Intervenção Federal do DF

É sabido que o nosso país adotou o arranjo federalista desde 1889 e, tal modelo surgira nos EUA dando grande ênfase na distribuição de competência e no equilíbrio de poderes entre o órgão central e os Estados-membros, que ficou conhecido como federalismo dual. Atualmente, tem-se um federalismo cooperativo onde vige o entrelaçamento de competência e partilha de recursos dos diferentes níveis de governo, sob a hegemonia da União. Diante de recentes atos terroristas no Distrito Federal, mais particularmente, na Esplanada dos Ministérios, onde ocorreu vandalismo e destruição de patrimônio público e, sério ataque ao Estado Democrático de Direito e ao governo legitimamente eleito e empossado, fez-se necessária a decretação da intervenção federal no DF.

Fonte: Gisele Leite

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Oito de janeiro de 2023, era para ser mais um domingo tranquilo, mas o Presidente Lula decretou a intervenção federal do Distrito Federal até 31 de janeiro. A motivação foi porque a capital federal brasileira fora alvo de atos terroristas promovidos pelos aliados do anterior Presidente da República[1] que invadiram e depredaram os prédios do Palácio do Planalto, Congresso Nacional e o Supremo Tribunal Federal.

A intervenção é prevista limita à área de segurança pública, conforme disposição do artigo 117-A da Lei Orgânica do Distrito Federal e visa pôr fim ao grave comprometimento da ordem pública, marcado pela violência e invasão de prédios públicos.

Restou nomeado para o cargo de interventor Ricardo Garcia Capelli[2], secretário-executivo do Ministério da Justiça e Segurança Pública. O cargo considerado o nº 2 da pasta chefiada por Ministro Flávio Dino, que fica subordinado ao Presidente da República, não estando sujeito às normas distritais que conflitarem com as medidas necessárias à execução da intervenção.

E, poderá requisitar, se for necessário, recursos financeiros, tecnológicos, estruturais e humanos do DF afetos ao objeto e indispensáveis à consecução do objetivo da intervenção.

O interventor, no âmbito do DF, exercerá o controle operacional de todos os órgãos distritais de segurança pública previstos no artigo 144 da CFRB/1988 e ainda no artigo 117-A da Lei Orgânica do DF.

Com a mencionada intervenção, os bens, serviços e servidores afetos às áreas da Secretaria de Estado de Segurança do DF, da Secretaria do Estado de Administração Penitenciária do DF e do Corpo de Bombeiros Militar do DF, para prover o emprego nas ações de segurança pública determinadas pelo interventor.

O anúncio da intervenção fora feito quase três horas e meia após a invasão dos prédios públicos. O atual Presidente da República reclamou a punição dos responsáveis e de quem facilitou o furo do bloqueio por parte dos terroristas.

Afirmou também que os policiais e demais autoridades que não atuaram contra os atos "não ficarão impunes, porque não são de confiança da sociedade brasileira".

Cumpre frisar que a doutrina balizada é unívoca em entender que os motivos autorizadores da intervenção federal constituem rol taxativo. Aliás, a jurisprudência confirma, in litteris:

“Taxatividade das hipóteses constitucionais de intervenção federal: STF – “O tratamento restritivo, constitucionalmente dispensado ao mecanismo da intervenção federal, impõe que não se ampliem as hipóteses de sua incidência, cabendo ao intérprete identificar, no rol exaustivo do art. 34 da Carta Política, os casos únicos que legitimam, em nosso sistema jurídico, a decretação da intervenção federal nos Estados-membros” (STF – Intervenção Federal nº 591-9/BA – Rel. Ministro-Presidente Celso de Mello, Diário da Justiça, Seção I, 16 set. 1998, p. 42).”

José Cretella Júnior ressaltava que, constituindo exceções, os casos de intervenção federal não são suscetíveis de qualquer tipo de interpretação ampliativa, uma vez que a autonomia do Estado-membro é da própria essência da Federação, motivo por que a enumeração constitucional das hipóteses excepcionais é taxativa, não exemplificativa.

O Ministro Gilmar Ferreira Mendes afirma que, no processo de intervenção federal nos estados e no Distrito Federal, verifica-se um conflito entre a União (que visa garantir a eficácia dos princípios constitucionais da CFRB-1988) e a posição dos estados e do Distrito Federal (que visam assegurar sua autonomia), sendo que, a primeira baliza interpretativa, é o próprio mandamento da não intervenção, consagrado constitucionalmente. Mendes propugna, em seguida, a análise da “legitimidade da intervenção federal a partir de sua conformidade ao princípio constitucional da proporcionalidade.

A Constituição brasileira vigente prevê, em seu artigo 34, as únicas hipóteses em que poderá ocorrer a intervenção e, em seu artigo 36, os órgãos competentes para solicitar o procedimento. Vale ressaltar que a decretação da Intervenção Federal é sempre de competência do Presidente da República, mas existem casos em que este depende da solicitação por outros órgãos. Para facilitar a compreensão de quem possui a iniciativa em cada caso, separamos alguns dispositivos em primeira parte e parte final, tratando de grupos de incisos.

O Presidente da República pode iniciar espontaneamente uma Intervenção Federal, nas hipóteses dos incisos I, II, III e V do art. 34, ou seja, quando destinada a: Manter a integridade nacional (inciso I); Repelir invasão estrangeira (inciso II, primeira parte); Repelir invasão de uma unidade da Federação em outra (inciso II, parte final); Pôr termo a grave comprometimento da ordem pública (inciso III); Reorganizar as finanças da unidade da Federação que (inciso V):a) suspender o pagamento da dívida fundada por mais de dois anos consecutivos, salvo motivo de força maior ; b) deixar de entregar aos Municípios receitas tributárias fixadas nesta Constituição, dentro dos prazos estabelecidos em lei.[3]

Entretanto, a Intervenção Federal permite a suspensão temporária da autonomia desses entes, em situações específicas, quando não houver outro remédio capaz de corrigir a situação de anormalidade. Por tratar-se de medida de exceção, as hipóteses constitucionais são consideradas restritivas, não podendo ser realizada a intervenção em situações não previstas expressamente.

A evolução do instituto da Intervenção federal através da constituições brasileiras quando se evidenciou que esse instituto surge no ordenamento jurídico brasileiro, muito pouco limitado e discriminado na Carta de 1891, situação retificada pela reforma constitucional de 1926. Após, suas demais encarnações foram todas igualmente bem tratadas e detalhadas nas demais constituições, notando-se uma pequena variação.

Nas Constituições brasileiras como a de 1967, por exemplo, houve uma ampliação das causas de intervenção. Por fim, ao se comparar o desenvolvimento do federalismo e da intervenção federal no Brasil, concluiu-se que a intervenção federal é menos usada em momentos que se observa uma preponderância da União sobre os entes federados, pois são nesses momentos que o governo central dispõe de meios mais efetivos para controlar os estados.

Na Constituição Federal brasileira de 1988, não obstante o esforço empregado na busca do equilíbrio federativo, observou-se um preponderância da União sobre o demais entes, notadamente no campo das competências fiscais, o que lhe permite influenciar os entes federados de maneira mais sutil, sem ter de recorrer à medida gravosa como a intervenção. Uma razão pela qual a intervenção deixou de ser decretada nos derradeiros anos.

Não obstante ter assumido um governo devastado pela péssima gestão anterior, ainda, contamos com esses atos terroristas só agravam a complexidade da crise política e econômica do país.

Referências

BBC O que é a intervenção federal decretada por Lula no Distrito Federal. Disponível em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2023/01/08/o-que-e-a-intervencao-federal-decretada-por-lula-no-distrito-federal.ghtml Acesso em 08.01.2023.

CRETELLA JÚNIOR, José. Comentários à constituição brasileira de 1988. Vol. IV. São Paulo: Forense, 1991.

PEDUZZI, Pedro; MÁXIMO, Welton. Agência Brasil. Lula decreta intervenção federal na segurança pública do DF. Secretário-executivo do Ministério da Justiça será interventor. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-01/lula-decreta-intervencao-federal-na-seguranca-publica-do-df Acesso em 08.01.2023.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 30ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008.

VINHAL, Gabriela; MELLO, Igor. Lula decreta intervenção federal no DF. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/politica/ultimas-noticias/2023/01/08/lula-decreta-intervencao-federal-no-df-ate-31-de-janeiro.htm Acesso em 08.01.2023.

Notas:

[1] Em tempo, cumpre apontar o disposto no art. 28. Os passaportes diplomático e oficial terão prazo de validade de até dez anos, podendo ser reduzido a critério do Ministério das Relações Exteriores, tendo em conta a natureza da função ou a duração da missão dos seus titulares. Decreto 1983, de 14 de agosto de 1996.

[2] De acordo com informações do ministério, Cappelli é jornalista, especialista em administração pública pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e atua, há 22 anos na administração pública. Ele já atuou como secretário municipal, secretário estadual e secretário nacional em áreas diversas no estado do Maranhão.

[3] A AGU (Advocacia-Geral da União) pediu ao STF a prisão do ex-secretário de Segurança Pública do Distrito Federal Anderson Torres, que foi ministro da Justiça do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL). O pedido é assinado por Jorge Messias e foi enviado horas após terroristas bolsonaristas depredarem a sede do tribunal e também o Congresso Nacional e Palácio do Planalto em Brasília. Torres foi demitido hoje pelo governador do DF, Ibaneis Rocha. Ele havia assumido a chefia da Secretaria de Segurança do DF.


Gisele Leite

Gisele Leite

Professora Universitária. Pedagoga e advogada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Conselheira do INPJ. Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Consultora Jurídica.


Palavras-chave: Estado Democrático de Direito CF/88 Intervenção Federal Atos Terroristas Federalismo Brasileiro

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