Condôminos, convivência razoável e responsabilidade.

Jaques Bushatsky, titular da Comissão de Direito Imobiliário e Urbanístico da OAB/SP e diretor da MDDI - Mesa de Debates do Direito Imobiliário.

Fonte: Jaques Bushatsky

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Foi recentemente veiculada a decisão da apelação cível n. 464012.4/4-00, alcançada pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, relatada pelo Desembargador Francisco Loureiro, jurista de reconhecido saber, cuidando de ofensas feitas por uma criança a um funcionário do condomínio. Na decisão, foi interpretada e afastada a alegação de que o menor não possuiria discernimento suficiente para compreender a ilicitude do ato; foi decidido que era irrelevante a inimputabilidade do menor e foi, por fim, decretada a responsabilidade dos pais a arcarem com a indenização pelos danos morais sofridos pelo empregado. Participaram do julgamento os eminentes Desembargadores Ênio Zuliani (presidente) e J.G. Jacobina Rabello (revisor)

Mais uma vez, como se vê, restou ao Judiciário, o balizamento de situações e de comportamentos que, este o esperado, deveriam ter sido resolvidos por nós, a Sociedade, se fossemos razoavelmente educados, ciosos, tivéssemos presente que vivemos em comunidades e que todos têm direitos... e deveres.

Realmente, se é verdade que cumpre naturalmente ao Judiciário deslindar os litígios, é igualmente verídico que poderíamos atribuir aos juízes, somente as questões efetivamente graves, difíceis. Impossível deixar de ver com vergonha (para os pais do garoto, é lógico, mas também para nós, cidadãos), essa necessidade de vir, o Tribunal de Justiça (a mais alta corte do Estado, composta por magistrados com enorme experiência), dar um puxão de orelhas nos responsáveis pela conduta de um filho.

Não é situação única, lamentavelmente, vista a crescente necessidade de invocação desse Poder para coactar atos terríveis de alguns políticos, más práticas - evidentes e danosas - de algumas empresas e de alguns profissionais, a renitência de alguns contumazes devedores, o despreparo mental e intelectual de alguns, para a vida comunitária. E, com repetição crescente e assustadora, para julgar questões que têm florescido onde moramos, nos condomínios.

A punição dos pais da criança mal educada é lição que força algumas ponderações de índole jurídica (sob as óticas comportamental e cultural, as conclusões perturbam pela inerente evidência). E a primeira, é que foi aplicada, muito bem, a lei: pais são responsáveis pela reparação civil, quanto aos filhos sob sua autoridade e em sua companhia, prevê o Código Civil; e este diploma legal dispõe claramente, acerca da obrigação de reparar o dano (material ou moral), prevendo que os bens do responsável estejam sujeitos àquela indenização. Mesmo que ocorra, ante a injúria, a difamação, ou a calúnia, dano exclusivamente moral, haverá fixação de indenização, de resto.

De outro lado, vale lembrar que nada impediria a promoção da ação, ante o Condomínio. Diga-se, que empregadores respondam por danos infligidos a seus empregados, não é novidade: por exemplo (até para que se veja que empregadora alguma está imune a condenações) o juiz Denílson Bandeira Coelho, do Distrito Federal, já condenou o Sindicato dos Trabalhadores do Poder Judiciário e Ministério Público da União no Distrito Federal, ao pagamento de R$ 70.000,00 de indenização a um empregado chamado de "burro" e de "incompetente" pelo chefe (na defesa, o empregador chegou a alegar que seria corriqueiro o uso de palavrões e de xingamentos naquele ambiente de trabalho); n´outro caso, um Condomínio foi condenado a arcar com indenização por dano moral, devida a empregado, diante de péssimo (quiçá histérico) comportamento de um morador: a comunidade condominial, integrada também por aquele autor dos impropérios, pagou pelos xingamentos dirigidos ao empregado (é preciso sublinhar: quem xingou foi um condômino, não o Síndico ou outro membro da hierarquia administrativa do prédio).

Todos, empresas ou condomínios têm necessidade de ter funcionários competentes e equilibrados e, se não o tiverem responderão pelos atos que os maus ou desidiosos trabalhadores praticarem, esta certeza é palmar e aconselha, aliás, senão o desejável treinamento, o desligamento do empregado inconveniente. No reverso, o que estes funcionários venham a sofrer na sua condição vinculada ao empregador, igualmente ensejará responsabilidade.

Sob outro aspecto essa condenação também merece análise: teria sido melhor (se pouco, para que se preservasse a discrição) a todos os envolvidos no vexatório episódio, se buscassem uma solução não judicial, legalmente aplicável: aí estão competentes cortes de mediação, conciliação, arbitragem. São entidades que têm exibido desempenho muito bom, sendo perfeitamente adequadas para a solução desses casos.

E, por que não cuidar de casos desse naipe, no próprio condomínio? Vários têm incentivado a criação de comitês para a solução de desavenças (como ocorre nos clubes e nos conselhos de profissionais, por exemplo), têm contratado especialistas em dinâmica de grupo e têm incentivado debates francos e honestos, trazendo os condôminos para as assembléias, foro privilegiado e específico para o desaguar das insatisfações, a discussão das possibilidades de solução, a oferta de um convívio salutar.

Tudo isso, sempre resgatada a simples, porém às vezes esquecida certeza de que os moradores em condomínios, não residem em chácaras longínquas e precisam observar algumas regras comezinhas, presentes tanto em manuais de boas maneiras quanto no direito de vizinhança (novamente, nosso Código Civil): respeito ao sossego, à saúde, à segurança, abstendo-se, diariamente, cada condômino, de constranger os demais, à participação ou ao enfrentamento de episódios ora mesquinhos, ora lamentáveis. Tudo, sob as penas da lei.


Palavras-chave: Condôminos

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2 Comentários

Davi Eletrotécnico15/04/2008 21:24 Responder

Pois é, caro Dr. Talvez isso seja exemplo que vemos todos os dias na alta esfera política (na verdade em todos os cantos). Então passa a se concluir que "tudo podemos" também, sem a devida responsabilização. Veja o Sr. que no condomínio onde resido, o síndico resolveu acrescentar mais uma vaga de garagem obstruindo outras 8. E que, se um dos 8 quiser se locomover tem que empurrar esse veículo prá lá ou pra cá. Diálogo? Nem pensar. Reclamar? Pode. Mas ele não irá fazer nada. Pois os demais, que são mais de 80, não se importam. Não é problema de nenhum deles. "Não custa nada". "O que é que tem?" "Se dá para por mais um..." É aquela velha história "de hoje é só uma flor, amanhã o jardim...."

Davi Eletrotécnico15/04/2008 21:56 Responder

Pois é, caro Dr. Talvez isso seja exemplo que vemos todos os dias na alta esfera política (na verdade em todos os cantos). Então passa a se concluir que "tudo podemos" também, sem a devida responsabilização. Veja o Sr. que no condomínio onde resido, o síndico resolveu acrescentar mais uma vaga de garagem obstruindo outras 8. E que, se um dos 8 quiser se locomover tem que empurrar esse veículo prá lá ou pra cá. Diálogo? Nem pensar. Reclamar? Pode. Mas ele não irá fazer nada. Pois os demais, que são mais de 80, não se importam. Não é problema de nenhum deles. "Não custa nada". "O que é que tem?" "Se dá para por mais um..." É aquela velha história "de hoje é só uma flor, amanhã o jardim...."

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