Resumo da ópera. Atuação do STF em 2023
Por Gisele Leite
É
verdade que tanto o Congresso Nacional como o Supremo Tribunal Federal têm
protagonizado debates simultâneos sobre vários temas e os tratados de formas
divergentes.
Nesse
fim de 2023, avaliamos a respeito da tese do marco temporal para a demarcação
de terras indígenas. A Suprema Corte começou a discutir o tema ainda em agosto
de 2021, e concluiu o julgamento em 21.09.2023, por nove a dois, a Suprema Corte
malbaratou o entendimento de que só poderiam ser demarcadas as terras que já se
encontravam sendo ocupados por indígenas no dia 5 de outubro de 1988 que foi a
data de promulgação da Constituição Federal brasileira vigente.
Além
do marco temporal, o Judiciário e Legislativo brasileiro também discutiram de
forma simultânea, a saber: a descriminalização do aborto; descriminalização do
porte de drogas para o usuário; o imposto sindical também conhecido como
contribuição sindical; quociente eleitoral das chamadas "sobras eleitorais";
casamento entre pessoas do mesmo sexo.
Os
ministros também começaram a julgar a descriminalização do aborto até a décima-segunda
semana de gestação. No fim de setembro, a então ministra Rosa Weber, atualmente
aposentada, votou a favor da descriminalização do aborto, mas um pedido de
destaque apresentado pelo ministro Luís Roberto Barroso levou a ação para o
plenário físico, ainda sem data para o julgamento.
Em seu
voto, a Ministra Rosa Weber afirmou que a “justiça social reprodutiva, fundada
nos pilares de políticas públicas de saúde preventivas na gravidez indesejada,
revela-se como desenho institucional mais eficaz na proteção do feto e da vida
da mulher, comparativamente à criminalização”.
Atualmente,
a distribuição das sobras é acessível a todos os partidos que participem do
pleito, desde que: O candidato tenha obtido votação equivalente a 20% do
quociente eleitoral; O partido do candidato tenha obtido votação equivalente a
80% do quociente eleitoral.
Em
paralelo, deu-se os relevantes debates dos temas acima citados, o Judiciário e
Legislativo também tiveram desentendimentos sobre a decisão de habeas corpus
para depoentes convocados peal Comissão Parlamentar Mista de Inquérito (CPMI).
Em
18.9.2023 o Ministro André Mendonça acatou pedido de defesa de Osmar
Crivelatti, ex-assessor de Jair Bolsonaro (PL), para que ele não fosse obrigado
a comparecer à comissão para depor.
Anteriormente,
em 11 de setembro do corrente ano, o Ministro Nunes Marques concedeu habeas
corpus a Marília Ferreira, ex- subsecretária de Inteligência da Secretaria
de Segurança Pública do Distrito Federal, para que também não fosse obrigada a
prestar esclarecimentos. E, o impasse se
formou, porque nessas duas decisões, o STF permitiu que os convocados não
fossem obrigados a comparecer e tanto Crivelatti quanto Marília, assim o
fizeram.
Frise-se
que as decisões do STF garantiram aos depoentes o natural direito ao silêncio
em questionamentos que pudessem incriminá-los. O então presidente da CPMI
classificou os dois habeas corpus concedidos como firmes tentativas de impedir
os trabalhos do colegiado e questionou própria existência da CPMI.
Também,
nesse ano que finda, obtivemos a solução para diversas questões trabalhistas
relevantes como a análise de temas controvertidos. podemos trazer decisões
importantes do STF como, por exemplo a grande mudança de entendimento em
relação à extensão da contribuição assistencial fixada pelos sindicatos em
acordos e convenções coletivas (Tema 935).
Ao
julgar o agravo em Recurso Extraordinário 1.018.459 (Tema de Repercussão Geral
935), o STF alterou substancialmente o seu posicionamento, passando a autorizar
esse desconto, dos empregados não sindicalizados, desde que seja garantido o
direito de oposição, ou seja, de manifestarem a vontade de não querer pagar.
Essa
alteração de entendimento possui como um de seus fundamentos o enfraquecimento
das entidades sindicais em razão da alteração trazida pela reforma trabalhista,
que tornou facultativa a contribuição (imposto) sindical.
Como
consequência desta alteração de entendimento, deverá a jurisprudência, tanto do
Tribunal Superior do Trabalho, quanto do Supremo Tribunal Federal, estabelecer
quais são os limites da cobrança, se existentes e quais as formas válidas para
garantir uma oposição justa e eficiente daqueles empregados que não quiserem
realizar o pagamento. O tema já tem gerado denúncias de excessos por algumas
entidades sindicais tanto no âmbito administrativo, quanto judicial.
Outro
ponto que foi tratado pelo STF é a necessidade de observação do artigo 386 da
CLT, ou seja, quando ocorrer o trabalho aos domingos, a escala da mulher deve
intercalar com o domingo quinzenalmente e não a cada três semanas.
O
entendimento foi firmado em decisão de relatoria da Ministra Carmem Lúcia no
ARE 1403904. A decisão teve como fundamentos a norma protetiva à mulher do
artigo 386 da CLT e o mesmo raciocínio utilizado no tema de repercussão geral
528, que foi fixado quando o STF analisou a constitucionalidade do intervalo da
mulher previsto no antigo artigo 384 da CLT, hoje revogado pela reforma
trabalhista.
O Plenário do Supremo Tribunal Federal
(STF) decidiu que a implementação do piso salarial da enfermagem, em relação
aos profissionais celetistas em geral, deve ocorrer de forma regionalizada,
mediante negociação coletiva nas diferentes bases territoriais e nas
respectivas datas-bases. O entendimento foi que deve prevalecer o negociado
sobre o legislado, tendo em vista a preocupação com eventuais demissões e o
caráter essencial do serviço de saúde.
A decisão se deu, na sessão virtual
finalizada em 18/12/2023, no julgamento de recurso (embargos de declaração)
apresentado na Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7222.
Prevaleceu a divergência aberta pelo
ministro Dias Toffoli. Por maioria, o STF entendeu que o prazo de 60 (sessenta)
dias, originalmente previsto no julgamento da ADI, para a realização de
negociações coletivas acabou se tornando, na prática, um desestímulo à própria
negociação. Isso porque as partes (empregados e empregadores) partiam da
certeza de que a Lei 14.434/2022, que instituiu o piso, seria necessariamente
aplicada após o fim do prazo.
STF também definiu que o piso salarial se
refere à remuneração global, e não ao vencimento-base, correspondendo ao valor
mínimo a ser pago em função da jornada de trabalho completa. A remuneração pode
ser reduzida proporcionalmente, no caso de carga horária inferior a 8(oito)
horas por dia ou 44 (quarenta e quatro) horas semanais.
Após julgamento no Plenário Virtual, o
Supremo Tribunal Federal (STF) definiu, por oito votos a dois, que o piso
nacional da enfermagem deve ser pago aos trabalhadores do setor público pelos Estados
e municípios na medida dos repasses federais.
Por voto médio, o Tribunal definiu que
prevalece a exigência de negociação sindical coletiva como requisito
procedimental obrigatório, mas que, se não houver acordo, o piso deve ser pago
conforme fixado em lei. Além disso, a aplicação da lei só ocorrerá depois de
passados sessenta dias a contar da publicação da ata do julgamento, mesmo que
as negociações se encerrem antes desse prazo.
O voto médio foi necessário uma vez que,
em relação ao setor privado, três correntes de votos foram registradas. As
informações constam da proclamação do resultado da Ação Direta de
Inconstitucionalidade (ADI) 7222, que trata do piso, feita pelo presidente em
exercício da Corte, ministro Luís Roberto Barroso, que também é relator da
ação.
Além disso, ficou definido, por oito votos
a dois, que o pagamento do piso salarial é proporcional à carga horária de oito
horas diárias e 44(quarenta e quatro) horas semanais de trabalho, de modo que
se a jornada for inferior o piso será reduzido.
Outra decisão que causou impacto e terá repercussão a longo prazo foi o julgamento da ADI 5.322, por meio da qual houve a declaração de inconstitucionalidade de alguns artigos da Consolidação das Leis do Trabalho que tratavam dos motoristas profissionais.
Eis algumas inovações: O tempo de almoço deve ser de,
pelo menos, 1 hora; A lei determina que em vinte e quatro horas de trabalho, o
motorista deve descansar por 11(onze) horas; não é mais permitido dividir o
repouso semanal em dois períodos, sendo um mínimo de 30 horas seguidas, a serem
usufruídos no retorno de uma viagem de longa duração. Também não é mais
possível acumular descansos semanais em viagens de longa distância.
Seja
no transporte rodoviário de carga ou de passageiros, não é permitido um período
contínuo de direção que seja acima de cinco horas e trinta minutos.
No
entanto, em resumo, o Supremo entendeu que os dispositivos declarados
inconstitucionais eram prejudiciais aos empregados, violando direitos
garantidos constitucionalmente. Como exemplo, podemos citar o antigo tempo de
espera, que era excluído da jornada de trabalho.
Eis
que houve a análise pelo STF, na ADI 6.050, em relação à aplicação dos artigos
223-A e 223-G da CLT. Ao analisar a ação direta de inconstitucionalidade, a
Suprema Corte entendeu que referidos dispositivos devem ser considerados apenas
como critério orientador de fundamentação do juiz, não servindo como limitador
da indenização.
O
Supremo Tribunal ainda apontou um direcionamento firme em relação ao seu
entendimento quanto aos casos de terceirização, pejotização e vínculo de
emprego de motoristas de aplicativo. Isso ocorreu em razão da análise de
diversas reclamações constitucionais ajuizadas que instigaram que a Suprema
Corte fizesse a análise de diversos casos concretos sob a ótica dos julgados
proferidos anteriormente, expandindo, assim, a compreensão dos casos que
estariam abarcadas por aquelas decisões.
Aguardaremos
para 2024, temos julgamentos aguardados por muitos como, por exemplo, a
possibilidade de inclusão de empresas do mesmo grupo econômico na execução
trabalhista, quando essa não tenha participado da fase de conhecimento.
Referida
decisão poderá causar impacto expressivo tanto na satisfação do crédito de
trabalhista quanto, também, na visão doutrinária da figura do empregador único,
afinal, até onde se justificaria entender pela aplicação do empregador único em
relação à exigência da mão de obra do mesmo empregado, para todas as empresas
do grupo, sem gerar um novo contrato de trabalho se, no momento de satisfazer o
crédito trabalhista, todas que aproveitaram da mão de obra não podem ser
cobradas?
E, referente
à ADI 5090 que trata do fator de correção monetária do FGTS. Esse julgamento
reflete diretamente no rendimento dos trabalhadores, uma vez que o resultado
desse julgamento fixará como deverão ser corrigidos os valores de FGTS, sendo
que, até o momento, a tese que foi proposta é no sentido de que a correção do
FGTS não pode ser inferior à da caderneta de poupança. No entanto, o julgamento
ainda está pendente, considerando o pedido de vista.
Quanto
a ADPF 944, por meio da qual a CNI questiona a constitucionalidade das decisões
da Justiça do Trabalho quanto à destinação das verbas resultantes de
condenações pecuniárias em ações civis públicas para finalidade diversa do
previsto na Lei da Ação Civil Pública.
Essa
decisão reflete diretamente na sociedade uma vez que, não tendo sido
constituído o fundo para destinação dessas verbas, em geral a Justiça do
Trabalho destina a entidades beneficentes que tenham afinidade com o tema
discutido na ação civil pública, o que auxilia essas entidades no exercício de
sua atividade filantrópica/beneficente.
O
Ministro Luís Roberto Barroso participou em 20.12.2023 do evento de promulgação
da Emenda Constitucional 123/2023, que promove a Reforma Tributária. “Essa
reforma terá um impacto muito grande sobre o Poder Judiciário. Tenho a
expectativa de que ela possa diminuir a litigiosidade tributária no Brasil, que
traz muita imprevisibilidade para as contas do governo e das empresas de uma
maneira geral”, afirmou,
Para o
Ministro, a reforma deve avançar mais. “Essa foi a primeira parte da reforma,
que é de simplificação. Agora o desafio é fazer com que o sistema seja mais
justo. A base da arrecadação está na tributação sobre o consumo, em que todas
as pessoas pagam o mesmo. Os modelos de justiça social envolvem a tributação
direta”.
Na
avaliação popular da atuação do STF enquanto 27% aprovaram, 38% reprovaram
revelou a pesquisa Datafolha publicada pelo Jornal Folha de S. Paulo em
9.12.2023. E, a margem de erro é de dois pontos percentuais, para mais ou
menos. O levantamento foi feito com 2.004 pessoas em 135 cidades, no dia 5 de
dezembro.
O
levantamento indicou que houve piora na avaliação do STF em comparação com
dezembro de 2022, quando houve empate no índice de aprovação e reprovação
(31%).
Segundo a pesquisa AtlasIntel-Jota brasileiros estão rachados quanto à confiança no STF e, o Ministro Alexandre de Moraes é o de maior popularidade, mas empata tecnicamente na liderança da rejeição com o Ministro Gilmar Mendes. Informou ainda a referida pesquisa que a desconfiança dos brasileiros sobre o STF é maior entre eleitores de Bolsonaro, homens, jovens entre 25 a 34 anos, evangélicos, com escolaridade até ensino médio e que possuem renda familiar de dois a três mil reais.
Referências
G1
Datafolha: 388% reprovam atuação do STF, enquanto 27% aprovam. Disponível
em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/12/09/datafolha-38percent-reprovam-atuacao-do-stf-enquanto-27percent-aprovam.ghtml
Acesso em 25.12.2023.
JOTA. Brasileiros
estão rachados quanto à confiança no STF, diz pesquisa AtlasIntel-JOTA. Disponível
em: https://www.jota.info/stf/do-supremo/brasileiros-estao-rachados-em-relacao-a-confianca-no-stf-diz-pesquisa-atlasintel-jota-13012023
Acesso em 25.12.2023.