O que vem a ser o direito? Do mínimo ético a uma potência moral (Segunda parte)
Perseguindo ainda a definição de Direito, percorre-se várias escolas doutrinárias e filosóficas. Trata-se da segunda parte de outro artigo sob o mesmo título e, com o mesmo objetivo. Do mínimo ético a uma potência moral. O direito conhece extremos, particularmente, o contemporâneo.
O
presente texto é a segunda parte do artigo jurídico de minha lavra intitulado
“O que vem a ser o direito.” Nesse conteúdo, esmiúço as definições galgadas
pela ciência jurídica tendo em vista as diversas escolas doutrinárias.
Na
verdade, Platão definiu o direito ao definir a justiça como aquilo que
possibilita que um grupo de qualquer homens, mesmo que bandidos ou ladrões,
conviva e aja com vistas a um fim comum (A República[1]).
Ao que
parece, essa seria uma função puramente formal do direito, graças à qual ele é
simplesmente a técnica da coexistência. Mas, Aristóteles já qualifica o direito
tomando como referência a coexistência justa, racionalmente perfeita.
O
Direito, diz ele, é o que pode criar e conservar, no todo ou em parte, a
felicidade da comunidade política, devendo-se recordar que a felicidade, como
fim próprio do homem, é a realização ou a perfeição da atividade próprio do
homem e, ou seja, a razão.
A
sanção do direito diz Aristóteles em Política, é a ordem da comunidade política
e a sanção do direito é a determinação do que é justo. Mas, um direito assim
entendido é só o direito natural, que é o melhor e em toda parte o mesmo. O
direito fundado na convenção e na utilidade é análogo às unidades de medida que
variam de um lugar para o outro.
O
direito natural, ao contrário, é aquilo que tem a mesma força em toda parte e
independe da diversidade das opiniões.
Esse
conceito de Direito, entre outras coisas, induzia a reconhecer a igualdade de
todos os homens visto que em todos eles, pela sua natureza racional, revela-se
a lei eterna da razão.
Em
Cícero[2], encontra-se esse
reconhecimento e também um dos corolários mais importantes da doutrina do
direito natural: o princípio e o fundamento de qualquer direito devem ser
procurados na lei natural dimanada antes que existisse qualquer Estado,
portanto, se o povo ou o príncipe podem fazer leis, estas não terão verdadeiro
caráter de direito se não derivarem da lei primeira.
Essas
afirmações foram reiteradas por Sêneca, em que também se encontra a Teoria do
Estado de Natureza que deveria dominar o pensamento político por muitos
séculos. Segundo essa teoria, antes das instituições criadas por convenção pela
sociedade, existiu uma idade em que homens viveram sem lei, unicamente à mercê
da inocência da natureza original.
Segundo
os doutores da Igreja que, nesse aspecto, continuam a tradição dos juristas
romanos, a lei natural está escrita no "coração" dos homens como uma
espécie de força inata ou instinto.
Afirmou
Santo Agostinho[3]: "O Direito natural não foi gerado por
uma opinião, mas inserido em nós por uma força inata, do mesmo modo como, na
religião, estão a piedade, a graça, a observância, a verdade".
E, foi justamente esse o conceito legado à filosofia escolástica através das Etimologias de Isidoro de Sevilha[4] (séc. VII) apud Abbagnano. Disse Isidoro: "O Direito natural é comum a todas as nações, sendo que em todos os lugares deriva do instinto natural, e não de uma constituição; por exemplo, a união do macho e da fêmea, a sucessão e a educação dos filhos, a posse comum de todas as coisas e a liberdade de todos, a aquisição das coisas que estão no céu, na terra e no mar, etc.".
A
identificação da lei natural com a lei divina constitui o fundamento do Direito
canônico. O Direito. natural, notava Rufino, comendador de Graciano, é
"uma força (vis) que a natureza imprime na criatura humana para
levá-la a fazer o bem e a evitar o mal". Ela ordena o que é útil, como por
exemplo, "ama o Senhor teu Deus"; proíbe o que é nocivo, como por exemplo,
"não matarás"; demonstra o que convém, como por exemplo, "tende
tudo em comum", ou "seja, uma só a liberdade de todos", etc.
A
distinção escrita por Graciano entre lei divina e lei humana é assumida como
fundamento da doutrina tomista do direito. Segundo São Tomás de Aquino[5], há uma lei eterna, uma
razão que governa todo o universo e que existe na mente divina; a lei natural
que está nos homens é reflexo ou "participação" dessa lei eterna.
Além
dessa lei eterna, que para o homem é natural, há duas outras espécies de leis:
a "inventada pelos homens e segundo a qual se dispõe de determinado modo
das coisas a que a lei natural já se refere" e a divina, necessária para
encaminhar o homem ao seu fim sobrenatural.
Assim,
São Tomás considera o Direito natural, ao mesmo tempo, instinto e razão visto
que inclui nele tanto a inclinação que o homem tem em comum com todos os seres
da natureza e com os animais, quanto a inclinação específica do homem.
Quanto
a esta última, ele estabelece entre os preceitos do Direito. natural e a razão
prática a mesma relação que há entre os primeiros princípios das demonstrações
e a razão especulativa: tanto os preceitos quanto os primeiros princípios são
"conhecidos de per si", ou seja, evidentes. Mas em todas as suas
determinações, tanto instintivas quanto racionais, o Direito natural é sempre a
participação na "lei eterna", na ordem providencial ou divina do
mundo.
Para o
jusnaturalismo moderno, o Direito natural não é mais o caminho através do qual
as comunidades humanas podem participar da ordem cósmica ou contribuir para
ela, e passa a ser uma técnica racional de coexistência.
Conquanto
Alberico Gentile[6]
que, antes de Grócio[7], ainda procurou extrair as
noções normativas do Direito natural da consideração do estado de guerra (De
jure belli, 1588) utilizasse o conceito de instinto natural imutável que
manteria os homens unidos como membros de um único corpo, todos os conceitos
desse gênero foram descartados por Grócio.
A
teoria do Direito natural foi levada por Grócio ao mesmo plano racional da
matemática, para o qual o próprio Descartes quis levar a filosofia e todas as
outras pesquisas científicas. Como fundamento da obra de Grócio, há o recurso à
razão, que é o recurso à razão matemática, à qual os filósofos do séc. XVII
julgam estar confiadas as verdades da ciência.
Segundo
Grócio, a matriz do Direito natural é a própria natureza humana, que conduziria
os homens às relações sociais mesmo que eles não tivessem necessidade uns dos
outros.
Por
isso, o Direito que se funda na natureza humana "teria lugar mesmo que se
admitisse aquilo que não pode ser admitido sem cometer um delito: que Deus não
existe ou que não se preocupa com as coisas humanas" (De jure belli ac
pacis, 1625, Prol., § 11).
Porquanto
procede por legítima dedução dos princípios da natureza, o Direito natural
distingue-se do Direito das gentes (jus gentiuni), que não nasce da
natureza, mas do consenso de todos os povos ou de alguns deles e visa ao
proveito de todas as nações.
A
doutrina do Direito natural teve de Grócio a formulação mais madura e perfeita
de sua longa história. Certamente essa formulação é condicionada pelo
racionalismo geometrizante do tempo.
Técnica
racional, nos tempos de Grócio e Descartes, é técnica geométrica; nela, uma
proposição só se justifica quando pode derivar, por dedução necessária, de um
ou mais princípios evidentes.
O jusnaturalismo nem sempre permaneceu fiel às formulações de Hugo Grócio. John Locke[8], no “Ensaio sobre a lei natural”, negava que essa lei fosse um ditame da razão, e considerava-a como sancionada e imprimida nos corações humanos por uma potência superior; desse modo, a razão só faz descobri-la, não sendo sua autora, mas sua intérprete (Law of Nature, I A ed., 1954, p. 110). Nisso, adotava a doutrina de Hooker (The laws of the Ecclesiastic Politycs, 1594-97,1, 8), que, por sua vez, adotava a doutrina tomista.
O
segundo passo decisivo do jusnaturalismo moderno foi dado por Hobbes, graças a
quem são eliminados da noção de Direito natural alguns vestígios dogmáticos que
ainda persistiam na doutrina de Grócio.
Para Hobbes, a lei natural é, sem dúvida,
"um ditame da reta razão", mas a razão de que ele fala é a razão
humana falível. "Por reta razão no estado natural da humanidade entendo,
ao contrário da maior parte dos escritores que a consideram uma faculdade
infalível, o ato de raciocinar, o raciocínio próprio de cada indivíduo,
verdadeiro em termos de ações que podem gerar vantagens ou prejuízos aos outros
homens.
A
segunda concepção de Direito, fundado na moral, prenuncia-se quando se começa a
atribuir à moral caracteres que os autores até aqui examinados atribuíam ao
Direito Em todas as doutrinas do Direito natural, nem chega a nascer o problema
da distinção entre moral e direito.
O
Direito natural é constantemente identificado com o que é bem ou justo na ordem
das relações humanas, portanto com a verdadeira moralidade; por outro lado, a
sua diferença em relação ao que Graciano e São Tomás chamavam de lei humana e
que Grócio chamava de lei voluntária é a distinção entre o que é justo e bom em
si mesmo (verdadeiramente moral) e o que é justo ou bom só por participação,
podendo, pois, não ser justo e bom, como de fato às vezes não é.
Leibniz
diz que o Direito é uma "potência moral" e que a obrigação é uma
"necessidade moral", (grifo meu) entendendo por
moral o que é natural no homem bom, ou seja, o amor ao próximo no sentido da
alegria pela felicidade alheia.
"Dessa
fonte", acrescenta, "flui o Direito natural, que tem três graus: o
Direito estrito, que é a justiça comutativa; a equidade ou caridade, que é a
justiça distributiva; a piedade ou a probidade, que é a justiça universal.
Esses graus correspondem aos três preceitos seguintes: 'não prejudicar ninguém'[9], 'atribuir a cada um o que
lhe é devido' e 'viver honestamente' (ou piamente)" (De notionibus
júris et justitiae, 1693, Op., Ed. Erdmann, p. 119). Já nessas formulações
de Leibniz a esfera da moral é entendida como originária e primária em relação
à do Direito natural.
Mas
foi Cristiano Thomasius[10] (1655-1728) o primeiro a
expressar com clareza e impor na filosofia jurídica a distinção entre esfera
jurídica e esfera moral, marcando assim a passagem da teoria do Direito natural
à teoria do Direito fundado na moralidade. Thomasius distinguiu três
"fontes" do bem: a honestidade (bonestum), o decoro (decoram)
e a justiça (justum).
Portanto,
o Direito é "o conjunto de condições por meio das quais o arbítrio de
um pode ajustar-se ao arbítrio de outro, segundo uma lei universal da
liberdade", e pode ser representado como "uma coação geral e
recíproca", de tal modo que "Direito e faculdade de coagir significam
a mesma coisa" (grifo meu).
Nessa
doutrina de Kant há três pontos importantes: 1º:o caráter primário e
fundamental da norma moral, que é a única lei racional, e, portanto, dá origem
à norma de Direito; 2º: o caráter "externo", logo imperfeito, da
norma de Direito e, por conseguinte, o caráter imperfeito e incompleto da ação
legal em relação à ação moral; 3º: o caráter necessariamente coercitivo do
Direito. Esses três pontos tiveram grande importância no desenvolvimento
sucessivo da doutrina do Direito; o primeiro deles é, obviamente, resultado da
doutrina do Direito natural.
E,
também inspira grande número de correntes da moderna filosofia do Direito, mais,
precisamente, aquelas que partem da distinção entre a esfera externa da ação,
como pertencente ao Direito, e a esfera interna da intenção ou da consciência,
como pertencente à moralidade.
Assim,
a teoria do Direito como "o minimum ético"[11],
proposta por Jellinek (Die sozial-ethische Bedeutungvon Recht, Unrecht, und
Strafe, 1878), implica, ao mesmo tempo, que o Direito deriva da moral e que
o Direito se reduz a uma esfera moral restrita ou diminuta.
Concepção
análoga foi sustentada por Croce, que a exprimia com a fórmula da identidade
entre atividade jurídica e atividade econômica, identidade que servia para
fazer a distinção entre Direito e moral, ao mesmo tempo em que vinculava os dois,
de acordo com a solução geral apresentada por Kant (Filosofia da prática, 1909,
pp. 370 ss.).
Outro
modo de exprimir a mesma noção de Direito pode ser visto na doutrina de R.
Stammler, de Direito como tendência imanente em todo D. positivo e da
moralidade como perfeição do Direito correto, isto é, como perfeição última
deste (Lebre von richtigen Recht, 1902, p. 87).
Ainda
na mesma linha, situa-se o russo Leon Petrazycki (Introdução ao estudo do direito
e da moral, 1905; Teoria do direito, 1907), que fez a distinção entre as normas
morais que estabelecem "obrigações livres", ou seja, não conferem aos
outros nenhum Direito ou pretensão, e as normas morais que garantem tais
obrigações em relação aos outros, ou seja, dão aos outros o Direito de
pretender o que a norma garante (Law and Morality, trad. in., 1955, pp.
46-47).
Da
negação do Direito natural e da ligação da noção de Direito com a de coerção
externa ou sanção nasce a terceira concepção fundamental de D., que o
identifica com a força.
A
característica essencial da força é garantir a realização da norma, de tal modo
que o Direito como força é o Direito realizado, ou seja, D. que ganha corpo e
substância em instituições historicamente existentes.
O
pressuposto dessa corrente é, portanto, a negação do Direito como dever-ser,
aliás, do próprio dever-ser: é a identificação entre norma e realidade, entre
dever-ser e ser.
Este
último aspecto exclui Hobbes[12] dessa corrente doutrinai,
pois, uma vez que ele não identificou o dever-ser com o ser, admitiu um Direito
natural que é a saída razoável do homem de uma situação hostil que ameaça
destruí-lo, e não considerou que essa saída era infalivelmente garantida e
plenamente realizada. A concepção do Direito como força, com base na
identificação entre dever-ser e ser, nasce com Hegel.
Segundo
Hegel, o Direito é "uma existência em geral que seja existência da vontade
livre". Isso significa que o Direito seja uma liberdade realizada em
instituições historicamente determinadas, que como tais nada têm mais a ver com
a liberdade entendida como arbítrio individual.
Hegel,
bem como todo o Romantismo reacionário peculiar do séc. XIX, via na liberdade
do indivíduo o conceito e a inspiração fundamental do Iluminismo e da Revolução
Francesa, contra os quais entendia assestar sua doutrina.
Citando
a definição kantiana de Direito, ele observava: "A citada definição de Direito contém a
opinião, corrente, sobretudo, depois de Rousseau, segundo a qual o “querer”
deve ser fundamento substancial e primeiro princípio, não enquanto racional em
si e para si, não enquanto espírito e espírito verdadeiro, mas enquanto
individualidade particular, enquanto vontade do indivíduo em seu arbítrio
particular[13].
Assim,
os "horrores" da Revolução Francesa[14] constituem um paralelo à
"superficialidade" de entender a liberdade não como realidade
histórica, mas como o dever ser de uma norma.
Consequentemente,
Hegel acha que o Direito é algo sagrado, só por ser "a existência do
conceito absoluto, da liberdade autoconsciente", e que um Direito
superior, ou seja, mais real, subordina um Direito mais abstrato, ou seja,
menos real ou imperfeitamente real.
Hegel,
"é o Estado; seu fundamento é a potência da razão que se realiza como
vontade. Como ideia de Estado não se devem ter em mente estados particulares,
instituições particulares, mas considerar a Ideia por si, esse Deus real".
Embora
aponte assim do Estado "em si", que conserva caráter divino ainda
que, em suas manifestações particulares, se mostre imperfeito, assim como um
homem conserva caráter humano mesmo quando é aleijado ou deficiente, Hegel
julga que todos os Estados são encarnações do "Espírito do povo", a
autoconsciência que um povo tem de sua própria verdade e de seu ser, ou a
"cultura" de uma nação (Phil. Der Geschichte, ed. Lasson, p.
93).
O
Direito não é senão a realização da liberdade no Estado: existe só como lei do
Estado. Assim, correspondentemente, a
liberdade existe só como obediência às leis do Estado. "Ao Estado
pertencem as leis, e isso significa que o costume não subsiste só na forma
imediata, mas na forma do universal, como objeto de um saber.
O fato
de esse universal ser conhecido constitui a espiritualidade do Estado. O
Indivíduo obedece às leis, e sabe que nessa obediência está a sua liberdade;
nela, portanto, entra em relação com seu próprio querer". imperfeição do
Direito positivo, na doutrina de Hegel não existe nenhum tribunal de apelação
e, aliás, a própria doutrina não passa de negação desse tribunal, que é
entendido como fonte de pensamentos "superficiais" e de
acontecimentos "horríveis".
O
Direito deve ser reconhecido como um dever-ser, como uma regulamentação do
comportamento humano, com a qual esse comportamento pode até não se ajustar.
Nessa
concepção, confluem vários elementos historicamente reconhecíveis: a velha
ideia do Direito como utilidade, que sofistas, epicuristas e céticos já haviam
defendido na Antiguidade e que no mundo moderno foi retomada por
Hobbes
e Hume[15], e, em especial, a ideia
central do jusnaturalismo moderno de que o Direito é a racionalidade das
relações humanas (pacíficas ou não) e que, portanto, em sua esfera inclui-se
qualquer regulamentação racional de tais relações.
Este
último também é o conceito de Direito aceito pela teoria formal, se bem que a
polêmica tradicional de ordem ideal e perfeita da comunidade até agora impediu
que essa teoria se identificasse em seu precedente histórico mais ilustre e
significativo.
Não há
dúvida de que a ideia de Direito como técnica ou instrumento para possibilitar
as relações humanas, tanto na paz quanto na guerra, ideia exprimível na forma
de imperativos hipotéticos ou de proposições condicionais do tipo se então, é
comum ao jusnaturalismo clássico de Grócio, Hobbes, Pufendorf e a outros
defensores hodiernos da "teoria geral do Direito"[16].
A
ideia de Direito como técnica ou instrumento para possibilitar as relações
humanas, tanto na paz quanto na guerra sendo uma ideia exprimível na forma de
imperativos hipotéticos ou de proposições condicionais do tipo se então, é
comum ao jusnaturalismo clássico de Grócio, Hobbes, Pufendorf[17] e a outros defensores
hodiernos da "teoria geral do Direito"
Pode-se
ver um precedente dessa teoria na doutrina de John Austin que definiu o Direito
como "regra formulada para que um ser inteligente guie outro ser
inteligente e tenha poder sobre ele. Direito seria, portanto, mando: expressão
da vontade de um indivíduo, injuntiva para o indivíduo a quem é dirigida, no
sentido de obrigá-lo a fazer o que o mandante requer (Lectures on
Jurisprudence, 1861, 5- ed., 1885, I, pp. 88 ss.).
As
características fundamentais da doutrina de Austin são duas: 1ª: redução do
Direito a uma norma injuntiva, enquanto mando; 2ª: caráter racional, ou pelo
menos razoável, desse comando, visto emanar de um ser inteligente e dirigir-se
a outro ser inteligente.
Essas
características também se encontram em doutrinas aparentemente diferentes da de
Austin, como por exemplo, na doutrina sociológica de Eugen Ehrlich, para quem "o
Direito é uma organização, vale dizer uma norma que atribui a cada membro da
associação sua posição na comunidade, seja ela de preeminência ou de sujeição,
bem como seus deveres” (grifo meu, in: Grundlegung der Soziologie des
Rechts, 1913, p. 18).
Nessa
doutrina, o conceito de ordenação prevalece sobre o de mando, mas a ordenação,
assim como o mando de Austin, é uma norma apta a realizar certa forma de
convivência. Kelsen, hoje o maior defensor e representante da teoria formal do
direito, remete-se a esses predecessores.
Distingue-se
de Ehrlich por não julgar que o conceito de ordenação baste para constituir o Direito,
porquanto nem sempre a ordenação tem força injuntiva; e distingue se de Austin
por julgar que tal força injuntiva não consiste no mando, mas no dever-ser do
Direito, ou seja, na estrutura normativa do próprio Direito.
Mais
precisamente, para Kelsen o Direito é "a técnica social específica de
uma ordenação coercitiva, (grifo meu) sendo, pois, caracterizado pela
"organização da força" (General Theory of Law and State, 1945,
I, A, d; trad. it., pp. 19 ss.).
A
eficiência dessa técnica é condicionada, segundo Kelsen, por sua coerência, que
pode ser medida a partir de uma "norma fundamental", que serviu de
base para a criação das várias normas de determinada ordem jurídica.
Portanto,
toda técnica eficaz deve ser autorretificável; essa é, na verdade, a única
vantagem que a técnica da ciência experimental, desde Galileu até hoje, possui
sobre as outras.
Desse
ponto de vista, o juízo técnico sobre determinado sistema de Direito é o juízo
sobre a sua capacidade de corrigir ou eliminar suas próprias imperfeições, de
tornar-se mais ágil e, ao mesmo-tempo, mais rigoroso.
Não é
um juízo que se refira à mera coerência do sistema, nem um juízo de valor
resultante do confronto do sistema com um ideal prévio de justiça. É um juízo
concreto e diretivo, capaz de influir na evolução histórica do direito.
De
fato, Direito e moral devem ser considerados idênticos tanto do ponto de vista
da teoria do Direito natural quanto do ponto de vista da teoria do Direito como
força.
Obviamente,
a teoria segundo a qual o Direito se apoia na moral faz uma distinção entre
ambas e, na realidade, é a teoria de tal distinção. Quanto à teoria formal do
Direito, provavelmente permite tanto uma quanto outra solução.
Mas na
realidade o jusnaturalismo moderno não se apoiou em determinado ideal de
justiça, mas na exigência de que o Direito, sejam quais forem as normas
particulares em que se concretize, seja eficiente no objetivo de possibilitar
as relações humanas.
Para
Hegel[18], o problema do conceito é
um problema filosófico, particularmente, ontológico, e, não lógico ou
gnosiológico (In: Filosofia del derecho, p. 37 e p. 45-62 e La
phénomelogie de l’espirit, filosofia de la história universal, p.86-100).
Enfim,
definir um objeto é, essencialmente, explicitar suas notas essenciais do objeto
de conhecimento significando determinar o que ele é. A essência é, pois, a soma
de predicados que, por sua vez, dividem-se em dois grupos, a saber: predicados
que convêm à essência de tal sorte que se lhe faltasse um deles não seria o que
é: e predicado que convêm à substância, mas que ainda que algum deles faltasse,
continuaria a ser a substância que é.
Aqueles
primeiros são a essência propriamente dita, porque se algum destes faltasse à
substância, ela não seria aquilo que é; e os segundo são o acidente, porque o
fato de tê-los ou não impede de modo algum que seja aquilo que é. (In: Garcia
Morente. Fundamentos da Filosofia, p. 76-96).
A
ciência jurídica é considerada ora como scientia pelo seu aspecto teórico,
ora como ars, pela sua função prática E, outros ainda, dão ao problema uma
solução eclética.
Nas
ciências humanas, talvez o caminho mais aconselhável seja aceitar, a título
provisório, ou para noção corrente consagrada pelo uso. Aos olhos do homem
comum, o Direito é lei e ordem, isto é, conjunto de regras obrigatórias que
garante a convivência social graças ao estabelecimento de limites à ação de cada
um de seus membros.
O
Direito corresponde à exigência essencial e indeclinável de uma convivência ordenada,
pois nenhuma sociedade poderá subsistir sem o mínimo de ordem, de direito ou
solidariedade.
E,
para o jurista Santi Romano[19] cansado de conceber o
Direito apenas como regra ou comando, resumiu que seja a realização de
convivência ordenada.
A lição
do brocardo jurídico ubi societas, ibi jus que tão bem traduz onde está
o Direito, está a sociedade, e a recíproca é verdadeira. Ubi homo ibi
societas; ubi societas, ibi jus é assim que se referia Ulpiano conforme
consta no Corpus Iuris Civilis[20].
O homem não consegue estar e ficar só. Pois, convive, socializa, nasce em
comunidade, no seio da família e, morre também dentro da comunidade (dos mais
variados tipos e formatos.
A
melhor edição do Corpus Iuris Civilis é a dos alemães Mommsen, Krueger,
Schoell e Kroll. Os dois primeiros editaram o Digesto (Pandectas); o
segundo, as Institutas e o Código; e os dois últimos, as Novelas. Mais
antigas, mas igualmente importantes, são as edições de Dionísio Godofredo,
publicadas entre 1583 e 1664.
Para a
língua portuguesa, há várias traduções das Institutas, uma única
integral do Digesto e nenhuma integral do Código ou das Novelas.
Do Digesto, a tradução foi empreendida pelo Conselheiro Vasconcellos nas
duas primeiras décadas do século XX, mas não se tornou (à época) pública.
Somente um século depois (precisamente, a partir do ano de 2017) é que ela foi adaptada, complementada e publicada por uma equipe de professores da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo[21] (após a descoberta por acaso dos nove volumes do manuscrito da tradução original do Conselheiro Vasconcellos). Em 2021 foi publicada uma nova tradução das Institutas de Justiniano[22], baseada em uma versão renovada do texto latino.
Historicamente
é impossível conceber o homem solitário, exceto por limitados espaços de tempo,
havendo a propensão inata e natural para o ser humano se agregar em
comunidades. E, uma vez inserido dentro de comunidade importa ao homem refutar
o caos e a anarquia e estabelecer um conjunto de regras de convívio e
socialização. Toda comunidade, terá, ipso facto, as suas regras e normas
de conduta.
Portanto,
o Direito é um fato ou fenômeno social, o que serve para designar a realidade
jurídica e a respectiva ordem de conhecimentos. Com razão, aduziu Giambattista
Vico, pensador italiano do século XVIII, quando nos ensinou que verum ae
factum convertuntur, o verdadeiro e o fato se convertem.
Como
fato social e histórico, o Direito é multiforme e reflete distintas e renovadas
estruturas normativas. A palavra “direito” é usada em diversos sentidos e se
cogitarmos do direito de determinado país do direito positivo (norma agendi)
seja brasileiro, espanhol ou português, estamos nos referindo ao conjunto de
legislação em vigor no Brasil, na Espanha ou em Portugal.
Já a
expressão “direito natural” trata dos princípios que supõem idênticos por toda
parte e, inspiradores do direito positivo[23]. Pode ainda, a palavra
“direito” designar a faculdade atribuída a cada qual de mover a favor de suas
pretensões previstas na ordem jurídica, tem-se o direito subjetivo ou facultas
agendi.[24]
O
mundo do direito é o mundo das relações entre os homens. O Direito abrange um
conjunto de disciplinas jurídicas. Disciplina é um sistema de princípios e de
regras a que os homens se ater em sua conduta; é um sistema de enlaces
destinados a balizar o comportamento dos indivíduos de qualquer idade ou classe
social bem como as atividades de entes coletivos e do próprio Estado.
O
Direito abrange um conjunto de disciplinas que se divide em duas grandes
classes, a saber: o Direito Privado e o Direito Público[25]. As relações que se
referem ao Estado e traduzem o predomínio do interesse coletivo são chamadas de
relações públicas, ou de Direito Público.
Mas, o
homem não vive apenas em relação com o Estado, mas também e, principalmente, em
relação aos seus semelhantes essas são as relações de Direito Privado, onde
predomina o interesse privado.
Conclui-se,
portanto, em cada comportamento humano, a presença embora indireta, do fenômeno
jurídico: o Direito está pelo menos pressuposto em cada ação do homem que se
relacione com outro homem.
Todas
as infinitas relações e ações condicionam à existência primordial do fenômeno
jurídico. O Direito, por conseguinte, tutela os comportamentos humanos. Assim,
o direito atua como salvaguarda da convivência social.
A
Ciência Jurídica como se trata de ciências, obedece a um tipo de unidade que
não é física e, nem orgânica, e sim, finalística ou teleológica.
O
Direito localiza-se no mundo da cultura e, para tanto vale-se diferentes
métodos. É fácil evidenciar os liames que estabelecem entre sujeito e o objeto,
pois o sujeito cognoscente (jurista) tende para o objeto (direito).
Essa
tendência é a intencionalidade do conhecimento que consiste em saber de si para
o objeto para capturá-lo mediante o pensamento. O sujeito produz um pensamento
do objeto e, o ato cognoscitivo, não é o ato solitário, é sempre heterogêneo.
A
palavra “método”[26]
é formada pela justaposição de dois vocábulos gregos, a saber: metas e odos. Meta
tem o significado de fim-objeto que tende a uma atividade. Odos, equivale
a caminho, trâmite. O composto “método” significa, portanto, o “caminho para”,
o meio para o fim, isto é, o caminho que conduz a ciência à verdade.
A
definição de método é complexa e pode sugerir certa gama de diferentes
significados. Martin Heidegger lembra-nos que, etimologicamente, método é uma
palavra de raiz grega e que significa “o caminho pelo qual sigo uma coisa”. No
mesmo sentido, Friedrich Rapp afirma que “en su sentido más estricto por
‘método’ ha deentenderse una manera consecuente de proceder que se aplica para
alcanzar un determinado fin”.
Questiona-se se o método científico por si só, já conduz a um resultado seguro. Pois, a finalidade da sistematização é negada por muitos doutrinadores, tal como Esser e, defendida por outros como Karl Engish[27], Larenz, Helmunt Coing[28] e Miguel Reale.
Outro
questionamento que instiga saber se caberá ao Direito sistematizar o
ordenamento jurídico? Afinal, há ainda os que negam a viabilidade de um
conhecimento científico do direito, negando ainda a cientificidade da
jurisprudência[29].
Para
alguns estudiosos da ciência do direito não é, na realidade, uma ciência porque
o seu objeto (o direito) modifica-se, com o tempo e no espaço. E, tamanha
mutabilidade impede ao jurista a exatidão científica na construção.
Sequencialmente
podemos identificar as seguintes correntes doutrinárias, a saber: 1.
Racionalismo metafísico ou jusnaturalista; 2. Empirismo exegético; 3.
Historicismo; 4. Sociologismo eclético; 5. Racionalismo dogmático; 6. Egologia
existência. (In: MACHADO NETO, Arthur. A Teoria da Ciência Jurídica. São Paulo:
Saraiva, 1975, p.80; COSSIO, Carlos. Las actitudes de la ciencia jurídica.
La Ley, 1956).
O
racionalismo metafísico ou jusnaturalismo de Stammler[30] e Del Vecchio[31] apesar de sua relevante
tradição, jamais pôde proporcionar um fundamento científico à ciência do
Direito, trata-se de atitude pré-científica, no campo do conhecimento jurídico.
Já
para o empirismo exegético de Demolombe[32], Aubry e Rau[33] e Laurent concluíram que
a tarefa do jurista seria de mera exegese do texto legal.
Para o
historicismo casuístico de Gustavo Hugo e Savigny[34] trouxeram a valorização
do costume, manifestação espontânea do espírito nacional (nacionalismo) e do
caráter feudal (conservadorismo). A experiência histórica e jurídica para a
Escola Histórica[35]
e o conhecimento do direito só poderia se basear nesta experiência.
A
escola naturalista, por sua vez, tem diante de si um objeto permanente e
imutável, o que lhe permite fazer verificações, experiências, correção de erros
que porventura tiver cometido.
Bobbio
(In: Teoria della scienza giuridica. Torino: Gianppichelli, 1950, p.53)
cita entre os negacionistas da ciência do Direito estão Chamberlain, Nussbaum,
Max Rumpf e, principalmente, Julian Herman Von Kirchmann, conforme a sua obra “La
Jurisprudencia no es ciencia. Madrid: Instituto de Estudios Políticos,
1949.
Anunciou
a maioria dos pensadores que a jurisprudência é ciência tal como Heirich
Rickert, Wundt, Recanséns Siches e Porrúa. A ciência jurídica só veio
consolidar-se no século XIX e, são inúmeras as concepções
epistemológico-jurídicas referentes à cientificidade da jurisprudência, todas
essas bem peculiares aos séculos XIX e XX.
Para o
sociologismo eclético de David[36], Léon Duguit[37], François Gény, Maurice
Hariou, Holmes, Pound, Rost, Olivercrona, Stundka, Pashukanis[38], Silvio Romero[39] e Tobias Barreto[40], a sociologia era a única
ciência social enquanto a ciência social sendo um setor dessa ciência total da
sociedade. Defendiam a aplicação do método sociológico à investigação jurídica.
O
racionalismo dogmático tem em Kelsen sua expressão máxima e egologia
existencial foi fundada por Carlos Cossio[41]. Consigne-se que a filosofia
do direito compreende três temas fundamentais, a saber: 1. Investigando o que é
o direito para chegar a defini-lo e precisar seu conceito; 2. O problema do
conhecimento do direito, a epistemologia jurídica que tem o fim de estudar os
pressupostos as características do objeto e o método do saber científico e de
verificar suas relações e princípios sendo a epistemologia jurídica a teoria da
ciência jurídica que tem por objetivo o estudo dos problemas do objeto e do
método de jurisprudência[42] bem como sua posição no
quadro das ciências e suas relações com as ciências afins[43].
A
epistemologia lato sensu é sinônimo de gnosiologia, parte da filosofia
que estuda a natureza, a origem e os limites e o valor da faculdade humana do
conhecimento e seus critérios de validade. Todas as ciências possuem íntimo
contato com a filosofia, uma vez que possuem princípios gerais, axiomas,
supostos que penetram o objeto de estudo que investigam daí, a necessidade de
uma consideração filosófica que permita justificá-los.
Lecionou
Machado Neto que se o jusnaturalismo racionalista foi a expressão e
configuração hierárquica do mundo medieval. Já o jusnaturalismo racionalista
foi fruto do mundo burguês em ascensão; já o historicismo além da repercussão
ideológica recém-instalada sociologismo, a ideologia jurídica de burguesia já
bem instalada veio canonizar o fato como direito, o relativismo da teoria pura
será o pensamento jurídico solidário e decadência da civilização liberal
burguesa.
Foi
com base nas descobertas de Kelsen que surgiu na Argentina nos meados do século
XX um movimento filosófico com objetivo epistemológico de proporcionar ao
estudioso do direito a utilização de instrumentos mentais que constituem o
egologismo existencial[44], cujo fundador foi Carlos
Cossio que concebeu a problemática jurídico-filosófica voltada para a
investigação científica voltada para a fenomenologia filosofia de valores e o
existencialismo.
Para
os doutrinadores argentinos Aftalión, Olano e Vilanova, o egologismo entende
que a filosofia jurídica envolve quatro grandes temas: ontologia jurídica; lógica
jurídica formal; lógica jurídica transcendental; e axiologia jurídica.
Ao
contrário da afirmação recorrente de que Cossio e o Egologismo entendem que a
ciência jurídica deveria estudar somente a conduta humana em sua dimensão
social, prescindindo da norma jurídica, um dos principais divulgadores da obra
de Cossio no Brasil, o jurista Machado Neto sustenta que a principal
preocupação da teoria egológica é a busca da essência (fundamento ontológico)
do Direito. Logo, para o egologismo jurídico esse fundamento não estaria na
norma jurídica, tal como defendido por Hans Kelsen, mas estaria na conduta
humana.
Para
Kelsen, o objeto do conhecimento jurídico é a norma, de modo que a atividade da
ciência jurídica se esgota na tarefa de conhecer as normas de direito. O objeto
da investigação do jurista deve ser a norma e o comportamento humano só o será
na meia em que constitui o conteúdo de comandos jurídicos.
Para
Hans Kelsen, a fórmula lógica da norma jurídica é deontológica (ou do
"dever-ser": dado A deve ser B), cujo enunciado é: "Dada a não
prestação deve ser sanção".
Cossio
aditou a esta lógica a condicionante humana, também deontológica (ou do
"dever ser") ou seja, para que haja uma sanção é preciso haver um
sujeito (juiz) que lhe aplique; de igual forma, a ilicitude em si não gera
automaticamente esta sanção. E, mesmo a não-prestação de uma norma depende do
sujeito a quem a sanção se destina: a sociedade, a quem o direito serve.
Segundo
Kelsen o Direito se identifica com a norma e para Cossio com a conduta humana.
Sendo que esta norma representa apenas o dever-ser da conduta.
Mais
importante que a Lei é a conduta do indivíduo e a interação de seu ego em
sociedade — daí o nome “Egológica” (grifo meu). Para Cossio, o
Direito é uma ideia, não um conceito como Kelsen o atribuía. Cossio declara que
a ciência jurídica deve estudar a conduta[45] humana enfocada em sua
dimensão social, e não na norma jurídica.
Sua
fórmula para a norma jurídica, então, obedece ao seguinte enunciado: Dado um
fato gerador deve ser prestação pelo sujeito obrigado face ao sujeito
pretensor, ou, dada a não-prestação, deve ser sanção pelo funcionário obrigado
face à comunidade pretensora.
As
ideias inovadoras de Cossio encontraram respaldo no Brasil, com o então jovem
jurista Antônio Luiz Machado Neto, professor da Universidade Federal da Bahia e
da Universidade de Brasília. Com o advento dos regimes militares, tanto no
Brasil quanto na Argentina, ambos foram tratados como persona non grata dos
respectivos governos. Parcialmente, por conta disto, as ideias do egologismo
não encontraram respaldo no meio acadêmico, e tratadas com descaso e ironia,
por parte dos demais juristas, afeitos à ordem vigente.
No
Brasil, não se ignorar a importante contribuição do Professor Julio C. Raffo
(ex-reitor da Universidade Nacional de Lomas de Zamora, Argentina), discípulo
direto de Carlos Cossio, que nos anos 70 e 80 do século passado atuou no Rio de
Janeiro como professor de Lógica, Metodologia e Filosofia Jurídicas na
Universidade Cândido Mendes de Ipanema e na PUC-RJ. Raffo chegou a publicar
pela Editora Forense a obra "Introdução ao conhecimento jurídico",
atualmente esgotada.
Contemporaneamente,
o egologismo jurídico possui na jurista baiana Marília Muricy, uma discípula e
continuadora do trabalho de A. L. Machado Neto, sendo uma das responsáveis para
que a Faculdade de Direito da UFBA tenha sido um dos polos do egologismo no
Brasil.
De
acordo com a teoria pura do direito, o objeto da jurisprudência consiste nas
normas jurídicas determinantes da conduta humana ou na conduta humana
determinada pelas normas jurídicas, ou seja, enquanto contida nas normas de
direito[46].
A
norma jurídica é o elemento de base do direito e, portanto, a célula de cada
ordenamento jurídico. É um imperativo de conduta, que coage os sujeitos a se
comportarem da forma por ela esperada e desejada.
Kant
considera ser a norma jurídica um juízo hipotético. No Kantismo encontramos a
origem da distinção de imperativo categórico do hipotético. O primeiro impõe
dever sem qualquer condição (norma moral), enquanto o hipotético é condicional.
O categórico ordena por ser necessário, enquanto no hipotético a conduta
imposta é meio para uma finalidade. Assim, o imperativo hipotético estabelece
condição para a produção de determinado efeito.
Kelsen
retomou essa distinção, considerando a norma jurídica um juízo hipotético por
dependerem as suas consequências da ocorrência de uma condição: se ocorrer tal
fato deve ser aplicada uma sanção. Então conclui Kelsen que a estrutura da
norma jurídica é a seguinte: em determinadas circunstâncias, determinado
sujeito deve observar determinada conduta e se não a observar, outro sujeito,
órgão do Estado, deve aplicar ao delinquente a sanção.
Norma
jurídica, segundo, Paulo Dourado de Gusmão, é a proposição normativa inserida
em uma ordem jurídica, garantida pelo poder público ou pelas organizações
internacionais. Coloca ainda ele, que tal proposição pode disciplinar condutas
ou atos, como pode não as ter por objeto, coercitivas e providas de sanção.
Visam, consoante o autor, a garantir a ordem e a paz social e internacional.
Norma[47] pode também se referir
aos fatos e situações que não constituem a conduta humana, mas, desde que sejam
condições ou efeitos da conduta humana.
Conforme
o conhecimento jurídico-científico dirija-se às normas que devem ser aplicadas
ou os atos de produção e aplicação, temos uma teoria estática e uma teoria
dinâmica.
A
teoria estática tem como objeto o direito tido como sistema de normas, estuda-o
em estado de repouso. Ao considerar o direito em seu momento estático, a
pesquisa jurídico-científica deve partir das normas de direito positivo e
confrontá-las entre si, numa unidade coerente e sistemática sob o enlace
dedutivo de preceitos normativos e da norma básica, mostrando o uno sistema no
múltiplo (multiplicidade das normas). As normas de direito não são o resultado
do estudo da Jurisprudência, mas sim, o seu objeto.
Por
sua vez, a teoria dinâmica considera o direito em movimento, e tem por objeto o
processo justo em que é produzido e aplicado o direito; “os atos de produção e
aplicação do direito só interessam, à ciência jurídica, enquanto forem o
conteúdo de normas jurídicas.
Por
sua vez, a teoria dinâmica considera o direito em movimento e, tem por objeto o
processo justo em que é produzido e aplicado o direito; “os atos de produção e
aplicação do direito só interessam à ciência jurídica enquanto forem o conteúdo
de normas jurídicas”.
A
atividade cognoscitiva do jurista conforme a doutrina de Hans Kelsen em que há
certa relação entre “ser” e “dever ser”. Dentre as várias teorias que explicam
a Jurisprudência, cabe o exame do racionalismo dogmático e do egologismo
existencial.
O
racionalismo dogmático[48], ou melhor, a teoria de
Kelsen é uma expressão ideológica de sua época, uma consequência do declínio do
mundo capitalista-liberal, marcado pela Primeira Guerra Mundial. Para
Jurisprudência, segundo essa doutrina, não importa o conteúdo do direito.
Segundo
Machado Neto, essa teoria foi fruto da era denominada de “racionalização do
poder”, resultante do democratismo formal e vazio de ideologias totalitárias
nascentes e suas primeiras experiências concretas conviviam com o liberalismo
democrático em sua fase conservadora, reconhecendo as ordens jurídicas de cunho
político, diverso do liberal ou social-democrata que exiba os povos europeus
ocidentais.
Constituiu
uma teoria do direito reconhecendo ao lado do direito democrático-liberal, de
um direito soviético, fascista e nazista. Vocação para a neutralidade com tom
axiológico de normas jurídicas.
Kelsen,
por sua vez, reagiu à anarquia conceitual a que má consciência científica do
jurista tinha reduzido a meditação científica do direito ao identificá-la como
ciência natural. A teoria pura do direito é a mais autêntica tentativa de
fundamentação autônoma da ciência jurídica, pois antes desta a ciência jurídica
se reduzia a ancilla sociologial e ao inerte protetorado teórico de
quanta ciência causal existia.
Tércio Sampaio Ferraz Júnior em que obra intitulada “Por que ler Kelsen hoje?” chega a afirmar que a obra de Kelsen ainda o mantém vivo suas implicações para a Ciência Jurídica, para a lógica da norma e para a aplicação do direito são fecundas que, por mais que critiquemos, não deixam de desvendar novos ângulos e novos encaminhamentos. Interessante consultar, ainda, Fabio Ulhôa Coelho autor da obra “Para entender Kelsen”[49].
O
denominador comum da teoria de Hans Kelsen é sua apaixonada postura
gnosiológica e, onde o jurista encontra delineado o seu método de trabalho.
O
positivismo da teoria de Kelsen foi prevalente no século XX, mas considerado
como fenômeno universal e, onde o jurista encontra o seu próprio habitat
teórico.
A
teoria de Kelsen é considerada o “ovo de Colombo” da teoria jurídica, mas não
quer dizer que tenha a palavra final sobre tão ricas implicações teóricas
apesar de ter Kelsen pretendido admitir a existência de uma “antinomia
inevitável” entre essas duas categorias apriorísticas, pois segundo ele, para
que uma norma seja tida como válida, ela terá não só de ser posta por um ato de
vontade – que é um ato do “ser” como também possuir determinado grau de
eficácia.
A
norma é vista como um sentido de um ato de vontade, que a fixa. O fim do ato de
fixação da norma não é um “dever ser”, mas um “ser “que é a conduta existente
na realidade, a qual corresponde à norma.
O ato
de vontade, como ato do “ser”, tem o sentido de um “dever ser”, que é norma.
Uma norma posta na realidade do ser por um realizante ato de vontade e uma
norma positiva.
O
segundo ato de vontade, de um ato comando dirigido à conduta de outrem só pode
ser descrito com o termo “dever ser”, pois essa conduta pode “ser”, mas pode
também “não ser”, isto é, o outro pode obedecer ou desobedecer à ordem.
Logo,
essa conduta não entra na ordem no modo de ‘ser” e, sim no modo “dever ser”.
Como se vê, a eficácia é condição de validade. A eficácia de uma norma consiste
em que esta é, em geral, efetivamente cumprida e, se não cumprida é aplicada.
A
validade consiste em que a norma deve ser cumprida, ou se não o for, deve ser
aplicada. Uma norma que proíba a venda de bebida alcóolica, punindo com prisão
a quem violasse, perderia sua validade, se fosse certo que não seria obedeceria
devido à resistência dos subordinados a esta; e, não fosse cumprida, também não
seria aplicada pelos órgãos competentes.
Trata-se
da desuetudo, o que mostra a relação entre validade e eficácia. As normas são
criadas por atos volitivos (atos de legislação) e atos que constituem um
costume criador do direito, atos jurisdicionais, administrativos e
convencionais sendo, por isso, consideradas como sentido subjetivo dos atos que
as prescrevem.
O
sentido subjetivo de um ato humano dirigido a conduta de outra só é
interpretado com o sentido objetivo desse ato se for uma norma validade. Que é
a promulgada por ato legítimo.
Suponha
que uma organização secreta como o Esquadrão da Morte, por exemplo, com o
escopo de libertar a sociedade de indivíduos nocivos, tanto que os executa.
Aquilo que, subjetivamente, se considera a sentença de condenação à morte,
objetivamente, ante o direito positivo, não é uma execução de sentença, mas um
homicídio, porque nenhuma disposição legal apoio os atos dessa organização
secreta.
Portanto,
ao afirmar que a norma, para a teoria pura do direito, tem validade objetiva, é
o mesmo que ratificar que o sentido subjetivo do ato legislativo é também o seu
sentido objetivo.
Para
Hans Kelsen, o que transforma um fato num ato jurídico (seja lícito ou ilícito)
não é a faticidade, isto é, o “ser” como tal como determinado pela lei da
causalidade, sua manifestação externa na conduta humana que se realiza no espaço
e no tempo, sensorialmente perceptível, mas o sentido objetivo a que está
ligado esse ato, a significação jurídica que possui.
Em
sentido jurídico do ato advém de uma norma, de tal modo que o referido ato pode
ser interpretado segundo esta. O juízo em que se enuncia que um ato de conduta
humana constitui um ato jurídico ou antijurídico é o resultado de uma
interpretação normativa.
E, a
norma que empresa ao ato significado de um ato jurídico ou antijurídico, é
produzida também por um ato jurídico que, por seu turno, recebe a sua
significação jurídica de uma outra norma, e assim por diante, até atingir a
norma básica.
A
norma funciona como um esquema de interpretação. Kelsen esclareceu que a norma
é válida quando: a) o ato cujo sentido objetivo é a norma; A1 está determinado
como devido em outra norma, que é o sentido subjetivo do ato A2 que está
dirigido intencionalmente ao ato A1; b) o sentido subjetivo do ato A2 é também
interpretado como o sentido objeto. A norma estabelecida no ato A2, que é
interpretada com o sentido objetivo desse ato, constitui o fundamento de
validade da norma estabelecida pelo ato A1. Aquela é, em sentido figurado, a
norma superior, e a norma cuja validade fundamenta é a norma inferior.
Portanto,
a validade da norma precede a norma individual, pois o conhecimento da norma
geral é pressuposto para a fixação da norma individual. A norma superior só
determina o ato do estabelecimento da norma inferior, não, porém, o conteúdo da
norma que deve ser estabelecida, pois autoriza, o estabelecimento de normas de
qualquer conteúdo.
Se a
norma fundamental determina apenas quem está autorizado a estatuir normas, a
norma inferior corresponde à superior se aquele que a estatuiu tem a sua
conduta determinada no conceito que está contido na norma autorizante.
A
norma superior apenas determina o órgão autorizado a produzir a norma inferior,
aplicando a norma superior. Nesta ordem de ideias, que a norma pode valer mesmo
quando o ato de vontade de que ela constitui o sentido já não existe; a
existência ou vigência de uma norma é diferente da existência do ato de vontade
que ela é o sentido objetivo; “a norma de dever ser, como sentido do ato de ser
que a põe, não se identifica com esse ato”.
Denota-se,
nesse caso no plano jurídico, não há nenhuma interligação de “ser” e “dever
ser”; essa correlação ocorre num momento anterior ou pré-jurídico, ou seja, na
fase da gestação da norma.
Lembremos
ainda que para Kelsen[50] um mínimo de eficácia é
condição de sua vigência (validade), deve existir a possibilidade de uma
conduta em desarmonia com a norma, deve haver sempre a possibilidade de sua
ineficácia, ou melhor, de não ser aplicada ou observada em casos particulares.
Logo,
a norma jurídica não é somente válida quando é inteiramente eficaz, isto é,
quando é aplicada e observada, mas também, quando é eficaz apenas até certo
grau.
Kelsen
pretendeu afirmar que o mínimo de eficácia consiste na condição de a norma ser
desobedecida e aplicada; ou obedecida e não aplicada, imprescindível para que
ela seja válida, vindo assim unir, de certa forma, o ser e o dever ser, uma vez
que estabelece uma comunicação entre normatividade (vigência) e facticidade
(eficácia).
Consigne-se,
ainda, que a validade da norma não se confunde com a eficácia sociológica de
norma. A validade ou vigência para a teoria de Kelsen é a existência específica
norma jurídica, significando que é obrigatória. A eficácia é o fato real de que
a norma é aplicada e seguida.
A
norma é eficaz quando for aplicada pelos órgãos jurídicos e respeitada pelos que
estão subordinados a esta. Esquematicamente, é eficaz a norma obedecida e não
aplicada como a desobedecida, mas aplicada.
A
norma vigente que for ineficaz será derrogada com o tempo, mas essa falta de
eficácia que ela perdeu a vigência, pois ela pode ser ineficaz somente em
alguns momentos recuperando sua eficiência quando outras condições sociais
permitirem.
Mas,
se ela permanecer duradouramente ineficaz, deixará de ser válida, sendo a
eficácia nesse sentido a condição de vigência. A norma ineficaz só é inválida
se a norma fundamental hipotética assim o dispuser.
Sublinhe-se
que a vigência e a eficácia[51] não se dão ao mesmo
tempo. A norma é válida mesmo que se torne ineficaz. Exemplificando: quando o
magistrado a aplicação pela primeira vez que ela pudesse adquirir a eficácia.
O que
Kelsen pretendeu afirmar foi que ao estabelecimento da norma deve seguir-se a
sua eficácia, para que a referida norma não perca sua vigência. É eficácia uma conditio
sine qua non (condição necessária) para a validade da ordem jurídica e, não
conditio per quam (condição suficiente).
Para a
sociologia jurídica a eficácia é nota característica do direito. Só é o Direito
vigente que obtém, na realidade, a aplicação eficaz.
A
maioria dos doutrinadores apresenta como objeção fundamental à teoria de Kelsen
o seu caráter fragmentário, ou a sua visão parcial do direito. Isto porque o
direito não se compõe apenas de normas; há algo mais, os valores, fatos
sociais, comportamentos humanos e, etc. Não sendo apropriado defini-lo apenas
por um de seus elementos.
Paul
Amselek vislumbra na teoria pura do direito uma inspiração fenomenológica, considerando
Kelsen como precursor da fenomenologia do direito, porque veem na sua doutrina
uma ciência fundada sobre a teoria eclética do direito[52].
Segundo
o professor Paul Amselek distingue-se dois tipos de pesquisa: a) pesquisa epistemológica: aquela que tem
como objetivo a investigação de conceitos sob um ponto de vista
dogmático-epistemológico.
b)
pesquisa operatória: aquela cujo principal objetivo é a resolução de um
problema prático da atividade do profissional do Direito.
Os
professores Monteiro e Savedra propõe a classificação da pesquisa científica em
epistemológica, instrumental e sociojurídica. Trata-se de uma classificação
bastante útil, a qual merece ser considerada detidamente.
A
pesquisa epistemológica implica atividade de pesquisa de cunho teórico ou
filosófico, interessando-se sobre os conceitos e categorias fundamentais da
Ciência do Direito, seus paradigmas, os fundamentos do discurso jurídico, os
valores informadores das normas jurídicas, bem como pelos conceitos
jusfilosóficos.
A
pesquisa instrumental requer atividade determinada pela preocupação com a
prática, buscando trazer uma contribuição teórica à resolução de problemas
técnicos (transformando o saber em saber-fazer).
A pesquisa é dita instrumental porque capta o
objeto da Ciência do Direito como um instrumento para a resolução de problemas
práticos, tendo como principal objetivo a “racionalização das técnicas
jurídicas e o aperfeiçoamento dos textos normativos”
A
pesquisa instrumental pode ser dividida em: a) doutrinária, a qual está voltada prioritariamente ao estudo das
teorias, teses ou opiniões emitidas pelos autores autorizados cujas obras têm
como principal finalidade interpretar o Direito (técnica de pesquisa mais comum
é a bibliográfica); b) legal, que está preocupada com a sistematização e
interpretação das normas jurídicas, restringindo-se à análise de enunciados
teóricos e práticos contidos nas normas do ordenamento jurídico vigente
(técnicas de pesquisa mais comuns são a documental, a histórica e a comparada)
; e c) jurisprudencial, que se pauta na análise das decisões suficientemente
concordantes a respeito de um determinado tema (principal técnica de pesquisa a
documental).
A
pesquisa sociojurídica importa atividade de pesquisa orientada pela relação da
ordem jurídica com a ordem social (entendida como meio ambiente humano). A
sociologia do Direito busca estabelecer as conexões entre as duas ordens de
fenômenos, considerando-as alternativamente como variáveis dependentes ou
interdependentes.
A
pesquisa tanto pode partir da influência de fatores sociais sobre a ordem
normativa quanto, inversamente, da influência da ordem normativa sobre os
comportamentos sociais.
Kelsen,
ao propor uma ciência pura, evitando toda mescla com elementos éticos,
políticos e sociológicos cujo método permite purificações sucessivas e que
permitem captar o fenômeno livre das impurezas que o ocultam, determinando a
essência.
O
normativismo de Kelsen jamais afirmou que direito é só norma que é apenas uma
parte do âmbito maior que é direito. É evidente a natureza epistemológica dessa
concepção, o esforço de conceder cientificidade ao conhecimento do direito,
ficando as bases de uma ciência autônoma e rigorosa.
A
Teoria pura do direito[53] é uma teoria do direito
positivo. Kelsen apostou dualismo radial entre “ser” e “dever ser” e pretendeu
submeter a ciência jurídica a uma dupla depuração metódica que é uma das vigas
mestras de sua doutrina, eliminando quaisquer investigações sociológicas e
axiológicas.
O
direito é o objeto da ciência jurídica. Cossio procurou descobrir a essência do
direito, com o fim de delimitar o objeto da ciência jurídica. Cossio partiu da
construção de Husserl dos objetos culturais e da intuição eidética, chegando a
concluir que o “ser” do direito é a conduta humana em sua interferência
subjetiva sobre o qual incidem valores. Conclui-se que o direito é,
ontologicamente, um objeto cultural egológico.
Kelsen,
com o fim de evitar o sincretismo metodológico baseado no dualismo radical
entre “ser” e o “dever ser”, pretendeu submeter a ciência jurídica a uma dupla
depuração metódica que é uma das chaves principais de sua doutrina, eliminando
de seu campo de ação quaisquer investigações sociológicas e axiológicas.
A
teoria de Kelsen[54]
confinou-se a uma perspectiva normativista, admitindo seu lado uma teoria da
justiça e uma sociologia jurídica. Propondo ao jurista, ao exercer sua tarefa
de conhecer normas, utilize o método normológico, o hipotético-dedutivo ou
lógico-transcendental, empregando um ou outro conforme a natureza do fundamento
de validade.
O tema
central é o direito que é o objeto da ciência jurídica. É indispensável que se
determine o “ser” do direito para que se fixe a faceta ou aspecto que a ciência
jurídica o abordará e, como isso não pode ser feito pela próprio Jurisprudência[55].
Segundo
Kelsen (o direito é uma) "ordem normativa de coerção", (reportada
a uma) "norma fundamental", "a que deve corresponder uma
constituição efetivamente estabelecida e, em termos gerais, eficaz, bem como as
normas que, de acordo com essa constituição, foram efetivamente estabelecidas e
são, em termos gerais, eficazes." É também uma "técnica
específica de organização social"(grifo meu).
O
Direito é a norma das ações humanas na vida social, estabelecida por uma
organização soberana e imposta coativamente à observância de todos. (Ruggiero e
Maroi) (grifo meu).
De
acordo com Max Weber, o direito é "Um ordenamento chama-se [...]
direito quando é exteriormente garantido pela possibilidade de coerção (física
ou psíquica), através de um comportamento, dirigido a forçar a observância ou a
punir a violação, de um grupo de pessoas disso especialmente incumbido".
(grifo meu).
Já,
para Gustave Radbruch: O Direito é vontade de justiça. Para Rudolf von
Ihering afirmou que: “o direito é a soma das condições de existência social,
no seu amplo sentido, assegurada pelo Estado através da coação".
(grifo meu)
Para
Immanuel Kant, "o direito é o conjunto das condições segundo as quais o
arbítrio de cada um pode coexistir com o arbítrio dos outros, de acordo com uma
lei geral de liberdade". (grifo meu)
Para
Dworkin, (o direito são) "os padrões que determinam os direitos e
deveres que um governo tem o dever de reconhecer e fazer respeitar, pelo menos
em princípio, através das instituições comuns dos tribunais e da polícia."
(grifo meu)
Luhmann
(o direito é) "a estrutura de um sistema social respeitante à
generalização congruente de expectativas normativas de comportamento." (grifo
meu)
Para
Robert Alexy "O direito é um sistema de normas que (1) ergue uma
pretensão de justeza, (2) compõe-se da totalidade das normas que pertencem a
uma constituição socialmente eficaz, em termos gerais, e não são extremamente
injustas, bem como da totalidade das normas que são estabelecidas em
conformidade com esta constituição, apresentam um mínimo de eficácia ou
possibilidade de eficácia social e não são extremamente injustas, e (3) ao qual
pertencem os princípios e os restantes argumentos normativos em que se apoia
e/ou deve apoiar o processo de aplicação do direito para cumprir a pretensão de
justeza."(grifo meu)
Convém
frisar que a criação do direito[56] não é exclusiva obra do
legislador[57],
mas também, e principalmente, do jurista, do magistrado, do advogado, enfim, de
todos os operadores do direito. A lei não esgota o direito, assim como a
partitura não esgota a música. Enfim, a finalidade do Direito, conforme é
doutrinariamente enfatizado, é a realização da Justiça.
Segundo
Perelman, ser justo é atribuir a cada qual o que lhe cabe, que, em sentido
jurídico, é aquilo que a lei lhe atribui. Ser justo é aplicar as leis do país;
daí decorrendo que, a depender de cada legislação, existirá um critério
particular de distribuição de justiça.
Na contemporaneidade, o Direito passou da opção entre um assumido e ortodoxo positivismo legalista e um certo quixotesco jusnaturalismo de viés clássico, para um sutil e tênue juspositivismo que não deixa de imperar soberanamente sobre a prática, e um pós-modernismo por vezes cáustico, cujas aportações construtivas parecem indicar que há muita crítica e desconstrução. Assim, repleto de conceitos jurídicos indeterminados e, um emaranhado de princípios jurídicos e, ainda, uma hermenêutica cada vez mais constitucional, deram-se as possibilidades de legitimação de valores razoáveis e proporcionais nas normas produzidas nas decisões judiciais.
Referências:
ABBAGNANO,
Nicola. Dicionário de Filosofia. Tradução da 1ª edição de Alfredo Bosi. Revisão
da tradução e tradução dos novos textos Ivone Castilho Benedetti. 5ª
edição. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
ALEXY,
Robert. Teoria dos Direitos Fundamentais. São Paulo: Editora Malheiros,
2008.
AUBRY,
C. e RAU, F. Cours de droit civil français d’après la méthode de
Zachariae. 6ª ed., 1º tomo. Paris: Marchal & Billard, 1936 (1869).
BEVILAQUA,
Clóvis. Teoria geral do direito civil. Brasília: Ministério da Justiça,
1972 (1928).
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Notas:
[1] A República é um diálogo socrático escrito por Platão e narrado em primeira pessoa por Sócrates. A conversa tem como ponto de partida um esquadrinhamento pela definição do que abarca a justiça. Também contém um diálogo entre Sócrates e Glauco sobre as vantagens e prejuízos da velhice. Foi escrita por volta de 380 a.C., e é particularmente rica em termos filosóficos, políticos e sociais. Em questão, está a busca de uma fórmula que garanta uma harmoniosa administração à uma cidade, mantendo-a livre da anarquia, dos interesses e disputas particulares e do caos completo. O local do diálogo é a casa de Polemarco, irmão de Lísias e Eutidemos, filho do velho Céfalo. Os principais personagens do diálogo são Sócrates; os dois irmãos de Platão, Glauco e Adimanto; Nicerato, Polemarco, Lísias, Céfalo e Trasímaco. Nos livros II a V os diálogos evoluem para a definição dos princípios da justiça, ou seja, o que constitui a verdadeira justiça administrada à população. O primeiro princípio da justiça seria a solidariedade social, forma pela qual a pessoa contribui para o bem-estar coletivo. O segundo é o desprendimento, dever consciente de pessoas realmente dispostas a prover o bem comum. Deste princípio surgiria a necessidade de uma classe social distinta das atividades econômicas, a dos guardiões, reis-filósofos que sustentariam a felicidade do Estado. A sociedade então, ficaria dividida em três classes: os chefes dos guardiões, os próprios guardiões, ou militares, e os produtores e artesãos. A classe dos guardiões seria constituída por homens e mulheres, em iguais condições, mantidos pelo estado, sem direito à riqueza, não poderiam constituir família.
[2]
Para Cícero, o direito natural é uma razão universal, e, por isso, comporta, ao
contrário de Aristóteles, a sua anunciação tal qual um rol de normas válidas a
todos, em todo o universo. Sendo um catálogo de deveres e ações, o justo para
Cícero aproxima-se grandemente da moral.
[3]
Santo Agostinho (354-430) foi um filósofo, escritor, bispo e importante teólogo
cristão do norte da África, durante a dominação romana. Suas concepções sobre
as relações entre a fé e a razão, entre a Igreja e o Estado, que dominaram toda
a Idade Média. Santo Agostinho, conhecido também como Agostinho de Hipona,
nasceu em Tagaste, na cidade da Numídia (hoje Argélia), no norte da África,
região dominada pelo Império Romano, no dia 13 de novembro de 354. Sua infância
e adolescência transcorreram principalmente em sua cidade natal, em um ambiente
limitado por um povoado perdido entre montanhas. Seu pai era pagão e sua mãe uma cristã devota
que exerceu grande influência sobre a conversão do filho. Santo Agostinho teve
papel importante na fixação da hierarquia na Igreja Católica e fez a síntese
entre a filosofia grega e o pensamento cristão. Fixou a ideia da vida interior
do homem como o palco essencial da construção da identidade.
[4]
Isidoro de Sevilha, em latim: Isidorus Hispalensis (560-636) serviu como
arcebispo de Sevilha por mais de três décadas, sendo considerado, segundo o
historiador do século XIX Montalement, num frase muito citada, "o último
acadêmico do mundo antigo". Sua fama depois de morto baseou-se em sua Etymologiae,
uma enciclopédia que juntou fragmentos de muitos livros antigos que, não fosse
isso, teriam sido completamente perdidos.
[5]
Tomás de Aquino, em italiano Tommaso d'Aquino (1225-1274) foi frade
católico italiano da Ordem de Pregadores (dominicano) cujas obras tiveram
grande influência na teologia e na filosofia, particularmente, na tradição
conhecida como Escolástica, e que, por essa razão, é conhecido por "Doctor
Angelicus, Doctor Communis, e Doctor Universalis. O nome "Aquino" é
referência ao condado de Aquino, uma região que foi propriedade de sua família
até 1137. Foi o mais relevante proponente clássico da teologia natural e o pai
do tomismo. E, sua influência sobre o pensamento ocidental é considerável e
presente mesmo na filosofia moderna que foi concebida como sendo
desenvolvimento ou oposição de suas ideias, particularmente, na ética, na lei
natural, metafísica e teoria política. Tomás abraçou as ideias de Aristóteles a
quem se referia como "o Filósofo" e tentou sintetizar a filosofia
aristotélica com os princípios do cristianismo. Suas obras mais conhecidas
foram a Suma Teológica ou Summa Theologiae, a Suma contra os Gentios ou Summa
contra Gentiles. É venerado como santo pela Igreja Católica e, é tido como
professor modelo para os que estudam para o sacerdócio por ter atingido a
máxima expressão tanto da razão natural quanto da teologia especulativa. Também
foi proclamado como Doutor da Igreja por Pio V em 1568.
[6]
Alberico Gentili (1552- 1608) foi jurista italiano que foi também diplomata na
Embaixada de Espanha em Londres, também trabalhou como professor de direito
civil na Universidade de Oxford por vinte e um anos. Reconhecido como um dos
fundadores do direito internacional.
[7]
Hugo Grotius (1583-1645) foi um jurista holandês, considerado um dos fundadores
do Direito Internacional. Foi também diplomata, poeta, dramaturgo e
historiador. É o autor da obra “O
Direito da Guerra e Paz”. Desenvolveu a doutrina da guerra justa, já
estabelecida por St. Agostinho. Hugo Grotius (1583-1645) conhecido também por
(Hugo Grócio) e (Hugo de Groot) nasceu em Delft, nos Países Baixos, no dia 10
de abril de 1583. Criança precoce começou a escrever poesia com apenas oito
anos. Com onze anos entrou para a Universidade de Leiden, onde seu pai era
curador, para estudar Direito. Com 15
anos acompanhou uma missão diplomática à corte parisiense de Henrique IV. Com
16 anos publicou obras sobre a filosofia grega e latina. Nesse mesmo ano, foi
nomeado para o Tribunal de Haia, quando pronunciou seu primeiro discurso.
[8]
John Locke (2632-1704) se destacou em seus estudos de filosofia política e
deixou grande contribuição ao desenvolvimento do liberalismo, principalmente da
noção de Estado de Direito. Foi um dos principais empiristas britânicos,
juntamente com Thomas Hobbes, George Berkeley e David Hume. E, a sua filosofia
reconhece a experiência como única fonte válida de conhecimento. John Locke
negava radicalmente que existiam ideias inatas, tese defendida por Descartes.
Argumentava ele, que quando se nasce, a mente é uma página em branco que a
experiência vai preenchendo. Sua teoria
do conhecimento foi exposta em sua obra fundamental: “Ensaio Sobre o
Conhecimento Humano”.
[9]
Neminem laedere é uma expressão em língua latina que significa, após
tradução para a língua portuguesa, "a ninguém ofender". No direito é representado como um princípio,
que rege a chamada responsabilidade aquiliana, oriunda do descumprimento direto
da lei (artigos 186 e 927 do Código Civil Brasileiro). O princípio alterum non
laedere ou neminem laedere, caracteriza-se, principalmente, pela sua
antiguidade e atualidade paralelas, fato que se perceberá ao longo dos tópicos
relacionados ao tema. O princípio em estudo provém do preceito de Ulpiano, e
consta no Digesto: “Iuris praecepta sunt haec: honeste vivere,
alterum non laedere, suum cuique tribuere”. “Os preceitos do direitos são
estes: viver honestamente, não lesar a outrem, dar a cada um o que é seu.”
Pelas palavras do jurisconsulto romano percebe-se que a realidade da vida em
sociedade atual não se difere muito daquela época. Aliás, muito antes de
Ulpiano, Moisés, ao conduzir o povo hebreu pelo deserto, recém liberto da
escravidão do Egito, recebeu das mãos do próprio Deus o Decálogo ou Dez
Mandamentos, dos quais, seis destinados a regular a vida em sociedade, conforme
se verifica nos livros de Êxodo, capítulo 20 e Deuteronômio, capítulo 5.
[10] Christian Thomasius (1655-1728) é considerado o precursor do Iluminismo na Alemanha. E, contribuiu significativamente com seu direito penal humanitário orientado pelo movimento para a abolição da caça às bruxas e tortura. Em 1687, desafiou a prática comum acadêmica de sua época ao dar suas aulas em alemão ao invés de latim, além de dar a lição intitulada "Como alguém deveria imitar o modo de vida francês”, se referindo ao costume dos franceses de usarem sua língua nativa, não só no dia a dia, mas também no meio acadêmico. De acordo com o estudioso Klaus Luig, esse evento marca o verdadeiro começo do Iluminismo na Alemanha. No ano seguinte, começou a publicar um periódico mensal (Scherzhafte und ernsthafte, vernüftige [sic] und einfältige Gedanken über allerhand lustige und nutzliche Bücher und Fragen) no qual ridicularizava o que julgava como fraquezas pedantes dos letrados, ficando ao lado dos Pietistas na controvérsia destes com os luteranos ortodoxos e defendendo o casamento entre calvinistas e adeptos de Lutero; também publicou um volume sobre direito natural, no qual enfatizava a razão natural e uma redação, na qual, novamente, defendia o casamento entre luteranos e cristãos reformados. Apesar de não ter sido um profundo pensador filosófico, Thomasius pavimentou o caminho para grandes reformas na filosofia, assim como no Direito, na Literatura, na Filosofia na Teologia. Adotou como missão introduziu um ponto de vista racional, perpassado pelo senso comum, nas ciências humanas e divinas, trazendo-as para o dia a dia. Portanto, foi um dos responsáveis pela criação de um novo período na sociedade alemã, e, juntamente com Ludwig Spittler, foi parte da vanguarda do período moderno da história eclesiástica protestante na Alemanha. Lutou constantemente pela liberdade de pensamento expressão na esfera religiosa, no meio público e acadêmico.
[11]
A teoria do mínimo ético foi desenvolvida pelo jurista Georg Jellinek
(1851-1911) e aperfeiçoada por Jeremy Bentham (1748-1823). Essa teoria consiste na ideia de que todas as
normas jurídicas são normas morais. Desse modo, considera-se que as normas morais
mais relevantes para a sociedade são transformadas, pelo Estado, em normas
jurídicas. Assim o direito representa apenas o mínimo de preceitos morais
necessários para que a sociedade possa viver em harmonia. A Teoria do Mínimo
Ético pode ser representada graficamente a partir de dois círculos concêntricos
no qual o maior representa a moral e o menos o direito. A moral, em costume, é
cumprida, de maneira espontânea, mas como as violações são inevitáveis, é
indispensável que um mínimo ético seja declarado obrigatório e armado de
coercibilidade para fazer cumprir, impedindo assim, a transgressão daqueles
dispositivos que a comunidade considera necessário para o bom convívio. Segundo
Miguel Reale, a teoria afirma que é necessário "armar" de forças a
certos preceitos éticos, pois nem todos podem ou querem de maneira espontânea
cumprir as obrigações morais, sendo estas indispensáveis a paz social. É
possível citar como exemplo de uma norma moral que necessita ser dotada de
coercibilidade para ser cumprida, é a proibição do ato de fumar em ambientes
fechados e sem ventilação. Dessa forma, não é direito algo diverso da moral,
mas é uma parte desta, armada de garantias específicas.
[12]
Thomas Hobbes (1588-1679) foi um teórico político e filósofo inglês. Sua obra
de maior destaque é "Leviatã", um tratado político cuja ideia central
é a defesa do absolutismo e a elaboração da tese do contrato social. Ainda em
Paris, em 1651, Hobbes publicou “Leviatã”, onde defende a monarquia
absolutista. A razão disto deriva da visão que ele tinha da sociedade, segundo
ele sempre ameaçada por uma guerra civil, onde todos os seus integrantes vivem
em uma situação de permanente conflito: “uma guerra de um contra todos e de
todos entre si”. O estado da natureza, segundo ele, não tinha nada de
harmonioso. O mundo antigo dos primeiros homens era um mundo de feras, onde “o
verdadeiro lobo do homem era o próprio homem”. Para se chegar a uma sociedade
civil era necessário que todos, por meio de um “contrato social”, concordassem
em transferir as suas liberdades naturais a um só homem: o rei, somente ele
deveria deter o monopólio da violência. Somente o rei deve ter poderes que lhe
permitam impor sua vontade sobre todos para o bem geral da comunidade.’’ No seu
ponto de vista, não existe o direito à propriedade, nem à vida, nem à
liberdade, que não sejam garantidos pela autoridade real. Rebelar-se contra
ela, significa regredir no reino animal, onde impera sempre a violência, pondo
em risco as conquistas da civilização. A obra desagradou a Igreja Católica e o
Governo Francês, por ser muito radicalista e, sob essa pressão foi obrigado a
deixar o país.
[13]
Para Kant, Direito é o que regula as relações entre indivíduos e moral é o
conjunto de preceitos internos de cada indivíduo. “O direito é o conjunto de condições
por meio das quais o arbítrio de um pode estar em acordo com o arbítrio de um
outro, segundo uma lei universal da liberdade”.
[14]
A Constituição inspirada pela Revolução Jacobina efetivava os direitos
fundamentais abstratamente declarados em 1789. Liberdade e igualdade são
transformadas em direitos desdobrados na garantia do sufrágio universal, no
direito de insurreição, nos direitos ao trabalho e na seguridade social e o
mais importante: no ideal de que a felicidade de toda a sociedade é o objetivo
do governo. Além do mais, os jacobinos aboliram os privilégios remanescentes do
antigo regime e tiveram coragem e a glória de decretar o fim da escravidão nas
colônias francesas, diferentemente dos revolucionários de 1789. Os jacobinos
também socializaram a propriedade ao defenderem espaços nas cidades e nos
campos para pequenos e médios proprietários, pequenos camponeses e lojistas e
fomentaram, ainda, o rápido desenvolvimento econômico.
[15]David
Hume foi filósofo, historiador, ensaísta e diplomata escocês, um dos mais
importantes filósofos modernos do Iluminismo. Seus pensamentos foram
revolucionários o que o levou a ser acusado de heresia pela Igreja Católica por
ter ideias associadas ao ateísmo e ao ceticismo. Por esse motivo, suas obras
foram acrescidas no "Índice dos Livros Proibidos" (Index Librorum
Prohibitorum). Inspirado nas correntes filosóficas do empirismo e do
ceticismo, Hume foi um crítico do racionalismo cartesiano em que os
conhecimentos estavam associados à razão. Suas ideias foram inspiradoras para
diversos filósofos posteriores, como Immanuel Kant e Augusto Comte.
[16]
É o estudo dos conceitos fundamentais e universais do direito, ou seja, das
características que são comuns a todos os sistemas jurídicos. Esta busca uma
visão compreensiva sobre a epistemologia (origem, natureza e limites) do
direito, suas ideologias, metodologias e conceitos gerais, e também sobre a
natureza e aplicações das leis. A despeito do viés unificador, a TGD está longe
de ser uma visão uniforme, pois inúmeras escolas de pensamento dão-lhe
interpretações díspares e concorrentes. Em crítica do jusfilósofo Hans Kelsen,
as teorias do direito se pretendem "científicas", ou seja, exatas e
empíricas, mas de fato são parciais aos julgamentos éticos e morais de seu meio.
Assim, a Teoria Geral do Direito é tão ciência quanto filosofia, sem ser
inteiramente nenhum dos dois, portanto suas conclusões dependem da linha de
raciocínio que o estudioso adotar.
[17]
Samuel Pufendorf (1632-1694) foi jurista alemão. Ao se tornar nobre, quando fora
elevado a barão, poucos meses antes da sua morte 1684, seu nome passou a ser
Samuel von Pufendorf. Foi um dos
expoentes da corrente jusnaturalista e criou o transpersonalismo, e sua obra
influenciou de forma duradoura o ensino do Direito na maior parte da Europa,
com especial destaque para os países de tradição católica, entre os quais
Portugal, onde suas obras foram adotadas como manuais na Universidade de
Coimbra. A visão transpersonalista traz que o Estado é ente moral. E, prevê a
divisão entre Estado e as pessoas que corporalizam esse mesmo ente, pessoa
física do soberano. Portanto, o Estado é separado das pessoas físicas.
Subscreveu a noção de que a soberania não se cria na sociedade, não é criada
por ninguém, quando muito, se institui.
[18]
É um importante evidenciar que o objetivo de Hegel não é mostrar as
configurações históricas e/ou uma concepção particular de Estado, mas como um
conceito pensado, “ideia”, especulação filosófica. Como expoente nesta
investigação temos Rousseau que colocou a “vontade geral” como princípio
pertencente e ao pensamento, tomou o Estado como uma instituição derivada de um
contrato de vontades individuais (mera associação). Estamos colocando um dos
tópicos principais da doutrina contratualista francesa para mostrar a discrepância
entre o seu ideal e o mundo dos fatos. Estamos diante da vontade arbitrária,
opinião facultativa dos indivíduos (mera liberdade livre-arbítrio) chegando à
conclusão de que esta pode ser suprimida a qualquer instante, destruindo a
totalidade ética do Estado.
[19]
Santi Romano (1875-1947) foi jurista italiano com atuação nas áreas da teoria
do direito, do direito constitucional, do direito administrativo e do direito
internacional. Advogado italiano.
Catedrático direito administrativo da Universidade de Camerino e direito
constitucional nas universidades de Pisa Modena e ocupa o mestre cátedra mesmo
mais tarde na Universidade de Milão. Ele foi presidente do Conselho de Estado e
membro do Senado. Escreveu numerosas obras, entre as quais princípios de
direito administrativo (1902), O jurídico ordenação (1918) e Curso de Direito
Constitucional (1926).
[20] O Corpus Juris Civilis (Corpo de Lei Civil) é uma obra fundamental da jurisprudência, publicada por ordem do imperador bizantino Justiniano I. O livro é composto por 4 partes: o Código de Justiniano, o Digesto ou Pandectas, composto pela jurisprudência romana; Institutos, os princípios fundamentais do direito; e as Novelas ou Autênticas, com leis formuladas por Justiniano. O CJC é a coleção de constituições imperiais (Codex), a compilação das obras dos juristas romanos (Digesto ou Pandectas), o curso de direito introdutório (Institutas) e as novas constituições imperiais de Justiniano (Novellae). Justiniano I (483-565 d.C.) foi o imperador romano do oriente (imperador bizantino) que ordenou a compilação do direito romano, por meio da constituição imperial Deo Auctore. Antecedentes: Codex Gregorianus, Codex Hermogenianus, Codex Theodosianus Discussão sobre as interpolações, que foram as possíveis alterações que as comissões justinianéias teriam feio às obras dos juristas anteriores. Principais juristas citados no Digesto: Ulpiano, Paulo, Gaio, Modestino e Papiniano. Estrutura das entradas do Digesto – Nome do jurista, livro e localização na obra.
[21]
Professores da USP editam o “Pandectas”, de Justiniano Maior obra jurídica do
imperador bizantino é lançada pela primeira vez em língua portuguesa Disponível
em: https://jornal.usp.br/cultura/professores-da-usp-editam-o-pandectas-de-justiniano/
[22]
O trabalho resultou em 50
livros na versão final, que foram reunidos sob o nome de Pandectas ou
Digesto e promulgados por Justiniano no dia 16 de dezembro de 533. Em vigor por
quase mil anos em Constantinopla até a tomada da cidade pelos turcos, em 1453,
essa obra influencia o direito ocidental até hoje. No Brasil, ela é a base de
aproximadamente 4/5 do Código Civil, de 2002.
[23]
Para Norberto Bobbio, em sua obra intitulada "O positivismo jurídico,
lições de filosofia do direito", quando passa a tratar da conclusão
histórica acerca do juspositivismo, afirma: (...) a corrente doutrinária do
juspositivismo entende o termo "direito positivo" de maneira bem
específica, como direito posto pelo poder soberano do Estado, mediante normas
gerais e abstratas, isto é, como "lei". Logo, o positivismo jurídico
nasce do impulso histórico para a legislação, se realiza quando a lei se torna
a fonte exclusiva ou, de qualquer modo, absolutamente prevalente - do direito,
e seu resultado último é apresentado pela codificação. (Bobbio, 1995. p.119).
[24]
Direito objetivo é o complexo de normas jurídicas que regem o comportamento
humano, as relações entre as pessoas e entre elas e o Estado. Direito posto. É
a norma de agir (norma agendi), abrange o direito existente e concretizado em
forma de leis. Compreende a série de direitos existentes e implantados.
Conjunto de normas que a todos se dirige e a todos vincula. Direito subjetivo
refere-se à posição do sujeito frente ao Direito Objetivo. Facultas agendi. É o
poder que a ordem jurídica confere a alguém de agir e de exigir de outrem
determinado comportamento. Permissão dada por meio da ordem jurídica para um
sujeito fazer ou deixar de fazer alguma coisa. Direito de forma concreta.
Hans Kelsen nega a
existência autônoma do direto subjetivo. Estabelece que o direito deve ser
visto como um sistema de normas e o direito subjetivo nada mais é do que o
reflexo de um dever jurídico, que existe por parte dos outros em relação ao
indivíduo de que se diz ter um direito subjetivo. Como o dever jurídico é a
própria norma, o direito subjetivo é o fenômeno normativo colocado à disposição
do sujeito. Três teorias que procuram definir a natureza do direito subjetivo:
1) TEORIA DA VONTADE de Savigny e Windscheid – direito subjetivo é o poder da
vontade reconhecido pela ordem jurídica (críticas – há direitos sem vontade do
titular; há casos em que há uma vontade real, porém o que o ordenamento
jurídico protege não é a vontade do titulas, mas sim seu direito; o direito
pode existir sem a vontade. 2) TEORIA DO INTERESSE de Ihering – direito
subjetivo é o interesse juridicamente protegido (críticas: há interesses
protegidos que não se confundem com direitos subjetivos; direitos subjetivos
onde não existe interesse por parte do titular; confunde o interesse seria o
objeto que interessa, o que não tem sentido. 3) TEORIA MISTA de Jellinek,
Saleilles e Michoud – direito subjetivo seria o poder da vontade reconhecido e
protegido pela ordem jurídica, tendo por objeto um bem ou interesse. Críticas:
mesma acima. Direito não é objeto.
[25]
A origem da dicotomia Direito Público e Direito Privado está no Direito Romano,
onde sua base é um trecho de Ulpiano (Digesto) que afirma: “O direito público
diz respeito ao estado da coisa romana, à polis ou civitas, o privado à
utilidade dos particulares”. A questão relacionada aos critérios de distinção
entre o direito público e o direito privado sempre foi muito debatida. Franco
Montoro aponta que não existe um critério perfeito, o que se prova pela
multiplicidade de critérios insatisfatórios que, ao longo do tempo, vêm sendo
propostos. O jurista brasileiro menciona ainda que alguns autores, como
Holiger, chegaram a catalogar mais de cem critérios.2 De todos os critérios
utilizados, três costumam ter mais destaque: o do interesse, do sujeito e da
subordinação. Além deles, também será feita menção à teoria da imputação, que
não deixa de ser uma derivação da teoria da subordinação. Ao final, serão
citados autores que negam a utilidade na distinção e os que defendem haver uma
tricotomia.
[26]
A discussão sobre o método possui essa finalidade. Ela pode se apresentar de
duas maneiras distintas: a) na configuração e explicitação de uma teoria geral
do direito que possibilite o acesso (conhecimento) ao fenômeno jurídico e à
explicação dele; b) na constituição de uma dogmática do direito ou, na
expressão de Larenz, de uma “ciência dogmática do direito”, que possui como
objeto a análise da apreciação judicial de casos, possibilitando, assim, a
solução de questões jurídicas.
[27]
Karl Engish (1899-1990) foi jurista e filósofo do direito alemão. Foi descrito
por Hans Joachim Hirsch como um dos notáveis teóricos de direito penal do
século XX. Durante seu tempo em Gießen, Karl Engisch, como seu irmão
Ludwig Engisch (1900-1957),[6] foi um membro da fraternidade "Corpo de
Hassia". Em 1924, Karl Engisch recebeu seu doutorado. Supervisionado por
Otto Eger, a sua dissertação abordou a teoria imperativa, um aspecto da
Filosofia Jurídica, e uma teoria que os alemães imputam a Jeremy Bentham e John
Austin. Ele realizou um Rechtsreferendariat (equivalente a um estágio)
entre 1924 e 1927, trabalhando no escritório de advocacia de seu pai, onde
trabalhava nos casos sobre direito penal. Em 1929, ele recebeu sua habilitação
em Gießen. Seu trabalho foi supervisionado pelo criminólogo Wolfgang Mittermaier
(1867-1956), composto por uma destacada monografia sobre a intenção criminosa e
a negligência, que ainda hoje, apesar das dramáticas mudanças de direção na
evolução das ciências criminais no decorrer de décadas, continua a ser
considerado por seus admiradores referência de trabalho em seu campo. Uma forte
influência durante esse período foi o criminologista de Munique Ernst von
Beling, à quem Engisch posteriormente dedicou seu "Logische Studien zur
Gesetzesanwendung" ("Estudos Lógicos sobre a Aplicação da
Lei"). Ele aceitou posições de professor de direito penal em Frieburg iB
(1929), e Munique (1932). Em outubro de 1933, ele retomou sua antiga posição de
professor de direito penal em Gießen. Em suas palestras, Engisch sabia expandir
os horizontes de seus assuntos para além do âmbito comumente aceito na
faculdade de direito, introduzindo conceitos das esferas da filosofia e da
literatura. Ele frequentemente citava Goethe, Kant, Thomas Mann e Schopenhauer.
[28] Helmut Coing (1912-2000) foi importante estudioso de direito alemão e professor universitário em Frankfurt am Main e, por muitos anos foi Chanceler de Ordem Pour Le Mérite para ciência e as artes. O foco de seu trabalho foi a história do direito privado europeu, especialmente da Idade Média, a história do direito na Alemanha e a filosofia do direito. Em 1968 foi eleito membro correspondente da Academia de Ciências de Göttingen e da Academia de Ciências da Baviera. Em 1972 ele se tornou um membro correspondente da Academia Britânica. De 1970 a 1973 ele foi presidente da seção de humanidades da Sociedade Max Planck e de 1970 a 1972 também chefe da Comissão de Estatuto e, finalmente, de 1978 a 1984 foi vice-presidente da Sociedade Max Planck. Em 1984, Coing, que já havia sido aceito na Ordem Pour le Mérite para a Ciência e as Artes em 1973, foi eleito Chanceler da Ordem. Ele ocupou este cargo até 1992. Coing é um cientista homenageado por causa de sua pesquisa. Em 1958 foi condecorado com a placa Goethe pela cidade de Frankfurt am Main. Em 1966 ele se tornou oficial da Legião de Honra Francesa. Em 1973, tornou-se membro da Ordem Pour le Mérite para a Ciência e as Artes. Um ano depois, ele foi agraciado com a Grande Cruz do Mérito com Estrela da República Federal da Alemanha. Em 1990 recebeu a Cruz do Comandante da Ordem do Mérito da República da Itália e no mesmo ano a Grande Cruz Federal do Mérito com Estrela e Fita de Ombro e a Ordem do Mérito de Hesse. Ele foi premiado com doutorado honorário concedido pelas Universidades de Lyon (1959), Montpellier (1959), Viena (1965), Aberdeen (1968), Bruxelas (1975) e Uppsala (1977). Em 2008, o Instituto Max Planck de História do Direito Europeu em Frankfurt am Main concedeu o Prêmio Helmut Coing pela primeira vez. O prémio visa dar a jovens investigadores a oportunidade de trabalhar no instituto durante 4 a 5 meses, no final de uma dissertação ou habilitação no domínio da história do direito europeu. A bolsa é divulgada mundialmente a cada três anos.
[29]
A Jurisprudência dos conceitos (Begriffsjurisprudenz) também reivindica
um ideal de sistema para o Direito. Seus mais representativos expoentes foram
formados no ambiente do historicismo de Savigny. Todavia, o formalismo
conceitual da Jurisprudência dos conceitos não se confunde com aquilo que foi
produzido pela escola histórica. O método formalista-conceitual da
jurisprudência dos conceitos representa o apogeu daquilo que Franz Wiacker
chama de “ciência das pandectas”, sendo a face mais evidente do
movimento nomeado de pandectismo. Os mais importantes autores dessa corrente
são, certamente, Puchta e Bernhard Windscheid. A jurisprudência dos interesses
tem sua origem na filosofia racionalista dos séculos XVII e XVIII ou no
historicismo. Seu maior corifeu teórico foi Philipp Heck que era líder na
Escola de Tübingen. Na origem desse movimento estão outras duas posturas
teóricas que, cruzadas servem de impulso para Heck e seus seguidores: trata-se
do pensamento professado segundo Ihering e dos postulados defendidos por
chamado movimento direito livre. Outro elemento, que também oferece as bases
para a Jurisprudência dos interesses, é a eclosão do movimento do direito
livre. E, teve em Ihering uma espécie de fiador intelectual, pelo menos em sua
vertente germânica. Duas curiosidades ceram esse movimento: de um lado sua
brevidade e seu ápice foi entre os anos de 1905 e 1914; por outro lado, sua internacionalização,
uma vez que o movimento começa com doutrinador francês François Gény e, passa
pelos doutrinadores alemães com destaque para Hermann Kantorowicz e,
disseminou-se para várias partes do mundo com fim da primeira grande guerra
mundial e ascensão do nacional socialismo na Alemanha. Houve também relações
com os movimentos nos EUA como se pode notar pelas doutrinadas de Cardoso,
Holmes e Pound.
[30]
Rudolf Stammler (1856-1938) foi filósofo do direito alemão. Foi inspirador da
corrente neokantiana na seara jurídica, conferiu à ciência do direito e
atribuiu-lhe metodologicamente os instrumentos do "fim e dos meios"
contrapostos aos de "causa e efeito" das ciências naturais. O mérito
de Stammler reside na sua tentativa de superar o positivismo da sua época. Foi
autor da teoria do chamado Direito natural de conteúdo variável.
[31]
Giorgio Del Vecchio (1878-1970) foi relevante filósofo jurídico italiano do início
do século XX. Entre outros, influenciou as teorias de Norberto Bobbio. É famoso
por seu livro Justiça. Entre os maiores intérpretes do neocantantismo italiano,
Giorgio Del Vecchio, como seus colegas alemães, criticou o positivismo
filosófico, afirmando que o conceito de direito não poderia ser derivado da
observação de fenômenos jurídicos. Nesse sentido, ele entrou na disputa entre
filosofia, teoria geral e a sociologia do direito que estava em fúria na
Alemanha, redefinindo a filosofia do direito. Em particular, ele atribuiu a ela
três tarefas: uma tarefa lógica que consistiria na elaboração do conceito de
direito; uma tarefa fenomenológica, consistindo no estudo do direito como um
fenômeno social; uma tarefa deontológica, que consiste em "buscar e avaliar
a justiça, isto é, o direito como deveria ser".
[32]
Jean Charles Florent Demolombe (1804-1887) foi jurista francês, foi conhecido
por seu comentário ao Código Civil, em favor de cuja conclusão. Recusou uma
nomeação para o Tribunal de Cassação. O comentário ao codex originalmente fora
planejado para abranger vinte volumes. NO entanto, não conseguiu atender aos
seus próprios padrões de exigências mesmo após a publicação de trinta e um
volumes de 1845 a 1882. O comentário cobriu somente a metade do Código. E, após
seu óbito, o trabalho foi continuado por Guillouard, mas de forma bem reduzida.
O comentário monumental fez com que Demolombe fosse declarado como o maior
jurista francês de sua época, mas seus críticos se ativeram à excessiva atenção
da obras aos detalhes bem coo sua negligência da estrutura dogmática do Código
além de excessiva elaboração e estilo descritivo.
[33]
Charles Aubry (1803-1883) foi jurista francês. Ficou famoso nos círculos
jurídicos franceses por sua única publicação feita junto com Frédéric Charles
Rau, o Cours de droit civil français (1839-46) que representou a
primeira síntese sistemática do direito civil francês abandonou a estrutura do
Código Civil. Introduziu noções jurídicas alemãs, tais como as regras de
evidência, bem como as teorias de propriedade conjunta e a defesa da lei
francesa.
[34]
Friedrich Carl von Savigny foi um dos mais respeitados e influentes juristas
alemães do século XIX. Foi o maior nome da Escola Histórica do Direito, seu
pensamento teve enorme influência no direito alemão, bem como no direito dos
países de tradição romano-germânica, especialmente, no direito civil. Na
política alemão, foi Ministro da Justiça entre 1842 a 1848, tendo renunciado
devido à revolução. Em 1803, publicou seu famoso tratado, Das Recht des
Besitzes ("Tratado da Posse"), que foi imediatamente saudado pelo
grande jurista Thibaut como sendo uma obra-prima e obteve uma rápida aceitação
europeia, permanecendo, ainda hoje, um marco na história do direito. Em 1804
Savigny se casou com Kunigunde Brentano, conhecida por "Gunda", a
irmã de Bettina von Arnim e Clemens Brentano, o poeta. No mesmo ano, iniciou
uma demorada viagem pela França e sul da Alemanha à procura por novas fontes do
direito romano.
[35]
A Escola Histórica do Direito foi uma escola de pensamento jurídico -
precursora do positivismo normativista que apareceria com a Jurisprudência dos
conceitos - que surgiu nos territórios alemães no início do século XIX e
exerceu forte influência em todos os países de tradição romano-germânica.
[36]
René David (1906-1990) foi jurista francês. Combatente na Segunda Guerra
Mundial, acabou capturado e feito prisioneiro no campo de prisioneiros Oflag
X-B, na Alemanha. Após fugir, retornou a Grenoble, onde logo se juntou a La
Résistance. Em batalha na Córsega foi gravemente ferido, tendo o episódio
lhe imposto sérias limitações motoras pelo resto da vida. Findada a guerra,
assumiu a cadeira de Direito Comparado na Universidade de Paris, lá
permanecendo até 1968, quando o levante estudantil de maio de 1968 engatilhou
uma ampla reestruturação na universidade, que culminaria em sua divisão em
trezes instituições independentes dois anos mais tarde. Diante da situação de
incerteza, optou por se mudar para Aix-en-Provence, passando a ensinar na
universidade local, onde permaneceria até se aposentar da docência, em 1976.
[37]
Pierre Marie Nicolas Léon Duguit (1859-1928) foi jurista francês especializado
em Direito Público. Duguit é responsável por influenciar significativamente a
teoria do Direito Público. Seu trabalho jurídico caracteriza-se por uma crítica
das teorias então existentes do Direito e pelo estabelecimento da noção de
serviço público como fundamento do Estado e seu limite. Desta forma, as regras
jurídicas são constituídas por normas que se impõem naturalmente e igualmente a
todos. Sobreleva-se a governantes e governados o dever de se absterem de
qualquer ato incompatível com a solidariedade social. Na visão de Duguit, o
Estado não é um poder soberano, mas apenas uma instituição que cresce da
necessidade de organização social da humanidade. Os conceitos de soberania e
direito subjetivo são substituídos pelos de serviço público e função social. No
Brasil, a função social da propriedade foi elevada ao status de princípio
constitucional fundamental (artigo 5º, inciso XXIII), constando ainda como
princípio ordenador da economia (artigo 170, inciso III). Apesar disso, os
juristas Eros R. Grau e Telga de Araújo informam que o germe da ideia de função
social da propriedade já havia sido lançado primeiramente por Augusto Comte, em
seu "Sistema de Política Positiva". O constitucionalista Dimas
Macedo, contudo, no seu livro "Política e Constituição" (RJ: Editora
Lumen Júris, 2003), acredita que foi Léon Duguit o primeiro jurista a admitir
que a função social da propriedade não quer significar que ela "esteja se
convertendo em coletiva, mas sim que estamos deixando de concebê-la em termos
de direito privado, passando a aceitá-la em termos de Função Social".
[38]
Evgeni Bronislávovich Pachukanis (1891-1937) foi um jurista soviético que
revolucionou a teoria geral do direito a partir da perspectiva metodológica
marxista, tornando-se um autor incontornável no debate jurídico contemporâneo.
Diferenciando-se radicalmente de outros marxistas, Pachukanis demonstrou em
seus escritos os vínculos indissociáveis entre a forma mercadoria – existente
no capitalismo – e a forma jurídica. A incompatibilidade de suas ideias com o
pensamento político-jurídico stalinista resultou em perseguição, prisão e morte
precoce. Sua obra mais importante é
intitulada Teoria geral do direito e marxismo (1924). As críticas pachukanianas
às teorias juspositivistas e jusnaturalistas renderam-lhe diversos embates
teóricos, inclusive com Hans Kelsen. Reabilitado publicamente em 1956, após a
autocrítica soviética ao período stalinista, sua teoria provocou enorme
impacto, especialmente na Europa, a partir da década de 1960, inclusive no
denominado “debate da derivação do Estado” desenvolvido, sobretudo, na Alemanha
e Reino Unido. No Brasil, Pachukanis ganhou notoriedade a partir das pesquisas
do professor Márcio Bilharinho Naves e de seu livro Marxismo e Direito: um
estudo sobre Pachukanis, influenciando juristas como Alysson Leandro Mascaro –
com destaque para sua obra Estado e Forma Política –, Celso Naoto Kashiura Jr.
e Silvio Luiz de Almeida dentre outros que se agruparam em tais conjuntos de
pesquisas a partir dos anos 2000.
[39]
Sílvio Vasconcelos da Silveira Ramos Romero (1851 —1914) foi um advogado,
jornalista, crítico literário, ensaísta, poeta, historiador, filósofo,
cientista político, sociólogo, escritor, professor e político brasileiro. Sílvio Romero foi um importante membro da
elite intelectual brasileira, porém suas falas notadamente racistas geram
polêmicas até hoje. Sílvio Romero dizia "“Povo que descendemos de um
estragado e corrupto ramo da velha raça latina, a que se juntaram o concurso de
duas das raças mais degradadas do globo, os negros da costa e os peles
vermelhas da América [...] [de que] resultaram o servilismo do negro, a
preguiça do índio e o gênio autoritário e tacanho do português [que] produziram
uma nação informe e sem qualidades fecundas e originais”. Sobre o futuro do
Brasil, Romero enunciava: A minha tese, pois, é que a vitória na luta pela
vida, entre nós, pertencerá, no porvir, ao branco; mas que esse, para essa
mesma vitória, tem necessidade de aproveitar-se do que de útil as outras duas
raças lhe podem fornecer, máxime a preta com quem tem mais cruzado. Pela
seleção natural, todavia, depois de prestado o auxílio de que necessita, o tipo
branco irá tomando a preponderância até mostrar-se puro e belo como no Velho
Mundo. Será quando já estiver de todo aclimatado no continente. Dois fatos
contribuirão largamente para esse resultado: de um lado, a extinção do tráfico
africano e o desaparecimento constante dos índios, e de outro a imigração
europeia.
[40]Tobias
Barreto de Meneses (1839-1889) foi um filósofo, poeta, crítico e jurista
brasileiro e fervoroso integrante da Escola do Recife, um movimento filosófico
de grande força calcado no monismo e evolucionismo europeu. Foi fundador do
condoreirismo brasileiro. Com apoio de seu amigo Sílvio Romero, foi designado
Patrono da Cadeira 38 da Academia Brasileira de Letras. Segundo registra Clóvis
Beviláqua, apesar de já ocupar a Cátedra de Teoria e Prática do Processo na
Faculdade de Direito do Recife, os anos finais da vida de Tobias Barreto foram
marcados por dificuldades econômicas e financeiras. Veio a falecer na
residência de um amigo. Por meio da Lei nº 13.927, de 10 de dezembro de 2019
seu nome foi inscrito no Livro dos Heróis e Heroínas da Pátria.
[41]
Carlos Cossio (1903-1987) foi militante universitário reformista, advogado,
filósofo do Direito e professor argentino. Cossio prova que "o juiz vê o
Direito não como algo conclusivo e já feito, mas sim como algo que se faz
constantemente em seu caráter de vida humana vivente." Sua obra chegou a
ser traduzida a línguas como francês, inglês, iugoslavo, alemão, polonês,
português, finlandês, sueco, além de outras. A Teoria egológica do direito é
uma das expressões mais destacadas do movimento cultural latino-americano infundido
pela Reforma Universitária de 1918. Em seus últimos anos de vida, durante a
ditadura militar argentina (1976-1983), Cossio encarregou-se, junto a Ernesto
Giudice, de difundir os ideais da Reforma Universitária, organizadas pela
Fundação Juan B. Justo.
[42]
São dois os principais modelos que fundamentam a aplicação do direito nos
diversos sistemas jurídicos espalhados no mundo, quais sejam: o civil law
e o common law. O civil law
se caracteriza como o sistema jurídico que está estritamente ligado às normas
escritas. Sua fonte criador por excelência é a lei. Daí, se afirmar que esta
prioriza as normas legisladas, pois são o ponto de partida para a definição dos
direitos. É o sistema adotado no nosso país. Encontra suas raízes no direito
romano, devendo-se considerar, também a influência alemão, a tradição
romano-germânica. E, por este, a jurisprudência revela um caráter persuasivo
(não vinculativo). Já o common law fundamenta-se no direito costumeiro, assim,
a norma escrita não é considerada como sua única fonte geradora, sendo
ressaltado o papel da jurisprudência ou da norma jurídica. Prioriza, ipso
facto, o instituto dos precedentes judiciais. Os precedentes visam dar
estabilidade e segurança ao sistema jurídico. Os países de tradição anglo-saxã,
tal como a Inglaterra, e os EUA seguem essa linha, embora não exista plena
identidade entre os seus sistemas. Cada país tem a sua realidade, oriunda da
história, cultura e valores que prezam, essencialmente, na formação do direito.
[43]
Miguel Reale em sua obra "Lições Preliminares de Direito" explicou a
importância de cada uma das ciências para o Direito. Cabe explicar filosofia em
relação ao Direito. Filosofia vem do grego “Philos” (amizade, amor) e
“Sophia” (ciência, sabedoria). Atribuída a Pitágoras em virtude de suas atitudes
e que recusava o título de sophos (sábio). A Filosofia pode ser vista
como uma dedicação desinteressada e constante ao bem e a verdade. Já a
Filosofia do Direito, é uma pesquisa permanente e desinteressada das condições
morais, lógicas e históricas do fenômeno jurídico e da Ciência do Direito. Como
o Direito é um fenômeno histórico-social sempre sujeito às mudanças, com isso
geram problemas que são de ordem filosófica. Sobre a Teoria Geral do Direito.
Teoria, do grego theoresis, significa a conversão de um assunto em
problema, sujeito a indagação e pesquisa. A Ciência Jurídica se eleve ao plano
de uma Teoria Geral do Direito, representa a parte geral comum a todas as
formas de conhecimento positivo do Direito. Alguns autores distinguem entre
Teoria Geral do Direito e Enciclopédia Jurídica, atribuindo a esta tarefa de
elaborar uma sumula de cada uma das disciplinas do Direito, numa espécie de
micro-organismo jurídico. Enciclopédia quer dizer “conhecimento ou visão de
natureza circular”.
[44]
A Teoria Egológica do Direito é uma proposta jusfilosófica de compreensão do
Direito, elaborada pelo catedrático argentino Carlos Cossio, a partir da teoria
de Hans Kelsen, de acordo com as ideias da fenomenologia crítica de Edmund
Husserl e do existencialismo de Martin Heidegger.
A síntese do pensamento
egológico pode ser expressa nas seguintes proposições:
O direito é conduta em
interferência intersubjetiva referida a valores;
O direito considera todas
as ações humanas;
O direito se interessa pelo
ato humano em sua unidade;
O direito supõe a
possibilidade de atos de força;
A liberdade é um conteúdo
imprescindível do direito;
As normas jurídicas
conceituam a conduta em interferência intersubjetiva; e
As normas jurídicas imputam
sanções e são juízos disjuntivos, diferenciando-se da teoria da norma de [Hans
Kelsen] que entendia que a norma jurídica era um juízo hipotético.
[45]
O cidadão precisa saber, de modo claro e absoluto, se a sua conduta está ou não
de acordo com a lei, não podendo, portanto, ficar ao livre arbítrio do juiz o
que pode ou não ser aplicado como lei, visto que, além do subjetivismo já
tratado e da disformidade da fonte, haveria o risco da concentração de poderes,
que representa um dos meios de condução ao regime absolutista. A questão da
legitimação também deve ser observada. O Poder Legislativo é o órgão legitimado
pela sociedade para, em regra, produzir as suas normas oficiais de convivência,
sendo que as exceções são previstas na própria Carta Maior. Tal legitimação é o principal fundamento da
democracia representativa adotada como pilar do Estado, onde todo poder emana
do povo e em seu nome será exercido. A CF/1988 estabeleceu, como cláusulas
pétreas, a separação dos poderes e o sufrágio universal e determinou que o
Poder Legislativo deve ser exercido pelo Congresso Nacional, vide art. 44, que
se compõe da Câmara dos Deputados e do Senado Federal, ressalvando-se que a
primeira Casa abriga os representantes eleitos do povo e a segunda Casa os
representantes eleitos dos Estados e Distrito Federal.
[46]
O conceito de Direito produzido pela modernidade estava assentado no que havia
sido desenvolvido teoricamente pelo positivismo jurídico. Com as transformações
ocorridas na sociedade e, também, na teoria do direito, o paradigma jurídico
contemporâneo é caracterizado pelo trinômio
moral-princípios-discricionariedade, ou seja: a) pelo predomínio da utilização
de princípios; b) pela incorporação da moral ao Direito; e c) pelo
reconhecimento do poder discricionário dos juízes. Em razão disso, a pergunta
pelo conceito de direito parece ganhar uma nova resposta, forjada a partir do
que vem sendo academicamente denominado de pós-positivismo.
[47]
Segundo Von Wright a classificação das normas se dá em seis espécies, sendo
três principais e três secundárias. As primeiras são: as normas definitórias ou
determinativas; normas derretias ou normas técnicas; normas prescrições. Os
costumes assemelham-se às prescrições por terem um caráter obrigatório. E, se
distinguem daquelas pelo fato de não emanarem de nenhuma autoridade. São,
portanto, prescrições anônimas. Os costumes aproximam-se das regras
determinativas, porquanto é por meio desses que se diferenciam as diversas
comunidades. Já as normas morais são muito difíceis de se identificar e
classificar. Podem parecer-se com costume e com as regras determinativas.
[48]
O dogmatismo filosófico pode ser entendido como a possibilidade de conhecer a
verdade, a confiança nesse conhecimento e a submissão a essa verdade sem
questionamento. No século XVIII, o dogmatismo racionalista prega confiança na
razão a fim de se chegar a verdades. Para ele o dogmatismo é toda atitude de
conhecimento. Dogmatismo é uma atitude espontânea que temos desde criança com
senso. É uma tendência para acreditar que o mundo é da maneira que aprendemos.
O sentido filosófico do termo dogmatismo é diferente do usado para definir um
termo não pertencente à realidade. Nesta última, o dogmatismo é o conjunto de
dogmas teológicos, isto é, de expressões surgidas com pensamentos filosóficos
ou pertencentes à hierarquia mais alta da Igreja absolutamente indubitáveis. Em
contrapartida, o vocábulo dogma do grego δόγμα (dogmatikós, em grego
moderno (alasbilaleiko)) significou primitivamente oposição. Tratando-se
assim de uma opinião centrista, isto é, algo que se referia a opinião em si.
Por isso, o termo dogmatismo significava "relativo doutrina" ou
"fundado em princípio".
[49] O livro divide-se em Prólogo, Conceitos Básicos, Teoria da Norma Jurídica, A Ciência do Direito e Kelsen na Filosofia Jurídica que, por sua vez, subdividem-se em outras 16 partes. O prólogo de Tércio Sampaio Ferraz Jr., que com perfeição pontua pontos fundamentais da obra e vida de Kelsen, dá início à obra. Logo em seguida temos o capítulo intitulado Conceitos Básicos, que é iniciado com a definição de epistemologia: ciência que define as condições para a construção de um conhecimento consistentemente científico do direito. Passamos então ao princípio fundamental do método proposto, método este que foi proposto por Kelsen baseando-se exclusivamente na norma posta. Coelho explica que, segundo Kelsen, “para que a doutrina se torne ciência deve-se observar o objeto do conhecimento e desconsiderar os aspectos prénormativos e metanormativos de modo que eles não venham a obscurecer o conhecimento da norma”. A norma de Justiça é de fundo moral. Nem toda norma moral é norma de Justiça: a norma moral é de Justiça quando prescrever uma conduta em face do semelhante. Para o teórico austríaco, o juízo de valor seria aplicado somente sobre as condutas e não sobre as normas, não sendo correto atribuir-se à norma jurídica a qualidade de justa e injusta. A Teoria Pura do Direito mostra uma separação entre os valores do Direito, que são referentes à validade da norma, e os valores da Justiça, que seriam critérios de ordem subjetiva, fora dos limites do Direito. Kelsen alega que não existe Justiça absoluta, e que por possuir conteúdo variável ela não faz parte do Direito. Ainda que cada sociedade tenha uma concepção valorativa acerca dos fatos sociais e das condutas a serem coibidas, as normas devem obedecer a hierarquia de valores e a ideia de Justiça adotadas pela sociedade da qual são destinatárias, devem ser baseadas em uma fonte de princípios que as fundamentem eticamente, de modo a propiciar um convívio harmônico entre os cidadãos, cumprindo o seu papel de reger a conduta dos indivíduos de maneira que estes as cumpram de modo autônomo, por dever, e não heterônomo, conforme o dever.
[50]
Como neokantiano, Kelsen empreende a fundamentação da autonomia metodológica da
ciência do direito a partir da distinção entre ser e dever-ser. A diferença
entre ser e dever-ser é, para Kelsen, insusceptível de maior explicação; é nos
dada imediatamente à consciência. Segundo Kelsen: Ninguém pode negar que o
enunciado: tal coisa é – ou seja, o enunciado através do qual descrevemos um
ser fático – se distingue essencialmente do enunciado :algo deve ser – com o
qual descrevemos uma norma – e que da circunstância de algo ser não se segue
que algo deva ser, assim como da circunstância de que algo deve ser se não
segue que algo seja. Outrossim, Kelsen propõe a separação entre direito e
política. A ciência do direito não pode ser confundida com a jurisprudência
dogmática, que procede de modo normativo (valorativo). A jurisprudência
dogmática pertenceria ao âmbito da política do direito. Firme no postulado da
neutralidade valorativa da ciência, Kelsen afirma que a ciência do direito só
pode ser uma ciência das formas puras do direito, uma ciência puramente
normativa.
[51]
A vigência está diretamente relacionada à eficácia jurídica da norma. Por sua
vez, a eficácia da lei está relacionada à possibilidade de a lei, uma vez
válida e devidamente publicada, vir a surtir efeitos junto aos seus
destinatários. ... Em regra, a vigência e a eficácia de uma lei se dão ao mesmo
tempo. A efetividade, ou eficácia social da norma, diz respeito ao cumprimento
do direito por parte de uma sociedade, ao reconhecimento do direito pela
comunidade ou, mais particularizadamente, aos efeitos que uma regra suscita
através do seu cumprimento, e equivale à (A) mera vigência da norma, conforme
pretendia Kelsen. (B) observância espontânea do comando contido na norma. (C)
aplicabilidade imediata da norma de eficácia plena. (D) materialização, no
mundo dos fatos, da dicção da norma.
[52]
TEORIA ECLÉTICA: defende que a existência do direito de ação independe da
existência do direito material, mas do preenchimento de certos requisitos
formais, chamados "condições da ação" (possibilidade jurídica do
pedido, legitimidade das partes e interesse de agir - lembrando que o NCPC não
considera a possibilidade jurídica do pedido como condição da ação, mas sim
como causa de mérito, acarretando a improcedência do pedido). Para essa teoria,
adotada pelo CPC, as condições da ação NÃO se confundem com o mérito e, quando
ausentes, geram uma sentença terminativa de carência de ação (art. 485, VI, CPC/2015)
sem a formação de coisa julgada material.
[53]
A questão acerca da importância que Kelsen atribuiu ao tema da interpretação
jurídica ao longo de sua obra é bastante controversa. Enquanto alguns autores
entendem que ela ocupa posição marginal no contexto da obra do jurista
austríaco, outros asseveram que ele se debruçou suficientemente sobre o tema. A
interpretação surge na obra de Kelsen quando da publicação do artigo intitulado
“Zur Theorieder Interpretation”, no periódico Internationale für
Theorie des Rechts, em 1934. No mesmo ano, o artigo em referência é
reproduzido, sem maiores alterações, na primeira edição da Teoria Pura do
Direito. É somente na segunda edição da Teoria Pura, publicada em 1960, que o
tema da interpretação será ostensivamente abordado, ainda que em uma dezena de
páginas.
[54]
Outrossim, Kelsen propõe a separação entre direito e política. A ciência do
direito não pode ser confundida com a jurisprudência dogmática, que procede de
modo normativo (valorativo). A jurisprudência dogmática pertenceria ao âmbito
da política do direito. Firme no postulado da neutralidade valorativa da
ciência, Kelsen afirma que a ciência do direito só pode ser uma ciência das
formas puras do direito, uma ciência puramente normativa. Karl Larenz, muito
perspicazmente, antevê o mesmo desequilíbrio na Teoria Pura do Direito, no que
se refere ao balanço entre teoria e práxis: Assim como a jurisprudência dos
interesses é deficiente como teoria, mas foi de grande utilidade prática, assim
a teoria pura do Direito atinge um alto nível como teoria, mas do ponto de
vista prático os seus resultados são pobres. Em último termo, porém, o fato
encontra a sua razão de ser numa deficiência da própria teoria.
[55]
Kelsen diferencia duas espécies de interpretação jurídica – autêntica e
não-autêntica –, elevando a primeira como objeto privilegiado de sua análise.
Quando o direito é aplicado por um órgão jurídico, trata-se da interpretação
autêntica. Já a interpretação não-autêntica é aquela realizada por uma pessoa
privada, especialmente pela ciência jurídica. A interpretação autêntica cria
direito, ao passo que a interpretação jurídico-científica (não-autêntica) não
cria direito, sendo pura determinação cognoscitiva do sentido das normas
jurídicas. Firme no jogo de contrastes, Kelsen estabelece que a interpretação
autêntica pode assumir o caráter de lei ou tratado internacional, como também
pode assumir a forma de uma sentença, enquanto a interpretação
jurídico-científica deve ser ater a estabelecer “as possíveis significações de
uma norma jurídica”
[56]
Além das críticas feitas às Ciências Jurídicas, o pensamento sociojurídico de
Ehrlich realiza uma reflexão crítica acerca da relação entre Direito, coerção e
Estado frequentemente feita pela doutrina do Direito. Para Ehrlich, a fonte
primária dos direitos não é o Estado, e sim a sociedade e as relações sociais
humanas. Do mesmo modo, para o sociólogo, as normas jurídicas, em geral, não
são cumpridas em razão da possibilidade ou efetivo uso da força aparelhada do
Estado, mas por serem reflexo dos anseios e necessidades sociais.