Liberalismo político e a democracia do século XXI

De fato, não existe uma única definição de liberalismo que seja aceita por todos. As grandes doutrinas políticas são vistas com muitas particularidades tanto por quem as adota, quanto por quem as crítica. A concepção de Estado Mínimo está atrelada à concepção política do liberalismo, e descreve que o governo não pode atuar ou intervir em todas as áreas. O liberalismo político afirma que existe um conjunto de direitos inerentes ao ser humano e, que, portanto, o Estado não pode intervir. Entre esses direitos está a liberdade religiosa, liberdade de imprensa etc. Fiel à tradição liberal, Rawls considera o princípio da liberdade anterior e superior ao princípio da igualdade.  Também o princípio da igualdade de oportunidades é superior ao princípio da diferença. Em ambos os casos, existe uma ordem lexical. Tal como ocorrera com sua teoria da justiça, também seu Liberalismo Político fora publicado em 1993, resultou em muitos artigos e conferências realizadas por John Rawls.

Fonte: Gisele Leite

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Para se compreender o liberalismo político proposto por John Rawls e tido como fundamento da democracia e para a educação da juventude, num período de insegurança jurídica, constrangimento social e instabilidade política.

Conclui-se na premente necessidade de atualização contínua das convicções e do exercício da democracia, especialmente através do debate público e da revitalização da legislação.

Em 1971, a publicação da obra intitulada "Uma teoria da Justiça" de John Rawls nos EUA foi decisiva para o estudo e o debate público sobre assuntos relacionados às desigualdades e injustiças no mundo que demandam a busca de soluções justas, a fim de evitar a desintegração social, ampliando as divergências que ameaçam a estabilidade social e podem também conduzir à extinção da democracia.

Com o fim da Guerra Fria e a necessidade de outro referencial para uma harmônica convivência, assim como para as relações internacionais. Esse era o contexto em que incidiu a contundente crítica de John Rawls ao utilitarismo[1] e ao institucionismo[2] demonstra a insuficiência dessas abordagens para propor formas de relacionamento pautadas por legalidade, pela moralidade, democrática, pela mediação institucional e pela efetiva valorização, participação e cooperação dos membros ativos da sociedade.

A reflexão sobre a obra de Rawls nos move para a superação de graves deficiências e dos dilemas sociais da atualidade, especificamente, as desigualdades que se situam na origem da instabilidade nacional e internacional.

A fragilidade da doutrina utilitarista como base das instituições da democracia constitucional, foi por não poder explicar as liberdades e direitos básicos dos cidadãos, como pessoas livres e iguais, uma exigência de importância absolutamente primordial para uma consideração de instituições democráticas. Rawls utilizou uma visão mais geral e abstrata da ideia de contrato social usando para tanto a ideia de posição original[3]. Uma explicação das liberdades e direitos básicos, e também de sua prioridade, foi o primeiro fim da justiça como equidade.

O segundo objetivo foi integrar essa explicação a um entendimento da igualdade democrática, o que conduziu ao princípio da igualdade equitativa de oportunidades e ao princípio da diferença.

Deu-se ampla aceitação da obra de Rawls seja no âmbito acadêmico, político, entre profissionais e outras áreas e sinalizou a carência de uma proposta atualizada para debater os temas relevantes do período e, adaptada com as mudanças e acontecimentos globais, bem como ser capaz de analisar de forma rigorosa e comprometida com a democracia e os temas nacionais contemporâneos.

O contexto da obra de Rawls e o período histórico de seu lançamento justificam o destaque, A teoria da Justiça renovou os debates no âmbito da filosofia política. E, ainda fomentou o diálogo entre as mais diversas disciplinas e entre profissionais das diferentes áreas, sendo atualmente considerado um clássico da filosofia contemporânea.

Já na introdução da obra, com o fito de situar o tema da democracia, o filósofo deu franca relevância à educação das novas gerações para a cidadania. E, os temas seguem sendo fundado em outra obra “O Liberalismo político” que também obteve franco reconhecimento político, entre outros motivos, pela capacidade do doutrinador em avaliar, esclarecer e, até corrigir a exposição anterior.

A estabilidade política, a tolerância e as condições de participação, financiamento das campanhas eleitorais, os acordos ou consensos, o funcionamento das instituições e a razão política, a paz e as relações internacionais e ainda o drama da miséria ou das desigualdades contemplam temas prioritários tendo em vista a premente necessidade de maior e efetiva justiça social.

A educação da juventude para a democracia é imperativo mundial, particularmente, em países como o Brasil. E, as conquistas fartamente evidenciadas por diversos meios demandam o seu maior conhecimento, atualização e correção de rumos. As crises, limites e deficiências experimentadas no país clama por líderes e às instituições pela educação das futuras gerações para que não amarguem retrocessos ainda maiores, com a destruição de instituições, ou mesmo a negação de suas referências básicas, como, por exemplo, o valor da pessoa, da dignidade humana e o exercício da liberdade.

Configura-se, portanto, que o liberalismo político é caminho privilegiado para se compreender a sua relevância, tanto formal como substancial, da democracia, seja pelo seu caráter didático e pedagógico, seja pelo intenso vigor instrumental, para exercitar essa missão em nível político, jurídico e institucional.

Em compreensão mais acurada da obra de Rawls pode se obter a partir da análise dos principais pilares da democracia e, especialmente, a decisiva contribuição da Reforma para o exercício da tolerância e a liberdade de consciência.

O entendimento sem preconceitos desta obra é um desafio para a reflexão política e a renovação da democracia. O liberalismo político é uma referência para os debates sobre a igualdade, as dificuldades do pluralismo, a estabilidade social, o conteúdo das legislações, o funcionamento das instituições e outros ramos da democracia constitucional.

Depois de algumas revisões na Teoria da Justiça, o pensador destacou, in litteris: “Os objetivos dessas conferências são bem diferentes. Observe que, em meu resumo dos objetivos de Teoria, a tradição do contrato social aparece como parte da filosofia moral e não faz distinção alguma entre filosofia moral e política”.

“Em teoria, uma doutrina moral da justiça de alcance geral não se distingue de uma concepção estritamente política de justiça[4]. O contraste entre doutrinas filosóficas e morais abrangentes e concepções limitadas ao domínio do político não é de grande relevância. No entanto, essas distinções e ideias afins são fundamentadas nas conferências aqui apresentadas” (RAWLS, 2000b).

O liberalismo político traz a apresentação de uma concepção de justiça atualizada e contextualizada num período histórico caracterizado por inúmeras disputas entre países e blocos econômicos e ideológicos bem definidos, que, embora cambaleantes e, com evidentes transformações internas e externas, influenciavam áreas importantes e estratégicas no mundo. A profissão de fé na democracia é uma característica de Rawls.

Conclui-se que o liberalismo político não é uma doutrina metafísica ou um plano de governo que visa a dar solução de problemas imediatos e pontuais, mas uma proposta de concepção política dirigida, inicialmente, às sociedades democráticas caracterizadas pelo pluralismo. Tal premissa fundamental para propor, escolher, concretizar e avaliar as condições de justiça social, ou mesmo, conforme destacou o preâmbulo da Constituição Federal brasileira, a efetivação do bem comum.

O ordenamento social seguro pressupõe a capacidade e as condições para a estabilidade política, considerando as incontáveis controvérsias ou divergências existentes no interior das sociedades. A apropriação dessa obra precisa antever essa característica como fato contingente, isto é, não pode ser negado ou desprezado.

A assertiva de John Rawls foi demonstrar a dinâmica, pois o liberalismo político pressupõe que, para propósitos políticos, uma pluralidade de doutrinas abrangentes e razoáveis, e, ainda assim, incompatíveis, seja o resultado normal do exercício da razão humana dentro da estrutura das instituições livres de um regime democrático constitucional.

O núcleo de orientação para entendermos a teoria de justiça de Rawls e as posteriores ampliações e eventuais correções está nessa capacidade de percepção de que a organização justa, segura e estável das sociedades contemporâneas, especialmente, as democrático-constitucionais, ocorre a partir dessa dinâmica sabendo que o núcleo de orientação é político e não metafísico.

A ambiguidade da teoria está eliminada agora e, a justiça como equidade é apresentada, desde o começo, como uma concepção política de justiça.

A estrutura da compreensão do liberalismo político, conforme proposto, percorreu uma extensa trajetória de debates, embates e construção de acordos. O exercício do debate público, seja acadêmico ou não, envolveu a necessidade de reconfigurar e, eventualmente, renunciar aos interesses ou convicções individuais, institucionais e políticos em vista dos novos contextos e atores. Rawls enumerou três eventos que foram determinantes para a filosofia moral e política.

A Reforma do século XVI, o desenvolvimento do Estado Moderno e o desenvolvimento da Ciência Moderna. Os três marcos históricos possuem significado simbólico e político, simultaneamente, e foram responsáveis por outros de igual relevância e repercussão bem como, contribuíram para a formatação de novas concepções e destacada importância, conforme sublinhou o mencionado filósofo.

Em verdade, o sucesso do construtivismo liberal manifestou-se como a descoberta de nova possibilidade social: a possibilidade de sociedade pluralista, estável e, razoavelmente, harmoniosa.

O liberalismo político não tem a pretensão de abarcar a totalidade das demandas sociais e solucioná-las, mas sim, ser uma alternativa que demonstre a necessidade e as condições para um ordenamento social estável, justo e seguro. Confirma-se a autonomia, a identidade e as convicções desse doutrinador, não dissociadas da tradição da que apresenta um liberalismo abrangente. Esse, sustenta o liberalismo político.

O liberalismo político tem como fim congregar e integrar num sistema de cooperação a diversidade de concepções existentes no interior das sociedades. As suas divergências, apesar de as vezes muito contraditórias, não podem ser motivo para a instabilidade social.

O traço norteador dessa dinâmica de convivência equitativa e tolerante é o necessário compromisso de todas com as orientações centrais da democracia. A união em torno desse sistema é consequência do exercício concreto da razão pública. A ampla diversidade de concepções e instituições independentes e cooperativas, contribui substancialmente com a vitalidade de uma sociedade democrática.  

A proposta de Rawls visa um construtivismo político a partir de uma clara concepção de pessoa como sujeito ativo e portador de uma concepção de bem e de sociedade cooperativa e, comprometida com o bem comum. As doutrinas, com suas divergências e concordâncias, endossam um regime democrático constitucional exercitando seus valores no cotidiano da rotina social. Explicitamente, destaca-se a tolerância e o debate público.

A questão da estabilidade das sociedades democráticas é a maior preocupação de Rawls no decorrer da obra “Liberalismo Político” porque as divergência e contradições são um paradoxo que pode limitar, impedir e até suplantar o seu funcionamento. A inversão dessa dinâmica de organização social do ponto de vista da sua constituição originária é impossível. O fato do pluralismo[5] é dado e não uma contingência histórica.

A percepção mais aperfeiçoada do fenômeno, ou seja, a sua afirmação, demonstra que é impossível, além de uma atitude de ingenuidade, propor uma igualdade aritmética porque essa, negaria a natureza e a atuação social do homem que é motivada por interesses diversos e objetivos nunca tacitamente convergentes. O contrário disso seria a proposição de autorregulação das sociedades, tanto interna como externa. Esta, por sua vez, implicaria, a existência de desigualdades que seriam consequências da ausência de controle e organização do seu próprio funcionamento.

Ambas as expectativas estão em contradição porque a diversidade é a características das sociedades democráticas. E, Rawls enfatizou tal realidade e manifestou a tensão existente no cotidiano das democracias contemporâneas:

“[…] o problema do liberalismo político consiste em compreender como é possível existir, ao longo do tempo, uma sociedade estável e justa de cidadãos livres e iguais profundamente divididos por doutrinas religiosas, filosóficas e morais razoáveis, embora incompatíveis” (RAWLS, 2000b). As proposições que visem solucionar problemas ou interferir na organização social devem contemplar esse contexto.

A organização das sociedades marcadas pelo pluralismo em todas as esferas sociais precisa buscar um conjunto de referências para a sua estabilidade por um período prolongado. A convicção de Rawls é no sentido de que a estabilidade seja formatada no âmbito político e não no moral. A consequência dessa referência demanda a educação para o exercício da democracia conjugado com o compromisso político dos cidadãos.

O discurso sobre a natureza da razão pública e seu fim, seja da estabilidade política, seja de identidade social, incluiu que essa tem o conteúdo essencial para organizar e articular os planejamentos sociais e o funcionamento das principais instituições a fim de construir o bem de todos. Os cidadãos, enquanto membros ativos da comunidade, têm capacidade moral, política e intelectual para atuar no seu interior.

A razão, sendo pública, é a razão de ser de uma sociedade democrática. É a razão do público em vista do seu bem estar. O filósofo sublinhou os seus três sentidos, a saber: trata-se da razão do público, seu objeto é bem do público e as questões de justiça fundamental e sua natureza e conceitos são públicos.  Essa é uma compreensão ideal para mostrar como seria um ordenamento equitativo seguro e estável. As pessoas, enquanto membros de uma sociedade, aderem a essas orientações.

A compreensão de uma sociedade democrática como um sistema de cooperação entre pessoas livres e iguais, como Rawls sublinha de forma convicta e insistente no decorrer da sua obra, especialmente no Liberalismo Político, supõe o reconhecimento de que o conteúdo da razão pública pertence a todos os cidadãos que conjuntamente exercem a liberdade, assim como, assumem os ideais de justiça.

Explica Oliveira, in litteris: “Na medida em que a razão pública é compartilhada por todos, publicamente, pode-se cogitar de uma democracia deliberativa, que se mostra como a melhor forma de governo do povo, pelo povo e para o povo. A ideia de razão pública é, portanto, correlata às ideias da prioridade do justo sobre o bem e do consenso sobreposto para a realização do liberalismo político”.

O reconhecimento do pluralismo como a característica genuína da identidade das sociedades democráticas contemporâneas é o fenômeno que mais preocupa as questões de justiça, especificamente a construção das condições para a convivência pacífica e tolerante, bem como impulsiona a formatação de mecanismos para a solução dos problemas decorrentes desse mesmo fenômeno.

Por exemplo, a sua própria negação, o distanciamento de pessoas, povos e culturas especificamente pela ampliação das desigualdades sociais e econômicas, ou mesmo, a sobreposição unilateral de interesses individuais ou de grupos.

A veemente condenação das diversas formas de injustiça social fora esclarecida na constante afirmação da necessidade de justiça social para todos. O destaque, com igual prioridade, à equidade demonstra, tanto do ponto de vista simbólico quanto político que essa meta é possível e irrenunciável.

A conjugação ou administração de concepções e interesses divergentes é próprio da atuação política nas democracias, o que exige cuidado e perspicácia. E, a avaliação da justiça social depende da efetivação de critérios de equidade.

A atuação política, orientada pelos princípios da justiça e tem entre suas metas a equalização das desigualdades e a prevenção dos problemas que possam ameaçar a sua estabilidade social. E, a assertiva de Rawls está em reconhecer o fato do pluralismo como parte da cultura política das sociedades democráticas, conforme destaca:

“No liberalismo político, o dualismo entre o ponto de vista da concepção política e os muitos pontos de vista das doutrinas abrangentes não é um dualismo originado na filosofia. Origina-se, ao contrário, na natureza especial da cultura política democrática marcada pelo pluralismo razoável” (RAWLS, 2000b).

Sabendo que o pluralismo não é um problema grave para a equalização das relações sociais, a razão pública democrática precisa orientar a conduta política dos cidadãos. Sem essa condição, a dicotomia amplia seus horizontes e impede a construção de acordos que tenha como meta um ordenamento seguro. O esclarecimento do conteúdo da razão pública é um exercício didático e pedagógico permanente em vista do bem comum, entendido como um objetivo do Estado e das instituições sociais

O tema da razão pública é essencial para a compreensão e justificação do liberalismo político porque representa a síntese das opções dos cidadãos livres e iguais de uma sociedade democrática. Rawls entende que a razão pública é aceita pelos membros da sociedade e orienta, limita e impulsiona a participação efetiva nos seus destinos.

Esta representa as motivações mais importantes que formam a identidade de um povo, o seu governo, as instituições e o funcionamento geral. A afirmação da razão pública é essencial para a legitimidade das sociedades democráticas e o equilíbrio da sua organização social sabendo das inúmeras divergências existentes no seu interior.

A participação social dos cidadãos, cuja identidade está ancorada na sua condição de livres e iguais, ultrapassa o formalismo para experimentar a dinâmica da razão pública numa sociedade democrática orientada por princípios aos quais é dada a adesão dos cidadãos individualmente e das instituições, especificamente destaca- se a missão da família na transmissão dos valores democrático-liberais e na educação das gerações futuras.

Assinala-se, especialmente na dimensão jurídica, a responsabilidade do Supremo Tribunal Federal[6] para a compreensão, o esclarecimento, a interpretação e a aplicação do conteúdo da razão pública seja para decidir as questões e problemas mais importantes da sociedade, seja para garantir a estabilidade institucional e em vista da justiça social sabendo das divergências internas e da necessidade de salvaguardar o valor de cada cidadão.

A compreensão do filósofo sobre a pessoa, sua realização e a responsabilidade de participação social está relacionada com as condições para sua integração e cooperação no cotidiano da sociedade na condição de cidadão livre e igual.

Essa afirmação é essencial para entender a obra Liberalismo Político e a integração e atuação de cada indivíduo na realidade, seja no ambiente onde vive, seja nas diversas esferas do ordenamento social.

A condição igual de cidadania é um valor essencial para Rawls, conforme assinalou in verbis: " A ideia do construtivismo político deve ser familiar a todos os que conhecem a posição original da justiça como equidade, ou uma estrutura semelhante”.

A estruturação da concepção de justiça depende da ação e participação ativa dos cidadãos. O fato do pluralismo está representado, também, na multiplicidade de concepções morais, políticas e religiosas existentes no interior de cada sociedade que impactam diretamente sobre a formação moral e a conduta política do conjunto da comunidade. A percepção assinalada por Rawls sobre as doutrinas afirmando que nenhuma delas é professada de

forma abrangente, designa a necessidade de antever as capacidades das pessoas, seja individualmente, seja no seu conjunto, de formatarem as condições para a equidade social.

A posição original é o espaço de representação dos cidadãos livres e iguais, membros de uma sociedade democrática caracterizada pelo pluralismo. Na proposta de um liberalismo político, os cidadãos atuam em vista de uma sociedade bem-ordenada a partir de uma base constitucional.

As diferenças existentes na sociedade impulsionam a construção de consensos em vista da justiça equitativa ou da estabilidade social. O homem é um ser capaz, conforme sublinha a terceira característica do construtivismo político é utilizar uma concepção bem complexa de pessoa e sociedade para dar forma e estrutura à sua construção. Enxerga-se que o construtivismo político encara a pessoa como membro da sociedade política entendida como sistema equitativo de cooperação social de uma geração para outra.

Supõe que as pessoas disponham de duas faculdades morais conjugadas a essa ideia de cooperação social – a capacidade de ter senso de justiça e uma concepção de bem (RAWLS, 2000b). O conteúdo dos princípios da justiça evidencia a identidade da pessoa como um agente ativo para a organização social, bem como as prerrogativas essenciais para o seu agir.

Inicialmente, destaca-se o direito a um amplo sistema de liberdades como a condição para a concretização das liberdades básicas acessíveis a todos.

Nesse tema específico, o acento às liberdades políticas demonstra a afirmação da democracia constitucional como o sistema de organização social com as melhores condições para reconhecer, valorizar e contribuir para a afirmação da pessoa e sua importância no ordenamento social. Em síntese, o liberalismo político é pensado para as pessoas, ou seja, os cidadãos.

Enfim, a afirmação do direito é outra dimensão básica para a compreensão do valor e da missão da pessoa nascida e identificada com a trajetória de uma sociedade concreta. John Rawls, por vezes, destacou que não escolhemos estar nesse ambiente, com essas condições e circunstâncias.

Contudo, inseridos nesta, precisamos agir como pessoas integradas e buscar a justiça e as condições de existência. Essa é uma dimensão que não se prende a uma estimativa teórica, mas supõe as condições necessárias para o exercício dos direitos e liberdades básicas.

A representação do cidadão na posição original objetivando uma sociedade bem-ordenada na forma de uma base constitucional demanda a observação da necessária contribuição valiosa das pessoas. Por fim, é a pessoa com sua identidade e relacionada com as demais que traz sentido ao modelo de justiça, apresentado por Rawls, na  forma de um liberalismo político.

O segundo princípio, no qual ressalta as condições de justiça a partir de um critério de ordenamento das  desigualdades, tem seu foco especialmente concentrado na dignidade das pessoas e nas condições concretas para  participar de forma livre e autônoma dos destinos da sociedade.

A prioridade aos menos favorecidos é, tanto de ponto de vista conceitual como da respectiva concepção política, a demonstração da necessária opção pelo valor e  pela busca da dignidade humana, começando pelos normalmente excluídos ou classificados em posições  secundárias.

A posição original (ou original position) é a situação hipotética na qual as partes contratantes (representando pessoas racionais e morais) isto é, livres e iguais escolhem, sob um véu de ignorância (viel of ignorance), os princípios de justiça que devem governar a estrutura básica da sociedade (basic structure of society).

A teoria da justiça como equidade pode ser destacada com seguinte conclusão: "Além disso, os dois princípios expressam uma forma igualitária de liberalismo em virtude de três elementos:

São eles: a)[7] a garantia do valor equitativo das liberdades políticas, de modo que não sejam puramente formais; b) igualdade equitativa[8] (e, é bom que se diga, são meramente formal) de oportunidades; e, finalmente, c) o chamado princípio da diferença, segundo o qual as desigualdades sociais e econômicas associadas aos cargos e posições  devem ser ajustadas de tal modo que, seja qual for o nível dessas desigualdades, grande ou pequeno, devem representar o maior benefício para os menos privilegiados da sociedade"[9]. (Rawls, 2000).

A condição de igualdade oferecida por Rawls para cidadãos livres e iguais responde ao fato do pluralismo a necessidade de demonstrar como a justiça social é possível, apesar das desigualdades e diferenças que não podem ser extintas ou alienadas.

A opção pelos direitos é característica da democracia que consagra a condição de sujeito de direitos como princípio igualitário para todos. O acesso aos cargos e posições juntamente, com a opção pelos menos favorecidos como critério de igualdade, não as extingue ou nega, mas permite desigualdades justas.

Ao encarar essa dinâmica social se evidencia as condições e possibilidades de abordar o valor da pessoa a partir e sua dignidade individual, bem como sua filiação cultural, seu pertencimento a uma sociedade específica e suas prerrogativas futuras. As condições de estabilidade social e política das sociedades democráticas e constitucionais requer a capacidade de integração das pessoas a partir de suas diferenças e características. A negação dessa prerrogativa é a exclusão da sua dignidade e das condições de justiça social, especificamente a partir das desigualdades equitativas[10].

A teoria da justiça por equidade é composta de tolerância e consensos, especialmente o liberalismo político que busca uma equalização das contradições ínsitas nas sociedades. O exercício da tolerância e a construção de consensos dependem de possibilidades de efetivação desse objetivo.

A afirmação de desigualdades filosóficas, religiosas e moral como traços característicos das sociedades.  contemporâneas. O que desafia os cidadãos para a criação das condições de convivência no mesmo espaço social.

Os exemplos de intolerância ao longo da história podem demonstraram as grandes dificuldades para a concretização da equidade, ou mesmo a superação de concepções e práticas de intolerância foram evidenciadas envolvendo os fatos e personagens. Vide os casos de Lutero e Calvino que eram tão dogmáticos e intolerantes quanto a Igreja Católica havia sido. E, essa é a demonstração da real dificuldade de democracias do passado e dos contextos contemporâneos. Enfim, trata-se de um problema de justiça política, não de um problema sobre o bem supremo.

A compreensão das desigualdades como sendo constitutivas da ordem social não permite justificá-las, mas sim, ordená-las, conforme o filósofo esclareceu nos princípios. E, nessa direção, para dar conta da necessária estabilidade política de longo prazo, é curial afirmar que quanto maiores forem as desigualdades, maiores serão as injustiças.

Na esfera moral e nas teorias da justiça, as desigualdades, especificamente são aquelas que ameaçam a boa convivência entre as pessoas ou o funcionamento razoável das instituições sociais, não encontram nenhuma justificativa ou legitimidade.

Enfim, a avaliação da justiça requer a superação de barreiras, sejam culturais ou institucionais que impedem a cooperação, a participação, o exercício da liberdade e outras referências da democracia constitucional que podem ser resumidas pelo individualismo moral que está na origem de inúmeras situações que constrangem a tradição e, ainda, impedem projetos que busquem o bem comum.

O valor da pessoa e a sua integração social na perspectiva consagrada como sujeito de direitos precisa ser recíproca e conduzir para metas comuns. Esse conflito é conclusivo para o liberalismo político, a base da tolerância e da cooperação social fundamentada no respeito mútuo corres perigo quando essas distinções não são reconhecidas, pois, quando isso acontece e esses ideias e modos de vida assumem uma forma política, os termos equitativos de cooperação são formulados de forma estreita, e a cooperação livre e voluntária entre pessoas com diferentes concepções de bem torna-se impossível.

Ainda se considerarmos o pluralismo de ordem filosófica, religiosa e moral, o liberalismo político não é um liberalismo abrangente. Pois deriva a necessidade de compreender e concretizar o valor da tolerância como uma das dimensões essenciais da razão pública democrática e, com objetivo de reafirmar a convicção, a demonstração da capacidade humana de superar divergências e fanatismos que comprometam negativamente a saudável convivência das pessoas nas sociedades democráticas.

Temos a consequência dessa cooperação que foi elaborada por Rawls no consenso sobreposto, o overlapping consensus, que representa as condições para estabilidade democrática diante da pluralidade divergente. A convergência, por sua vez, ocorre a partir de uma concepção de justiça para as sociedades democráticas e de pessoa na sua condição de membro ativo.

O objetivo do consenso sobreposto é incluir as questões mais relevantes da sociedade democrática. E, por essa razão é profundamente utópico. A unidade social é construída a partir de uma concepção de justiça aceita por todos e orientada pelas instituições sociais justas. E, portanto, a meta é construir uma concepção política democrático liberal abrangente e razoável, ou seja, aceita por significativa parcela da sociedade e das diversas formas de pensar presentes no seu interior.

Os desafios da unidade e estabilidade social e política, no atual contexto, encontram na ideia de um consenso as referências básicas para a estruturação das condições de justiça que seja comum a todos. As divergências, nesta orientação, não são extintas, mas integradas numa estrutura social abrangente e justa, não excludente, mas capaz de ordenar as diferenças e esclarecê-las em vista da justiça social.

Já o consenso constitucional, que é outra prerrogativa de Rawls em vista da equalização das desigualdades, não é profundo e contempla um conjunto de procedimentos materializados na Constituição de um país cujo conteúdo visa o ordenamento e a atuação de um governo democrático. A opção por acordos de maior ou menor profundidade precisa obter a anuência das doutrinas existentes na sociedade que sejam razoáveis e orientadas por princípios e convicções aos quais as pessoas possam aderir. Por exemplo, a tolerância e o respeito

às decisões por maioria. As democracias contemporâneas têm na arquitetura legal8 o seu referencial mais importante para as garantias dos Direitos Fundamentais, das instituições e do próprio funcionamento das sociedades, tanto no âmbito interno, quanto em nível internacional. Nesse sentido – e destacando novamente o pluralismo como realidade –, afirma-se que os acordos e consensos precisam plasmar as relações políticas e institucionais visando a equidade social.

O justo funcionamento da estrutura básica da sociedade, conforme entende Rawls, depende fortemente, dentre outros fatores, da capacidade dos cidadãos enquanto livres e iguais de conjugar a cooperação social, a participação política e a construção de acordos ou consensos. A diminuição dos níveis de desigualdade orientada pelo princípio da diferença e das garantias de liberdade, efetiva-se com mais intensidade quando ancorada na razão pública democrática, cujos consensos são amplamente esclarecidos, acordados e concretizados.

O conjunto da obra de Rawls, particularmente Liberalismo Político, é a expressão da sua confiança nas condições de um ordenamento seguro, duradouro e equitativo das sociedades democráticas. A escolha dos princípios da justiça na posição original para orientar a organização e o funcionamento das instituições sociais é uma dimensão básica para o entendimento das condições de justiça e da concepção de sociedade. Uma sociedade bem-ordenada é consequência da cooperação de todos.

Os princípios da justiça de John Rawls são: (a) todas as pessoas têm igual direito a um projeto inteiramente satisfatório de direitos e de  liberdades básicas iguais para todos, projeto este compatível com todos os demais; e, neste  projeto, as liberdades políticas, e somente estas, deverão ter seu valor equitativo garantido b) as desigualdades sociais e econômicas devem satisfazer dois requisitos: primeiro, devem  estar vinculadas a posições e cargos abertos a todos, em condições de igualdade equitativa de oportunidades; e, segundo, devem representar o maior benefício possível aos membros  menos privilegiados da sociedade (RAWLS, 2000b).

Uma sociedade bem-ordenada depende da avaliação, compreensão, publicidade e, especificamente, das possibilidades de efetivação do conteúdo dos princípios, sem os quais não se pode falar em justiça social. Nessa reflexão, a liberdade foi esclarecida, contudo, cabe uma maior atenção às condições de igualdade a partir dos benefícios aos menos privilegiados da sociedade. Enfim, a não eliminação das desigualdades não significa a sua legitimidade ou concordância, mesmo em situações de complexas ou similares.

A síntese sobre os critérios de igualdade foi esclarecida por Rawls no decorrer da sua exposição de forma a eleger desigualdades justas num conjunto de orientações que conjugam a cooperação entre os que estão em melhores e piores condições, ou seja, os primeiros justificam os seus ganhos na medida em que tenham contribuído para a melhoria dos demais. O princípio da diferença, nessa dinâmica, emerge como o critério para, simultaneamente, ordenar e corrigir as desigualdades (RAWLS, 2000b).

A necessidade de um ordenamento justo das relações políticas e sociais (sociedade bem-ordenada) é um objetivo que preocupa os responsáveis pela sua organização, especificamente os legisladores que pautam sua ação pela moralidade pública e pelo combate às injustiças. Rawls sabe que sua proposta é um ideal, no entanto, assinala que precisa de condições em vista de uma proposição equitativa, nesse sentido, por exemplo, propõe o recurso que chamou de véu de ignorância para que sua proposta seja possível.

Os cidadãos concebidos na sua identidade genuína de pessoas livres e iguais demonstra a afirmação do seu valor próprio e da sua autonomia. A condição de igualdade dos membros ativos da sociedade reconhece, promove e respeita a individualidade de forma a superar o individualismo moral e a atuação política pautada pelo autointeresse. Afirma-se a necessidade de fomentar a cooperação como demonstração do exercício da cidadania na condição de sujeito de direitos, referência básica do homem livre numa democracia.

Referências:

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___________. Conferências sobre a História da Filosofia Política. Tradução de Fábio M. Said. São Paulo: Martins Fontes, 2012.

Notas:

[1] O utilitarismo é uma doutrina que avalia a moral e, sobretudo, as consequências dos atos humanos. Caracteriza-se pela ideia de que as condutas adotadas devem promover a felicidade ou prazer do coletivo, evitando assim as ações que levam ao sofrimento e a dor. Utilitarismo é uma teoria filosófica que busca entender os fundamentos da ética e da moral a partir das consequências das ações. Neste caso, o utilitarismo consiste na ideia de que uma ação só pode ser considerada moralmente correta se as suas consequências promoverem o bem-estar coletivo.  Caso o resultado da ação seja negativo para a maioria, esta é classificada como condenável moralmente. A partir deste raciocínio, o utilitarismo se apresenta oposto ao egoísmo, pois as consequências das ações devem estar focadas na felicidade de um conjunto e não de interesses particulares e individuais. A teoria utilitarista foi defendida, como uma doutrina ética, principalmente pelos filósofos e economistas ingleses John Stuart Mill e Jeremy Bentham, durante os séculos XVIII e XIX. No entanto, o pensamento utilitarista já era explorado desde a Grécia antiga, principalmente através filosofo grego Epicuro.

[2] Diferentemente da Teoria contratualista, o Institucionalismo social abarca um interesse cuja exclusividade não se restringe aos sócios. Em certa medida, considera-se a relevância dos interesses dos empregados, credores, clientes, e demais vinculados à atividade empresarial, inclusive o interesse público. Segundo Rathenau, o interesse social da empresa vai ao encontro do interesse público, onde há uma nítida assunção de responsabilidades do Estado por parte da empresa. É valorizada a relevância social da empresa e o interesse público que nela se tem representado. Nesta visão, o interesse dos sócios e acionistas sofre limitação da influência exercida pelos interesses sociais da empresa, vinculados ao interesse público em si. Esta teoria orientou a legislação alemã a adotar a tese de que o bem coletivo deveria se colocar como superior ao interesse institucional puro e simples. Isto é, o interesse público iria se sobrepor demasiadamente ao interesse dos sócios, tornando praticamente nula a diferença entre empresa pública e empresa privada. Vale ressaltar que a atividade econômica é dependente direta do lucro e tal teoria poderia comprometer a noção de propriedade privada em uma sociedade republicana.

[3] A situação da posição originária é fruto de um experimento arquitetado por Rawls a fim de tornar plausíveis os critérios de justiça que deveriam informar leis e instituições. Aqui é que ele se revela um neocontratualistas, não mais vinculado ao modelo de estado de natureza (Hobbes, Locke e Rousseau), porém à chamada original position. Segundo este método, se algum indivíduo implicado no processo de determinação dos termos contratuais a vigorar na futura sociedade soubesse, anteriormente, qual será no futuro sua posição, ou a de seus inimigos, é previsível que se incline pela proposta cujos critérios de estruturação da sociedade se fundamentem  em bases vantajosas para si próprio e seus amigos, bem como desvantajosa para  seus inimigos.

[4] Para Rawls, essa distribuição deve ser justa, pois “a justiça é a virtude primeira das instituições sociais, tal como a verdade o é para os sistemas de pensamento”.  Assim, da mesma forma que uma teoria do conhecimento deve ser rejeitada se não for verdadeira (ainda que seja esta uma teorização elegante, bem elaborada), as teorias estabelecidas no campo da práxis, mesmo que eficazes e bem concebidas, devem ser rejeitadas se forem injustas. Ou seja, além de funcionar, há um incontornável compromisso dessas teorias com a justiça. Nesta perspectiva, observamos como uma teoria jurídica rawlsiana rejeitaria um direito que não trouxesse em seu bojo a possibilidade de contemplar o ideal de justiça (entendida esta como equidade, o que a afastaria de uma compreensão positivista de justiça).

[5] Corrente ideológica segundo a qual as ideias políticas, sociais e culturais, são consequência de uma multiplicidade que, embora unida por uma diversidade independente, apresentam ligações entre si. A noção de pluralismo jurídico comunica a ideia de que existem e vigem em determinado espaço normatividades oriundas de diferentes fontes, para além das normas editadas pelo Estado que exerce soberania sobre aquele território. Nas últimas décadas vários países latino-americanos incorporaram em suas Constituições e práticas soluções que adotam modelos de pluralismo jurídico.

[6]O Supremo Tribunal Federal é o órgão de cúpula do Poder Judiciário, e a ele compete, precipuamente, a guarda da Constituição, conforme definido no art. 102 da Constituição da República. O STF pode ser considerado o lugar apropriado e legítimo para resolver questões políticas fundamentais.  Defende-se a tese, a partir da teoria rawlsiana, de que o uso da razão pública como procedimento de justificação e de aplicação dos princípios da justiça, por suas características, oferece uma plataforma satisfatória para a resolução dos desafios inerentes a sociedades complexas e que o Supremo Tribunal Federal (STF) exprime ou deveria exprimir aquela. Oferece um critério de reflexão e aferição da legitimidade de decisões políticas em sociedades democráticas e fornece diretrizes para a identificação, racional, das ações políticas que defendem ou violam os princípios de justiça de um Estado Democrático de Direito.

[7] “O princípio da igual liberdade” Este princípio afirma que “cada pessoa deve ter um direito igual ao mais amplo sistema total de liberdades básicas, que seja compatível com o sistema semelhante de liberdade para todos.” Como se vê, ele valoriza fundamentalmente as liberdades individuais que devem ser iguais para todos, servindo para fundamentar o princípio da universalidade dos direitos fundamentais (ou pelo menos no que se refere aos direitos de primeira geração).

[8] O segundo princípio e a busca pela mitigação das desigualdades socioeconômicas Se o primeiro princípio trata de forma mais explícita dos direitos de liberdade, o segundo volta suas vistas mais contundente para a igualdade. E o faz a partir de dois subprincípios, chamados por Rawls de princípio da diferença (maximim) e princípio da igualdade de oportunidades. Basicamente, tratam estes princípios das desigualdades econômicas e sociais de forma que: a) garantam os maiores benefícios possíveis aos menos favorecidos (princípio da diferença); b) estejam vinculados a tarefas e posições acessíveis a todos em circunstâncias de justa igualdade de oportunidades (princípio da igualdade de oportunidades).

[9] O princípio da oportunidade justa. Este princípio estabelecido informa que as desigualdades econômicas e sociais devem estar ligadas a postos e posições acessíveis a todos em condições de justa igualdade de oportunidades. Ou seja, um sistema justo só o será se aqueles que estão em condições menos favoráveis na sociedade, tiverem iguais condições de oportunidade em relação aos demais membros, de acessarem os diferentes cargos e posições a serem ocupados pelos indivíduos.


Gisele Leite

Gisele Leite

Professora Universitária. Pedagoga e advogada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Conselheira do INPJ. Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Consultora Jurídica.


Palavras-chave: Ideologia Filosofia Sociologia Liberalismo Econômico Igualdade Liberdade

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