Parecer Jurídico sobre ICMS Ecológico
Sua eficácia como instrumento de Política Ambiental.
O
questionamento cinge-se a implantação do ICMS Ecológico?
O ICMS Ecológico foi pioneiramente instituído no Estado do Paraná, em 1991, sob a sigla ICMS-E e veio a ser sucessivamente adotado por diversos Estados da federação brasileira, sendo já implantado em apenas treze dos entes federativos, a saber: Paraná (1991), São Paulo[1] (1993), Minas Gerais (1995), Amapá (1996), Rondônia (1996), Rio Grande do Sul (1997), Mato Grosso (2000), Mato Grosso do Sul (2000), Pernambuco (2000), Tocantins (2002), Acre (2004), Goiás (2007), Rio de Janeiro (2007).
Sendo
oportuno enfatizar que o ICMS Ecológico é, realmente, eficaz como instrumento
de política ambiental, pois à luz da
experiência dos Estados já praticantes, trouxe evidentes vantagens em
comparação com os demais mecanismos de controle tradicional e que tem conduzido
aos resultados objetivamente positivos.
Vive-se,
no agora, a sociedade de risco referida por Ulrich Beck[2] em seu Risk Society
and the Provident State, que, conquanto alcançando níveis de desenvolvimento
jamais imaginados, tem, paradoxalmente, a sua própria sobrevivência posta em
cheque pelos perigos - sociais, políticos, ecológicos –, potencialmente
catastróficos, decorrentes deste mesmo desenvolvimento, os quais já não podem
mais ser contidos pelos mecanismos de controle até então empregados.
Percebe-se,
assim, a instalada “crise de legitimidade do sistema econômico predador e
degradador, que começou a surtir efeitos dentro do próprio sistema” , a partir
de seus respectivos agentes, que passaram a propugnar a necessidade de uma
mudança de paradigma na atividade econômica: há que se preservar se não se quer
sucumbir.
A
noção desenvolvimento sustentável surge sob o influxo desse novo standard, prescrevendo
uma forma de crescimento econômico que, partindo da consciência de que os bens
da natureza (limitados) não bastam à satisfação das múltiplas necessidades
humanas (ilimitadas), persiga o consumo
racional, previdente e ordenado de tais recursos, e promova a sua constante
renovação.
No
Brasil, nosso país que é detentor da maior riqueza biológica do mundo, não
poderia ser diferente: a Constituição Federal de 1988, no compasso do movimento
internacional de ampla reestruturação do capitalismo e construção de uma nova
ordem econômica, reconhece, em seu art. 225, o direito das presentes e futuras
gerações ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, determinado à
coletividade e ao Poder Público a sua efetivação, em regra que, consoante
entendimentos doutrinários de escol, logra elevar ao status de direito
fundamental a referida garantia, entendida esta como manifestação do direito à
vida e à existência digna, e, com tal qualidade, como pressuposto ao exercício
lógico dos demais direitos, pois, é intuitivo, somente aqueles que têm vida
podem exercitar as demais prerrogativas humanas, de natureza social, política
ou personalista.
Nesse sentido, é notável a lição de José
Afonso da Silva: “A Constituição, com isso, segue, e até ultrapassa, as
Constituições mais recentes (Bulgária, art. 3, ex-URSS, art. 18, Portugal, art.
66, Espanha, art. 45) na proteção do meio ambiente. Toma consciência de que a
qualidade do meio ambiente se transformara num bem, num patrimônio, num valor mesmo,
cuja preservação, recuperação, e revitalização se tornaram num imperativo do
Poder Público, para assegurar a saúde, o bem-estar do homem e as condições de
seu desenvolvimento”.
Em
verdade, para assegurar o direito fundamental à vida. As normas constitucionais
assumiram a consciência de que o direito à vida, como matriz de todos os demais
direitos fundamentais do homem, é que há de orientar todas as formas de atuação
no campo da tutela do meio ambiente. Compreendeu que este é um valor
preponderante, que há de estar acima de quaisquer considerações com as de
desenvolvimento, como as de respeito ao direito de propriedade, como as da iniciativa
privada.
Também
estes são garantidos no texto constitucional pátrio, mas, a toda evidência, não
podem primar sobre o direito fundamental à vida, que está em jogo quando se
discute a tutela da qualidade do meio ambiente, que é instrumental no sentido
de que, através dessa tutela, o que se protege é um valor maior: a qualidade da
vida humana.” (Curso de Direito Constitucional Positivo. 12. ed. São Paulo:
Malheiros, 1996, p.144).
Oportuno
também salientar que, superada a noção de neutralidade estatal que tanto caracterizou
o liberalismo, o Estado cuida de produzir normas que legitimem a sua intervenção
no domínio econômico, dotando-os do instrumental necessário para, enfim,
mediante atuação direta ou indireta, galgar, inclusive na esfera ambiental fins
que reputem necessários.
Coube,
ainda, aos arts. 173 e 174 da Constituição explicitar as formas de intervenção
estatal na economia, sendo que o primeiro deles cuida da chamada intervenção direta,
ou, segundo Eros Roberto Grau , intervenção no domínio econômico, de caráter excepcional
e somente admissível à vista de “imperativos da segurança nacional” ou “relevante
interesse coletivo”, ao passo em que o segundo versa em derredor da modalidade de
intervenção indireta, ou, ainda conforme Grau, intervenção sobre o domínio
econômico, sendo a que mais de perto interessa aos objetivos do presente
trabalho, por ser nesta seara que se desenvolve a chamada tributação ambiental.
O ICMS
Ecológico é a denominação que se convencionou utilizar para qualquer sistema
normativo que fixe o percentual que cada Município de um determinado Estado tem
direito a receber, quando da repartição de receitas oriundas da arrecadação de
ICMS, segundo critérios de caráter ambiental.
Para
sua escorreita compreensão, é mister recordar o art. 158 da Constituição Federal,
que destina aos Municípios 25% (vinte e cinco por cento) do produto da
arrecadação do ICMS, creditando-lhes esta receita conforme os seguintes
critérios: I) três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado fiscal
(VAF), nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de
serviços realizadas em seus territórios. Nos termos da Lei Complementar nº 63,
de 11 de janeiro de 1990, o VAF corresponde ao valor das mercadorias saídas,
acrescido do valor das prestações de serviços, no território do Município,
deduzido o valor das mercadorias entradas, em cada ano civil.
Destarte,
quanto maior a aptidão do Município para gerar receitas tributárias decorrentes
da circulação de mercadorias e serviços, maior será seu VAF[3] e, portanto, sua parcela
de repasse de ICMS, donde se conclui que o critério de distribuição aqui
previsto beneficia os Municípios economicamente mais desenvolvidos.
II)
até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual. Aqui, o Estado tem autonomia
para definir os critérios de distribuição da receita, de acordo com suas especificidades
econômicas e sociais, e com os objetivos visados em suas políticas públicas.
O ICMS,
a seu turno, situa-se exatamente nessa
última fatia os 25% (vinte e cinco por cento)
da receita de ICMS destinados aos Municípios, cuja fórmula de rateio caberá ao
Estado definir.
Não se
trata de imposto novo, mas apenas de reformulação dos critérios legalmente previstos para repasse de receitas tributárias
às municipalidades, induzindo-as a adotar medidas de preservação ambiental e de
incremento da qualidade de vida.
Em
nenhum dos Estados, as receitas repassadas aos Municípios encontram-se vinculadas
a despesas com programas de preservação ambiental. Assim o é, por força do disposto
no art. 167, inciso IV, da Constituição Federal, que veda a vinculação de
receitas provenientes da arrecadação de impostos. Porém, é certo que, conquanto
não obrigado pelo Estado a aplicar tais recursos em políticas ambientais, o
Município beneficiado pelo novo sistema irá fazê-lo sponte própria, se quiser
manter ou melhorar seu índice de participação nas transferências de ICMS.
Analisado
o contexto histórico em que se deu a concepção do ICMS-E no Estado da Paraná,
sua feição original e a evolução normativa percebida no decorrer de sua implantação
em outros 12 (doze) Estados federativos, é seguro concluir que, nos moldes atuais,
tal instituto se predispõe ao cumprimento de duas funções essenciais:
compensatória e indutiva.
Pela
primeira (compensatória) – única visada quando de sua concepção –, o ICMS-E se
propõe a restabelecer o equilíbrio econômico entre os Municípios de um mesmo Estado,
reparando o prejuízo daqueles que sofrem restrições de uso de seu território,
por força da existência de áreas de proteção ambiental[4].
No
exercício da função indutiva, que melhor o caracteriza atualmente, o ICMS-E é
posto a serviço da política de proteção ambiental do Estado, que, mediante
promessa de incremento de receitas tributárias, logra induzir os Municípios a
formularem e aplicarem programas que privilegiem a conservação ambiental, o desenvolvimento
sustentável, o saneamento ambiental e a elevação de seus indicadores sociais.
Nesse
sentido é que o ICMS-E, como autêntico representante da categoria dos instrumentos
econômicos de indução, na modalidade de extrafiscalidade[5] tributária, ostenta, como
comprovam as experiências relatadas no item precedente, expressivas vantagens aplicativas.
Inicialmente, vale acentuar que o ICMS
Ecológico realiza à perfeição o ideal do desenvolvimento sustentável abraçado
por nossa Constituição, segundo o qual, os valores da preservação ambiental e
do desenvolvimento econômico são ambos importantes e ponderáveis, e como tais
devem ser postos em linha de conciliação.
Deveras,
a concepção do instrumento em questão tem, na sua base - e é exatamente este o seu
grande diferencial -, a compreensão de que “o problema ecológico é de natureza
econômica e, portanto, o seu tratamento somente se fará com êxito mediante a utilização
de instrumentos conaturais ao próprio sistema econômico”.
Assim
é que a sistemática do ICMS-E busca desvincular a preservação ambiental da
carga negativa que normalmente é a ela associada, como um custo a ser
suportado, conferindo aos recursos naturais tratamento de “ativos financeiros”
ao lhes atribuir valor monetário, e possibilitar, desse modo, que a conservação
da ambiência seja vista não como uma obrigação apenas, mas antes como uma
estratégia de crescimento econômico para os Municípios.
Trilhando
por esta senda, e na medida em que recompensa financeiramente a preservação
ambiental, o ICMS Ecológico trabalha com conceitos como prêmio e vantagem, tão
caros ao capitalismo, “falando” uma linguagem que este entende e aprecia, o que
abaliza a sua aptidão para funcionar como indutor dos comportamentos
preservacionistas dos Municípios que alcança, sem, contudo, deixar de atender,
paralelamente, aos reclamos de desenvolvimento econômico destes mesmos entes
públicos.
Ao
implementar o ICMS Ecológico, os Estados adotam, naquilo que vem sendo apontado
como valioso aprendizado institucional, política pública que não se concretiza
pela recomposição do dano ocorrido e sanção ao respectivo agente,
consubstanciando-se, ao revés, numa atuação proativa para evitar que danos
ocorram, através da indução dos Municípios a ações efetivas, e também proativas,
em prol da conservação ambiental em seus territórios.
Assim,
é de todo pertinente afirmar que a instituição do ICMS-E privilegia, também, o
Princípio Ambiental da Prevenção, que, partindo do reconhecimento de que os
danos ambientais são de difícil reparação ou mesmo irreparáveis,
institucionaliza a máxima popular de que “é melhor prevenir que remediar”, e consagra
“a passagem do modelo clássico de proteção ambiental – ‘reaja e corrija’ – para
um novo modelo – ‘preveja e previna’.”
Feito
que igualmente deve ser creditado ao ICMS Ecológico é o de, mediante o estímulo
financeiro proporcionado, trazer os Municípios para mais perto das questões ambientais,
instando-os a, em cumprimento às suas competências constitucionais, efetivamente
participar, como coautores, da gestão ambiental, adotando as políticas públicas
adequadas à realidade local - que eles conhecem mais e melhor, retirando-se,
assim, dos Estados, o fardo, de que há muito estes se ressentem, de ter que
suprir a omissão municipal, seja por desinteresse ou mesmo ignorância, na
efetivação das medidas destinadas à conservação ecológica.
Finalmente, evidencia-se que não sendo o ICMS Ecológico um imposto novo, como a esta altura já se sabe, posto corresponder a uma simples reacomodação de receitas provenientes de tributo preexistente, é modalidade de extrafiscalidade tributária que logra atingir seus fins, induzindo aos comportamentos ambientalmente desejados, sem a necessidade de aumentar a carga tributária, o que inegavelmente se traduz em inestimável vantagem.
Quanto
aos resultados objetivos alcançados, os números, eloquentes, falam por si: para
ficar apenas com o Estado do Paraná, entre 1991 e 2005, houve, segundo Wilson Loureiro,
um incremento na superfície das Unidades de Conservação (UCs) municipais da ordem
de 2.585,45%, nas UCs estaduais de 718,05%, e nas UCs federais e terras
indígenas de 20,88%.
Houve,
ainda, uma sensível melhoria na qualidade de conservação das próprias UCs, e também das Reservas Particulares do
Patrimônio Natural (RPPNs). Por outro lado, asseguram Fernando Facury Scaff e
Lise Vieira da Costa Tupiassu que o número de Municípios beneficiados cresce a
cada ano, sendo que, enquanto em 1992 foram 112, em 1998 já eram 192.
Entre
estes, muitos lograram aumentar expressivamente a sua participação no repasse
das receitas do ICMS, sendo um dos melhores exemplos é o do Município de Guaraqueçaba,
que elevou a sua arrecadação em aproximadamente 600% .
No que
tange à sua vocação para servir de veículo à preservação ambiental, que o ICMS
Ecológico carrega, em sua conformação básica, todos os atributos que, na forma
das deliberações resultantes da Conferência da Organização das Nações Unidas
pelo Meio Ambiente, realizada no Rio de Janeiro em 1992 (ECO-92), foram
reputados necessários para o bom e exitoso manejo dos instrumentos econômicos
no campo ambiental: “1) Eficiência Ambiental: é a imposição tributária correta
para que alcance os limites da preservação ambiental; 2) Eficiência Econômica:
um tributo que reflita um baixo custo para a economia, mas que consiga atingir
o seu objetivo maior que é o incentivo a
comportamentos ambientalmente corretos; 3) Administração barata e simples: não
poderá a tributação ambiental onerar ainda mais o Estado, com a implantação de
políticas tributárias ambientais; 4) Ausência de efeitos nocivos ao comércio e
à competitividade internacionais: que a tributação ambiental não provoque efeitos
danosos na grade de consumo”.
Desse
modo, o Estado deverá implementar um tributo que seja favorável ao meio
ambiente, mas que não crie transtorno para o seu próprio agente implementador,
através de aumento de custo para a máquina administrativa e não onere ainda mais
a carga tributária do contribuinte, que já é exorbitante.
Não
obstante os programas de proteção ambiental se insiram no contexto das políticas
de Estado (que visam concretizar as declarações de vontade nacional, e, por
isso mesmo, são dotadas de caráter sistêmico e estruturante), e não das
políticas de governo (que refletem a vontade passageira de um governo
ocasional, ou que se destinam a solucionar questões circunstanciais), fato é
que, desde 2007, o ICMS-E não retornou à agenda de discussões no Estado da
Bahia.
Nesse
contexto, calha investigar se o Estado da Bahia, assim como os demais que ainda
não aderiram à sistemática do ICMS-E, estão jungidos ao dever de fazê-lo, ou
se, ao revés, esta efetivação é meramente facultativa.
Os fundamentos dessa tutela foram definidos no art. 225 da Constituição Federal, que, em seu caput, erigiu a qualidade do meio ambiente como bem público, cuja preservação e recuperação incumbe a todos – Poder Público e coletividade –, e, nas demais disposições que o integram, cuidou de elencar as medidas reclamadas do Poder Público para efetivação desse direito, além de prescrever condutas preservacionistas a todos quantos possam, direta ou indiretamente, ocasionar danos ao meio ambiental.
Deveras,
a toda e qualquer norma constitucional, inclusive aquelas de eficácia limitada,
deve-se reconhecer aptidão para gerar duas ordens de pretensão: a) uma
pretensão de omissão, que impede a todos, Poder Público e particulares, de
adotarem conduta contrária às suas diretrizes; b) uma pretensão de ação, esta
direcionada exclusivamente aos poderes constituídos, aos quais se impõe o dever
de adotar todas as medidas necessárias à sua máxima eficácia.
A respeito
do tema, Canotilho observa que a disciplina contida nas normas constitucionais
“é obrigatória e as directivas por elas definidas, longe de serem meros convites
para legislar, assumem o caráter de verdadeiras imposições constitucionais de actividade
legiferante”.
Nessa
senda, a partir da proclamação de que o meio ambiente ecologicamente equilibrado
é direito fundamental de todos, aí incluídas as gerações presentes e futuras, o
legislador constituinte reclamou a atuação concreta do Poder Público, no
propósito de adotar, em todas as suas áreas de atuação, políticas públicas
voltadas à efetivação desse direito.
Ex
positis, o ICMS-E se apresenta como relevante instrumento de
política ambiental, pois, por seu intermédio, o Estado logra induzir os
Municípios a adotarem programas de ação que favoreçam a proteção do meio
ambiente e a elevação de seus indicadores sociais.
Compreende-se
no conceito de ICMS-E qualquer sistema normativo que, observado o disposto no
art. 158 da Constituição Federal, fixe o percentual que cada Município deve
receber, quando da transferência de receitas oriundas da arrecadação de ICMS,
segundo critérios de caráter ambiental. A evolução normativa do ICMS-E, desde
sua concepção pelo Estado do Paraná, em 1991, seguindo pela sua ulterior
implantação em outros 12 (doze) Estados, revela sua aptidão para o cumprimento
de 02 (duas) funções: compensatória, na medida em que repara o prejuízo de
Municípios que sofrem restrições de uso de seu território, por força da
existência de áreas de proteção ambiental, e indutiva, porque direciona os
Municípios no sentido da adoção de políticas públicas que privilegiem a conservação
ambiental, o desenvolvimento sustentável, o saneamento ambiental e a elevação de
seus indicadores sociais.
Uma
vez que os chamados instrumentos de comando e controle se revelaram insuficientes
para, isoladamente, conduzir a uma adequada e eficiente tutela ambiental, o Estado
deve também lançar mão dos instrumentos ditos econômicos para, mediante mecanismos
de estímulo e indução, obter os resultados ambientais almejados. Com tal característica
é que a sistemática do ICMS-E vem sendo manejada em diversos Estados
brasileiros,
apresentando, em todos eles, além de uma série de vantagens aplicativas, resultados
positivos numericamente comprovados, que logram evidenciar a sua eficácia como veículo
de política ambiental estadual.
A
proclamação constitucional do direito fundamental de todos ao meio ambiente ecologicamente
equilibrado origina, em face dos diversos entes federativos, uma pretensão de
ação, que lhes impõe adotar, em todas as suas áreas de atuação, políticas públicas
voltadas à efetivação desse direito.
Registre-se pequeno rol sobre a utilização do ICMS Ecológico em outros Estados, a saber:
Rio Grande do Sul - criou o ICMS Ecológico em 1997, mediante a Lei Estadual nº 11.038. A Lei, associou o critério de superfície territorial municipal às Unidades d e Conservação, tratando diferenciadamente os municípios que as possuem com o incremento no índice do bolo do ICMS Ecológico;
São Paulo – Segundo Estado a adotar o
mecanismo do ICMS ecológico, de modo a destinar 0,5% em função de espaços
territoriais, especialmente protegidos, existentes nos municípios. Lei nº
8.510/1993;
Ceará - Lei 14.023/2007. Considera além de
meio ambiente, educação e saúde entre os critérios de repasse. Na repartição,
ficam 18% pelo Índice Municipal de Qualidade Educacional (IQE); 5% pelo Índice
Municipal de Qualidade da Saúde (IQS); e 2 % pelo Índice Municipal de Qualidade
do Meio Ambiente (IQM).
É o
parecer que, também as políticas de tributação dos Estados devem estar
preordenadas à concretização de objetivos preservacionistas. O ICMS-Ecológico possui como benefício externo
a criação de novas unidades de conservação nos municípios e, também, a melhoria
de tais ambientes, favorecendo a educação ambiental e a qualidade dos serviços
ecossistêmicos.
Os
valores totais, repassados aos municípios através do ICMS Ecológico, correspondem
ao percentual de 2,5% (dois vírgula cinco pontos percentuais), do total de ICMS
arrecadado pelo Estado.
O ICMS
Ecológico corresponde a 0,5% da parcela da arrecadação total do ICMS repassada
pelo Estado aos municípios. É sabido que constitucionalmente, os municípios têm
direito a 25% do total do ICMS arrecadado pelo Estado, e deste, três quartos
(¾), no mínimo, devem ser distribuídos na proporção do Valor Adicionado pelas
operações e prestações realizadas em seus territórios, e um quarto (¼), no
máximo, de acordo com o que dispuser a Lei Estadual.
O objetivo principal é o “pagamento por serviços ambientais”, bem como ressarcir aquele que preserve o meio ambiente, fazendo-se cumprir as restrições exigidas nas legislações existentes.
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Notas:
[1] No Estado de São Paulo, a matéria foi tratada
inicialmente na Lei Estadual nº 3.201/1981. Posteriormente, a Lei nº 8.510/1993
introduziu as áreas protegidas como critério para repasse da quota municipal do
ICMS. Esse critério ambiental é chamado ICMS Ecológico, e é calculado em função
da existência de espaços territoriais especialmente protegidos nos municípios
paulistas.
[2]
Nascido em 1944 na Pomerânia, Ulrich Beck cresceu em Hanôver e fez todos os
seus estudos (sociologia, filosofia, psicologia e ciências políticas). em
Munique. Ulrich Beck destacava-se porque falava de uma outra modernidade. Para
si, "a produção social da riqueza" era inseparável da "produção
social de riscos”. Ulrich Beck foi um sociólogo alemão, cuja principal teoria, a
da Sociedade de Risco, buscava evidenciar a passagem da era moderna para a
pós-moderna no quesito dos impactos socioambientais ocasionados por decisões
tomadas sem considerar o que o sociólogo denominou como riscos.
[3]
O Valor Adicionado Fiscal é o principal critério para cálculo do IPM – Índice
de Participação Municipal (Lei Complementar Nº 63/1990 – art. 3º). É através do
IPM que o município tem a sua cota-parte definida no ICMS pertencente aos
municípios.
[4]
Considera-se como espaço territorial especialmente protegido aquele sob
proteção legal do Estado que incide na área de cada município. Para os efeitos
do Inciso VI do Artigo 1º da Lei Estadual nº 8.510/1993, são consideradas como
especialmente protegidas as seguintes categorias de áreas: I – Estação
Ecológica; II – Reserva Biológica; III – Parque Estadual; IV – Zona de Vida
Silvestre em Áreas de Proteção Ambiental (ZVS em APA’s); V – Reserva Florestal;
VI – Área de Proteção Ambiental (APA); VII – Área Natural Tombada; VIII –
Reserva de Desenvolvimento Sustentável (RDS) (inserido pela Lei nº
12.810/2008); IX – Reserva Extrativista (inserido pela Lei nº 12.810/2008),
[5]
A extrafiscalidade se opera quando o tributo é utilizado com outras finalidades
que vão além da arrecadação. A função precípua do tributo é angariar receitas
suficientes ao custeio do Estado. Ao utilizar o tributo com finalidade
extrafiscal, pretende o Estado alcançar outro fim que não, apenas, o de
financiar as suas atividades. São essas as lições de Paulo de Barros Carvalho:
“A experiência jurídica nos mostra, porém, que vezes sem conta a compostura da
legislação de um tributo vem pontilhada de inequívocas providências no sentido
de prestigiar certas situações, tidas como social, política ou economicamente
valiosas, às quais o legislador dispensa tratamento mais confortável ou menos
gravoso. A essa forma de manejar elementos jurídicos usados na configuração dos
tributos, perseguindo objetivos alheios aos meramente arrecadatórios, dá-se o
nome de extrafiscalidade.” Geraldo Ataliba afirma que a extrafiscalidade seria
uma repercussão da afirmação do princípio da rigidez do sistema constitucional
tributário, consistente no uso do tributo com objetivo ordinatório, diverso do
fiscal.9 Seria o uso deliberado do tributo para finalidades regulatórias de
comportamentos sociais, matéria econômica, social e política.
No mesmo sentido são as lições de Aliomar Baleeiro, para quem a extrafiscalidade pode ser entendida como o emprego do imposto “como instrumento de intervenção ou regulação pública, a função fiscal propriamente dita, ou “puramente fiscal”, é sobrepujada pelas funções “extrafiscais”. A sua técnica é, então, adaptada ao desenvolvimento de determinada política, ou diretriz.
*Gisele Leite, Professora universitária há três décadas. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Pesquisadora - Chefe do Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Presidente da Seccional Rio de Janeiro, ABRADE – Associação Brasileira de Direito Educacional. Vinte e nove obras jurídicas publicadas. Articulistas dos sites JURID, Lex Magister. Portal Investidura, Letras Jurídicas. Membro do ABDPC – Associação Brasileira do Direito Processual Civil. Pedagoga. Conselheira das Revistas de Direito Civil e Processual Civil, Trabalhista e Previdenciária, da Paixão Editores – POA -RS.