Atrasos no pagamento de salários e as consequências ao empregador
O presente artigo discorre sobre atrasos no pagamento de salários e as consequências ao empregador
A onerosidade é um dos elementos necessários no contrato de emprego, sem o qual não haverá o reconhecimento do vínculo e, assim, será afastada a relação empregatícia, se configurando trabalho voluntário entre tomador e prestador dos serviços, conforme art. 3º da CLT.
A alteridade é elemento presente no contrato de emprego, sendo configurada na prestação de serviços pelo obreiro em favor do empregador e sob sua exclusiva conta e risco, ou seja, não podem os prejuízos do empreendimento ser divididos com os empregados, salvo a indenização dos prejuízos causados por estes, desde que tenha dolo (intenção) ou haja previsão em contrato (art. 462, §1º da CLT).
Diante disso, havendo ou não lucro, estando ou não em crise, a empresa é obrigada a arcar com as verbas trabalhistas de seus empregados, que possuem natureza alimentar e devem ser quitadas independentemente da saúde econômico-financeira do empregador.
Todavia, há inúmeros casos em que os empregados são preteridos no pagamento da contraprestação de seu trabalho, já realizado e de impossível restituição, motivo pelo qual os trabalhadores buscam a tutela da Justiça do Trabalho para fazer cessar tal ilegalidade.
Ao atraso ou não pagamento de salários a modo e tempo, dá-se o nome de mora contumaz, que se configura pela sonegação dos direitos trabalhistas nos prazos fixados em lei. Quanto ao momento do pagamento, eis o que dispõe a CLT:
“Art. 459 - O pagamento do salário, qualquer que seja a modalidade do trabalho, não deve ser estipulado por período superior a 1 (um) mês, salvo no que concerne a comissões, percentagens e gratificações.
§ 1º Quando o pagamento houver sido estipulado por mês, deverá ser efetuado, o mais tardar, até o quinto dia útil do mês subsequente ao vencido.”
Percebe-se que, nos moldes da lei, o pagamento do salário, estipulado por mês, deverá ser pago o mais tardar até o quinto dia útil do mês subsequente ao vencido, o que, por vezes não é observado.
Referido atraso, caso ocorra de forma reiterada, gera a justa causa do empregador, conforme previsão do art. 483, ‘d’ da CLT, sendo absolutamente desnecessário que ocorra por período dilatado (três meses ou mais como defende parte da doutrina) nesse sentido o entendimento do C. Tribunal Superior do Trabalho:
“Ementa: RECURSO DE REVISTA. RESCISÃO INDIRETA. MORA SALARIAL. Não é necessário que o atraso no pagamento dos salários se dê por período igual ou superior a três meses, para que se configure a mora salarial justificadora da rescisão indireta do contrato de trabalho. O Decreto-Lei nº 368/68 diz respeito apenas aos efeitos administrativos e fiscais em desfavor da empresa com débitos salariais com seus empregados, de modo que o prazo amplo de três meses para a incidência das restrições nele previstas se justifica, nesse aspecto, a fim de viabilizar a reorganização da empresa e a quitação de suas dívidas. Quando, no entanto, se entra na seara do Direito do Trabalho, o prazo de três meses previsto no § 1º do artigo 2º da referida lei é extremamente longo, na medida em que o salário tem natureza reconhecidamente alimentar. Assim, não é justificável que um empregado tenha que aguardar pacificamente mais de noventa dias para receber a contraprestação pecuniária pelo trabalho já prestado. No caso, o atraso no pagamento de salários por dois meses já autoriza a rescisão indireta do contrato de trabalho por culpa do empregador, fundada no art. 483, d, da CLT. Recurso de revista a que se nega provimento.” (TST - RR Tribunal Superior do Trabalho 48800-93.2009.5.13.0022 - Relator: Kátia Magalhães Arruda - Data de Publicação: 06/07/2012 - Data de Julgamento: 27/06/2012) g. n. Fonte: JusBrasil.
O mesmo entendimento vem sido aplicado pelo Tribunal Regional do Trabalho da 23ª Região/MT, em razão do não recolhimento do FGTS, assim:
“Ementa: RESCISÃO INDIRETA. ATRASOS SALARIAIS E AUSÊNCIA DE RECOLHIMENTOS DAS CONTRIBUIÇÕES PARA O FGTS. INCIDÊNCIA, NO CASO, DO ART. 483. ALÍNEA 'D', DA CLT. Os constantes atrasos salariais somados a ausência de recolhimento de contribuições mensais para o FGTS configuram, na linha das decisões do TST, transgressão ao dever patronal de cuida a alínea 'd' do art. 483 da CLT, o que é suficiente para reconhecer a falta grave patronal e acolher a tese de rescisão indireta do empregado.” (TRT 23. Processo: RO 197201000823002 MT 00197.2010.008.23.00-2. Órgão Julgador: 1ª Turma. Relator(a): DESEMBARGADOR EDSON BUENO. Julgamento: 05/07/2011. Publicação: 07/07/2011.) g. n. Fonte: JusBrasil.
Ademais, além da resolução do contrato de emprego por justa causa do empregador, a mora contumaz gera o dever de indenização por danos morais, pois com referida atitude o empregador gera lesão extrapatrimonial ao empregado, ao submetê-lo a situação que o impossibilita de saldar seus compromissos mais comezinhos com alimentação, moradia, saúde, educação dentre outros.
Neste sentido, eis a jurisprudência:
“Ementa: INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. ATRASO SALARIAL.
O atraso reiterado no pagamento de salários caracteriza ato de gravidade suficiente a ensejar o direito à reparação por dano moral. Sentença reformada. Como já registrado, no caso em análise restou incontroverso o atraso no pagamento dos salários, ainda que decorrente de problemas de repasse orçamentário na Prefeitura. Assim, resta comprovada a ocorrência do ato ilícito a produzir efeitos na esfera jurídico-patrimonial do reclamante. Quanto ao dano, entendo ser este presumido (in re ipsa), uma vez que o atraso na quitação salarial viola direitos da personalidade do trabalhador. Não há dúvida que sem salário, cuja natureza é alimentar, o obreiro não terá condições de se alimentar, de pagar o aluguel, comprar itens de higiene, ou mesmo cuidar da saúde e educação sua e de seus dependentes. Neste sentido, decisões do C. TST: RR - 857-16.2008.5.10.0017. Relatora Ministra: Delaíde Miranda Arantes, 7ª Turma. Data de Publicação: DEJT 14/02/2014; e RR - 1314-50.2011.5.04.0004. Relatora Ministra: Maria de Assis Calsing, 4ª Turma. Data de Publicação: DEJT 14/02/2014.” (TRT 4. RO RO 00003908420125040204 RS 0000390-84.2012.5.04.0204. Relator (a) LAÍS HELENA JAEGER NICOTTI. Julgamento: 26/02/2014. Órgão Julgador: 4ª Vara do Trabalho de Canoas TRT 4). G. n. Fonte: JusBrasil.
Assim, resta claro que o não pagamento do salário da forma determinada em lei pode gerar consequências ao empregador inadimplente, sendo estas mais gravosas que a simples correção monetária dos valores, prevista na súmula 381 do C. TST, posto que dá causa à rescisão indireta do contrato de emprego, com a obrigação do pagamento de todos os direitos trabalhistas equivalentes à dispensa imotivada (sem justa causa do empregado), bem como o dever de indenizar o empregado por ofensa moral.