O Ministro dos votos vencidos. Senhor vencedor de teses
O Ministro Marco Aurélio[1] representa um grande legado para a jurisprudência e para a doutrina do direito brasileiro e, seus votos vencidos, foram vencedores por ampliar o espectro de justiça e de equidade para a cidadania brasileira e, por ampliar o perímetro do Estado Democrático de Direito. Sentiremos saudades de seus votos e de sua erudição sempre iluminadora mesmo diante das agruras, infelizmente, tão comuns na realidade brasileira.
Depois de três décadas de atuação no STF,
a biografia do Ministro Marco Aurélio Mello é marcada por divulgar ideias e
soluções, tanto em doutrina, como na jurisprudência, notadamente na seara
processual.
Foi exaltado com justiça por seus colegas
na derradeira sessão plenária da Suprema Corte, e o Ministro Toffoli destacou
algumas das teses desposadas por ele, abordando a ciosa evolução da
jurisprudência constitucional brasileira e, que se tornaram vencedoras.
Foi do alcance do mandado de injunção[2] até a
prisão em segunda instância e, na época as teses que foram defendidas pelo
Ministro Marco Aurélio foram votos vencidos, porém, atualmente configuram como
jurisprudência pacífica na mais alta corte judicial brasileira.
A proibição de progressão de pena em crime
hediondo, era matéria disciplinada no primeiro parágrafo do artigo 2º da Leidos Crimes Hediondos[3], a Lei
8.072/1990, segundo a qual quem cometesse a prática de tortura, tráfico ilícito
de entorpecentes e drogas afins e do terrorismo deveria cumprir
obrigatoriamente a pena integralmente em regime fechado. Eis que o douto
Ministro arguiu a inconstitucionalidade no HC 69.657 que foi julgado em 1992.
E, a mudança jurisprudencial finalmente veio no HC 82.959, julgado em 2006.
O referido ministro apontou que a Lei dosCrimes Hediondos fora elaborada não propriamente sob a observância de coerente
política criminal, mas sob o pesado clima tenso de emoções, como se pudesse
crer que a majoração da pena e o extremo rigor do regime penitenciário fossem
os únicos meios de afastar-se o elevado índice de criminalidade brasileira.
Distanciar-se da individualização da pena
é um passo largo implicando em restrição de garantia constitucional em
detrimento de todo um sistema jurídico. E, a transgressão aos princípios tão
importantes para um Estado Democrático, tal como os princípios consagradores da
igualdade de todos perante a lei e o da dignidade da pessoa humana bem como o
da atuação do Estado sempre dirigida ao bem comum.
Outra tese corresponde a impossibilidade
do depositário infiel. E, o primeiro precedente vencido foi o HC 71.131, de
1995 e, finalmente, a mudança ocorrera em 2008, no HC 87.585. E, atualmente, a
única prisão civil possível e aplicável no Brasil passou a ser apenas do
devedor de pensão alimentícia decorrente da efetiva introdução das regras
provenientes do Pacto de São José da Costa Rica[4],
ratificado pelo nosso país. Atualmente, em razão da pandemia, todos os
devedores de pensão alimentícia cumprem sua pena civil através de prisão domiciliar.
O que, segundo alguns, arrefeceu em muito o poder coercitivo em adimplir o
pagamento ao alimentado.
O terceiro voto foi sobre a
impossibilidade da exigência de depósito como requisito para apreciação de
recursos administrativos no INSS, o que em face da situação econômica do
infrator, acabava por obstar o direito de defesa. E, numa frase lapidar,
cogitou: "Não pode o Estado dar com uma das mãos e retirar com a
outra".
E, assim, defendeu a impossibilidade de
exigir depósito como requisito essencial para apreciação de recursos
administrativos no INSS. A dita exigência estava positivada no primeiro
parágrafo do artigo 636 da CLT e, o Ministro Marco Aurélio restou vencido
inicialmente na ADI MC 1.049, em 1995. Porém, mais tarde a mudança jurisprudencial
fora consagrada pelo RE 389.383 em 2007.
A quarta tese seguindo a mesma inspiração
da anterior, propugnou pela impossibilidade da exigência de depósito para a
apreciação de recursos administrativos no âmbito do Ministério do Trabalho. O
que, em síntese, representava um óbice, em alguns casos, até mesmo ao exercício
do direito de defesa, inviabilizando-se, portanto, desde que aquele indigitado
como infrator não tenha meios suficientes para a realização do depósito, a
interposição do próprio recurso.
A referida norma era positivada no sexto
parágrafo do artigo 636 da CLT e foi primeiramente contestada em voto vencido
do ministro no RE 210.246, em 1997, com a mudança da jurisprudência na ADPF
156, em 2011.
A quinta tese ainda sob a inspiração das
anteriores, propugnou pela impossibilidade de exigência de depósito como
requisito de apreciação de recursos administrativos no âmbito do Carf (Conselho
Administrativo de Recursos Fiscais) conforme ditava o segundo parágrafo do
artigo 33 do Decreto 70.235/1972, com a redação dada pelo artigo 32 da Lei10.522/2002.
Pontuou o doutro Ministro que o pleito
administrativo resta inserido no gênero "direito de petição", e este
consoante dispõe o inciso XXXIV do artigo 5º da Constituição Federalbrasileira, é assegurando independente do pagamento de taxas. Afinal, pode
inviabilizar-se até mesmo o direito de defesa.
Numa sexta ocasião, abordou a efetividade
do mandado de injunção no enfrentamento das omissões legislativas, afinal,
trata-se de instrumento jurídico que pode ser manejado por qualquer cidadão que
venha se sentir prejudicado por eventuais omissões na legislação brasileira. Em
1989, quando ainda era recém- promulgada a Constituição Cidadã, o Ministro
Marco Aurélio defendeu em questão de ordem na MI 107 um maior alcance ao
instrumento do que era praticado pelo STF, na ocasião.
In litteris:
"Impetra-se o mandado de injunção não para lograr-se simples
certidão de omissão do poder incumbido de regulamentar o direito",
destacou. "Conclamo, por isso, o Supremo, na composição atual, a rever a
óptica inicialmente formalizada", disse. A mudança veio com o MI 670, cujo
julgamento terminou em 2007.
Na época, o caso concreto referendou os processos atinentes ao direito de greve[5] de servidores públicos, previsto no artigo 37, inciso VII da CF/1988, mas que ainda não tinha sido regulamentado por lei específica. Pela via do mandado de injunção, a Suprema Corte definiu que, enquanto não for elaborada tal regulamentação, valem as regras previstas para o setor privado (a Lei 7.783/1989).
Em caso concreto mais recente, definido
nas ADCs 43, 44 e 54 em 2019, o STF mudou a orientação jurisprudencial para
afirmar que a prisão só é possível após o trânsito em julgado da ação,
prevalecendo a presunção de inocência consagrada no texto constitucional
vigente no país.
Apesar de vencido, o referido Ministro em
2016, quando a prisão após a condenação em segundo grau fora admitida pelo
Plenário do STF, no HC 126.292. Reiteradamente, defendeu que não se poderia
potencializar o que fora decidido pelo Pleno na ocasião.
Concluiu com sabedoria, que precipitar a
execução da sanção, importa em antecipação de culpa, por serem indissociáveis.
Segundo as estatísticas oficiais, de cada
três ações que o STF julga, o Ministro Aurélio resta vencido em uma. O que lhe
rendeu o epíteto de Senhor Voto Vencido” e, contando com um total de 514
decisões proferidas pela Suprema Corte desde 2006, desse total, o Ministro
Marco Aurélio ficou vencido em 161.
Ao revés do que a maioria pensa, ficar
vencido num julgamento, não deve ser considerado como fracasso e, menos ainda,
como inutilidade. Aliás, em voto inesquecível veio reconhecer a legitimidade do
pleito dos participantes da Marcha da Maconha, e ainda destacou a importância
da divergência.
Aliás, Habermas[6] que nos
trouxe a teoria dos direitos fundamentais com fulcro no elemento comunicativo,
partiu da constatação fática para alicerçar a teoria que defendeu: o fato do
pluralismo.
O consenso ético resultante de
homogeneidade que existia nas sociedades pré-industriais não existe mais, de
forma que as decisões públicas não podem ser justificadas com base nesse acordo
global de natureza ética entre os cidadãos.
Ao revés, nas sociedades contemporâneas,
os indivíduos discordam veementemente sobre um amplo leque de temas. E, na
dinâmica do mosaico cultural tão multifacetado, a legitimidade das normas
jurídicas só pode ser sugada do processo de autolegislação levado a efeito
pelos próprios cidadãos. Trata-se, portanto, da concepção política de Habermas
onde a primazia do processo democrático na construção do direito legítimo,
porque não há mais como recorrer às verdades apriorísticas.
Noutro voto, citou Hans Kelsen[7] e,
explicou porque ficar vencido não seja uma derrota pessoal, mas sim, uma
vitória da democracia. A democracia se constrói principalmente quando se
respeitam os direitos da minoria, mesmo porque esta poderá um dia influenciar a
opinião da maioria[8].
Eis o recado deixado no julgamento do HC 82.424/RS, do editor Siegried contra a
condenação imposta pela Justiça gaúcha, por ter ele publicado livros
reconhecidamente antissemitas.
Cardoso e Matsuura explanaram, com
clareza:
"O tempo é outro fator capaz de demonstrar a utilidade das posições
minoritárias. Não são raros os casos na carreira do ministro que o voto vencido
de ontem é a tese vencedora de hoje. Entre os casos mais marcantes está o
julgamento que declarou inconstitucional a regra que proibia a progressão de
regime para condenados por crimes hediondos. Outro foi o que declarou
inconstitucional a prisão de depositário infiel. Um terceiro foi o que deu
caráter mandamental e não apenas declaratório ao Mandado de Injunção. Em todos
os casos citados, o ministro saiu de posição minoritária para majoritária
depois de vários anos, com a renovação quase total da composição da
corte."
Na ADPF 46, julgada em 5.08.2009
cogitava-se sobre o monopólio dos Correios.
O serviço postal é exclusivamente público
e não foi aberto, na Constituição Federal, para ser prestado pela iniciativa
privada. O serviço postal, no entanto, se restringe à entrega de
correspondências, cartões-postais e correspondências agrupadas, não incluindo
boletos bancários, contas, jornais, livros e outros tipos de encomendas. Este
foi o entendimento do Plenário do STF ao analisar o monopólio dos Correios (Lei6.538/1978).
O ministro Marco Aurélio ficou novamente
vencido por entender que não deveria haver qualquer monopólio, inclusive sobre
as correspondências simples, por respeito ao princípio da livre concorrência.
Também ficaram vencidos os ministros Gilmar Mendes, Celso de Mello e Ricardo
Lewandowski, porque defendiam o monopólio apenas no serviço de entrega de
cartas.
A ação foi proposta pela Associação
Brasileira das Empresas de Distribuição (Abraed), com o argumento de que a lei
é incompatível com a Constituição por instituir monopólio não previsto
constitucionalmente e por impedir o livre exercício do trabalho, ofício ou
profissão.
Já na ADPF 130, julgada em 30.4.2009 a Leide Imprensa[9]
de 1967 fora considerada inconstitucional por sete ministros do STF. E, a
referida decisão judicial autorizou a exclusão integral do texto da lei do
ordenamento jurídico brasileiro. Dos três ministros vencidos votaram pela
suspensão de alguns dispositivos da lei, mas não do texto integral. O Ministro
Marco Aurélio fora o único a entender que a lei deveria continuar em vigor.
Começam seu voto, questionando a quem
interessava o vácuo legislativo. E, em seguida respondeu: Com a revogação da
lei não passaremos a ter liberdade. A liberdade já existe. Passaremos a ter
conflitos de interesses resolvidos com critério de plantão, estabelecido pelo
julgador. Também atacou a ideia de que lei fosse ruim por ter sido feita no
período ditatorial brasileiro.
Afinal, o que dizer então do atual CódigoPenal que fora decretado em pleno Estado Novo e, continua a viger até a
presente data? Apontou que também
durante o regime de exceção foram elaboradas reformas que, no tocante as
garantias do cidadão, se mostraram profícuas, adequadas, aconselháveis quando
se vive em Estado Democrático de Direito.
Afirmou na mesma ocasião que a revogação
da Lei de Imprensa seria ruim para os jornalistas e, ainda, ressaltou que os
prazos de prescrição e decadência das ações são até mais benéficos aos jornais
e aos jornalistas do que os constantes na legislação civil brasileira.
No
julgamento da ADIs 1.501 e 1.497 em 9.10.1996, na época entrou em vigor a
Emenda Constitucional 12, permitindo a criação da CPMF, contribuição provisória
sobre movimentação financeira. E, no mesmo ano, chegou a Suprema Corte a ação
questionando a constitucionalidade da dita Emenda Constitucional. Ao analisar o
pedido de liminar, a maioria dos Ministros votou para manter em vigor a emenda.
O Ministro Marco Aurélio ficou vencido, na companhia de Ilmar Galvão. Escreveu
em seu voto que, de fato, o Estado deveria se preocupar e investir recursos na
saúde do país, mas estes devem vir de cobranças harmônicas com a Constituição
Federal.
Na época, a dita Emenda Constitucional
permitia a instituição da cobrança e autorizava igualmente que o artigo 154 da
CF não fosse aplicado ao caso. O dispositivo prevê que o fato gerador da
obrigação tributária não pode ter duas incidências. O problema é que sobre as
MESMAS movimentações financeira já era incidente o IOF.
Além de explicitamente criticar o total
desrespeito à Constituição Federal brasileira, o Ministro Marco Aurélio
criticou a reincidência do Congresso na edição de normas inconstitucionais. E,
até hoje o Judiciário padece das consequências, para próprio descrédito,
considerada a demora nas soluções das lides, da edição de diplomas legais como
o da época, que às escâncaras, surgem, desde o primeiro momento, conflitantes
com a Constituição Federal.
Fato, que ainda, persiste nos dias atuais.
O ministro se destaca pelo volume expressivo de decisões julgadas que
ultrapassam as grandes discussões em colegiado, só ano passado, julgou oito mil
processos.
O Ministro Marco Aurélio representa um grande legado para a jurisprudência e para a doutrina do direito brasileiro e, seus votos vencidos, foram vencedores por ampliar o espectro de justiça e de equidade para a cidadania brasileira e, por ampliar o perímetro do Estado Democrático de Direito. Sentiremos saudades de seus votos e de sua erudição sempre iluminadora mesmo diante das agruras, infelizmente, tão comuns na realidade brasileira.
Referências:
CARDOSO, Maurício; MATSUURA, Lilian.
"Senhor Voto Vencido", Marco Aurélio diverge e fala pelas minorias.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2015-jun-15/senhor-voto-vencido-marco-aurelio-diverge-pelas-minorias
Acesso em 22.6.2021.
CARVALHO, Matheus. Manual de direito
administrativo. 3. ed. rev. ampl. e atual.
Salvador: JusPODIVM, 2016.
DE MOURA, Cid Capobiango Soares. Direito
de greve do servidor público. Disponível em: https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-administrativo/direito-de-greve-do-servidor-publico/ Acesso em 23.6.2021.
FERREIRA, Adriano. Habermas e o Direito.
Disponível em: https://direito.legal/sociologia-do-direito/11-habermas-e-o-direito/ Acesso em 23.6.2021.
MURTA, Antonio Carlos Diniz; FERNANDES,
Gustavo de Figueiroa. Posicionamento Contra-Majoritário do Supremo Tribunal
Federal como Pressuposto de Manutenção do Estado Democrático de Direito.
Disponível em: http://publicadireito.com.br/artigos/?cod=ce3fe4cab8dd6922 Acesso em 23.6.2021.
PAIVA, Letícia. Marco Aurélio Mello se
aposenta com histórico de votos divergentes e vencidos. Disponível em: https://www.jota.info/casa-jota/marco-aurelio-mello-se-aposenta-com-historico-de-votos-divergentes-e-vencidos-21062021
Acesso em 22.6.2021.
REDAÇÃO DO MIGALHAS. Passado e presente.
STF: Dez anos do julgamento histórico que revogou a lei de imprensa. Disponível
em: https://www.migalhas.com.br/quentes/299406/stf--dez-anos-do-julgamento-historico-que-revogou-lei-de-imprensa Acesso em 23.6.2021.
Revista Consultor Jurídico, 13.6.2020.
Sete votos vencidos de Marco Aurélio que viraram teses vencedoras no STF.
Disponível em: https://www.conjur.com.br/2020-jun-13/veja-sete-votos-vencidos-marco-aurelio-viraram-teses-vencedoras Acesso em 22.6.2021.
Notas:
[1] Marco Aurélio
Mendes de Farias Mello (Rio de Janeiro, 12 de julho de 1946) é um magistrado
brasileiro, ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) desde 13 de junho de
1990, tendo sido nomeado pelo então presidente da República Fernando Collor de
Mello, seu primo. Foi, também, ministro e presidente do Tribunal Superior
Eleitoral (TSE) e ministro do Tribunal Superior do Trabalho (TST). Desde 1982 é
professor do Centro de Ensino Unificado de Brasília (UNICEUB) e da Universidade
de Brasília, e tem extensa listagem de obras produzidas. Em 13 de outubro de
2020, Marco Aurélio tornou-se o decano do Supremo Tribunal Federal, em
decorrência da aposentadoria do até então decano, ministro Celso de Mello.
[2] O mandado de
injunção é um dos cinco remédios constitucionais, onde estão inclusos, também,
o habeas corpus, o habeas data, o mandado de segurança e a ação
popular. Ele está previsto no artigo 5º da Constituição da República Federativa
do Brasil de 1988, no inciso LXXI, que afirma: “Art. 5º, LXXI - conceder-se-á
mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável
o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas
inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania”. O mandado de injunção
tem como objetivo tornar viável os direitos garantidos pela Constituição
Federal, dando soluções para que esses direitos sejam válidos mesmo que não
existam leis ou normas que os regulamentem. A Constituição Federal determina
direitos, deveres e normas a serem seguidas para que a nação mantenha a sua
soberania e a sua organização social. A ausência de uma norma reguladora, por
sua vez, compreende a falta de uma lei ou dispositivo do Poder Público que faça
com que o direito previsto na Constituição Federal possa ser aplicado na
sociedade, garantindo-o ou regulamentando-o. Vale ressaltar que apenas
indivíduos ou coletivos cujo direito constitucional represente seus interesses
próprios podem entrar com o mandado de injunção, impedindo que pessoas entrem
com o mandado para contemplar interesses exclusivamente alheios.
[3] Em fevereiro de 2006, o Supremo Tribunal
Federal, por seis votos a cinco, considerou inconstitucional o §1º do artigo 2º
da lei, que vedava a possibilidade de progressão de regime. Isso se deu em
função de penalistas acreditarem que o cumprimento total da pena em regime
fechado ia contra princípios fundamentais do maior grau de hierarquia normativa
referentes a individualização e humanização da pena, além dos princípios da
igualdade e do devido processo legal. Ficou definido como: "A progressão
de regime, no caso de condenados aos crimes previstos neste artigo, dar-se-á
após o cumprimento de 2/5 (dois quintos) da pena, se o apenado for primário, e
de 3/5 (três quintos), se reincidente. Com o advento da Lei 11.464/2007, o
prazo para progressão de regime aos crimes hediondos ou equiparados a hediondos
passou a ser de 2/5 ao réu primário e 3/5 ao reincidente. Antes dessa lei,
porém, aplicava-se o montante de 1/6 da pena ao crime comum, ao hediondo e aos
equiparados. Atualmente, aplica-se 1/6
da pena para progredir de regime apenas aos crimes não considerados hediondos
ou equiparados a este (art. 112, da Lei 7.210/84 LEP).
[4] "PACTO DE
SAN JOSÉ DE COSTA RICA" (Assinada em San José, Costa Rica, em 22 de
novembro de 1969, na Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos
Humanos) ENTRADA EM VIGOR: 18 de julho
de 1978, conforme o artigo 74.2 da Convenção. O documento é composto por 81
artigos, incluindo as disposições transitórias, que estabelecem os direitos
fundamentais da pessoa humana, como o direito à vida, à liberdade, à dignidade,
à integridade pessoal e moral, à educação, entre outros. A convenção proíbe a
escravidão e a servidão humana, trata das garantias judiciais, da liberdade de
consciência e religião, de pensamento e expressão, bem como da liberdade de
associação e da proteção a família.
[5] Para o
doutrinador Matheus Carvalho, os servidores militares não têm direito de greve
nem de sindicalização, vedação expressa do artigo 142, inciso IV da
Constituição Federal. Tal regra se aplica aos que prestam serviços às forças
armadas, como exército, marinha e aeronáutica, se estendendo aos militares dos
estados, incluindo a polícia militar e o corpo de bombeiros. Já com relação aos
servidores públicos civis, o direito de greve está garantido pelo art. 37,
inciso VII da Constituição Federal e será exercido nos limites definidos em lei
específica, se refere à edição de lei ordinária para tratar do tema, definindo
os contornos e forma de exercício deste direito pelos servidores públicos
civis, não sendo matéria afeta à lei complementar (CARVALHO, 2016, 798).
[6] A trajetória intelectual de Jürgen Habermas (1929-) é inicialmente marcada pela Escola de Frankfurt, nome genérico que se atribui ao espaço acadêmico situado naquela cidade, mas também a um grupo de pensadores cujos expoentes mais significativos foram Theodor W. Adorno e Max Horkheimer. O direito estaria ligado ao sistema burocrático-estatal, decorrendo de uma estrutura de normas, órgãos e profissionais. Sua validade, contudo, exigiria a participação popular na elaboração das normas gerais e abstratas que o delimitam e a justificativa de seus atos. Nesse momento, as características sistêmicas de busca eficiente da ação devem subordinar-se à lógica comunicativa que irá determinar o conteúdo das normas jurídicas e justificar sua aplicação.
[7] O objetivo
dessa teoria de Kelsen é de manter, através da jurisdição constitucional, a proteção
dos direitos e garantias fundamentais das minorias em face de decisões
políticas majoritárias, pois afirma que é a forma necessária de existência de
um Estado democraticamente forte.
[8] A crescente
atuação do STF em casos polêmicos de grande repercussão coloca em dúvida as
típicas funções atribuídas pelo princípio da separação dos poderes e os
prováveis limites institucionais que deveriam restringir a jurisdição
constitucional do STF, pois sua atuação é em grande parte contramajoritária aos
anseios da sociedade. Foi o caso da aplicabilidade da Lei Ficha Limpa nas
eleições de 2010, a do aborto de fetos anencefálicos, a união homoafetiva e,
outras decisões memoráveis do STF. Assim, a forma contramajoritária serve para
garantir direitos de determinadas minorias.
[9] Pesquisa
recente do CNJ revela que mais da metade das ações judiciais sobre liberdade de
imprensa são motivadas por difamação. Tudo começou quando o então deputado Miro
Teixeira, ao entender que a lei de imprensa não se alinhava à CF/88, assinou a
petição da ADPF 130, visando a revogação da lei. Conforme
argumentou Miro Teixeira, a lei havia sido imposta à sociedade pela ditadura
militar e, por isso, continha dispositivos incompatíveis com o Estado
Democrático de Direito inaugurado pela CF/88, como a pena de prisão para
jornalistas condenados por calúnia, injúria e difamação. O CNJ lançou um relatório em 2018, divulgando
a situação processual de liberdade de imprensa no Brasil. Para isso, o Conselho contou com a
colaboração da Abraji (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo),
Abert (Associação Brasileira de Emissoras de Rádio e Tv) e ANJ (Associação
Nacional de Jornais), que encaminharam a relação de processos cadastrados nas
respectivas associações. Ao todo, foram 2.373 processos relacionados à
liberdade de imprensa. De acordo com a
pesquisa, a maioria desses processos estão na Justiça Estadual e uma parcela significativa
se encontra na Justiça Eleitoral.