Alimentos gravídicos

Os laços de parentesco trazem muito mais do que amor e carinho mútuos, trazem também a responsabilidade alimentar e de cuidado de uns para com os outros.

Fonte: Josiane Coelho Duarte

Comentários: (0)




Os laços de parentesco trazem muito mais do que amor e carinho mútuos, trazem também a responsabilidade alimentar e de cuidado de uns para com os outros. Mas, qual o início de referida obrigação e quem está a ela vinculado?


A Constituição Federal de 1988, denominada Constituição Cidadã, se ocupou em definir as diretrizes e linhas mestras para a proteção da pessoa humana, aqui incluída a obrigação de sustento e proteção, com absoluta prioridade, para com as crianças, adolescentes e jovens, nos seguintes termos:


Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.


Importante expor que os alimentos são prestações devidas a uma pessoa, destinada à sua manutenção, decorrem da obrigação alimentar “que se define como um múnus público regulado por lei, cujo fundamento é a solidariedade familiar, pelo qual estão os parentes obrigados a prestarem-se assistência mútua, de forma a viverem de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação, desde que não tenham bens suficientes, nem possam prover, pelo seu trabalho, à própria mantença, e aquele, de quem se reclamam, possa fornecê-los, sem desfalque do necessário ao seu sustento.” (In: Sérgio Nunes dos Santos. Alimentos: obrigação alimentícia e dever de sustento face à súmula 358 do STJ. Disponível em: http://www.ambito-juridico.com.br/site/index.php/%3C?n_link=revista_artigos_leitura&artigo_id=12325. Acessado em 23/03/2016.).


Diversas leis denotam a obrigação alimentar e trazem disposições acerca do dever de sustento no âmbito da entidade familiar. De acordo com o artigo 22 do Estatuto da Criança e do Adolescente - ECA – Lei 8.069/1990:


Art. 22. Aos pais incumbe o dever de sustento, guarda e educação dos filhos menores, cabendo-lhes ainda, no interesse destes, a obrigação de cumprir e fazer cumprir as determinações judiciais.


O Código Civil brasileiro – CC/2002 dispõe sobre o dever de prestar alimentos, nos artigos 1.694 e seguintes, nestes termos:


Art. 1.694. Podem os parentes, os cônjuges ou companheiros pedir uns aos outros os alimentos de que necessitem para viver de modo compatível com a sua condição social, inclusive para atender às necessidades de sua educação.


(...)


Art. 1.698. Se o parente, que deve alimentos em primeiro lugar, não estiver em condições de suportar totalmente o encargo, serão chamados a concorrer os de grau imediato; sendo várias as pessoas obrigadas a prestar alimentos, todas devem concorrer na proporção dos respectivos recursos, e, intentada ação contra uma delas, poderão as demais ser chamadas a integrar a lide.


A omissão quanto à prestação alimentar é tão séria a ponto do Direito Penal definir como crime contra a assistência familiar, denominado abandono material e descrito no art. 224 do Código Penal, assim:


Art. 244. Deixar, sem justa causa, de prover a subsistência do cônjuge, ou de filho menor de 18 (dezoito) anos ou inapto para o trabalho, ou de ascendente inválido ou maior de 60 (sessenta) anos, não lhes proporcionando os recursos necessários ou faltando ao pagamento de pensão alimentícia judicialmente acordada, fixada ou majorada; deixar, sem justa causa, de socorrer descendente ou ascendente, gravemente enfermo.


Assim, certo que a obrigação alimentar existe entre os membros da mesma família, podendo ser extensível aos avôs paternos, no caso de menor como beneficiário dos alimentos. Mas será que a obrigatoriedade apenas nasce quando a pessoa já possui personalidade civil, que se dá com o nascimento com vida (art. 2º do CC/2002)?


Por certo que não, a obrigação surge desde o momento da concepção, assim, a gestante deve receber os chamados alimentos gravídicos a serem pagos pelo pai do nascituro (aquele que está sendo gerado), a fim de auxiliar nas despesas do pré-natal, bastando terem indícios de paternidade para que sejam fixados.


De acordo com a Lei 11.804/2008:


Art. 2º  Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes a alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes.


(...)


Parágrafo único.  Os alimentos de que trata este artigo referem-se à parte das despesas que deverá ser custeada pelo futuro pai, considerando-se a contribuição que também deverá ser dada pela mulher grávida, na proporção dos recursos de ambos.


Art. 6º Convencido da existência de indícios da paternidade, o juiz fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança, sopesando as necessidades da parte autora e as possibilidades da parte ré.


Parágrafo único.  Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão.


Deste modo, certo afirmar que a gestante que não possui vínculo de união com o pai do nascituro está igualmente amparada pela lei no sentido de ter auxílio nas despesas com pré-natal, custeadas pelo genitor do nascituro, devendo buscar os alimentos gravídicos devidos a este, seja de modo amigável ou através de processo judicial, para fazer frente às despesas extras que surgem com o início de uma nova vida ainda intrauterina.


Neste sentido, eis o entendimento do C. Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul:


AGRAVO DE INSTRUMENTO. ALIMENTOS GRAVÍDICOS. POSSIBILIDADE. INDÍCIOS DE PATERNIDADE. O requisito exigido para a concessão dos alimentos gravídicos é de que a parte requerente demonstre "indícios de paternidade", nos termos do art. 6º da Lei nº 11.804/08. O exame de tal pedido, em sede de cognição sumária, sob pena de desvirtuamento do espírito da Lei, não deve ser realizado com extremo rigor, tendo em vista a dificuldade em produzir prova escorreita do alegado vínculo parental. Caso em que as fotografias, dando conta do relacionamento amoroso das partes, juntadas ao instrumento, conferem verossimilhança à alegação de paternidade do réu e autorizam o deferimento dos alimentos gravídicos, em sede liminar. DERAM PROVIMENTO (Agravo de Instrumento Nº 70065486870, Oitava Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Julgado em 20/08/2015). (TJ-RS - AI: 70065486870 RS, Relator: José Pedro de Oliveira Eckert, Data de Julgamento: 20/08/2015,  Oitava Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 25/08/2015).


Ademais, cabe ressaltar que não apenas o pai do nascituro possui referida obrigação, sendo certo que a mesma é extensível aos avós paternos, caso aquele não possua condições de prestar alimentos, a exemplo do que ocorre com a prestação alimentar da pessoa já nascida, como obrigação advinda de parentesco, os avós podem ser compelidos à prestação dos alimentos gravídicos, devendo ocupar, de modo subsidiário, o polo passivo de eventual ação, conforme entendimento do C. Tribunal de Justiça do Distrito Federal:


AGRAVO DE INSTRUEMENTO. ALIMENTOS GRAVÍDICOS PROVISÓRIOS. AVÓS. 1. NÃO HÁ ELEMENTOS QUE AUTORIZEM A MAJORAÇÃO DOS ALIMENTOS PROVISÓRIOS DEVIDOS PELO PAI. 2. A OBRIGAÇÃO DOS AVÓS É SUBSIDIÁRIA. (TJ-DF - AI: 129119220118070000 DF 0012911-92.2011.807.0000, Relator: FERNANDO HABIBE, Data de Julgamento: 30/05/2012,  4ª Turma Cível, Data de Publicação: 08/06/2012, DJ-e Pág. 118).


Por fim, importante frisar que referidos alimentos são devidos ao nascituro e não à gestante, todavia a mesma receberá como representante daquele por ser ainda absolutamente incapaz (art. 3º do CC/2002).


Josiane Coelho Duarte

Josiane Coelho Duarte

Advogada Bacharel em Direito pela Anhanguera Educacional S/A, pós graduada em Direito e Processo do Trabalho pela UNIVAG em convênio com a Amatra XXIII, Servidora Pública Estadual perfil Advogado e Professora do Ensino Superior.


Palavras-chave: CC CF ECA CP Alimentos Gravídicos Súmula STJ

Deixe o seu comentário. Participe!

colunas/josiane-coelho-duarte/alimentos-gravidicos-2016-04-04

0 Comentários

Conheça os produtos da Jurid