Janela partidária
A janela partidária é prevista como hipótese de justa causa para mudança de partido, é que esta, além de estimular o transfuguismo[1], ainda contribuiu para a acentuação de um problema há muito relatado no país, a existência de partidos não ideológicos. Conclui-se que a janela partidária é deletéria à nossa incipiente democracia.
A
chamada janela partidária ofereceu um prazo de trinta dias para que os
parlamentares possam mudar de partido sem perder o mandato. Esse período
antecede em seis meses ao pleito eleitoral. A regulamentação se deu através da
Reforma Eleitoral de 2015[2], através da Lei
13.165/2015 e se consolidou como meio de troca de legenda, depois da decisão do
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) segundo a qual o mandato pertence ao partido
e, não ao candidato eleito.
A
decisão do TSE estabeleceu a fidelidade partidária para os cargos obtidos em
eleições proporcionais, a saber: deputados estaduais, deputados federais e
vereadores. A norma também está positivada na Emenda Constitucional 91 que foi
aprovada pelo Congresso Nacional em 2016.
Como
exceção, existem algumas situações que permite a mudança de partido por justa
causa. São estas: o fim ou fusão do
partido; o desvio do programa partidário ou grave discriminação pessoal. E,
assim, as mudanças de legenda partidária que não se enquadrem nesses motivos
podem acarretar a perda do mandato.
Em
2018, O TSE decidiu que só pode usufruir da janela partidária a pessoa eleita
que esteja no término do mandato vigente. Portanto, os vereadores só podem
migrar de partido na janela destinada às eleições municipais e os deputados
federais e estaduais naquela janela que ocorre seis meses anteriores às eleições
gerais.
A
fidelidade partidária[3] se apresenta como um dos
principais temas de debate, pois está relacionada à concepção de representação
política. E, a intensa troca partidária entre os parlamentares, nesse contexto,
enseja consequências auspiciosas, tal como a difícil identificar pelo eleitor
da ideologia de cada partido, candidato e ainda dos trabalhos prestados pelo
seu candidato.
A
doutrina define a fidelidade partidária a partir de dois elementos distintos, a
saber: a observância de diretrizes do partido pelo parlamentar e a permanência
do mesmo no partido pelo qual se elegeu. De sorte que a infidelidade partidária
do eleito pode ser relacionada tanto à indisciplina partidária[4], quanto também ao seu
sentido estrito, sinônimo de transfuguismo, relacionada a costumeira troca de
partido praticada por parlamentares.
Cumpre
destacar que com fulcro na ordem constitucional vigente e pelo posicionamento
das Cortes Judiciais até o ano de 2007, a desfiliação partidária injustificada
não acarretava qualquer efeito à titularidade do mandato, ou seja, o
parlamentar mudava de legenda partidária e permanecia com seu mandato.
Portanto, naquele momento o mandato parlamentar tinha inequívoco caráter
representativo na qual o eleito é o titular do mandato.
Após
2007, as Cortes judiciais brasileira passaram a entender que nesses casos, o
efeito da perda do mandato era possível, para ambos sistemas eleitorais
existentes no país e, depois de 2015, apenas para o sistema proporcional.
Eis
que surgiu um conceito híbrido de mandato parlamentar e que poderia ser
classificado por uma natureza representativa partidária. E, suas
características fundamentais seriam:1. subordinação do eleito ao estatuto e
programa partidários; 2. a representação operada pelo partido político cujo
exercício se daria através de pessoas a este filiadas; 3. a liberdade de
manifestação do parlamentar em relação aos atos tipicamente legislativos.
A
mudança de entendimento realizada pelos Tribunais Eleitorais representou uma
virada para o tratamento a infidelidade partidária e, sem dúvida, operou
modificações substanciais à concepção da natureza do mandato parlamentar.
Ademais,
as alterações legislativas de 2015 e 2017 solidificaram novo entendimento e,
por consequência, prevê a perda do mandato parlamentar devido a desfiliação
partidária injustificada. Acredita-se que as migrações elevadas podem ser
mitigadas, operando ipso facto, um maior fortalecimento da representação
política no país e também de suas respectivas ideologias.
Com a
inclusão da chamada janela partidária, o fluxo de migrações partidárias
intensificou-se, chegando a ser um terço de todo Congresso Nacional. Enquanto
de novembro de 2007 a dezembro de 2010 apenas 41 mudanças de agremiação foram
efetivadas na Câmara - número reduzido indiscutivelmente em função do novo posicionamento
do TSE e do STF, somente na janela de 2018, 116 trocas foram registradas, isto
é, praticamente três vezes o número relativo ao período destacado.
Surge,
então, novo fenômeno pois a janela se tornara intervalo de intenso fervor, pelo
qual as siglas partidárias procuram se movimentar a fim de angariar candidatos
para as próximas eleições.
O direito eleitoral brasileiro abriga a Lei 14.208, de 28 de setembro de 2021 que alterou a Lei 9.096/1995 (Lei dos Partidos Políticos) e a Lei 9.504, de 30 de setembro de 1997 (Lei das Eleições) para instituir as federações[5] de partidos políticos.
Cumpre
diferenciar a coligação da federação partidária. Primeiramente, as federações
não poderão acabar logo após as eleições, o que já é possível de acontecer com
as coligações. Existe prazo mínimo de quatro anos de atuação conjunta. E, nas
federações, os partidos podem se unir para apoiar qualquer cargo, desde que
permaneçam unidos durante todo mandato eletivo.
As
federações possuem abrangência nacional, o que diverge das coligações que são
diferentes em cada Estado da federação. As federações podem, ainda, fazer
coligações em eleições majoritárias, mas os partidos que a integram não podem
isoladamente.
A
janela partidária é fenômeno que ocorre a cada ano eleitoral e se refere ao
prazo de trinta dias para que os que desejam disputar as eleições, do mesmo
ano, possam mudar de partido político sem perder o mandato vigente.
A
janela partidária é resultante do entendimento do Supremo Tribunal Federal que
aduz que o mandato político, pertence especificamente a quem se elege pelo
sistema proporcional, e pertence ao partido pelo qual foi eleito o titular. O
congressista só poderá desvincular da respectiva agremiação sem a perda do
mandato m situações elencadas taxativamente.
O art.
22-A, da Lei nº 9.096/95, conhecida como a Lei dos Partidos Políticos,
determina que “perderá o mandato o detentor de cargo eletivo que se desfiliar,
sem justa causa, do partido pelo qual foi eleito”, colocando, contudo, como
ressalva a essa tida “infidelidade partidária” a hipótese de “(III) mudança de
partido efetuada durante o período de 30 dias que antecede o prazo de filiação
exigido em lei para concorrer à eleição, majoritária ou proporcional, ao
término do mandato vigente.” Essa janela partidária se abre por 30 dias, antes
do prazo de 6 (seis) meses do pleito eletivo.
É o
tempo para que qualquer candidato, que pretenda nele concorrer, esteja filiado
a um partido político. Em 2022, considerando que a eleição será em 2 de
outubro, o prazo determinado para a migração de partido, por meio da janela
partidária, é de 3 de março a 1º de abril. O prazo de filiação termina em 2 de
abril, 6 meses antes do 1º turno.
É o
que está na Resolução nº 23.674/TSE. Importante salientar que o Tribunal
Superior Eleitoral, em resposta à consulta que lhe foi formulada (consulta nº
060015955/ íntegra – 44KB), decidiu que a hipótese de justa causa para
desfiliação partidária, pela, pela janela partidária, somente se aplica ao
eleito que esteja no término do mandato vigente no ano eleitoral. Isso, então, não se verifica em relação a
vereadores que se desfiliem para concorrer nas eleições gerais.
Importante,
ainda, ressaltar uma outra hipótese de janela partidária que foi criada pelo
art. 17, §5º da Constituição Federal, incluído pela Emenda Constitucional nº
97/2017, segundo o qual “ao eleito por partido que não preencher os requisitos
previstos no parágrafo 3º deste artigo é
assegurado o mandato e facultada a filiação, sem perda do mandato, a outro
partido que os tenha atingido, não sendo essa filiação considerada para fins de
distribuição dos recursos do fundo partidário e de acesso gratuito ao tempo de
rádio e de televisão”.
A
janela partidária[6]
é prevista como hipótese de justa causa para mudança de partido, é que esta,
além de estimular o transfuguismo, ainda contribuiu para a acentuação de um
problema há muito relatado no país, a existência de partidos[7] não ideológicos.
Infelizmente,
a migração raramente é realizada somente em razão com o conteúdo programático
das agremiações.
E, assim o fortalecimento de programas políticos ideológicos chegam mesmo ser dificultados e os prognósticos apontam que a intensa troca de partidos fulmina nossa ainda engatinhante democracia.
Referências
FALCÃO,
Joaquim; ARGUELHES, Diego W., PEREIRA, Thomaz. Recondo, Felipe. O Supremo e
o Processo Eleitoral. Rio de Janeiro: Editora FGV Direito RIO.,2019. Disponível
em: https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/handle/10438/27540
Acesso em 01.04.2022.
FALCÃO,
Daniel. A hermenêutica do termo "processo eleitoral" no STF na anualidade
eleitoral. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-nov-14/observatorio-constitucionala-hermeneutica-termo-processo-eleitoral-stf Acesso
em 01.04.2022.
GOMES,
José Jairo. Direito Eleitoral. 18ª edição. São Paulo: Atlas, 2022.
PORTELA,
Thiago Barreto. Fidelidade Partidária: Uma análise histórico-dogmática
perante o ordenamento jurídico brasileiro e jurisprudência do STF.
Disponível em: https://suffragium.tre-ce.jus.br/suffragium/article/download/27/19/93
. Acesso em 01.04.2022.
PRETTI,
Gleibe. Direito Eleitoral. Col. Legislações. São Paulo: Alfacon, 2016.
ROMANO,
Rogério Tadeu. A infidelidade partidária e perda do mandato eleitoral.
Disponível em: https://jus.com.br/artigos/88437/a-infidelidade-partidaria-e-a-perda-do-mandato-eleitoral
Acesso em 01.04.2022.
Tribunal
Superior Eleitoral. Sumário - Lei dos Partidos Políticos. Disponível em:
https://www.tse.jus.br/legislacao/codigo-eleitoral/lei-dos-partidos-politicos
Acesso em 01.04.2022.
TSE - Glossário
Eleitoral. Disponível em: tse.jus.br/eleitor/glossario/glossario-eleitoral
Acesso en 01.04.2022.
TSE-
Entenda o que é janela partidária. Disponível em: https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2021/Maio/entenda-o-que-e-janela-partidaria Acesso em 01.04.2022.
TSE - Janela
Partidária termina nesta sexta-feira.(1º) Disponível em: https://www.tse.jus.br/imprensa/noticias-tse/2022/Abril/janela-partidaria-termina-nesta-sexta-feira-1o Acesso em 01.04.2022.
VALENTE,
Ettore Antônio L. A influência da "janela partidária" nos rumos da
democracia representativa brasileira. Disponível em: https://www.migalhas.com.br/depeso/360119/a-influencia-da-janela-partidaria-nos-rumos-da-democracia Acesso
em 01.04.2022.
Notas:
[1] “Transfugismo
partidário” é a troca de partido de um candidato eleito para uma nova legenda política,
sem a apresentação de motivo justo. É uma das formas de manifestação da
infidelidade partidária
[2]
A Lei 13.165/2015, também conhecida como Reforma Eleitoral 2015, alterou
diversos pontos da legislação eleitoral. Como a norma foi sancionada um ano
antes do pleito municipal de 2016, no dia 27 de outubro, já será aplicada, no
que couber, às eleições do próximo ano. Confira abaixo as principais mudanças e
inovações promovidas pela Reforma Eleitoral 2015 no Código Eleitoral. A Reforma
Eleitoral 2015 também ampliou as possibilidades do voto em trânsito. Até as
eleições 2014, essa forma de exercer o direito de voto valia exclusivamente
para os cargos de presidente da República, nos municípios com mais de 200 mil
eleitores. Agora, o artigo 233-A do Código Eleitoral assegura aos eleitores em
trânsito no território nacional o direito de votar para diversos cargos nos
municípios com mais de cem mil eleitores. A primeira alteração destacada como
“importante” pelo ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Henrique Neves
é a prevista em parágrafo incluído no artigo 28 do Código (parágrafo 4º). O
dispositivo determina que, a partir de agora, as decisões dos Tribunais
Regionais sobre quaisquer ações que resultem em cassação de registro, anulação
geral de eleições ou perda de diplomas somente poderão ser tomadas com a
presença de todos os integrantes. E o parágrafo 5º do artigo 28 prevê que, no
caso de ocorrer impedimento de algum juiz, será convocado o suplente da mesma
classe.
[3]
Basicamente, fidelidade partidária consiste na obrigação que os parlamentares
possuem com seus respectivos partidos, conforme as regras estabelecidas
previamente. Sempre que um candidato se filia a um partido para disputar as
eleições, deve estar ciente que, uma vez eleito, deverá seguir alguns
princípios da legenda, e, às vezes, abrir mão de sua vontade para seguir o que
é recomendado pelos líderes partidários. Segundo o artigo 24 da Lei 9.096/95, o
integrante do partido na Casa Legislativa tem o dever de subordinar a sua ação
parlamentar aos princípios doutrinários e programáticos e às diretrizes
estabelecidas pelo partido, desde que a conduta conste no estatuto partidário
que deve ser registrado no TSE.
[4]
Quando o Brasil se redemocratizou nos anos 1980, após um longo período de
Regime Militar, tornou-se muito comum a prática de constantes trocas de
partido. Ou seja, os candidatos eram eleitos em uma legenda e, posteriormente,
migravam para outra quando já haviam assumido o mandato. Isso não só causou
incômodo nos próprios partidos políticos, que se sentiam prejudicados, como em
vários setores da sociedade civil. Este descontentamento motivou diversas
tentativas de Reforma Política nos anos 1990, para que fosse instituída a
fidelidade partidária. Nenhuma delas deu certo, mas a regra acabou sendo criada
por iniciativas do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e do Supremo Tribunal
Federal (STF), em 2007. A primeira delas foi a Resolução n. 22.610, do TSE, que
determinou que o mandato eletivo pertence ao partido. A decisão levou os
partidos políticos a requerer a cassação do mandato dos parlamentares “infiéis”
e sua substituição por seus suplentes. No mesmo ano, o STF determinou a
constitucionalidade da resolução, determinando como norma a cassação dos
parlamentares que trocassem de partido após essa decisão.
[5]
Federação é um instrumento que permite a união de dois ou mais partidos que têm
afinidade programática por pelo menos quatro anos, sem possibilidade de
separação nesse período. É diferente, porém, da fusão de partidos, quando eles
passam a ter um único registro no TSE. O DEM e o PSL, por exemplo, se fundiram em um
só partido, o União Brasil. Em uma federação, eles continuariam com os partidos
e os registros separados no TSE, inclusive com nomes, siglas e números, mas
atuariam juntos.
[6]
Janela partidária termina em 01.04.2022 e deixa o PL com a maior bancada da
Câmara Partido de Bolsonaro foi o que mais ganhou deputados; mais trocas já
feitas na Justiça Eleitoral ainda poderão ser comunicadas à Câmara nos próximos
dias Fonte: Agência Câmara de Notícias Disponível em: https://www.camara.leg.br/noticias/863065-janela-partidaria-termina-nesta-sexta-e-deixa-o-pl-com-a-maior-bancada-da-camara/
Acesso em 02.04.2022