CVM e ESG - Papel Fiscalizador
Por Patricia Punder, advogada e CEO da Punder Advogados.
Recentemente, a Superintendência de Registro de Valores Mobiliários (SRE) da Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) suspendeu a 1ª emissão de oferta pública do RIO BRAVO ESG Fundo de Investimento em cotas de fundos incentivados de investimento em infraestrutura renda fixa crédito privado (FIC-FI-Infra), tendo o BRL Trust Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários S.A. como administradora e a Warren Corretora de Valores Mobiliários e Câmbio Ltda. como instituição intermediária líder.
Os motivos técnicos identificados foram irregularidades em materiais publicitários, descritas abaixo:
- informação não contida no prospecto preliminar e/ou com potencial de induzir o investidor ao erro;
- ausência de linguagem serena e moderada;
- ausência de informações sobre a forma de acesso aos materiais da oferta pública, assim como o prospecto.
Este ato da CVM reforça uma o papel fiscalizador desta autarquia, que seria uma de suas finalidades definidas na legislação brasileira. Ademais, corrobora este papel sua atribuição de assegurar o acesso do público a informações sobre os valores mobiliários negociados e as companhias que os tenham emitido.
Consequentemente, os investidores, tanto institucionais quanto de varejo, estão cada vez mais rigorosos na busca por transparência sobre o tema ESG e sobre as discussões que envolvem isso. O acesso a informações deve ser concedido para toda a sociedade e as informações devem ser claras, precisas e em uma linguagem adequada ou consistente com a compreensão dos consumidores. Afinal, o mercado mobiliário não pertence mais apenas a uma elite de investidores, que possuem domínio de dos jargões técnicos e termos em inglês. Existe uma crescente onda de investidores de todas as idades e classes sociais que entraram no mundo dos investimentos de ações, principalmente, devido a popularização dos bancos virtuais.
Com maior acesso a novas alternativas de investimentos, houve uma maior democratização na bolsa de valores por uma grande parcela da população, que antes não era vista como um “cliente” interessante para os modelos bancários tradicionais. Agora, com apenas um “click” em um smartphone, qualquer cidadão brasileiro pode se tornar uma acionista seja de uma empresa brasileira, seja de uma multinacional.
Por tudo isso, realmente é essencial que a CVM fique cada vez mais atenta aos novos fundos ou ações denominados de “ESG” (termo em inglês que significa “meio-ambiente, social e governança”), pois temos um novo nicho de mercado que vem tomando um espaço expressivo nos jornais, mídias sociais e propagandas no geral. Nunca se ouviu tanto falar sobre como as questões climáticas estão impactando nossas vidas neste condomínio que é o planeta terra, como também sobre o impacto das empresas, na grande maioria listadas na bolsa de valores de São Paulo, estão tratando ou não deste tema.
Importante salientar que a própria CVM, através da assimilação do Código Brasileiro de Governança Corporativa – Companhias Abertas à Instrução 480, prevê o dever das companhias de esclarecer e explicar aos investidores o seu grau de aderência às práticas, de forma completa, verdadeira, consistente e sem induzi-los a erro.
Sendo assim, a alta administração das empresas tem por obrigação a implementação de uma estratégia de um programa de ESG definida por seu respectivo Conselho de Administração, sendo responsabilidade dos diretores ter clareza sobre suas responsabilidades e sobre os riscos financeiros ou operacionais que podem assumir. Também devem garantir que os princípios ESG sejam observados durante a condução dos negócios das empresas.
Em vista disso, que os fundos de investimentos fiquem cada vez mais atentos em relação a sua comunicação com o mercado, pois o mesmo não irá perdoar falta de transparência ou compromissos públicos assumidos em relação a ESG e não cumpridos. Nunca a reputação de uma empresa foi tão testada como está sendo agora.
*Patricia Punder, advogada é compliance officer com experiência internacional. Professora de Compliance no pós-MBA da USFSCAR e LEC – Legal Ethics and Compliance (SP). Uma das autoras do “Manual de Compliance”, lançado pela LEC em 2019 e Compliance – além do Manual 2020. Com sólida experiência no Brasil e na América Latina, Patricia tem expertise na implementação de Programas de Governança e Compliance, LGPD, ESG, treinamentos; análise estratégica de avaliação e gestão de riscos, gestão na condução de crises de reputação corporativa e investigações envolvendo o DOJ (Department of Justice), SEC (Securities and Exchange Comission), AGU, CADE e TCU (Brasil).