?Acusador de exceção?

TJRS decreta nulidade de julgamento do júri de comarca interiorana porque nele atuou - sem justificativa aceitável ? notório promotor de Justiça da Capital, quando a promotora local estava em pleno exercício da função

Fonte: Espaço Vital

Comentários: (0)




Um interessante acórdão do TJRS reforça a necessidade de observância do princípio do promotor natural no processo penal, sob pena de se decretar a nulidade do julgamento.


O caso tem origem na comarca de Encruzilhada do Sul, onde Marcos Odilon Cunha de Freitas é réu pela acusação de cometimento de duplo homicídio duplamente qualificado, por haver, conforme a acusação, à emboscada, assassinado um funcionário seu juntamente com o filho de 12 anos de idade.


O ocorrido ganhou enorme repercussão na pequena cidade sendo notícia inclusive em jornais da Capital.


Sobreveio julgamento pelo tribunal do júri na comarca interiorana e o juiz presidente, em conformidade com a decisão do conselho de sentença, estabeleceu condenação à pena de 32  anos e 6 meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado.


Fato decisivo para os desdobramentos do caso no TJRS foi que – embora obrasse pelo Ministério Público Estadual na comarca a promotora de Justiça Dra. Brenusa Marcquardt Corleta – quem atuou na sessão de julgamento foi o também promotor Eugênio Paes Amorim, que labora na comarca da Capital.


Essa troca de promotores foi denunciada pelo réu em apelação ao tribunal gaúcho, sob a sustentação – entre outros argumentos - de nulidade posterior à decisão de pronúncia, por quebra do princípio do promotor natural.


Ao analisar o apelo, a 1ª Câmara Criminal – por maioria de votos – decidiu por decretar a nulidade do julgamento.


O relator, desembargador Manuel José Martinez Lucas, iniciou seu voto esclarecendo que há divergências sobre a questão, mas “a tendência atual é a de admitir-se a vigência do Princípio do Promotor Natural, com apoio em dispositivos constitucionais, não obstante os princípios da unidade e da indivisibilidade do Ministério Público, também consagrados na Carta Magna.”


Para o desembargador, é tolerável a designação de promotor de Justiça para atuar em um caso específico desde que o ato seja justificado e formalizado e não constitua imposição de “acusador de exceção”.


Entendeu o desembargador Martinez Lucas que o processo está eivado de “graves irregularidades”, pois a promotora de Justiça da comarca estava em pleno exercício da função, uma vez que véspera do júri ela própria manifestou desistência na inquirição de uma testemunha e, no dia seguinte ao julgamento, participou de audiência.


O acórdão revela que a promotora Brenusa Marcquardt Corleta teria enviado à Procuradoria-Geral de Justiça “documento cientificando acerca de sua impossibilidade de atuar no Plenário do Tribunal do Júri em razão de encontrar-se no final da gestação”, contudo, a informação estaria datada de um mês depois da realização do júri, “não havendo nos autos, até aquele momento, qualquer explicação para o afastamento da titular da Promotoria”, avaliou o relator: “é estranho que a agente ministerial, em razão de seu adiantado estado gestacional, não tivesse condições de atuar em plenário, mas continuasse exercendo suas funções regularmente, o que demandaria uma justificativa que não se encontra nos presentes autos.”


Ainda segundo a compreensão do desembargador, a designação de outro promotor “não foi devidamente formalizada, tendo sido feita ao arrepio de comezinhas regras processuais”, porque “apenas com as contrarrazões aparece a Portaria nº 0560/2010, firmada pelo Dr. Luiz Carlos Ziomkowski, Subprocurador-Geral para Assuntos Institucionais, e juntada a fl. 625, designando aquele Promotor de Justiça para atuar no julgamento.”


A referida portaria, asseverou o relator, “está datada do mesmo dia do júri  -  13 de abril de 2010  -  o que demonstra que não corresponde à realidade, eis que seria até mesmo impossível ao Promotor designado chegar à Comarca de Encruzilhada do Sul a tempo de participar do julgamento, eis que o júri se iniciou às 9,00 horas da manhã.”

 
O acórdão também traz adjetivos ao membro do MP que atuou perante o júri: “induvidoso que a designação de um Promotor de Justiça como o Dr Eugênio Paes Amorim  -  sabidamente preparado, experiente, combativo, um dos mais conhecidos tribunos do júri de nosso Estado  -  para atuar em julgamento de repercussão na pequena Comarca de Encruzilhada do Sul, com o afastamento da titular da Promotoria, constitui exatamente a nomeação de um ‘acusador de exceção’, o que fere o Princípio do Promotor Natural.”


Por isso, o magistrado decidiu por decretar a nulidade do julgamento.


E, por estar o réu preso há quase onze meses e pronunciado há cerca de sete, reconheceu – “ex officio” - o excesso de prazo na formação da culpa, o que resultou no provimento do recurso e na concessão de habeas corpus, para imediata soltura do acusado.

 
De outra banda, o desembargador Marcel Esquivel Hoppe divergiu do relator, por entender não haver motivos para desacreditar a justificativa da promotora de Justiça titular para o seu impedimento e por ser o MP uma instituição permanente, regida pelos princípios da unidade, indivisibilidade e independência funcional: “Em caso de impossibilidade de atuação de um dos membros, não haverá qualquer violação ao devido processo legal se realizada a substituição dentro das normas pré-estabelecidas para tanto.”


O desembargador  Hoppe compreendeu que “tendo sido o substituto regularmente designado, segundo informação das mais altas autoridades da Instituição, não há que se falar em nulidade do julgamento ou na figura do ‘promotor de exceção’”.

 
Por isso, também votou contra a concessão de habeas corpus de ofício, “considerando para tanto, a gravidade em concreto dos delitos, quais sejam, dois homicídios duplamente qualificados, sendo uma das vítimas infante de 12 anos de idade” e porque não houve excesso de prazo imputável ao Poder Judiciário.


O terceiro desembargador a votar – Marco Antônio Ribeiro de Oliveira – acompanhou o relator, confirmando o provimento da apelação do réu e a concessão do habeas corpus.

 

Palavras-chave: Nulidade Julgamento Acusação Homicídio Emboscada Assassinato

Deixe o seu comentário. Participe!

noticias/acusador-de-excecao

0 Comentários

Conheça os produtos da Jurid