, não modifica, apenas suspende a eficácia de uma decisão, com o fim de evitar lesão aos bens jurídicos tutelados pela norma de regência. Conferir efeito retroativo à decisão suspensiva de liminar significaria, na prática, violação ao princípio da segurança jurídica, pois os pressupostos autorizadores da medida anteriormente deferida, não deixaram de existir, apenas foram afastados para dar lugar à supremacia do interesse público (AgRg na STA 85).

Com esses argumentos tenho por subsistentes os requisitos legais, pelo que nego provimento ao agravo.

É o voto."

AgRg na SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA Nº 162 - PE (2005/0126743-9)

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO EDSON VIDIGAL (Relator): O Ministério Público Federal e o Ministério Público do Estado de Pernambuco ajuizaram, contra a CELPE ? Companhia Energética de Pernambuco, a ANEEL ? Agência Nacional de Energia Elétrica e a Termopernambuco S/A, Ação Civil Pública pretendendo a declaração de nulidade do reajuste de tarifa autorizado pela ANEEL ? Agência Nacional de Energia Elétrica através da Resolução Homologatória nº 112/2005, bem como do Despacho ANEEL nº 892, de 08/11/2004, que autorizou a Revisão Tarifária Extraordinária mencionada no item 255/258 da Nota Técnica nº 106/2005 SER/ANEEL, e, conseqüentemente, de todos os atos normativos ou homologatórios emanados da ANEEL que, de uma forma ou de outra, influenciaram na respectiva revisão tarifária.

O pedido de antecipação da tutela foi deferido pelo Juízo da 3ª Vara Federal da Seção Judiciária de Pernambuco, para suspender os efeitos da Resolução Homologatória nº 112/2005 e do Despacho ANEEL nº 892/2004, até a fixação de novos valores para as tarifas, determinando, ainda, aquela decisão, a fixação provisória, pela ANEEL, de novos percentuais para as tarifas de energia elétrica fornecida pela CELPE e a desconsideração, nas faturas de energia, dos valores decorrentes da Resolução n.112/2005, mantendo os valores anteriores até que fossem divulgadas as novas tarifas, devendo a CELPE substituir as faturas que já tivessem sido expedidas com o aumento impugnado (fls. 101/102).

Contra essa decisão a ANEEL formulou Pedido de Suspensão de liminar, negado pelo Presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, o que ensejou agravo regimental, não provido pelo pleno daquele Regional, restando mantida, por conseqüência, a liminar concedida pelo juiz da causa.

Com base na Lei nº 8.437/92 c/c Lei nº 9.494/97, pediu, aqui, a ANEEL, a suspensão da tutela antecipadamente concedida, para evitar lesões ao interesse público, à ordem administrativa e à economia pública.

Para tanto, sustentou que o ato impugnado pelos autores da ação civil pública está em conformidade com o ordenamento jurídico.

Sua manutenção, afirmou, ofende o legal exercício das funções da Administração pelas autoridades constituídas, podendo resultar impedimento à normal execução do serviço público, conforme previsto no processo de desestatização e Lei nº 8.987/95, que dispôs sobre o regime de concessão e permissão da prestação de serviços públicos, bem como atribuiu ao Poder concedente, dentre outras, a incumbência de "homologar reajustes e proceder à revisão das tarifas na forma desta Lei, das normas pertinentes e do contrato" (artigo 29, V) (fl. 7/8), previsão essa que é decorrente do disposto no art. 9º, § § 2º, 3º e 4º.

Editou-se, também, a Lei nº 9.427/96, que disciplina o regime das concessões de serviços públicos de energia elétrica e instituiu a ANEEL, à qual foram cometidas a regulação e fiscalização da produção, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica, estabelecendo, o art. 15, a forma de remuneração da prestação do serviço.

Afora a previsão da competência da ANEEL para fixar as tarifas resultantes de processo de reajuste nas Leis nºs 8.987/95 e 9.427/96, acrescentou, o Decreto nº 2.335/97 "regulamenta a competência da ANEEL para atuar, na forma da lei e do contrato, nos processos de definição e controle de preços e tarifas, homologando seus valores iniciais, reajustes e revisões, e criando mecanismos de acompanhamento de preços" (fl. 8). Por isso que, ao expedir ato homologando reajuste para as concessionárias distribuidoras de energia elétrica, a ANEEL o faz no exercício das prerrogativas que lhe foram atribuídas por leis regularmente emanadas do Poder Legislativo (fl. 8).
A composição das tarifas, aduziu, corresponde a um dos elementos que, de forma conjunta, constituem a política do Governo Federal para o setor energético brasileiro, prevista em leis emanadas do Congresso Nacional e nos contratos de concessão. Política essa que não legitima a atuação do Judiciário "para impedir a efetivação desta opção em vista da 'cláusula pétrea constitucional' de independência e harmonia entre os Poderes" (fl. 9).

Agiu a ANEEL nos estritos termos das competências legalmente a si atribuídas pelo Conselho Nacional de Desestatização ? CND, razão pela qual a decisão impugnada ofende a ordem administrativa e causa inegável estado de insegurança jurídica, além de ditar nova política para o setor elétrico, em prejuízo à competência conferida à ANEEL, como já decidido por esta Presidência nas SL 57/DF, SL 76/PR e SS 1.468/GO, pois, "o desrespeito aos contratos não 'privilegia o nosso País como um país sério de cumprimento das avencas que pactuou' " (fl.12).

O contrato de fornecimento de energia celebrado entre a CELPE e a Termopernambuco, questionado na Ação Civil Pública, destacou, além de ser fruto de política traçada pelo Governo Federal para o setor elétrico, foi devidamente aprovado pelo órgão regulador do Setor, em cumprimento às suas atribuições legais (fls.9/10).

Esclareceu que "a liminar aqui impugnada, confirmada pelo Pleno do TRF da 5ª Região, suspendeu os efeitos da Resolução Homologatória ANEEL nº 112/2005 - que estabeleceu o índice de revisão tarifária da CELPE - e determinou que a ANEEL fixasse outro índice tarifário, não com base no contrato de concessão e nos critérios da metodologia utilizada pela Agência reguladora, fruto de meticuloso trabalho da área técnica, mas sim com base em um critério pelo próprio MM. Juízo estipulado, utilizando um parâmetro externo aos contratos aprovados pelo Poder Concedente, vale dizer, o valor da energia hidráulica obtido no Leilão de 2005" (fl.10).

Garantiu que o parâmetro utilizado, além de ser externo aos contratos, é inadequado, porque essa sistemática do Leilão de energia não existia à época em que o contrato foi aprovado pela ANEEL, incorrendo ainda em erro ao comparar energia hidráulica com energia térmica, contrato de longo prazo com contrato de curto prazo, desconsiderando a desvinculação que a legislação setorial faz entre a entrega física da energia e os contratos financeiros, decorrentes do Sistema Interligado Nacional (fls. 10/11).

A lesão à ordem administrativa, ressaltou, emerge não só do fato de o Poder Judiciário estar ditando nova política para o setor elétrico em prejuízo da competência conferida legalmente à ANEEL, mas, principalmente, por causar sérios prejuízos à política estabelecida por quem de direito, situação agravada pelo efeito multiplicador, já que outras decisões de igual teor já foram prolatadas no âmbito de jurisdição do TRF da 5ª Região (fl.12).

A lesão à economia pública, com risco de sério comprometimento do setor elétrico, veio pelo prisma de que o esgotamento da capacidade de geração de energia das hidrelétricas então existentes e a necessidade de novos e vultosos investimentos em momento de escassez de recursos foram fatores que, em 2001, acabaram por fazer eclodir crise sem precedentes no setor, exigindo do Governo a tomada de medidas urgentes e drásticas, dentre as quais o processo de desestatização, sendo certo que "a atração dos investidores para atuarem no setor elétrico, evitando-se a eclosão de nova situação de escassez de energia, não prescinde da demonstração de confiabilidade por parte do Governo, mormente no que se refere ao cumprimento dos contratos celebrados" (fls. 13/14).

A seu ver a manutenção da antecipação da tutela que limitou o reajuste homologado pela ANEEL ? após meticuloso trabalho elaborado pela sua área técnica para se chegar ao percentual necessário -, culminaria por destruir a credibilidade que o Governo tem tentado conquistar perante os investidores ao longo dos anos. E, mais, a ausência de investimentos, conseqüência do não reajustamento das tarifas, poderia acarretar, em futuro próximo, lesão irreparável à economia pública do setor elétrico, não se afastando a possibilidade de nova crise nos moldes da ocorrida em 2001. Crise essa que "fatalmente implicará racionamento e aumento de preços de energia, perde o País, que deixa de crescer, e perde o consumidor, que vai pagar mais caro por uma energia que sequer poderá consumir livremente" (fl. 15), perdendo-se, também, eficiência na prestação do serviço público.

Discorreu, após, acerca da lesão ao equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão, componente que configura "um dos alicerces em que assenta a concepção jurídica da concessão de serviço público", pois, se não fossem previstas no contrato cláusulas que garantissem o seu equilíbrio econômico-financeiro, certamente a Administração teria sérias e reais dificuldades em encontrar particulares interessados em com ela negociar.

Destacou que a situação se agrava com o fato de que a decisão que ora pretendia suspender determinava que a ANEEL considerasse, para repasse às tarifas, apenas o valor de R$ 57,51/MWh como valor da aquisição da energia da Termopernambuco, em detrimento do valor acordado de R$ 137,85/MWh. Acrescentou a isso o fato de que a receita da concessionária é dividida em duas parcelas: a parcela A formada por custos não gerenciáveis, referentes à atividade de distribuição de energia e explicitamente indicados no contrato, e a parcela B, correspondente aos valor remanescente da receita, estes gerenciáveis pela Concessionária.

Realçou que a Concessionária tem que efetuar o repasse dos valores pontualmente, independentemente de estar recebendo efetivamente os valores correspondentes.

Arrematou noticiando que se mantida a mantida a decisão, além do prejuízo diário da ordem de R$ 715.000,00, a concessionária não teria o necessário reposicionamento de suas tarifas, implicando na impossibilidade de prestar um serviço adequado, o que prejudicaria todos os consumidores de energia elétrica.

Instado a se manifestar o Ministério Público Federal pugnou pelo indeferimento da suspensão, argumentando que na ação civil pública não se questionou a competência da ANEEL para homologar e proceder aos reajustes tarifários, mas, apenas, a legalidade dos índices de reajustes e os seus componentes de cálculo (fl. 578).

Sustentou a possibilidade de revisão, pelo Judiciário, dos atos administrativos, destacando que a competência atribuída à ANEEL não lhe permitia agir sem que haja fiscalização sobre a legalidade e razoabilidade de seus atos.

Esclareceu que a decisão impugnada não vedou o reajuste das tarifas, determinando, apenas, "que a revisão observasse o custo da energia disponível no mercado, considerando o valor de 57,51/MWh, afastando, desta forma, o valor de R$ 137,85/MWh referente ao custo da energia elétrica fornecida pela Termopernambuco" (fl. 581).

Disse que "a ANEEL não demonstrou concretamente que os valores oriundos da decisão impugnada geram prejuízos reais, pelo que não se faz presente qualquer prejuízo à ordem administrativa" (fl. 582).

Impróprio, também, para o Ministério Público, falar em lesão grave à ordem econômica por quebra do equilíbrio financeiro do contrato, porque a concessionária continuava a obter lucros.

Os valores das tarifas discutido nos presentes autos, garantiu, foram fixados pela ANEEL, observando-se exclusivamente o interesse público secundário, isto é, o interesse da administração em apoiar o investimento do setor privado na ampliação e manutenção dos estoques de energia elétrica, desconsiderando o interesse primário dos consumidores do Estado de Pernambuco (fl. 585).

O índice de revisão tarifária autorizado pela ANEEL, a seu ver, foi inflado pelo contrato de fornecimento de energia firmado entre a CELPE e a Termopernambuco, empresas pertencentes a um mesmo grupo empresarial, a Neoenergia, resultando um valor do KWH equivalente a quase três vezes o valor médio da energia disponível no mercado, violando, assim, diversos dispositivos legais e propiciando um ganho real em favor da concessionária da ordem de 30%.

Concluiu destacando ser o consumidor a parte mais fraca na relação e sustentando que havia perigo inverso causado pelo reajuste imediato das tarifas, porque o Estado de Pernambuco teria sua economia seriamente prejudicada, na medida em as empresas teriam suas despesas aumentadas e o lucro diminuído, comprometendo a demanda, aumentando o desemprego e a inflação.

Deferi a suspensão requerida, por antever potencial lesivo na decisão impugnada, notadamente por entender que o descumprimento de cláusulas contratuais impedindo a correção do valor real da tarifa, nos termos em que previstos no contrato de concessão, causa prejuízos financeiros que podem afetar gravemente a qualidade dos serviços prestados e sua manutenção, implicando ausência de investimentos no setor, prejudicando os usuários, refletindo negativamente na economia pública e inspirando insegurança e riscos na contratação com a Administração, sobretudo nos contratos de longo prazo.

Considerei, também, que a decisão atacada determinara que a ANEEL fixasse o índice de reajuste tarifário com base em parâmetros não previstos nos contratos aprovados pelo Poder Concedente, desconsiderando, inclusive, o contrato de fornecimento de energia termoelétrica firmado entre a CELPE e a Termopernambuco, já aprovado pela agência reguladora. Assim, obrigou a administração a calcular o reajuste tarifário substituindo o valor da energia termoelétrica adquirida pela CELPE pelo valor da energia hidráulica apontado no Leilão de 2005.

Sobrevém agravo regimental no qual o Ministério Público Federal pugna pela reforma da decisão, repetindo os argumentos já expendidos, aos quais acrescenta a alegação de utilização da suspensão como sucedâneo recursal e a inexistência de perigo ao investidor estrangeiro.

Tudo isto porque, na sua ótica, a decisão que limitou o reajuste tarifário não tem poder de afetar a estabilidade econômica do país com o aumento do chamado "Risco Brasil", sendo "por demais simplista creditar ao presente caso concreto a habilidade de provocar uma repercussão negativa na imagem do País" (fl. 648).

Assegura que "um reajuste menor do que aquele estabelecido pela ANEEL não importa diretamente na quebra do equilíbrio economico-financeiro do contrato ou provoca risco à própria prestação do serviço, em razão da empresa concessionária de serviço público continuar a aferir (sic) lucro, mesmo com o percentual deferido", como se vê do demonstrativo anexado às fls. 657/667.

Conclui sustentando que a intervenção judicial na Ação Civil Pública em comento mostra-se legitima ao resguardar o interesse público dos consumidores afetados pela decisão da ANEEL. Pede, assim, a reconsideração da decisão agravada e o esclarecimento de que a suspensão de liminar tem efeito ex nunc, vedada a cobrança retroativa dos serviços públicos de energia elétrica.

Relatei.

AgRg na SUSPENSÃO DE LIMINAR E DE SENTENÇA Nº 162 - PE (2005/0126743-9)

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO EDSON VIDIGAL (Relator): Senhores Ministros, já firmado nesta Corte e no STF o entendimento de que não cabe examinar, no pedido de suspensão de liminar, as questões de fundo envolvidas na lide, devendo a análise cingir-se, somente, aos aspectos concernentes à potencialidade lesiva do ato decisório, em face das premissas estabelecidas na Lei 8.437/92 (RTJ 143/23).

É certo que, no caso em exame, na oportunidade da celebração do contrato de concessão da distribuidora de energia elétrica, conforme autorizado pela legislação pertinente, inseriram-se cláusulas prevendo mecanismos de manutenção de seu equilíbrio econômico-financeiro, como o reajuste tarifário.

Nessa linha, reconheci, na decisão em comento, potencial suficiente para causar o desequilíbrio econômico financeiro do contrato, notadamente porque determinado que a ANEEL fixasse o índice de reajuste tarifário com base em parâmetros não previstos nos contratos aprovados pelo Poder Concedente, desconsiderando, inclusive, o contrato de fornecimento de energia termoelétrica firmado entre a CELPE e a Termopernambuco. Assim, obrigou-se a administração a calcular o reajuste tarifário substituindo o valor da energia termoelétrica adquirida pela CELPE pelo valor da energia hidráulica apontado no Leilão de 2005.

Entendo que dada a complexidade do cálculo dessas tarifas não se pode, simplesmente, igualar energia hidráulica, com energia termoelétrica, como se fossem parâmetros iguais.

Considero, também, que o preço da energia contratado com a Termopernambuco, tido como um dos principais responsáveis pela majoração da tarifa, deve ser ponderado à luz do momento em que firmado o negócio jurídico. Isto porque, especificamente no setor de energia elétrica, ao tomar decisões, os agentes públicos ou quem as vezes lhes fizer, têm que prever como ficará o cenário a longo prazo, ou seja, nos próximos 10, 20 ou 30 anos, sob pena de não poder garantir a oferta de energia suficiente para atender à demanda futura.

Em outras palavras: o setor elétrico não pode sofrer os efeitos da volatilidade do mercado de curto prazo, sob pena de criar um ambiente instável no setor.

A decisão objeto do pedido de suspensão ao determinar a utilização, para fins de cálculo de reajuste tarifário, de parâmetro externo aos contratos, sem observar a metodologia que deve ser aplicada ao caso específico, desconsiderando o momento em que celebrado o contrato de fornecimento com a Termopernambuco, as peculiaridades que diferenciam um contrato de curto prazo de um de longo prazo, etc. interferiu na política pública do Governo traçada para o setor.

Destaco que o reajuste tarifário contra o qual se insurgiu o agravante, resultou de cálculo feito pela ANEEL, no exercício regular de sua competência legal como agência reguladora que é, sendo fixado, portanto, com base em critérios técnicos indispensáveis à manutenção do equilíbrio econômico-financeiro do contrato de concessão vigente.

A substituição aleatória da fórmula de reajuste previamente pactuada ofende, portanto, a ordem pública administrativa, porque interfere nos mecanismos de política tarifária previamente aprovados pelo Conselho Nacional de Desestatização ? CND, e que são vitais para que a prestação do serviço público possa se dar em conformidade com os princípios constitucionais e legais incidentes, e que não só permitam, mas viabilizem a celebração de tais contratos entre o Poder Público e o particular que se disponha a negociar com a Administração, notadamente em se tratando de contratos de concessão com prolongado prazo de duração.

Tenho decidido, reiteradas vezes, pela necessidade de manutenção do equilíbrio econômico-financeiro dos contratos, porque o interesse público não deve se resumir à contenção de tarifas, sendo evidenciado, também, na continuidade do fornecimento de energia, na manutenção do contrato de concessão do serviço público, de modo a viabilizar investimentos no setor, para que o país não volte à escuridão. Assim, o descumprimento do que foi legalmente pactuado, com a chancela do Judiciário, pode, a meu ver, afetar o seu equilíbrio econômico-financeiro, até porque não há como olvidar a real inflação do País a atingir a quem contrata a longo prazo.

O descumprimento de cláusulas contratuais, impedindo a correção do valor real da tarifa, nos termos em que previsto no contato de concessão, causa sérios prejuízos financeiros à empresa concessionária, podendo afetar gravemente a qualidade dos serviços prestados e sua manutenção, implicando ausência de investimentos no setor, prejudicando os usuários, causando reflexos negativos na economia pública, porquanto inspira insegurança e riscos na contratação com a Administração Pública, afastando os investidores, resultando graves conseqüências também para o interesse público como um todo, além, é claro, de repercutir negativamente no chamado "Risco Brasil".

Afirma o agravante ser por demais simplista creditar à decisão objeto da suspensão a habilidade de provocar repercussão negativa na imagem do País, quando a discussão de cláusulas contratuais junto ao Poder Judiciário é prática corrente em todo o mundo.

Não se está a negar a possibilidade de se discutir judicialmente cláusulas contratuais. O que se pretende evitar é que o Brasil seja visto como terra-de-ninguém, onde o compromisso só tem valor no momento da celebração do contrato, já idealizado para ser descumprido.

Entendo, assim, que a decisão em comento, sequer proferida em cognição exauriente, ameaça a economia pública, na medida em que afeta gravemente o equilíbrio econômico-financeiro do contrato firmado com a administração pública, comprometendo a qualidade e a continuidade dos serviços contratados.

Neste contexto, os documentos apresentados pelo agravante informando os lucros auferidos pela Concessionária no ano de 2004, em nada modificam este entendimento, sobretudo porque se referem a período anterior à decisão que alterou o índice de reajuste tarifário e nada garante que tais resultados possam ser repetidos acaso mantidos os efeitos da mesma. Aliás, em sendo mantida a decisão impugnada, maior é a possibilidade de que estes resultados não mais possam se repetir.

Não antevejo perigo inverso tal como alegado pelo agravante. Reconheço-o, sim, no fato de que se afinal julgado improcedente o pedido dos autores da ação civil pública, maior dano causará o reajuste com os acréscimos pelo atraso, do que o contrário, a devolução aos consumidores do valor eventualmente pago a maior em face do reajuste.

Quanto à utilização desta via como sucedâneo recursal esclareço que esta Corte já decidiu que a suspensão de liminar tem efeito "ex nunc" e não pode, nem deve ser confundida com recurso, eis que não revoga, não modifica, apenas suspende a eficácia de uma decisão, com o fim de evitar lesão aos bens jurídicos tutelados pela norma de regência. Conferir efeito retroativo à decisão suspensiva de liminar significaria, na prática, violação ao princípio da segurança jurídica, pois os pressupostos autorizadores da medida anteriormente deferida não deixaram de existir, apenas foram afastados para dar lugar à supremacia do interesse público (AgRg na STA 85).

Com esses argumentos tenho por subsistentes os requisitos legais, pelo que nego provimento ao agravo.

É o voto."

Processo:  SLS 161

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