Projeto de lei acende debate sobre direito animal

Um projeto de lei apresentado na Assembleia Legislativa de São Paulo quer proibir o uso e o sacrifício de animais em cultos religiosos no Estado.

Fonte: Folha Online

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Mesmo longe de ser votado, o projeto mobilizou religiosos e protecionistas. O debate contrapõe tradição cultural e direito animal e mostra furos na atual legislação.


Para o deputado Feliciano Filho (PV), o autor, ele não propõe nada além do que a lei prevê. "Só fixei multa para quem praticar o sacrifício, que já é proibido."


Ele se refere à Constituição e à Lei de Crimes Ambientais. Uma garante que os animais não sofram crueldade. Na outra, maus-tratos é crime. "Matar sem anestesiar é maus-tratos", argumenta.


Mas a Carta também garante liberdade de culto. O que viria primeiro?


"É um conflito. A legislação encampa valores da liberdade religiosa e do ambiente. Os dois lados podem ter razão", diz Daniel Lourenço, especialista em direito animal.


No Sul, uma lei de 2003 permite sacrifício de bichos em rituais de matriz africana. Em 2005, houve tentativa frustrada de derrubá-la.


Em São Paulo, a discussão mal começou e não envolve só as religiões africanas.


TRADIÇÃO DO SACRIFÍCIO

 

O sacrifício animal está na origem das maiores religiões do mundo. Historicamente, a morte dos animais era feita para expiação dos pecados ou em celebrações, explica o sociólogo Reginaldo Prandi.


Como religião institucionalizada, o cristianismo nunca adotou o sacrifício, mas teologicamente admite o seu significado. "Quando recebem a hóstia, os católicos fazem um sacrifício simulado. Para os cristãos, a morte de Jesus foi o último sacrifício."


No judaísmo, não é comum o sacrifício de animais, mas existe o abate kosher, que usa em larga escala técnicas próprias para matar o animal.


No abate kosher, assim como no halal (abate muçulmano), o animal é morto por degola e não é anestesiado.


A nova lei enquadraria toda morte de bicho feita sem insensibilização (anestesia).


Em 2010, o Brasil exportou 475,23 mil toneladas de carne para países que exigem abate halal ou kosher (39% do total exportado).


"O abate kosher não é um ritual. O ideal judaico é o vegetarianismo. Consumir carne é uma concessão a alguém de alma fraca", diz o rabino Ruben Sternschein, da Congregação Israelita Paulista. Segundo ele, o abate kosher "deve ser feito com o mínimo de sofrimento para o animal".


Já o abate halal de bois, aves e carneiros é um sacrifício religioso, diz Mohamed Hussein El Zoghbi, diretor da Federação das Associações Muçulmanas do Brasil.


"Mas prima pelo bem-estar como nenhum outro. A morte por degola não causa sofrimento. A ruptura das veias e da traqueia faz com que o animal morra rapidamente. Quem vê pensa que está sofrendo, mas já está morto, se debate por reflexo."


De acordo com o presidente do CEN (Coletivo de Entidades Negras), Márcio Alexandre Gualberto, o bicho morto no candomblé também é consumido -nada a ver com a imagem de feitiçaria e galinha em encruzilhada.


"Tem quem faça isso, mas não é nossa tradição. Usam partes da tradição para fazer coisas que não são nossas."


Segundo ele, o sacrifício é praticado por sacerdotes treinados para minimizar o sofrimento. "O animal não pode sofrer. Somos preocupados com o bem-estar dos animais oferecidos aos deuses."


São Paulo tem 719 terreiros, segundo levantamento de Prandi, para quem o projeto é preconceituoso: "As motivações da lei são o preconceito e a ignorância. Se o deputado estivesse preocupado com animais, deveria bater na porta de frigoríficos".


Para Antonio Carlos Arruda, coordenador de políticas públicas da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania de SP, o projeto é "inaceitável". "Liberdade religiosa é princípio da democracia."


Uma reunião do Fórum Inter-Religioso da secretaria discutiu a participação de entidades do Estado no movimento de reação ao projeto. O slogan da campanha, que antes era "Não toquem nos nossos terreiros", foi ampliado para "Cultura de paz e liberdade religiosa já!".


Um ato público organizado pelo CEN está previsto para o dia 15, às 13h, em São Paulo, no vão do Masp.


LIMITE DA LIBERDADE


Do outro lado, os defensores dos animais consideram o projeto pertinente ao menos por levantar o debate. "Nossa sociedade ainda tem a ideia de que animais são coisas. Nessa visão, o direito do homem é superior ao deles", diz o advogado Lourenço.


O promotor de Justiça do Estado Laerte Fernando Levai diz que há limites morais para o exercício da liberdade religiosa. "Há que se respeitar o direito ao culto, sim, desde que as práticas não impliquem violência."


O promotor João Marcos Adede y Castro, do Rio Grande do Sul, reforça o coro: "Se fosse assim, era só criar uma religião de sequestradores e haveria respaldo legal".


O mesmo pensa a veterinária Ingrid Eder, da ONG WSPA Brasil. "Que cultura é essa que causa maus-tratos aos animais? A cultura evolui de acordo com o conhecimento. Hoje, sabemos que os animais sentem dor."


Reginaldo Prandi acredita que a evolução deve vir de dentro da religião. "Há segmentos do candomblé que não matam animais. Pode ser que, no futuro, a religião evolua para um sacrifício mais simbólico, mas isso não pode ser imposto. Não se muda uma religião por decreto."

Palavras-chave: Animais; Lei; Direito; Sacrifício; Legislação

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5 Comentários

sandra fernandes securitária09/11/2011 0:49 Responder

Coisa mais retrógrada qualquer tipo de sacrifício com animais, mesmo sob anestesia. OS TEMPOS MUDARAM. Até a religião precisa evoluir. Respeitem os animais. APÓIO TOTALMENTE O PROJETO E TORÇO PARA QUE SE TORNE LEI.

Marta Putini Lopes Professora universitária09/11/2011 0:59 Responder

Nos dias atuais, não é possível mais uma polêmica desse nível, vez que é o direito à vida que está em jogo. Se o animal, que também é um ser vivo e sente, pode ser sacrificado, massacrado, torturado, de igual forma o homem, as matas, a água, o ar podem, pois são todos parte de um mesmo TODO, a vida, a natureza. Portanto, abomino todo e qualquer ato de crueldade em tradições culturais, religiosas, frigoríficos etc. etc. atc. Que Deus é esse que aceita o sacrifício de um ser vivo indefeso em prol de sua glória!!!! Não entendo.

Dante Lassi comerciante 25/02/2012 11:02

Perfeito, é isto mesmo, mas Deus é infinito, Grande, não precisa de relevar estes humaninhos que fazem isto, e sim estas culturas loucas que criam o incriavel.Realmente todos são parte de um todo, e assim que é construidos os \\\"tijolinhos\\\" do mundo.Estou a favor de um basta...

Marcos Rezende Professor09/11/2011 11:48 Responder

Ora, fico a pensar quantos animais são sacrificados em rituais judaicos, muçulmanos e de candomblé e a forma como o fazem e percebo que os métodos utilizados não tem crueldade e ainda assim não refletem praticamente nada no universo de mortes de animais no Brasil e no mundo. Certamente a pesca esportiva que assistimos na televisão aos domingos que fisgam os peixes, mostram e depois soltam me parece muito mais cruel. Assim como os absurdos das touradas e dos rodeios c0m maus-tratos sérios. Pior ainda são os milhares do vacas, porcos e galinhas que vão para o sacrifício todos os dias e sem qualquer tipo de anestesia somente para alimentar a fome humana e que ninguém fala. Imagine o absurdo de mortes de galinhas quando o garçon de uma churrascaria aparece com aquele espeto cheio de coração, Quais foram as anestesias que elas tomaram? Enfim, em uma sociedade carnívora, em que o preço da arroba o colocada na televisão todos os dias, me parece que um projeto de lei como este, não passa de Intolerância Religiosa e sempre às mesmas religiões que historicamente foram perseguidas. Ou seja, judaísmo, islamismo e religiõess de matrizes africanas.

Eduardo Barcelos Advogado09/11/2011 12:22 Responder

Legal, pra expiar meus pecados eu corto o pescoço do outro, isso parece até piada do português, aliás, seria cômico se não fosse trágico, por fim, quem cria, quem vende, quem compra, quem consome carne, não encontrará a felicidade nem vivo nem depois de morto.

arlete moraes costa babharel10/11/2011 12:33 Responder

É parece brincadeira de piq e esconde mas que absurdo, envolver religiões sacrifissio, isso não faz sentido pois o homem mata os animais diz que é para sua subsistencia .Há isso pode quanta hirronia não? Tinha que deixar claro maus tratos é você adiquirir um animal e abandona-lô isso sim faz parte de discussão mas ritos Deus é unico verdadeiro a qual não exige nada de nos basta cre e ser fiél e teras vida eterna em espirito e em verdade não em discussão e julgando querendo ser Deus na terra isso não é mandamento.

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