Lixando-se para opinião pública

Gisele Leite. Professora universitária. Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, Doutora em Direito.

Fonte: Gisele Leite

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Recentemente, num arroubo o deputado gaúcho afirmou "estar se lixando para a opinião pública" foi afastado da relatoria de um processo que investigava um de seus pares no Conselho de Ética da Câmara dos Deputados.

Depois, tentou consertar a infeliz frase mas insistiu em alegar que não mudara de opinião. O verbo lixar provém de lixa que é de origem incerta e, em sentido figurativo significa não dar importância, embora que no seu sentido denotativo queira, de fato, indicar debastar ou alisar com lixa.

Parece incrível que um político chega a público revelar num pronunciamento aos seus pares que pouco importa com a opinião pública, exatamente quando ele precisa desta para angariar votos e, finalmente, ser um representante do povo... Agora, que é poderoso torna-se indiferente às suas opiniões e quiçá necessidades.

Outra pessoa que segue a mesma tese do ilustre deputado gaúcho é Silvio Santos pois recentemente tivemos um choro compulsivo da menor Maísa que consta como contratada do Programa de domingo. Aliás, é bom que se recorde que é vedado trabalho a menores de 14(quatorze) anos. Aliás, a possibilidade de se ter a contratação de menor aprendiz está prevista no Capítulo IV da CLT, com disposição dos arts. 402 ao 441 da CLT.

A jornada laboral do aprendiz é de no máximo seis horas diárias, restando proibidas a prorrogação e a compensação de jornada, pdoendo chegar ao limite de oito horas diárias desde que o aprendiz tenha completado o ensino fundamental (o que, aliás, não parece ser o caso da menor Maísa), e se nelas forem computadas as horas destinadas à aprendizagem teórica.

O contrato de aprendizagem não poderá exceder a dois anos e seus direitos são a receber saldo de salário, décimo-terceiro, férias acrescidas de 1/3 e FGTS do mês.

A cena presenciada em cadeia nacional é nitidamente de abuso e violação quer dos direitos da criança quer à ordem jurídica vigente que abomina tratamento degradante e desumano até mesmo para sentenciados.

Tanto a Constituição Federal quanto ao ECA são uníssonos em proibir expressamente o trabalho infantil. Felizmente parece que Ministério Público de São Paulo apesar de tardiamente acordado, irá propor a retirada do programa do ar, bem como a punição dos responsáveis pela cruel violação praticada.

Ainda que se trate de script e encenação, tal prática pode comprometer a integridade moral e psíquica da criança pois não se trata, frise-se, de uma peça teatral, nem mesmo uma encenação artística a promover elevados valores e com intuito educativo.

Queria parabenizar o advogado Carlos Nicodemos presidente do CEDCA do Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente que em sua entrevista a reportagem do Terra foi lúcido , instrutivo e bastante esclarecedor.

A própria família de Maísa pode vir também a responder processo por ter negligenciado que Maísa é uma criança de apenas seis anos de idade e não pode ser atemorizada por falsos monstros, ou verdadeiros, e, ainda, por causa de seu medo e agonia ter passado por constrangimento vindo inclusive a colidir com uma das câmeras do programa.

Cabia a família que deve estar acompanhando-a, intervir imediatamente para evitar um desfecho lesivo à infância e à psiquê da referida criança. Fato que não se deu. Tal omissão poderá até ser tipificada como abandono moral e material.

É impressionante perceber que as crianças perderam direito à sua infância, a ter seu crescimento saudável preservado e, não serem exploradas como mercadorias capazes de elevar IBOPEs de programas domingueiros de gosto no mínimo duvidoso.

Espero mesmo que as autoridades competentes como Conselho Tutelar e o Ministério Público tenha uma providencial intervenção poupando essa menina desta exposição lesiva e lixiviante. E, ainda, arbitrando uma indenização devida e apta a ressarcir possíveis danos à formação moral e psicológica da criança.

Outro fato relevante, é a tarja de "menina-prodígio" atribuída a Maísa também é perigosa pois pode ser exigida além de sua compreensão e da natural evolução da criança. É razoável que se investigue tudo profundamente tendo em vista que outros menores anteriores e que também trabalhavam no mesmo programa Priscila e Yudi. Cogita-se ainda no trabalho de outra menor chamada Rebeka Angel.

É um absurdo que tais violações a dignidade da pessoa humana, principalmente a uma criança só venham merecer atitudes das autoridades constituídas depois de uma dolorosa exposição, apesar da presença da mesma menor ocorrer já há bastante tempo.

Mas, antes tarde do que nunca... Mas parece que o dono do baú da felicidade está mesmo se "lixando" para opinião pública, não é? Mais um que despreza o respeito e a consideração de quem exatamente construiu o que eles significam.

Será ingratidão?


Notas:

* Gisele Leite. Professora universitária. Mestre em Direito, Mestre em Filosofia, Doutora em Direito. [ Voltar ]

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