Palestrantes criticam modelo do ensino jurídico no Brasil, em webinar do IAB

O atual modelo do ensino jurídico no Brasil foi duramente criticado por todos os participantes.

Fonte: Enviado por Fernanda Pedrosa

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Reprodução: Pixabay.com

O VI Seminário da Comissão de Direito Constitucional do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), realizado nesta terça-feira (23/8), pelo canal TVIAB no YouTube, teve dois painéis na parte da tarde, abordando os temas A realidade histórica do ensino jurídico e seus reflexos no sistema de Justiça e Os desafios para a mudança estrutural do ensino jurídico e do sistema de Justiça. O atual modelo do ensino jurídico no Brasil foi duramente criticado por todos os participantes.


O objetivo do seminário foi debater o Bicentenário da Independência do Brasil e os desafios do ensino jurídico para a mudança estrutural do sistema de justiça. No primeiro painel, a professora da Universidade de Fortaleza (Unifor) Ana Paula Araújo fez um histórico da criação dos cursos superiores do Brasil, ressaltando que “o ensino jurídico no País já nasce deficitário, porque não nasce enquanto universidade. O Estado não se preocupa em fundar uma educação genuinamente brasileira e cria os cursos de Direito atrelados ao pensamento português”.


Segundo ela, “até hoje não somos independentes nas bases do ensino jurídico. O ensino dogmático, o ensino muito vinculado às matrizes religiosas não nos permitem abordar certos assuntos, como aborto, relações homoafetivas, por exemplo. Não conseguimos separar conhecimento científico do conhecimento religioso”. Sobre a criação do IAB, em 1843, ela disse que, embora tenha sido criado nos moldes do Instituto dos Advogados Portugueses, com a missão de disseminar a cultura jurídica exterior, “também teve a função de criar cultura jurídica local, daí a importância e relevância do nosso IAB”.


Fast food – O professor da Unisinos Lenio Streck foi enfático ao criticar o ensino do Direito no País: “Hoje nós temos o império da cultura fast food. Formamos uma multidão de protofascistas, reacionários, advogados que odeiam a Constituição e querem fechar o STF, e firmamos um imaginário lavajatista”. Em seguida, ele indagou: “O que houve com o ensino jurídico brasileiro? O que aconteceu no Brasil? Onde nós erramos? A democracia falhou? Vamos ter que responder a isso, do contrário o futuro será obscuro”.


Lenio Streck criticou também a maneira como são feitos os concursos públicos na área do Direito, “na base do decoreba, que deram origem aos cursinhos, ao direito facilitado e aos resumões”. Para ele, “enquanto o ensino jurídico for um lugar onde se prepara para a prova da OAB, o Direito no Brasil deu errado. A nossa tarefa é pesquisar o que deu errado, por que deu errado e quais são os nossos planos para o futuro. E a grande questão é: o que fazer com tudo que já está aí? Eis o nosso desafio”.


Como debatedor, o defensor público aposentado Roberto Reis fez uma retrospectiva da História do Brasil, começando com o governador Tomé de Souza e seu Regimento de 17 de dezembro de 1548. “Desde sempre vivemos sob a égide do patrimonialismo. O Brasil é comandado por uma elite que domina toda a trajetória da nossa história, muitas vezes com o apoio das Forças Armadas”, afirmou. Mas, segundo ele, “não precisamos das elites para existir como Nação; precisamos de uma palavra que define toda a problemática do Brasil: educação”.


O primeiro painel foi mediado pela professora da Faculdade Lusófona Tais Loureiro. Ela afirmou: “Vivemos um momento um tanto quanto delicado, apesar de termos uma certa esperança de mudanças, que também são desafiadoras. O ensino jurídico no Brasil e a mudança estrutural do sistema de justiça se fazem necessários. Como profissionais da área, temos que estar vigilantes quanto a esse momento em que a história está sendo feita”.


Bastião – O painel da tarde foi aberto pela professora Vania Aieta, presidente da Comissão de Direito Eleitoral do IAB. Ela falou do papel do Instituto como “bastião da defesa do Estado Democrático de Direito”, lembrando que a entidade “não poderia deixar de dar a sua contribuição para esse momento tão importante da vida do País, onde temos um divisor de águas entre a continuidade de uma série de questões de muito dissabor constitucional e todo o esforço dos acadêmicos, dos operadores do Direito e de todos aqueles que estão nessa empreitada de fortalecimento do Estado de Direito”.


Como debatedora, falou a professora aposentada Flora Strozemberg, ex-advogada de presos políticos. “Vejo com muita dor a situação atual das faculdades de Direito. São 1.927 faculdades de Direito no Brasil, alimentadas por dinheiro público e que não entregam o que lhes é exigido: a formação de bacharéis e professores, juízes, promotores e advogados com visão crítica e humanista”, afirmou ela.


Ex-reitor da Universidade de Brasília (UnB), José Geraldo de Sousa Júnior comentou o bicentenário da Independência, dizendo: “Ainda que tenha havido uma ruptura da colônia com a metrópole, que aponta para a soberania do País, a subordinação colonizadora permaneceu”. Ele acrescentou que é preciso “descolonizar os currículos”. Segundo ele, “a perda de confiança na cultura jurídica da nossa formação vai levar à perda da confiança na função social que exercemos”.


Fechando o segundo painel e o evento, o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão disse: “A questão do ensino jurídico no Brasil se revela talvez como um dos desafios maiores para a reconstrução nacional. Sabemos o que nós passamos nos últimos anos, com o completo desvio das funções dos operadores do Direito, utilizando suas prerrogativas e seus poderes para fazer uma política antipopular. O que estamos vivendo hoje tem muito do sistema judiciário do País”.


Com relação às razões que levaram a “esse desastre do sistema jurídico, que não transmite segurança às pessoas que buscam por Justiça”, Eugênio Aragão afirmou: “Acredito que a formação jurídica é uma grande responsável por isso. Outro problema é a seleção desses operadores. E um terceiro problema é o controle”.

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