É válida a proibição de tatuagem para candidatos a concurso público?

O estigma social e o preconceito sempre fizeram parte do universo da pessoa tatuada, haja vista que os mais desavisados as rotulam como marginais ou pessoas que possuem alguma espécie de transtorno social. 

Fonte: Josiane Coelho Duarte

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O estigma social e o preconceito sempre fizeram parte do universo da pessoa tatuada, haja vista que os mais desavisados as rotulam como marginais ou pessoas que possuem alguma espécie de transtorno social. Absolutamente não podem ser normais, mas por quê?


Nos dias de hoje referido padrão preconceituoso vem sendo quebrado na medida em que cada vez mais pessoas que possuem destaque social e profissional se tornam adeptas à tatuagem, utilizando-a como adorno ao corpo assim como qualquer outro, com a diferença que este é eterno.


Mas mesmo com toda a evolução social e mudança de paradigmas ainda nos deparamos com preconceito dos mais variados e a tatuagem ainda é vista como algo estranho, inaceitável ou até mesmo repugnante por parte conservadora da sociedade.


Exemplo disto são algumas seleções de emprego em que pessoa tatuada, mesmo que tenha um currículo invejável, não é escolhida em virtude da tatuagem ou até mesmo editais de concursos públicos que preveem a exclusão de candidato tatuado.


Seria constitucional tal restrição?


A Constituição Federal de 1988 trouxe como direito fundamental a isonomia ou igualdade, que garante os mesmos direitos a todas as pessoas humanas, admitidas apenas as distinções legalmente previstas, assim:


Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:


(...)


Deste modo, certo afirmar que ações que visem a criar distinções entre as pessoas para qualquer fim, aqui incluindo para acesso a serviço ou concurso público, devem estar amparadas em autorização legal e, ainda, referidas normas serem constitucionais, sem ofensa aos princípios norteadores do Estado Democrático e Social Brasileiro.


Para que haja distinções é importante que as mesmas se pautem em critérios objetivos que tenham razão jurídica concreta, fazendo, assim, nascer uma ação afirmativa, tal como ocorre com as pessoas com deficiência que possuem tratamento adequado para ingresso no mercado de trabalho, bem como cotas em concursos públicos.


Neste diapasão, distinções simplesmente por critérios subjetivos, ínsitos aos julgadores ou bancas de concursos, não são toleráveis, haja vista que o edital de certame público, como já dito, deve ser pautado na lei e esta ser constitucional para ter validade.


Sobre preconceito no ambiente de trabalho, feitas as devidas adaptações, o e. Tribunal Superior do Trabalho possui súmula no seguinte sentido:


Súmula nº 443 do TST


DISPENSA DISCRIMINATÓRIA. PRESUNÇÃO. EMPREGADO PORTADOR DE DOENÇA GRAVE. ESTIGMA OU PRECONCEITO. DIREITO À REINTEGRAÇÃO - Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012 

Presume-se discriminatória a despedida de empregado portador do vírus HIV ou de outra doença grave que suscite estigma ou preconceito. Inválido o ato, o empregado tem direito à reintegração no emprego.


Pelo entendimento sumulado resta claro que preconceitos não são admissíveis no ambiente de trabalho, seja ele de qualquer viés, inclusive voltado à pessoa tatuada.


A questão ocorre com frequência nos concursos de ingresso aos quadros da Polícia Militar, posto que por ser instituição rígida, seus dirigentes fazem exigências sobre as tatuagens proibidas em seus editais de concurso.


Todavia, a jurisprudência de alguns Tribunais é firme em reconhecer que há discriminação na exclusão de candidato tatuado quando a tatuagem não ofende a moral, bons costumes ou a corporação da Polícia Militar, assim:


Ementa


- CONCURSO PÚBLICO. POLÍCIA MILITAR DO ESTADO. ELIMINAÇÃO DE CANDIDATO PORTADOR DE TATUAGEM. ILEGALIDADE. 1. É ilegal a declaração de inaptidão de aspirante a cargo na Polícia Militar em razão de tatuagem não atentatória à moral, aos bons costumes, ao pundonor da Corporação ou ao Estado Democrático de Direito. 2. Segurança concedida. Unanimidade. (TJMA. Processo: MS 0423352013 MA 0009481-80.2013.8.10.0000. Relator(a): PAULO SÉRGIO VELTEN PEREIRA. Órgão Julgador: SEGUNDAS CÂMARAS CÍVEIS REUNIDAS. Julgamento: 18/07/2014. Publicação: 23/07/2014.) (Fonte: http://tj-ma.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/160163884/mandado-de-seguranca-ms-423352013-ma-0009481-8020138100000). (G. m.).


Ementa


1) DIREITO ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA POLICIAL MILITAR. CANDIDATO PORTADOR DE TATUAGEM. DESCLASSIFICAÇÃO DESCABIDA. AUSÊNCIA DE OFENSA À HONRA PESSOAL OU AO PUNDONOR E O DECORO. a) Não diz o Edital que será considerado inapto o candidato portador de tatuagens, de qualquer tamanho e extensão, mas somente o portador daquelas que expressem motivos obscenos, ofensivos à honra pessoal ou ao pundonor e o decoro exigido aos militares, bem como as que apresentem símbolos ou inscrições alusivas a ideologias terroristas ou extremistas contrárias às instituições democráticas; associação à violência e à criminalidade; ideias ou atos libidinosos; ou ideias ou atos ofensivos às Corporações Policiais e às Instituições Democráticas.b) A proibição editalícia é possuir tatuagem que não se coadune com os preceitos da Corporação Militar, não podendo o examinador excluir o candidato do certame pela simples existência de tatuagens em seu corpo.c) A tatuagem não interfere na saúde física ou mental do candidato, tampouco o impede de exercer regularmente as atividades militares inerentes ao cargo almejado ou, por si só, avilta a honra da Corporação Militar.2) AGRAVO DE INSTRUMENTO A QUE SE DÁ PROVIMENTO. (TJPR. Processo: 11451404 PR 1145140-4 (Acórdão). Relator(a): Leonel Cunha. Órgão Julgador: 5ª Câmara Cível. Publicação: DJ: 1296 12/03/2014). (Fonte http://tj-pr.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/24985680/acao-civil-de-improbidade-administrativa-11451404-pr-1145140-4-acordao-tjpr). (G. m.).


Recentemente o e. Supremo Tribunal Federal (STF) reconheceu a repercussão geral do tema no Recurso Extraordinário (RE) 898450 de São Paulo e julgará se o fato de uma pessoa possuir determinado tipo de tatuagem é elemento idôneo e suficiente para impedi-la de ter acesso ao cargo público de policial militar.


Sobre a celeuma, assim se manifestou o relator do recurso, Ministro Luiz Fux, no STF:


O relator enfatiza que o artigo 37 da Constituição Federal (incisos I e II) estabelece que o provimento de cargos públicos efetivos depende de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos e se dará nos termos de lei. Entretanto, pontuou, um alegação genérica de que o edital é a lei do concurso não pode, em hipótese alguma, implicar ofensa ao texto constitucional, especialmente quando esta exigência não se revelar proporcional quando comparada com as atribuições a serem desempenhadas no cargo a ser provido. Segundo ele, é preciso definir se o fato de um cidadão ostentar tatuagens seria circunstância idônea e proporcional a impedi-lo de concorrer a um cargo público. (http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=302564).


Comungo da mesma opinião do Ministro, haja vista que uma marca no corpo não pode se sobrepor ao conhecimento demonstrado pelo candidato no decorrer do certame e não se mostra razoável ser o único motivo da não aprovação para que ocupe cargo público, ainda mais quando considerarmos que após a posse o candidato pode se tatuar sem problemas, como vemos acontecer no dia a dia.



Josiane Coelho Duarte

Josiane Coelho Duarte

Advogada Bacharel em Direito pela Anhanguera Educacional S/A, pós graduada em Direito e Processo do Trabalho pela UNIVAG em convênio com a Amatra XXIII, Servidora Pública Estadual perfil Advogado e Professora do Ensino Superior.


Palavras-chave: CF Súmula TST Proibição Desclassificação Portador de Tatuagem Concurso Público

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