Usuários devem entrar na justiça se planos se recusarem a cobrir especialidades não convencionais utilizadas no tratamento do autismo, diz especialista

Resolução normativa 539/22 da Agência Nacional de Saúde Suplementar ampliou as regras de cobertura assistencial para o Transtorno do Espectro Autista, reconhecendo a importância das terapias multidisciplinares para o seu tratamento.

Fonte: Mérces da Silva Nunes

Comentários: (0)



Reprodução: Pixabay.com

Recentemente, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) negou o recurso especial da Amil Assistência Médica Internacional que questionava a cobertura do tratamento multidisciplinar para pessoa com Transtorno do Espectro Autista (TEA) -- e a possibilidade de reembolso integral das despesas feitas pelo beneficiário do plano de saúde fora da rede credenciada. O recurso da Amil era contra a resolução normativa 539/22 da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS), que ampliou as regras de cobertura assistencial para TEA, reconhecendo a importância das terapias multidisciplinares para indivíduos com transtornos de desenvolvimento. A agência também noticiou a obrigatoriedade da cobertura de quaisquer métodos ou técnicas indicados pelo médico para esses transtornos.


Mas quais especialidades convencionais e não convencionais são essas? A advogada e especialista em Direito Médico Mérces da Silva Nunes -- sócia titular do escritório Silva Nunes Advogados -- explica.


“O transtorno do espectro autista é uma condição que afeta a comunicação, a interação social e o comportamento. O tratamento para o TEA é geralmente multidisciplinar. Dentre as especialidades convencionais estão a neurologia (especialidade médica que se dedica ao estudo do sistema nervoso); a psiquiatria (que trata de transtornos mentais, incluindo o TEA); a psicologia (que se dedica ao estudo do comportamento humano, e que pode ajudar no diagnóstico e tratamento do TEA); a fonoaudiologia (que trabalha com a comunicação humana, incluindo a fala e a linguagem); a terapia ocupacional (que se concentra em ajudar as pessoas a desenvolver habilidades para realizar atividades do cotidiano); e a educação especial (que se dedica a desenvolver e implementar estratégias de ensino para pessoas com deficiência, incluindo o TEA).”


Segundo Mérces, as especialidades não convencionais que podem ser utilizadas no tratamento do TEA, por sua vez, incluem vários métodos -- como o ABA (Applied Behavior Analysis) TEA, que faz uma abordagem terapêutica baseada em evidências para tratar crianças com autismo. “O método analisa o comportamento da criança; identifica aqueles considerados problemáticos; e trabalha para substituí-los por comportamentos positivos. O método é altamente estruturado, individualizado e intensivo, geralmente envolvendo mais de 20 horas de terapia por semana. O objetivo final do método ABA TEA é ajudar a criança a desenvolver habilidades que lhe permitam alcançar o máximo potencial em todas as áreas.”


Nas especialidades não convencionais há também o TEACCH (Treatment and Education of Autistic and Related Communication Handicapped Children), um método de intervenção para crianças e adultos com TEA e outras deficiências de comunicação; o Modelo Denver de Intervenção Precoce (também conhecido como Denver Model); a Comunicação Alternativa e Suplementar (CAS), abordagem que utiliza sistemas de comunicação não-verbal ou parcialmente verbais para ajudar pessoas com dificuldades de comunicação a se expressarem; e a Integração Sensorial, uma abordagem terapêutica que visa melhorar a capacidade do cérebro em processar e interpretar as informações sensoriais recebidas do ambiente. Há também outras terapias não convencionais empregadas no tratamento de TEA: a terapia com animais treinados para ajudar no tratamento de diversos transtornos; a acupuntura; a musicoterapia; e a aromaterapia.


Ainda assim, existem situações em que os usuários não têm direito ao reembolso pela contratação de tratamentos multidisciplinares? “No Recurso Especial de no 2.043.003 -- SP, de relatoria da ministra Nancy Andrighi, o STJ decidiu sobre ‘a obrigação de reembolso integral das despesas assumidas pelo beneficiário com o custeio do tratamento realizado fora da rede credenciada’”, reitera Mérces Nunes, acrescentando, porém, que “o STJ afirmou que, segundo a jurisprudência, o reembolso das despesas médico-hospitalares efetuadas pelo beneficiário com tratamento/atendimento de saúde fora da rede credenciada pode ser admitido somente em hipóteses excepcionais, tais como a inexistência ou insuficiência de estabelecimento ou profissional credenciado no local e urgência ou emergência do procedimento, e, nessas circunstâncias, poderá ser limitado aos preços e às tabelas efetivamente contratadas com o plano de saúde”.


Mérces observa que o STJ “aduziu que se distinguem, da hipótese tratada na orientação jurisprudencial sobre o reembolso nos limites do contrato, as situações em que se caracteriza a inexecução do contrato pela operadora, causadora de danos materiais ao beneficiário, a ensejar o direito ao reembolso integral das despesas realizadas por este, a saber: inobservância de prestação assumida no contrato, descumprimento de ordem judicial que determina a cobertura do tratamento ou violação de atos normativos da ANS”.


E a pergunta que não quer calar: como proceder diante da recusa, pelos planos, de custear o tratamento de autismo mesmo na rede credenciada?


“As especialidades não convencionais utilizadas no tratamento de autismo, em especial o método ABA, na grande maioria das vezes, têm sua cobertura recusada pelos planos de saúde, devido ao alto custo do tratamento. Assim, para ter acesso aos tratamentos recusados pelo plano de saúde, a pessoa interessada deverá ingressar na Justiça e pleitear uma liminar -- ordem judicial -- que obrigue o plano de saúde a custear o tratamento. Felizmente, as decisões do Poder Judiciário quase sempre reconhecem a necessidade do tratamento e obrigam o plano de saúde a custeá-lo.”


*Mérces da Silva Nunes, advogada, sócia titular do escritório Silva Nunes Advogados; mestre e doutora em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo -- PUC/SP; especialista em Direito Médico e Bioética pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo; membro da Comissão de Direito Médico da OAB/SP; autora de artigos jurídicos e da obra “O direito fundamental à alimentação e o princípio da segurança”.

Palavras-chave: Usuários Justiça Planos de Saúde Recusa Cobertura Especialidades não Convencionais TEA

Deixe o seu comentário. Participe!

noticias/usuarios-devem-entrar-na-justica-se-planos-se-recusarem-a-cobrir-especialidades-nao-convencionais-utilizadas-no-tratamento-do-autismo-diz-especialista

0 Comentários

Conheça os produtos da Jurid