Filmado: racismo criminoso e indecente
Por Gisele Leite.
O
futebol aqui e no mundo é monitorado por dezenas de câmeras e microfones todos
voltados ao gramado e ao esporte e mesmo com farta prova documental, há
flagrantes de racismo nas arquibancadas e até mesmo dentro do campo. É
indispensável que haja combate a esse tipo de violência.
O
Observatório da Discriminação Racial no Futebol começou a mapear os casos de
racismo disseminados aqui no Brasil. Em três anos, as denúncias ultrapassaram
ao dobro, de vinte casos em 2014, passaram para 43 em 2017. E, o auge fora em
2919 quando se atingiu o total de 67 casos relatados.
Em
2020 ocorreu queda por conta da paralisação de futebol e, em 2021, apesar de
não se ter os números de todos os Estados, foram registrados mais de 50 denúncias
registradas. Infelizmente, apesar de tantas denúncias há rotundo silêncio do
Tribunal de Justiça Desportiva e dos órgãos internacionais atuantes no futebol
pelo mundo.
O
futebol é, sem dúvida, o mais popular esporte do mundo e, infelizmente, o palco
de cruéis espetáculos de racismo. Enfim, o racismo pode funcionar como espécie
de punição popular que é mais pesada do que a punição do Estado, em forma de
pena, ou multa ou sanções restritivas.
Mesmo nos clubes que expressam ser contra o racismo, reconhecem as falhas ocorridas e, se mostram inertes diante tantas denúncias registradas. Mais do que uma mensagem de repúdio, torna-se imperioso uma conscientização antirracista.
O
antirracismo é forma de ação contra o ódio, o preconceito racial, o racismo sistêmico
e a opressão estrutural contra as pessoas
e grupos que são marginalizados racialmente e etnicamente.
Friedrich
Tiedemann foi uma das primeiras pessoas a contestar cientificamente o racismo.
Em 1836, usando medições craniométricas e cerebrais (tiradas por ele de
europeus e negros de diferentes partes
do mundo), ele refutou a crença de muitos naturalistas e anatomistas
contemporâneos de que os negros têm cérebros menores e, portanto, são
intelectualmente inferiores aos brancos. dizendo que era cientificamente
infundado e baseado apenas nas opiniões preconceituosas de viajantes e
exploradores.
Lembremos
que o biólogo evolucionista Charles Darwin escreveu em 1871 que 'não se pode
duvidar de que seja possível nomear qualquer personagem que seja distintivo de
uma raça e constante' e que '[a] embora
as raças humanas existentes difiram em muitos aspectos, como na cor, cabelo,
formato do crânio, proporções do corpo, etc., mas se toda a sua estrutura for levada em consideração eles se parecem
muito uns com os outros em uma infinidade de pontos.'
Somente
através da educação será possível superar os crônicos problemas da sociedade
brasileira, tal como o racismo estrutural, as desigualdades de gêneros e outras
formas de opressão. É na escola onde se constroem as primeiras aprendizagens,
se fazem as descobertas sobre a vida, a
ciência e a saúde. Infelizmente, também é nas escolas que há situações de
preconceitos, violências e discriminações.
O
ensino antirracista está previsto pela Lei 10.639/2003 que o tornou obrigatório o ensino da história
e da cultura africana e afro-brasileira, sendo relevante mecanismo para a
correção desse cenário tenebroso. O estabelecimento de um ensino antirracista é
determinante também para reduzir a exclusão escolar e coibir o trabalho e
exploração infantil.
Os
dados da Pnad Contínua Educação, divulgada em 2020, apontam que das 50 milhões
de pessoas de 14 a 29 anos no Brasil, 20,2% (ou 10,1 milhões) não completaram
alguma etapa da educação básica, seja por terem abandonado a escola ou por
nunca a terem frequentado. Desse total, 71,7% eram pretas ou pardas. Em número
absoluto, os homens representam 58,3% e as mulheres somam 41,7%.
A
exclusão aumenta por vários fatores, todos ligados a uma problemática
estrutural. Tem a desigualdade social, que obriga os jovens a saírem da escola
para ajudar a família. Há também a questão de gênero, pois a condição das
mulheres é mais precária, principalmente das mulheres negras.
É
preciso discutir o acesso que esses jovens têm às redes de proteção e olhar
para as desigualdades sociais que conduzem as crianças e adolescentes para o
trabalho infantil”.
A Lei
10.639, de 2003, alterou dispositivos da Lei de Diretrizes e Bases da EducaçãoNacional (LDB/1996), documento que organiza toda a educação básica brasileira. Resultado
da articulação de movimentos sociais, principalmente do Movimento Negro, o
texto da lei aponta que os conteúdos trabalhados na escola deve incluir “luta
dos negros no Brasil, a cultura negra e formação da sociedade nacional
resgatando a contribuição do povo negro nas áreas social, econômica e política
pertinente à História do Brasil”.
O
recente episódio ocorrido na Espanha com jogador brasileiro é mais uma prova de
que esse é momento para reforçarmos a educação antirracista e promover a inclusão
e o verídico respeito à dignidade da pessoa humana que é um dos fundamentos do
Estado democrático de Direito que é nosso país.