Crianças refugiadas podem ficar no Brasil mesmo sem autorização do pai, diz TRF-3
Esse é o entendimento da 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que confirmou o direito de duas crianças nigerianas ficarem no país.
Crianças refugiadas têm o direito de permanecer no Brasil independentemente da autorização do pai ou de decisão judicial nesse sentido. Esse é o entendimento da 6ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que confirmou o direito de duas crianças nigerianas ficarem no país.
Para os magistrados, o direito à permanência no país concedido à mãe dos menores, que tem um filho brasileiro, garante também a permanência dos filhos estrangeiros.
Os menores ingressaram no país na condição de refugiados, com sua mãe, no começo de 2017. Seguindo o artigo 21 da Lei 9.474/97, foi conferido o direito de permanência enquanto a administração não proferisse decisão definitiva sobre o refúgio. Na sequência, a mãe dos menores teve com outro nigeriano, também refugiado, filho brasileiro, nascido em agosto de 2017, em São Paulo.
Por isso, solicitou o pedido de permanência definitivo no país em face do filho brasileiro e da necessidade de reunião familiar, segundo o artigo 30 (inciso I, letra j), artigo 37 (inciso II), e artigo 55 (inciso II, letra a) da Lei 13.445/17 (nova Lei de Migração) e da Portaria MJ 04/15. Porém, foi exigida autorização do pai das crianças que nasceram na Nigéria para o processamento do pedido de regularização migratória dos menores.
Após decisão favorável aos menores em primeira instância, a União apelou reafirmando a necessidade de autorização do pai para que fosse deferido o pedido, enquanto titular do poder parental. Apontou que as crianças estão acobertadas pelo ordenamento na condição de refugiados, mantido o direito à residência no país enquanto inexistente decisão definitiva sobre o refúgio — artigo 21 da Lei 9.474/97.
A defesa contestou, dizendo que a exigência se reputa ilegal, ausente previsão nesse sentido, e desproporcional, pois o contato com o pai é extremamente difícil. Ele não exerce qualquer influência parental ou econômica, constituindo inclusive nova família na Nigéria.
Ao analisar a questão, o relator do processo, desembargador Johonsom Di Salvo, explicou que as normas brasileiras garantem ao estrangeiro o direito de se fixar no país, caso mantenha filho brasileiro sob sua guarda, tutela ou dependência econômica ou socioafetiva.
“É o que se sucede nos autos, presumida a dependência afetiva e econômica do filho brasileiro perante seus pais biológicos, aqui havidos na condição de refugiados. Há, portanto, situação jurídica diversa da apresentada no ingresso dos mesmos no país, a ensejar o gozo do direito de aqui permanecer em definitivo diante da prevalência do interesse do menor.”
Segundo o magistrado, por decorrência lógica e mantida a prevalência do interesse do menor, o direito à residência definitiva deve abranger todo o núcleo familiar, alcançando não só os pais do filho brasileiro como também os filhos estrangeiros sob a tutela de seus pais.
“Violaria frontalmente o ordenamento brasileiro e internacional garantir a permanência do estrangeiro para proteção de prole brasileira, mas manter sob situação transitória no país seus demais filhos, aqui também residentes, sujeitando-os à separação compulsória caso não sejam admitidos em definitivo como refugiados”, ressaltou.
Para Johonsom Di Salvo, é desarrazoada a exigibilidade de autorização do pai dos menores para que seja processado o pedido de permanência definitiva, uma vez que há presunção de que a relação familiar é exercida pela mãe e seu atual companheiro.
“A unidade familiar abrange tanto a relação da mãe estrangeira com seu filho brasileiro quanto com seus filhos estrangeiros, devendo todos se aproveitar do visto de permanência”, explicou.
Por fim, apontou que o deferimento do pedido de permanência dos menores não afasta o direito de o pai nigeriano procurar o Judiciário ou os órgãos administrativos competentes de seu país para pleitear o exercício do direito de guarda e visitação.
“Observada a presente situação familiar e em observância da legislação vigente e do princípio da supremacia do interesse do menor (tanto brasileiro quanto estrangeiro), confirma-se o direito líquido e certo dos impetrantes verem processado seu pedido de permanência no país independentemente da autorização de seu genitor ou de decisão judicial nesse sentido”, concluiu.
Reexame Necessário 5023945-46.2017.4.03.6100