Esferas da justiça e igualdade complexa
Walzer iniciou sua teoria da justiça apresentada em sua obra fazendo recorte que vem a definir seu objeto, a justiça distributiva como sendo aquela que se refere aos bens distribuídos dentro de sociedades políticas. Sua argumentação deveria servir para qualquer comunidade política, incluindo-se as não democráticas, projeto depois modificado quando buscou construir uma teoria da justiça aplicável somente às sociedades democráticas.
Quando Michael Walzer publicou
a obra intitulada “Esferas da Justiça”, em 1983, eram John Rawls e Robert
Nozick expoentes da filosofia do direito. Sabe-se que Rawls construiu sua proposição de
teoria da justiça com base num experimento mental que pretende descobrir quais
seriam os princípios de justiça escolhidos.
E, numa situação hipotética,
impedidos de ver por um véu de ignorância de saber quais seriam suas próprias
circunstâncias numa sociedade real e concreta, aquele autor considerou que
pessoas razoáveis escolheriam determinados princípios capazes de servir de base
para a alocação de recursos socialmente relevantes numa sociedade
bem-organizada.
Tais princípios distributivos
então orientariam a alocação de direitos e de bens fundamentais que levariam a
um certo balanço entre a igualdade e a diferença e, seriam potencialmente
aceitos por toda pessoa.
Especialmente, o princípio que
levaria em consideração as diferenças que tanto comprometem o desempenho dos
menos afortunados num contexto de ríspida concorrência e, por isso, legitimaria
as políticas compensatórias, o que levou a teoria de Rawls superar seu berço
liberal e dar-lhe feições mais afetas à socialdemocracia.
Outra obra relevante é de
autoria de Nozick, intitulada “Anarquia, Estado e utopia”[1], de 1974 e, se voltou
frontalmente contra as possibilidades do que ele denominou intervencionismo
estatal aberto consagrado pelo princípio de Rawls[2] da diferença.
E, mesmo com os doutrinadores
renovadores do liberalismo tais como Friedrick Hayek e Milton Friedman, bem
como a teoria contratualista de John Locke[3], Nozick não apenas negou
ao Estado qualquer legitimidade de intervenção na livre concorrência entre os
cidadãos, mas restringe seu papel ao de guardião da vida e da propriedade
submetido ele próprio à concorrência com outros agentes. Seu liberalismo tem
como âncoras principais a liberdade para a fruição da propriedade e liberdade
frente ao Estado.
O doutrinador reconheceu
injustiça apenas na apropriação ou na transmissão injusta de bens. Toda forma de
tentar alocar bens que não seja por livre deliberação ou pela livre troca entre
os indivíduos só seria viável ao preço do uso da força, porquanto a pretensão
de estabelecer ou manter uma distribuição igualitária teria que ser obtida ou
pelo impedimento da transmissão voluntária de bens ou por sucessivas expropriações
para fins redistributivos.
Para contrapor ao argumento de
Nozick de que a busca da igualdade mediante as políticas públicas contém em si
o germe do autoritarismo, Walzer desenvolveu sua tese sobre as distintas
esferas da justiça. E, o ponto de partida é a distinção entre igualdade simples
e igualdade complexa.
Na primeira, todos os membros
de uma sociedade disporiam sobre os mesmos bens e direitos indistintamente, um
objetivo que o autor considera indefensável. Já na igualdade complexa se admite
que diferenças de diversos matizes existam e subsistam, mas considera-se
inadmissível que as diferenças de uma esfera da vida sejam transmitidas também
a outras esferas, especialmente, quando essa expansão das diferenças tem como
implicação a dominação.
Walzer considerou que na arte
da diferenciação das esferas da vida social e dos critérios segundo os quais
bens e direitos são distribuídos dentro destas está o antídoto para o temido
germe da dominação. Relembrando Pascal e
Marx como precursores de sua tese da separação "qualidades pessoais e bens
sociais têm suas próprias esferas de atuação".
O significado social destes
até possibilita, em alguma medida, a transferência de uma esfera a outra, mas é
sua interpretação interna a cada esfera que permite a descoberta de princípios
de justiça distributiva.
A transferência de vantagens adquiridas
numa esfera para outra sem que haja uma ligação considerada intrínseca entre
estas é considerada tirania. O respeito à autonomia e à validade dos princípios
válidos em cada esfera constitui para Walzer a igualdade complexa.
In litteris:
"a igualdade complexa significa que a situação de nenhum cidadão em uma
esfera ou com relação a um bem social pode definir sua situação em qualquer
outra esfera, com relação a qualquer outro bem”.
A propósito, Marcelo Neves
(2006) desenvolveu uma tese sobre a transmissão da desigualdade a partir da
perspectiva da teoria sistêmica de Luhmann que tem diversos paralelismos com a
reivindicação de autonomia feita por Walzer.
Nessa igualdade complexa[4], a distribuição tem por
base três princípios distributivos, cada qual em esferas também distintas de
alocação: o livre intercâmbio no mercado, o mérito em âmbitos que envolvem
juízos complexos como o estético e, a necessidade com um recorte diferenciado
de abrangência segundo a sociedade específica.
A sociedade com igualdade
complexa, por conseguinte, para Walzer não necessita uniformizar as pessoas,
precisa fundamentalmente evitar que prospere a injustiça, consistente em que
titulares de uma posição vantajosa numa esfera façam uso desta sua condição para
influenciar sua posição também em outra ou outras. Uma sensibilidade especial
de Walzer enfoca o poder político, por ver nesse âmbito o maior potencial para
tentativas de expansão da dominação.
Assim, enquanto o liberalismo
coloca todo seu peso na liberdade para o uso da liberdade de livre troca,
ignorando tanto a origem de eventuais desigualdades quanto suas consequências,
Walzer pretendeu ressaltar a existência de limites para a troca com base em
equivalências monetárias. Então, sua tese é que há coisas e bens cujo valor não
se mensura e, cuja aquisição não se realiza através de dinheiro.
Quando cogitou em bens, o
doutrinador Walzer não teve em mente apenas os bens tangíveis e interesses, mas
também amplo conjunto de dimensões da vida social que constroem a identidade
tanto da comunidade como também dos indivíduos que nesta habitam e vivem.
Em verdade, o doutrinador se
referiu ao poder político, direitos do cidadão, saúde física, mental e
espiritual, reconhecimento, acesso ao trabalho, a educação, a cultura, a
segurança e ao desfrute do amor, do ócio e até da graça divina (Krause e
Malowitz, 1998).
Afinal, para o referido
doutrinador, cada comunidade ou sociedade define historicamente o que para esta
são bens relevantes e, também como são distribuídos.
Diferentemente de Rawls, por
exemplo, que formulou quais os princípios que deveriam ser a bússola da
distribuição e como as instituições nesta envolvidas deveriam funcionar, Walzer[5] priorizou a exposição do
modo como historicamente certas comunidades políticas definiram seus bens
relevantes e ainda como determinaram sua alocação.
Nem mesmo a constituição de um
catálogo de necessidades fundamentais é encarada como viável segundo o
doutrinador, porquanto não dependeriam apenas da natural constituição das
pessoas, e sim, também da história e da cultura de sua comunidade.
O doutrinador não enxergou a
possibilidade de universalizar juízos sobre os bens e seu significado e
relevância ainda dependem da avaliação que os membros da comunidade específica
em que são alocados lhes dão.
Entretanto, também o processo
reverso foi destacado pelo doutrinador “homens e mulheres assumem identidades
concretas devido ao modo como concebem e criam, e depois possuem e empregam os
bens sociais”. Há uma história da relação dos seres humanos entre si e com os
bens que antecede a presença de cada um nessa comunidade política e, nessa
história formou-se uma identidade que é herdada pelos novos membros.
Portanto, haveria para o
doutrinador uma relação de reciprocidade na constituição da autocompreensão da
comunidade e do significado que os bens sociais têm dentro desta (Krause,
Malowitz, 1998).
A partir dessa íntima vinculação
entre o modo como historicamente são distribuídos os bens sociais e a
identidade da comunidade, entre tradições, direitos, linguagem e a
autocompreensão e as instituições sociais, Walzer inferiu a impossibilidade de
uma teoria da justiça da validade geral e universal[6].
Em síntese, a normatividade
dos princípios que se orientam a distribuição dos bens em uma determinada
comunidade não advém, para Walzer, de características gerais atribuídas aos
indivíduos, mas da compreensão e práxis social[7] formadas historicamente nessa
comunidade política e, dentro dela, nas diversas esferas da vida.
A teoria social atualiza,
rememora e sistematiza tais princípios orientadores. Porém, esta não os cria.
E, opositor Barry considerou essa a afirmação a mais distintiva e desafiadora da
obra Walzer em questão. E, assim, o doutrinador se posicionou contrário às
teorias citadas em que o contexto teórico e de aplicação são distintos.
E, o doutrinador viu nessa
separação um dos grandes problemas da teoria política em geral e das teorias
atuais da justiça em particular.
E, para Walzer, portanto, os
princípios da justiça são considerados dados, isto é, não existe necessidade de
explicitação da gênesis conceitual ou de justificação de conceitos, porque eles
são retirados de uma análise social da multiplicidade de esferas da justiça.
E, conforme Paul Ricouer
(2000) a teoria da justiça de Walzer está amparada em três concepções
basilares, a saber: 1. a ideia de que os bens sociais são múltiplos; 2. cada um
deles tem seu próprio simbolismo e, 3. cada um deles desenvolve uma lógica
interna, na base da qual os respectivos grupos desenvolvem valores compartilhados
que justificam as reivindicações feitas no âmbito de seu horizonte
hermenêutico.
Uma tal estratégia traz consigo
dificuldades que se tornam mais claras quando confrontada com o que Ricouer
chama de “paradoxo político”: “We touch here on what I shall call the
political paradox, namely that politics seems both to constitute one sphere of
justice among others and to envelop all the other spheres” [8](Ricoeur, 2000).
Conclui-se, de outra forma que
seria possível que uma teoria plural da justiça consiga subsistir sem a transcendência,
isto é, que seja possível desenvolver uma teoria plural da justiça sem que se
possa admitir que uma esfera da justiça seja o pressuposto de todas as outras
ou que, pelo menos, estabeleça os limites e fronteiras de todas as outras,
questiona-se.
Será que esse problema
inerente a todas as teorias plurais da justiça? Ricoeur pareceu ter encontrado
na teoria de Luc Boltanski[9] e Laurent Thévenot as
pistas de como resolver tal busilis e talvez superá-lo. (Ricoeur, 2000).
A mencionada teoria de
Boltanski e Thévenot se desenvolveu a partir de crítica à sociologia crítica de
Pierre Bourdieu[10]
e foi na sua obra “De La Justification” que os pensadores privilegiaram
como objeto de pesquisa, os litígios e contendas sociais com o fito de
identificar os princípios e valores que definiam as posições e interesses em
jogo nos conflitos.
Portanto, refere-se a uma
sociologia da crítica, em contraposição à sociologia crítica de Bourdieu. Assim,
negou-se o estruturalismo e aderiu-se ao pragmatismo norte-americano, quando os
doutrinadores vão se interessar primeiramente nas ações e práticas críticas.
No lugar das estruturas, os
doutrinadores adotam as cidades e, conforme explicou Bandenbergue: "(...)
Boltanski e Thévenot introduzem as Cidades como mediações simbólicas e
axiológicas que permitem constituir a situação como um conjunto bem ordenado de
interações vividas entre as pessoas e os objetos que os atores encontram em seu
ambiente imediato (Vandenbergue, 2006).
Em situações cotidianas, as
ações entre as pessoas são coordenadas por pressuposições tacitamente
compartilhadas e pré-reflexivas e muitas vezes condensadas em objetos,
instituições, organizações, costumes e regras.
Porém, ao surgirem as
disputas, os autores apontam que os indivíduos argumentam e procuram justificar
suas ações em busca de acordo com os argumentos que possam subsistir a
contra-argumentações, o que nos recordar da proposição de Habermas, na qual o discurso
visa ao restabelecimento do consenso sobre temas que temporariamente se
tornaram não-consensuais (Habermas, 1988).
São chamados de “Momentos
críticos”, pelos autores que dão à essa situação em que o consenso pressuposto
se desfaz e o indivíduo se sente coagido a reconstruir uma gênese justificativa
para sua posição. A pessoa in casu não apenas está “sujeita a um
imperativo de justificação”.
Em sua obra, os doutrinadores
sistematizaram seis cidades que são desenvolvidas, a partir de seis textos de filósofos,
a saber: A cidade de Deus[11], de Santo Agostinho, a
cidade doméstica de Bossuet “La politique tirée des propres paroles de l'écriture
sainte[12]”,
a cidade de renome, de Hobbes em Leviatã, a cidade cívica[13], Rousseau, em “Do
Contrato Social”[14],
a cidade mercantil, Adam Smith, “A riqueza das nações”[15] e a cidade industrial de
Saint Simon “Du systéme industriel”[16].
Evidentemente, não se trata de
elenco exaustivo, uma vez que, por exemplo, Boltanski e Chianello introduziram
no seu livro intitulado O novo espírito do capitalismo (2003) e a "Cidade
por projetos".
Ainda, do indivíduo que
argumenta, justifica suas ações e posições, se requer enorme habilidade. A de
calcular e estabelecer equivalências já fora mencionada. Além disso, ele
necessita poder contextualizar o tom adequado da justificação.
E, nesse ponto, as Cidades que
lhe são de grande valia, pois pré-estruturam um espaço de justificações
plausíveis entre as quais há pontes de equivalência. E, curiosamente, há
doutrinadores que dão pouca atenção sobre a diferença abordada por Habermas, por
exemplo, quanto ao desempenho retórico ou performático.
A teoria de Axel Honneth[17] fora desenvolvida em
quatro momentos distintos, em um primeiro momento, ele procurou mostrar as
insuficiências da versão da teoria crítica desenvolvida por Habermas. Honneth
sustentou que a teoria habermasiana da sociedade precisa ser criticada do ponto
de vista do horizonte da dimensão de intersubjetividade social, na qual as
instituições estão inseridas.
Num segundo momento, Honneth
procurou desenvolver sua própria versão da teoria crítica ex negativo,
pois ele esclareceu no posfácio de Kritik der Macht [18]que a primeira versão da
teoria de Habermas da sociedade poderia ser melhor desenvolvida a partir do
conceito de Hegel de luta por reconhecimento.
Nesse sentido, poder-se-ia
concluir que Honneth, em Kritik der Macht, procura mostrar,
principalmente, que uma teoria crítica da sociedade deveria estar preocupada em
interpretar a sociedade a partir de uma única categoria, ou seja, do reconhecimento
(Saavedra, 2007).
Em “Kampf um Anerkennung”,
obra considerada como o marco da segunda fase de sua teoria, Honneth desenvolveu
essa conclusão de forma consequente (Saavedra, Sobottka, 2008), onde introduziu
os primeiros elementos da sua teoria do reconhecimento a partir da categoria da
dependência absoluta, de Winnicott. Esta categoria designa a primeira fase do
desenvolvimento infantil, na qual a mãe e o bebê se encontram num estado de
relação simbiótica.
A carências e a dependência
total do ser humano em tenra idade e o direcionamento completo da atenção da
mãe para a satisfação de necessidades da criança fazem com que entre eles não
exista nenhum tipo de limite de individualidade e ambos se sintam como unidade.
(Honneth, 2003).
Aos poucos, com o retorno
gradativo aos afazeres da vida diária, este estado de simbiose vai se
dissolvendo por meio de um processo de ampliação da independência de ambos,
pois, com a volta à normalidade da vida, a mãe não está mais em condições de
satisfazer as necessidades da criança imediatamente.
A criança, então, em média com
seis meses de vida, precisa acostumar-se com a ausência da mãe. E, tal fato
estimula a criança o desenvolvimento de habilidades e capacidades que a tornam
capaz de se diferenciar do seu ambiente. Winnicott atribui a essa nova fase o
nome de relativa independência.
Nesta fase, a criança
reconhece a mãe não mais como uma parte do seu mundo subjetivo e, sim, como
objeto dotado de direitos próprios. A criança trabalha essa nova experiência
por meio de dois mecanismos, que o autor chamou de destruição e fenômeno de
transição.
O primeiro mecanismo é
interpretado, por Honneth, a partir dos estudos de Jessica Benjamin. Essa
autora constatou que os fenômenos de expressão agressiva da criança nesta fase
acontecem na forma de uma espécie de luta, que ajuda a criança a reconhecer a
mãe como um ser independente com reivindicações próprias. A mãe precisa, por
outro lado, aprender a aceitar o processo de amadurecimento que o bebê está
passando.
A partir dessa experiência de
reconhecimento recíproco, os dois começam a vivenciar também uma experiência de
amor recíproco sem regredir a um estado simbiótico (Honneth, 2003).
A criança, porém, só estará em
condições de desenvolver o segundo mecanismo se ela tiver desenvolvido com o
primeiro mecanismo uma experiência elementar de confiança na dedicação da mãe.
Com base nos estudos de
Winnicott[19],
Honneth esboça os princípios fundamentais do primeiro nível de reconhecimento.
E, quando a criança
experimenta a confiança no cuidado paciencioso e duradouro da mãe, ela passa a
estar em condições de desenvolver uma relação positiva consigo mesma. Honneth
chama essa nova capacidade da criança de autoconfiança (Selbstvertrauen). De
posse dessa capacidade, a criança está em condições de desenvolver de forma
sadia sua personalidade.
E, esse desenvolvimento
primário da capacidade de autoconfiança é visto por Honneth (2003) com a base
das relações sociais entre adultos. Honneth vai além e sustenta que o nível do
reconhecimento do amor é núcleo fundamental de toda a moralidade.
Portanto, este tipo de reconhecimento
é responsável não só pelo desenvolvimento do autorrespeito (Selbastachtung),
mas também pela base de autonomia para a participação na vida pública.
Dois questionamentos guiam a
análise de Honneth de segunda esfera do reconhecimento nesta fase de desenvolvimento
de sua teoria: qual é o tipo de autorrelação que caracteriza a forma de
reconhecimento do direito?
Como é possível que uma pessoa
desenvolva a consciência de ser sujeito de direito? A estratégia utilizada por
Honneth consiste em apresentar o surgimento do direito moderno de tal forma
que, neste fenômeno histórico, também seja possível encontrar uma nova forma de
reconhecimento.
Honneth pretendeu, portanto,
demonstrar que o tipo de reconhecimento característico das sociedades
tradicionais é aquele ancorado na concepção de status :em sociedades
desse tipo, um sujeito só consegue obter reconhecimento jurídico quando ele é
reconhecido como membro ativo da comunidade e apenas em função da posição que
ele ocupa nesta sociedade.
Honneth reconheceu na transição
para a modernidade uma espécie de mudança estrutural na base da sociedade, à
qual corresponde também uma mudança estrutural nas relações de reconhecimento:
ao sistema jurídico não é mais permitido atribuir exceções e privilégios às
pessoas da sociedade em função do seu status.
Pelo contrário, o sistema
jurídico deve realmente combater estes privilégios e exceções. O direito,
portanto, deve ser geral o suficiente para levar em consideração todos os
interesses de todos os participantes da comunidade. E, em face desta
constatação, a análise do direito de Honneth procurou desenvolver basicamente
um novo caráter, nova forma de reconhecimento jurídico que surgiu na
modernidade. (Honneth, 2003).
Honneth procurou mostrar que,
junto com o surgimento de uma moral ou de uma sociedade pós-tradicional,
ocorrendo também uma separação da função do direito e daquela do juízo de valor
(Wertschätzung). Na teoria de Ihering e na tradição de Kant de
diferenciação de formas de respeito (Achtung), principalmente com base
na pesquisa de Darwall, ele encontra elementos para determinar a diferença
entre direito e juízo de valor.
Para o direito, a questão
central é: como a propriedade constitutiva das pessoas de direito deve ser
definida; no caso do juízo de valor, como se pode desenvolver um sistema de
valor que está em condições de medir o valor das propriedades características
de cada pessoa.
Os sujeitos de direito
precisam estar em condições de desenvolver sua autonomia, a fim de que possam
decidir racionalmente sobre questões morais. Nesse momento, Honneth teve mente
a tradição dos direitos fundamentais liberais e do direito subjetivo em condições
pós-tradicionais, que indicam a direção do desenvolvimento hsitórico do
direito.
A luta por reconhecimento
deveria então ser vista como uma
pressão, sob a qual permanentemente novas condições para a participação na
formação pública da vontade vêm à tona. Honneth esforça-se, influenciado pelos
escritos de T.H. Marshall[20] (1967), para mostrar que
a história do direito moderno deve ser reconstruída como um processo
direcionado à ampliação dos direitos fundamentais.
Apesar de Honneth sempre
utilizar um conceito problemático de direito subjetivo, a sua correta intuição
pode ser compreendida claramente quando ele explicita a sua interpretação da
reconstrução histórica de Marshall: os atores sociais só conseguem desenvolver
a consciência de que eles são pessoas de direito, e agir consequentemente, no
momento em que surge historicamente uma forma de proteção jurídica contra a
invasão da esfera da liberdade, que proteja a chance de participação na
formação pública da vontade e que garanta um mínimo de bens materiais para a
sobrevivência (Honneth, 2003).
Honneth sustentou que as três
esferas dos direitos fundamentais, diferenciadas historicamente, são o
fundamento da forma de reconhecimento do direito.
Por conseguinte, reconhecer-se
reciprocamente como pessoas jurídicas significa hoje muito mais do que no
início do desenvolvimento do direito: a forma de reconhecimento do direito
contempla não só as capacidades abstratas de orientação moral, mas também, as
capacidades concretas necessárias para uma existência digna, em outras
palavras, a esfera do reconhecimento jurídico cria as condições que permitem ao
sujeito desenvolver autorrespeito (Selbastachtung).
No caso da forma de
reconhecimento do direito, são postas em relevo as propriedades gerais do ser
humano. No caso da valoração social, são postas em destaque as propriedades que
tornam o indivíduo diferente dos demais, ou seja, as propriedades de sua singularidade.
Portanto, Honneth partiu do
princípio de que a terceira forma de reconhecimento, a saber, a comunidade de
valores ou solidariedade, deve ser considerada um tipo normativo ao qual
correspondem as diversas formas práticas de autorrelação valorativa (Selbstschätzung).
Honneth não aceitou aquilo que
Hegel e Mead consideravam condição deste padrão de reconhecimento, pois ambos
os autores estão convencidos da existência de um horizonte valorativo e
intersubjetivo compartilhado por todos os membros da sociedade como condição da
existência da forma de relacionamento.
Honneth chamou de
solidariedade e, procurou mostrar, ao contrário, que com a transição da
sociedade tradicional para a sociedade moderna surge um tipo de
individualização que não pode ser negado (Honneth, 2004).
A terceira esfera do
reconhecimento deveria ser vista, então, como um meio social a partir do qual as
propriedades diferenciais dos seres humanos venham à tona de forma genérica,
vinculativa e intersubjetiva (Honneth, 2003). E, identificou um segundo nível
desta terceira esfera do reconhecimento (solidariedade[21]).
No nível de integração social
encontram-se valores e objetivos que funcionam como um sistema de referência
para a avaliação moral das propriedades pessoais dos seres humanos e cuja
totalidade constitui a autocompreensão cultural de uma sociedade.
A avaliação social de valores
estaria permanentemente determinada pelo sistema moral dado por esta
autocompreensão social. E, esta esfera de reconhecimento está vinculada de tal
modo em uma vida em comunidade que a capacidade e o desempenho dos integrantes
da comunidade somente poderiam ser avaliadas intersubjetivamente.
No caso de relações jurídicas,
Honneth analisou a transição da sociedade do tipo tradicional para a moderna
como uma espécie de mudança estrutural desta esfera de reconhecimento: assim
que a tradição hierárquica de valoração social, progressivamente, vai sendo
dissolvida, as formas individuais de desempenho começam a ser reconhecidas.
Honneth partiu, novamente, do princípio
de que uma pessoa desenvolve a capacidade de sentir-se valorizada somente
quando as suas capacidades individuais não são mais avaliadas de forma
coletivista. Daí, resulta que uma abertura do horizonte valorativo de uma sociedade
às variadas formas de autorrealização pessoal somente se dá coma transição para
a modernidade.
Em função dessa mudança estrutural
existe, porém, no centro da vida moderna, uma permanente tensão, um permanente
processo de luta, porque nesta nova forma de organização social há, de um lado,
uma busca individual por diversas formas de autorrealização e, de outro, a
busca de um sistema de avaliação social;
Essa espécie de tensão social, que oscila
permanentemente entre a ampliação de um pluralismo valorativo que permita o
desenvolvimento da concepção individual de vida boa e a definição de um pano de
fundo moral que sirva de ponto de referência para avaliação social da
moralidade, faz da sociedade moderna uma espécie de arena na qual se desenvolve
ininterruptamente uma luta por reconhecimento: os diversos grupos sociais
precisam desenvolver a capacidade de influenciar a vida pública a um de que sua
concepção de vida boa encontre reconhecimento social e passe então a fazer
parte do sistema de referência moral que constituía autocompreensão cultural e
moral da comunidade em que estão inseridos.
Além disso, com o processo de
individualização de reconhecimento Honneth chamou de solidariedade e, procurou
mostrar, ao contrário, que com a transição da sociedade tradicional para a
sociedade moderna surge um tipo de individualização que não pode ser negado
(Honneth, 2004).
A terceira esfera do
reconhecimento deveria ser vista, então, como um meio social a partir do qual as
propriedades diferenciais dos seres humanos venham à tona de forma genérica,
vinculativa e intersubjetiva (Honneth, 2003). E, identificou um segundo nível
desta terceira esfera do reconhecimento (solidariedade).
No nível de integração social
encontram-se valores e objetivos que funcionam como um sistema de referência
para a avaliação moral das propriedades pessoais dos seres humanos e cuja
totalidade constitui a autocompreensão cultural de uma sociedade.
A avaliação social de valores
estaria permanentemente determinada pelo sistema moral dado por esta
autocompreensão social.
E, esta esfera de
reconhecimento está vinculada de tal modo em uma vida em comunidade que a
capacidade e o desempenho dos integrantes da comunidade somente poderiam ser avaliados
intersubjetivamente.
No caso de relações jurídicas,
Honneth analisou a transição da sociedade do tipo tradicional para a moderna
como uma espécie de mudança estrutural desta esfera de reconhecimento: assim
que a tradição hierárquica de valoração social, progressivamente, vai sendo
dissolvida, as formas individuais de desempenho começam a ser reconhecidas.
Honneth teve como premissa do princípio
de que uma pessoa desenvolve a capacidade de sentir-se valorizada somente
quando as suas capacidades individuais não são mais avaliadas de forma
coletivista. Daí resulta que uma abertura do horizonte valorativo de uma sociedade
às variadas formas de autorrealização pessoal somente se dá coma transição para
a modernidade.
Em função dessa mudança estrutural existe, porém, no centro da vida
moderna, uma permanente tensão, um permanente processo de luta, porque nesta
nova forma de organização social há, de um lado, uma busca individual por
diversas formas de autorrealização e, de outro, a busca de um sistema de
avaliação social;
Essa espécie de tensão social que oscila
permanentemente entre a ampliação de um pluralismo valorativo que permita o
desenvolvimento da concepção individual de vida boa e a definição de um pano de
fundo moral que sirva de ponto de referência para avaliação social da
moralidade, faz da sociedade moderna uma espécie de arena na qual se desenvolve
ininterruptamente uma luta por reconhecimento: os diversos grupos sociais
precisam desenvolver a capacidade de influenciar a vida pública a um de que sua
concepção de vida boa encontre reconhecimento social e passe então a fazer
parte do sistema de referência moral que constituía autocompreensão cultural e
moral da comunidade em que estão inseridos. Além disso, com o processo de
individualização
Para que os atores sociais
possam efetivamente desenvolver autorrelacionamento positivo e saudável, precisam
ter chance simétrica ao desenvolver a sua concepção de vida boa sem sofrerem os
sintomas das patologias oriundas das experiências de desrespeito.
Porque a experiência do
reconhecimento corresponde sempre uma forma positiva de autorrelacionamento,
Honneth precisou partir do princípio de que o conteúdo do que seja desrespeito
deva estar implicitamente vinculado nas reivindicações individuais por
reconhecimento: se e quando o sujeito social faz uma experiência de
reconhecimento, ele adquire um entendimento positivo sobre si mesmo; se e
quando, ao contrário, um ator social experimentar uma situação de desrespeito,
consequentemente, a sua autorrelação positiva, adquirida intersubjetivamente,
adoece.
Honneth, para tornar plausível
sua teoria, precisou, por consequência encontrar na história social traços de
patologia tripartite negativa da estrutura das relações de reconhecimento.
Esta tipologia negativa deve cumprir duas
tarefas, a saber: a primeira, para cada esfera de relação de reconhecimento
deve surgir um equivalente negativo, com o qual a experiência de desrespeito
possa ser esclarecida, seguindo a estrutura da forma de reconhecimento
correspondente; segunda: a experiência de desrespeito deve ser ancorada de tal
modo em aspectos afetivos do ser humano que a sua capacidade motivacional de
desenvolvimento e desencadeamento de uma luta por reconhecimento venha à tona.
A primeira esfera de
reconhecimento, o amor, corresponde as formas de desrespeito definidas por
Honneth como maus tratos e violação. E, nesta forma de desrespeito, o
componente da personalidade que é atacado é aquele da integridade psíquica, ou
seja, não é diretamente a integridade física que é violentada, mas sim o autorrespeito
(selbstvertändliche Respektierung) que cada pessoa possui de seu corpo e
que, segundo Winnicott, é adquirido por meio do processo intersubjetivo de
socialização originado através da dedicação afetiva.
Quanto à forma de
reconhecimento do direito correspondente à forma de desrespeito intitulada privação
de sentidos (Entrechtung). Nesta esfera do reconhecimento o componente da
personalidade que é ameaçado é aquele da integridade social. Também aqui o
desrespeito se refere ao tipo específico de autorrelação, a saber, o
autorrespeito.
É central para a análise das
formas de desrespeito feita por Honneth é o fato de que todo tipo de privação
violenta da autonomia deve ser vista como vinculada a uma espécie de
sentimento. O sentimento de injustiça ocupa um papel relevante na análise que
Honneth faz do direito.
Porém, apesar de Honneth ter
ressaltado em um primeiro momento o papel do sentimento de injustiça, logo em
seguida, a sua análise passa a considerar um tipo de respeito cognitivo da
capacidade de responsabilidade moral, que um ator social vivencia numa situação
de desrespeito jurídico.
Portanto, o que significa ser
uma capacidade para responsabilidade moral de uma pessoa deve ser medido no
grau de universalização e, também no grau de materialização do direito.
À forma de reconhecimento da
solidariedade correspondente à forma de desrespeito da degradação moral e da
injúria e Honneth entendeu que a dimensão da personalidade deve ser encontrada
na degradação da autoestima, ou seja, a pessoa nesse caso é privada da
possibilidade de desenvolver uma estima positiva de si mesma.
Para esclarecer sobre as
formas de desrespeito Honneth adotou o conceito psicanalítico de patologia. E,
todas as formas de desrespeito são, portanto, uma forma de patologia.
Todas essas formas de
desrespeito são, portanto, uma forma de patologia. Assim, uma teoria do reconhecimento
deveria ser capaz de indicar a classe de sintomas que os atores sociais
atingidos pela forma de desrespeito em seu estado patológico deixam
transparecer (ibid.).
Os sinais corporais do
sofrimento psíquico devem ser vistos, portanto, como expressões exteriores, ou
melhor, como reações externas de sentimentos patológicos interiores ou
psíquicos. Dessa forma, somente as experiências de injustiça que acarretam
fenômenos patológicos devem ser consideradas fenômenos de desrespeito
Por derradeiro, através de
análise crítica dos estudos históricos de E. P. Thompson e Barrington Moore,
Honneth procurou mostrar que por trás dos acontecimentos históricos há um
processo do desenvolvimento moral que somente se deixa explicar a partir da
lógica da ampliação das relações de reconhecimento.
O modelo da luta por
reconhecimento deve, portanto, cumprir duas missões: 1) ser um modelo de
interpretação do surgimento das lutas sociais e (2) do processo de
desenvolvimento moral.
Só então esse modelo estará em
condições de realizar uma ordenação sistemática dos fenômenos históricos e sociais,
que sem esse modelo permaneceriam amorfos.
Dessa forma, os sentimentos
morais assumem a função de aceleração ou retardamento da evolução moral e
histórica da sociedade e o modelo da luta por reconhecimento passa a ser visto
como o ponto de vista normativo, a partir do qual é possível definir o estágio
atual do desenvolvimento moral da sociedade (Honneth, 2003).
O ponto de partida de um tal
processo de formação moral precisa ser, portanto, um momento histórico, em que
o modelo tripartite do reconhecimento ainda não se diferenciou. Honneth
caracteriza tal processo como um processo de aprendizagem que tem a capacidade de esclarecer ao mesmo tempo a diferenciação
as esferas do reconhecimento eo potencial que elas carregam internamente para o
desenvolvimento moral da sociedade.
O modelo da luta por
reconhecimento explicita, então, uma gramática, uma semântica subcultural, na
qual as experiências de injustiça encontram uma linguagem comum, que
indiretamente oferece a possibilidade de uma ampliação das formas de
reconhecimento (ibid.).
Com isso, Honneth[22] pretende mostrar que a
análise dos acontecimentos sociais é uma tarefa da área da interpretação, que
permite explicar esses acontecimentos como estágios de um processo de formação
moral que se dá por meio do conflito e cuja direção é dada pela ideia-guia da
ampliação das relações de reconhecimento.
Quanto a terceira fase de sua
teoria fora marcada pelo debate com Nancy Fraser[23]. E, nesta obra, corrigiu
dois pontos de sua teoria, a saber: deixou de compreender as esferas do
reconhecimento como dimensões ontológicas do desenvolvimento da personalidade
para tratá-las como esferas sociais, contextualizadas historicamente.
E, por derradeiro, numa
subsequente fase de desenvolvimento de sua teoria, passou a conceber a
existência de uma dimensão existencial das esferas do reconhecimento.
Conclui-se que a teoria
congrega momentos das duas teorias anteriormente analisadas, pois pretende: (1)
romper com uma visão unitária da justiça (Habermas e Rawls) adotando uma teoria
pluralista da justiça (Honneth 2003; 2000; 2007; 2004b; 2004c;2008a; 2009); (2)
contextualizar a concretização em esferas da justiça, as esferas do
reconhecimento; e, por fim, (3) atualizar, rememorar e sistematizar os
princípios orientadores das esferas do reconhecimento e não criá-las teoricamente
(Honneth, 2008).
A propósito, com sua mais
recente obra intitulada “Das Recht der Freiheit” de 2011[24], Honneth mudou sua
estratégia teórica, pois em lugar de três esferas de reconhecimento, mesmo que
com uma dimensão existencial anteposta, ele doravante hierarquiza os princípios
valorativos, colocando em seu topo a liberdade. As antigas esferas do
reconhecimento passam a ser modo de expressão da liberdade.
Em semelhança a Walzer,
Boltanski e Thévenot que são céticos com a atividade de uma teoria que se
pretende crítica e estabelecedora de princípios do alto de seu isolamento; eles
buscam a imersão e, em certa medida, observação reconstrutiva dos valores (Walzer)
ou da atividade crítica (Boltanski e Thévenot) já presentes no cotidiano das
pessoas comuns.
À teoria social, segundo esses
autores, não caberia estabelecer princípios que tornem possíveis relações
justas, mas cabe-lhe analisar os reclamos de quem se sente injustiçado, para
sistematizar os princípios ou as justificativas ali pressupostos.
Também em Honneth cabe às
percepções de injustiça um lugar privilegiado como indicador à atividade teórica.
A diferença é que nesse autor há uma reivindicação de que seu projeto teórico
já tenha reconstruído a fundamentação moral para as reivindicações de
reconhecimento, com validade transcendente ao regime de justificação num
momento crítico particular (Boltanski e Thévenot) ou a uma comunidade política
determinada (Walzer).
Nos três doutrinadores, tanto
a questão da igualdade/desigualdade como a da justiça/injustiça é colocada em
planos teóricos que evadem a relação com a estratificação social – lugar onde
classicamente elas são discutidas nas ciências sociais.
Walzer admitiu sem dificuldades
a desigualdade localizada numa esfera da vida com a expectativa de que, como
efeito marginal da pluralidade de esferas e da interdição de
conversão/transmissão de vantagens entre as esferas, resulte no conjunto uma igualdade
complexa.
Respeitadas as regras internas
de alocação de bens e a autonomia das esferas, não haverá injustiça. Boltanski e
Thévenot priorizam as situações cotidianas e a permanente troca de papéis ou
funções que o indivíduo desempenha como membro de uma sociedade complexa, e com
isso evitam a espinhosa questão de princípios ou equivalências universais.
Para não cair no outro
extremo, o de um pluralismo relativista, as Cidades assumem um importante papel
teórico no que Luhmann[25] denominaria de “redução
de complexidade”, porquanto dentro delas é possível buscar por equivalências
que embasem argumentações e acordos.
Já em Honneth, há uma conjugação
entre o reconhecimento jurídico, igual para todos, típico da segunda esfera, e
o reconhecimento de méritos individuais, da terceira esfera, que abrem a
possibilidade para desigualdades legítimas.
A percepção de injustiça não se
dá pela amplitude da desigualdade, mas pela negação do reconhecimento que legitimamente
o indivíduo poderia esperar ou pelo desrespeito. Enquanto Honneth e Boltanski e
Thévenot em certa medida
Dissolvem a dificuldade de tratar
da desigualdade e da injustiça entre os grupos sociais, Walzer dissolve as estruturas
sociais em favor de uma comunidade política holística.
Apesar de todo o foco no
compartilhamento de convicções, Walzer precisou discutir as situações de
dissenso. E, nestas, a pior situação possível seria a adoção de princípios
orientadores de uma esfera em outra, porquanto feriria sua autonomia e, ao fim,
diminuiria também o número de esferas autônomas, diminuindo a margem de
diluição de eventuais desigualdades nas esferas de maior peso na vida social.
Já Boltanski e Thévenot
descreveram como uma das alternativas para o final de uma disputa um tipo de
compromisso em que "the aim of the criticism is to substitute for the
current teste another onde relevant in another world. Then the dispute is no
longer turned towards the way the test must be designed towards the question of
knowing what kind of test, relevant in a certain world, would really fit the
situation” (1999).
A situação daí resultante é
vista como instável e particularmente vulnerável à crítica. Com sua proposta de
uma metodologia reconstrutiva, Honneth supõe estar tão somente explicitando aqueles
princípios que, gradativamente, foram se cristalizando nas sociedades modernas
como um todo, e particularizadas como opções éticas nas sociedades
particulares.
Ainda que os modos de vida
sejam nelas cada vez mais plurais, segundo os projetos individuais de vida, os
princípios que possibilitam esta autonomia são compartilhados.
Ainda a questão das condições
da crítica das justificações, dos valores compartilhados ou das reivindicações
de reconhecimento. Parece-nos que o enfoque pragmático de Boltanski e Thévenot
deixam pouco espaço para a questão da validade da justificação para além da
convicção dos participantes do momento crítico.
Já em Walzer, a despeito de
sua ênfase no trato de sociedades modernas e complexas, ele sempre de novo
busca fundamento para sua argumentação na cristalização histórica de convicções
em comunidades políticas.
O desafio, in casu, é
como tratar aqueles valores que se cristalizem em comunidades, masque ferem
direitos considerados fundamentais contemporaneamente.
Em Honneth, há uma explicitação
de critérios para essa crítica, advindos da própria teoria e tomada do âmbito
das discussões da Teoria Crítica sobre emancipação, um objetivo explícito e
fundamental em seu projeto teórico.
Passíveis de serem tidas como
legítimas são para esse doutrinador as reivindicações de reconhecimento que ou estendam
a mais pessoas ou a novos âmbitos da vida a possibilidade de que o próprio
indivíduo conceba e realize seu projeto de vida. Talvez esse par de critérios
possa se revelar válido inclusive quando estabelecido como referência numa
análise crítica das situações que as outras duas propostas teóricas analisam.
Afinal, a pluralidade é
constatação inevitável que a reflexão sobre a realidade social deverá
incorporar e, não tentar dissipar. A teoria da justiça de Walzer assume esta
pluralidade de duas formas complementares, pois, de um lado, vimos na análise
que enxerga na pluralidade se traduz em concepções culturais de uma comunidade
que devem servir de ponto de partida para haver a reflexão filosófica sobre a
justiça, e de outro lado, a oportunidade de demonstrar que os múltiplos bens
diferentes entre si, os princípios que regem a sua distribuição devem ser
também estes diferentes e adequados à respectiva natureza social de cada bem.
A justiça é plural não só
porque a sua configuração pode diferir de sociedade para sociedade, mas também
porque as distribuições justas de uma comunidade são distribuições
diferenciadas internamente.
Se a justiça distributiva procura
encontrar os mecanismos adequados à distribuição de bens entre os membros de
uma sociedade, então ela deve partir da
análise do significado social desses bens para esses membros, e das concepções
de justiça que essas pessoas já possuem.
A argumentação walzeriana, por
isso, inicia-se com a defesa da natureza social dos bens. Os bens em causa nas
reflexões sobre justiça distributiva são sempre bens sociais. Adjetivando os
bens desta forma, Walzer pretende salientar que eles não possuem nenhum significado
natural ou intrínseco alcançável mediante um esforço de abstração. “Os bens
deste mundo têm significados compartilhados, porque a concepção e criação são
processos sociais. Pela mesma razão, os bens têm significados diferentes em
sociedades diferentes.”
O significado dos bens é fruto de um processo
criativo e interpretativo que nunca pode negligenciar as suas particularidades.
Este processo é social, ou seja, envolve toda uma comunidade de pessoas que, intersubjetivamente
vão construindo significados mais ou menos consensuais acerca da natureza dos
bens que necessitam.
Da mesma forma que podemos
constatar em diferentes sociedades a existência de significados sociais
diversos, constatamos que ao longo do tempo esses significados sociais sofrem
modificações, mesmo dentro do contexto de uma cultura determinada.
Como constatamos, a
universalidade contextualista de Walzer implica a origem empírica dos seus
postulados. Nenhum princípio abstrato concebido apenas racionalmente pode
assumir preponderância sobre as concepções sociais concretas de cada povo.
No grupo das teorias da
justiça que utilizam metodologias abstracionistas Walzer inclui também a teoria
da justiça de John Rawls. Para Walzer não se pode construir uma estrutura
distributiva alheando as pessoas das suas próprias identidades.
Aquilo que as pessoas são
depende da relação que elas estabelecem não só com as outras pessoas, mas
também com os bens de que necessitam, e suas respectivas formas de distribuição.
Segundo Walzer, pretender
abstrair desse estatuto social, que inevitavelmente possuímos, para deliberar
sobre os critérios que devem nortear a
distribuição, é, no mínimo, inútil.
As distribuições não podem ser
compreendidas como sendo atos de homens e mulheres que ainda não possuem bens especiais
na mente ou nas mãos. Em verdade, as pessoas já mantêm uma relação com um
conjunto de bens e têm uma história de transações, não apenas umas com as
outras, mas também com o mundo moral e material onde vivem.
Percebe-se que todo este
imenso contexto social e cultural não poderá ser suspenso tendo em vista a
deliberação filosófica e, que os bens sociais estão sempre na mente das
pessoas, mesmo antes delas os possuírem.
As relações que se estabelecem
entre as pessoas são mediadas pelos significados sociais que estas possuem
sobre os bens. Qualquer metodologia que implique a abstração das
particularidades culturais e sociais não consegue responder às verdadeiras
preocupações das pessoas.
Na perspectiva de Walzer,
mesmo que as pessoas estejam empenhadas e comprometidas na imparcialidade, a
questão que provavelmente se colocará nos espíritos dos membros de uma
comunidade política não será “Qual será a escolha de indivíduos racionais em
condições de universalização de tal ou tal espécie?”, mas antes “Qual será a
escolha de indivíduos como nós, posicionados como estamos, participando de uma
cultura e dispostos a continuar a dela participar?”
E esta questão pode ser
facilmente transformada em “Que opções fizemos já no decurso da nossa vida
comum? Que conceitos compartilhamos (realmente)?” O que valida plenamente
Ortega Y Gasset: “Eu sou eu, e minhas circunstâncias”.
O problema dos indivíduos
quando se preocupam com as distribuições justas é o de saber que solução é a
adequada para a sua situação concreta. Nesta reflexão, os argumentos mais eficazes
são aqueles que invocam a história e as tradições comuns de justiça
distributiva de uma comunidade, e não os argumentos baseados em conclusões
abstratas de versões abstratas das pessoas tomadas numa situação abstrata.
É da cultura, das tradições e
da história partilhadas por uma comunidade que se deve partir para a reflexão
política e moral. Enquadrando os bens no contexto de construção social
particular a cada comunidade humana, Walzer, obviamente, rejeita o conceito
rawlsiano de bens primários. “Não há um conjunto único de bens primários ou
básicos imaginável por todos os universos morais ou materiais; de outro modo,
um tal conjunto teria de ser concebido em termos tão abstratos que teriam pouca
utilidade no planeamento de distribuições específicas.”
A origem filosófica dos bens
primários de John Rawls torna‑os
demasiados abstratos e, portanto, distantes da realidade. No entanto, para
Rawls, o objetivo de uma concepção de justiça distributiva consistia em
organizar determinados princípios que possibilitassem uma distribuição
equitativamente justa de bens primários que, na perspectiva de Rawls, são bens
que se pretendem neutrais perante a diversidade de possibilidades e planos de
vida.
Portanto, a principal
característica destes bens, é serem universais, ou seja, são bens necessários a
todos os seres humanos sem excepção. Como consequência podem e devem ser
distribuídos mediante um único processo distributivo. Walzer rejeitou esta
pretensão universalista.
Num enquadramento cultural
diferente do da cultura ocidental em que vivemos, os bens primários de Rawls
teriam um significado e um enquadramento distributivo completamente distinto. A
estipulação filosófica não pode pretender encontrar respostas aos problemas
concretos das pessoas através de definições universais alcançadas mediante
abstração das particularidades culturais de cada povo.
Assim, uma definição de bens
primários tal como a de Rawls não possui utilidade na reflexão sobre justiça
distributiva. Mulhall e Swift aprofundaram o alcance desta crítica walzeriana
afirmando que esta atinge também os princípios de justiça de Rawls.
Negando importância ao
conceito de bens primários, negamos igualmente a importância de toda a
estrutura distributiva preconizada por Rawls. Se o conceito de bens primários é
inútil, então, o mesmo se aplica aos princípios de justiça, já que estes são
apenas uma construção abstrata concebida para distribuir bens abstratos.
Assim, no entender de Walzer,
só os bens sociais que são significativos para uma determinada comunidade
colocam verdadeiros problemas de justiça distributiva.
Portanto, os bens são
realidades socioculturais cujo significado é local; não são entidades abstratas
passíveis de distribuição por princípios abstratos.
Os bens possuem em cada
sociedade um significado particular que lhes é atribuído pelas pessoas
concretas envolvidas na tarefa de os repartir.
Por outras palavras, os bens
não são apenas objetos num jogo cujas regras lhes são estranhas; eles têm um
papel substancial na definição da justiça, pois são um elemento estruturador não
só das relações sociais entre as pessoas, mas do seu próprio mundo
interior.
Desta forma, um princípio
distributivo justo deve derivar da análise dos significados sociais dos bens.
Esta relação entre o significado de um bem e a forma de entender a sua
distribuição confere ao argumento de Walzer a sua originalidade, e serve de
base a toda a sua concepção de justiça distributiva. Se a distribuição dos bens
depende dos seus significados sociais, ela nunca poderá ser um processo simples
e unificado. E, jamais uniforme.
As formas de distribuir os
bens serão tantas quantas esses mesmos bens, pois a natureza social destes
originará diferentes critérios distributivos. Percebe-se, assim, o alcance da
renúncia ao universalismo abstrato, já que aplicado aos esquemas distributivos
ele não teria em conta esta ligação particular, mas necessária, entre os
diversos bens sociais e os seus respectivos mecanismos distributivos.
Um só princípio distributivo,
ou conjunto de princípios conectados, aplicados a todo o universo dos bens
negligenciariam necessariamente as particularidades de cada bem social.
Se a justiça distributiva
decorre dos significados dos bens, as distribuições que não atenderem a tais
significados são injustas. E, a justiça requere que as distribuições sejam
autônomas, isto é, que nenhum bem seja distribuído por razões exteriores ao seu
princípio distributivo derivado do seu significado social.
Exemplificando a distribuição
de um bem tal como a saúde a um indivíduo que possui um outro bem (dinheiro)
apenas por possuir este, é uma distribuição injusta pois não teve em conta o
significado do bem distribuído. Walzer apelidou esta situação de predomínio,
precisando a diferença entre o conceito e o de monopólio.
Quando a fronteira entre as
esferas distributivas é rompida estamos perante uma situação de predomínio de
um bem sobre outros.
Se a este predomínio juntarmos
o monopólio desse bem por parte de alguém, ou de um grupo de pessoas, então
estamos perante uma situação de dominação. No entanto, o monopólio por si só
não representa uma situação injusta, porque é concebível que se consiga alcançar
uma posição monopolista sem recorrer a distribuições injustas.
A injustiça acontece quando
essa situação se converte através das outras esferas mediante a ação
predominante de um bem. Se as trocas injustas estiverem bloqueadas não existe
injustiça no monopólio. As desigualdades não se podem multiplicar pelas esferas
todas. Podem existir localmente, mas nunca globalmente.
A universalidade
contextualista de Walzer implica na origem empírica dos seus postulados. Nenhum
princípio abstrato concebido apenas racionalmente pode assumir preponderância
sobre as concepções sociais concretas de cada povo. No grupo das teorias da
justiça que utilizam metodologias abstracionistas Walzer incluiu também a
teoria da justiça de John Rawls.
Para Walzer não se pode
construir uma estrutura distributiva alheando as pessoas das suas próprias
identidades. Aquilo que as pessoas são depende da relação que elas estabelecem
não só com as outras pessoas, mas também com os bens de que necessitam, e suas
respectivas formas de distribuição.
Segundo Walzer, pretender
abstrair desse estatuto social, que inevitavelmente possuímos, para deliberar
sobre os critérios que devem nortear a distribuição, é, no mínimo, inútil.
As distribuições não podem ser
entendidas como actos de homens e mulheres que ainda não têm bens especiais na
mente ou nas mãos. Na verdade, as pessoas já mantêm uma relação com um conjunto
de bens e têm uma história de transações, não apenas umas com as outras, mas
também com o mundo moral e material em que vivem.
O problema dos indivíduos
quando se preocupam com as distribuições justas é o de saber que solução é a
adequada para a sua situação concreta.
Esta relação entre o
significado de um bem e a forma de entender a sua distribuição confere ao
argumento de Walzer a sua originalidade, e serve de base a toda a sua concepção
de justiça distributiva. Se a distribuição dos bens depende dos seus
significados sociais, ela nunca poderá ser um processo simples e unificado.
As formas de distribuir os
bens serão tantas quantas esses mesmos bens, pois a natureza social destes
originará diferentes critérios distributivos. Percebe-se, assim, o alcance da
renúncia ao universalismo abstrato, já que aplicado aos esquemas distributivos
ele não teria em conta esta ligação particular, mas necessária, entre os
diversos bens sociais e os seus respectivos mecanismos distributivos.
Um só princípio distributivo,
ou conjunto de princípios conectados, aplicados a todo o universo dos bens
negligenciariam necessariamente as particularidades de cada bem social.
A justiça não entendida literalmente, advém do encaixe da pluralidade dos bens na pluralidade de princípios distributivos. Assim, todos tem hipóteses de alcançarem os bens que pretendem pelos motivos corretos, e não dependem da posse de um qualquer bem predominante para os adquirir. Estão sujeitos apenas aos critérios próprios de cada esfera distributiva.
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Notas:
[1] Robert Nozick inicia “Anarquia, Estado e Utopia” afirmando que os indivíduos têm direitos, e há coisas que nenhuma pessoa ou grupo pode fazer com os indivíduos sem lhes violar os direitos. Para ele, um Estado justo em relação aos seus cidadãos nada mais é do que um Estado que respeita a conduta individual. O livro foi publicado originalmente em 1974, traduzido em 2011 pela Editora WMF Martin Fontes e pode ser obtido aqui. Para quem quiser adquirir a versão publicada em inglês, basta clicar aqui. Trata-se de livro famoso no meio liberal, libertário e conservador. No meio da Ciência Política não ganhou tanta notoriedade quanto o livro “Uma teoria da Justiça”, do também filósofo norte-americano John Rawls. Inclusive, certa parte do livro de Nozick trata-se de uma resposta a algumas ideias do livro do Rawls. Então, se você deseja ler o livro de Nozick, sugiro que leia antes o livro “Uma Teoria da Justiça”, de John Rawls. Sempre ouvi falar positivamente desse livro, e, após a leitura, vejo que o livro correspondeu às minhas expectativas. O autor divide seu livro em três partes. Primeiro ele desenvolve seu raciocínio para sair do Estado de Natureza e chegar no Estado Mínimo, e na moralidade e legitimidade que há nesse Estado Mínimo. Na segunda parte, ele se defende de todo o raciocínio que possa levar ao aumento do Estado nos termos já delineados. Na última parte ele aborda brevemente sobre a possibilidade de sociedades utópicas. Faço a seguinte ressalva para o leitor da área do Direito. Durante a resenha usarei termos sem o rigor jurídico. Preferi usar os termos conforme li na tradução. Quem ler o livro irá notar que a palavra “posse” está sendo usada sem rigor jurídico, podendo significar tanto propriedade quanto posse, e que a palavra “roubo” parece ter o significado de furto.
[2]
A teoria de justiça mais influente do século passado foi a idealizada por John
Rawls, colocou0se diretamente dentro da tradição, ao propor os princípios da
justiça racionalmente como ideais para a estrutura básica para a formação do
acordo original. O esquema teórico do filósofo detalhou como é possível pensar
a alocação de poder político por meio de cooperação equitativa ao longo do
tempo e durante várias gerações. E,
nesse sentido, Rawls necessariamente discorreu sobre como essa alocação de
poder deva ser distribuída de modo a evidenciar certos princípios de justiça,
que de certa forma consigam privilegiar a possibilidade de consensos
sobrepostos inerentes a esse tipo de sociedade plural formada por pessoas
livres e iguais em um sistema de cooperação equitativo. Logo, Rawls desenvolveu
a ideia de que os princípios de justiça irão atuar na estrutura básica, a fim
de promover os valores essenciais para a manutenção desse sistema de
cooperação.
[3]
O contratualismo em John Locke concebeu um ser humano racional, livre e igual,
mas não naturalmente bom, o que seria a motivação para a construção do contrato
social. O contratualismo foi uma linha de pensamento filosófico que buscava
entender as condições que proporcionaram o surgimento das sociedades civis.
Desse modo, o objetivo da criação do Estado para Hobbes é preservar a vida, é
deixar de viver sob o constante medo, para Locke é preservar a propriedade que
já existe desde o estado de natureza, e para Rousseau é preservara liberdade
civil.
[4]
Ademais, os bens da afiliação e do poder político apresentados na obra Esferas
da Justiça tidos como estruturantes das distribuições dos demais bens em
qualquer sociedade, continuam a ser pensados assim, mas passam a ser
estritamente compreendidos, enquanto cidadania e Estado, quando se trata da
possibilidade concretização do seu ideal de justiça denominado de
"igualdade complexa", ao ser aplicado apenas às sociedades
democráticas. Esta delimitação, por seu turno, é uma modificação significativa
na teoria da justiça de Walzer, de modo que é preciso levar em conta não apenas
os conceitos básicos da obra Esferas da Justiça, mas também, as modificações e
acréscimos posteriores neste sentido, especialmente, os provocados pela
recepção welzeriana das críticas realizadas por David Miller. A interpretação
da igualdade complexa tida como igualdade de status, proposta por Miller, bem
como o reconhecimento de que no caso das sociedades democráticas é preciso
acrescentar a cidadania igualitária ao pluralismo distributivo para que a
igualdade complexa ou igualdade de status possa ser obtida.
[5] É provável que a obra de Walzer tenha sido
uma resposta à visão liberal da justiça apresentada por Rawls e apesar de
admirá-lo sinceramente. Conforme indicou Nedel, o próprio Walzer, ainda que
reconheça que, sem a obra de Rawls, o seu trabalho não teria seguido o rumo que
tomou. A propósito, o comunitarismo é
expressão prevalente da concepção de mundo de tipo organístico que marcou quase
que incontrastavelmente ou neocomunitarismo como explicou Salvatore, nasceu e se
desenvolveu nos EUA, entre os anos de 1973 a 1985, em resposta as duas
exigências principais, mas muito diversas. De um lado, trata-se de formular um
paradigma político adequado à crise do sistema soviético à consequente
multiplicação da identidade cultural e dos vários nacionalismos étnicos,
próprios das sociedades pós-coloniais, em vista dos quais o liberalismo não
oferece uma resposta adequada. E, de outro lado, em sua versão, mais
propriamente normativa, no plano filosófico-político, o comunitarismo
constitui-se numa resposta à virada procedimentalista que marca
significativamente o ressurgimento da filosofia prática, em virtude da grandiosa teoria da justiça de Rawls,
externada em A Theory of Justice, de 1971.
[6]
A investigação conceitual acerca do papel que desempenha o Direito na reconstrução
da realidade social. A hipótese central é que o reconhecimento jurídico, como
possível forma de compreensão das reivindicações sociais em sociedades
democráticas modernas, deixa de cumprir um papel central de emancipação social
ao longo da teoria de Honneth. Para tanto, parte-se de uma espécie da
localização de Honneth na tradição filosófica daquilo que se denomina Teoria
Crítica (Escola de Frankfurt), com objetivo de indicar a sua compreensão
metodológica da investigação filosófica, construída a partir do que se chama
comumente de “método reconstrutivo”. Apresenta-se, então, uma análise
conceitual da noção de Direito nos dois referidos textos de Honneth,
partindo-se dos “padrões de reconhecimento subjetivo” em Luta por
Reconhecimento e do subtópico sobre a liberdade jurídica em O Direito da
Liberdade. Por fim, conclui-se que o teórico alemão não só compreende o
fenômeno jurídico de maneiras diferentes no desenvolvimento de sua obra, mas,
fundamentalmente, de maneiras contrapostas, principalmente no que se refere à
esfera da relação entre direito, ética e emancipação. O título da obra "
Direito da Liberdade: modelo de uma eticidade democrática" Das Recht
der Freiheit: Grundriss einer
demokratischen Sittlichkeit) expressa
justamente essa opção metodológica de Honneth. “Direito”(“Recht”)
está no sentido de direito objetivo, de um sistema ou totalidade de
valores, que justifica
padrões de comportamento ou normas,
possibilitando, assim, a reprodução
das práticas sociais e
instituições. A reconstrução
do direito objetivo, metodologia utilizada na
filosofia de Honneth, consiste, neste
caso, na tentativa
de justificar o
conjunto de instituições
fundamentais para compreensão da realidade social. Como um leitor atento já
deve ter observado, na medida em que a tentativa de Honneth é uma atualização
da clássica obra de Hegel, Princípios da Filosofia do Direito(Grundlinien
der Philosophie des Rechts),é importante notar que a sua
tentativa não deve
ser compreendida na
linha dos estudos
contemporâneos de filosofia
do direito, que se
concentram no fenômeno
do direito subjetivo
a partir da
filosofia da linguagem ordinária, ou mesmo de uma crítica
ao sujeito do direito subjetivo. Trata-se, ao revés, de um livro de
Filosofia Política, no
qual estão os
traços desenvolvidos daquilo
que se apreende
na filosofia hegeliana por Recht
e Sittlichkeit.
[7]
A práxis expressa, precisamente, o poder que o homem tem de transformar o
ambiente externo, representado, em Marx, pela natureza e pelo meio social em
que está inserido. Em resumo, entende-se que a atividade teórica por si só não
leva à transformação da realidade, já que não se objetiva, não se materializa,
não se torna práxis. A prática, por sua
vez, não fala por si mesma. Teoria e prática são indissociáveis como práxis.
[8]
Tocamos aqui no que chamarei de paradoxo político, ou seja, que a política
parece constituir uma esfera de justiça entre outras e envolver todas as outras
esferas.
[9]
Luc Boltanski (4 de janeiro de 1940) é um sociólogo francês, professor na École
des Hautes Études en Sciences Sociales (EHESS) de Paris, onde foi um
dos fundadores do Groupe de Sociologie politique et morale . É conhecida como a figura principal da escola
"pragmática" da sociologia francesa, [corrente que se iniciou com
Laurent Thévenot e que também é chamada
de teoria das "economias da grandeza" ou "sociologia dos regimes
de ação". O trabalho de Boltanski tem uma influência significativa na
sociologia, na economia política etc. história social e econômica.
[10] Nesta obra, Pierre Bourdieu analisa os fundamentos sociais da construção daquilo que se convencionou chamar "gosto estético". De uma maneira que se pode chamar "anti-kantiana" este autor acaba por realizar uma verdadeira exegese das categorias simbólicas que estruturam as percepções dos grupos sociais. Neste sentido, é correto afirmar que Bourdieu acaba por dessacralizar os conceitos de "voga", "clássico", "bom gosto", "bom tom" ao demonstrar que estes nada tem de gratuito e que na verdade representam todo um investimento em termos de capital cultural (escolar e não-escolar) realizado por estes grupos no intuito de se distinguirem e afirmarem desta maneira uma suposta superioridade cultural, algo como uma espécie de nobreza sobre os demais. É possível concordar ou discordar da análise empreendida por Bourdieu em La Distinction, porém para todos os que desejam conhecer a fundo a Sociologia, e em especial, a Sociologia da Cultura, é impossível deixar de ler esta obra, reputada como um dos mais brilhantes trabalhos de Sociologia já realizados no mundo, e que tornou Bourdieu (re)conhecido internacionalmente como o sociólogo mais poderoso (no nível das análises) do século XX. Pierre Bourdieu (1930-2002), francês, é um dos grandes sociólogos do século XX. Ele se destaca por ter renovado as ideias de autores clássicos como Durkheim, Marx, Weber, Lévi-Strauss e Mauss, criando um verdadeiro sistema teórico para interpretar a sociedade.
[11]
De Civitate Dei (A Cidade de Deus) é uma das obras de Santo Agostinho,
onde descreve o mundo, dividido entre o dos homens (o mundo terreno) e o dos
céus (o mundo espiritual). Teria sido a obra preferida do imperador Carlos
Magno . Uma das criações ou literaturas mais representativas do gênero humano.
[12]
A Política das Palavras da Sagrada Escritura, mais conhecida como a Política da
Sagrada Escritura, é uma obra de teoria política de Jacques-Bénigne Bossuet na
qual ele se esforça para demonstrar os vínculos entre política e religião e
para se inspirar nas Sagradas Escrituras, a fim de encorajar um espaço público.
que está em plena conformidade com a lei de Deus e a caridade evangélica, no
contexto histórico da monarquia absoluta por direito divino. Em 1670, Bossuet
foi nomeado tutor do futuro rei, filho de Luís XIV, sendo então responsável
pela formação filosófica, política e religiosa do jovem delfim. Para esta
importante tarefa, ele também escreveu seu Tratado sobre o Conhecimento de Deus
e de si mesmo (1677), uma obra de religião, e seu Discurso sobre a História
Universal (1681), destinado a tirar lições do passado.
[13]
Hobbes publica em 1651 “Leviatã, ou a matéria , a Forma e o Poder de um
Eclesiástico e Civil – Leviatã, na introdução o autor indica o caminho que
pretende seguir: “ ... a arte do homem... pode fazer um animal
artificial...Mais ainda, a arte pode imitar o homem, obra-prima racional da
natureza.Pois é justamente uma obra de arte esse grande Leviatã que se denomina
coisa pública ou Estado (Commonwealth) ... o qual não é mais do que um homem
artificial, embora de estatura muito mais elevada e de força muito maior que a
do homem natural, para cuja proteção e defesa foi imaginado. Nele, a soberania
é uma alma artificial, pois que dá a vida e o movimento a todo corpo... A
recompensa e o castigo... são os seus nervos. A opulência e as riquezas de
todos os particulares, a sua força. Salus populi, a salvação do povo, e
a sua função... a equidade e as leis são para ele razão e vontade artificiais.
A concórdia é a sua saúde, a sedição sua doença, e a guerra civil sua morte.
Enfim, os pactos e os contratos que, na origem, presidiram a constituição,
agregação e união das partes desse corpo político, assemelham-se ao Fiat ou
façamos o homem, pronunciado por Deus na criação.”
[14]
O contrato social é fundamentado em um pacto convencional, por meio do qual os
cidadãos, em condições justas, abrem mão de seus direitos individuais e
consentem com o poder de uma autoridade na qual depositam confiança. O Estado,
resultante desse acordo tem o dever de proteger os cidadãos
[15]
O primeiro livro da Riqueza das Nações explica toda a mudança e adaptação das
forças produtivas do trabalho, e como essas mudanças impactaram as diferentes
classes sociais. Adam Smith procura investigar como, em seu tempo, ocorrera um
aumento significativo na produtividade comparada aos O Segundo Livro trata da
natureza da reserva de capital, de sua acumulação e das quantidades de trabalho
que ela põe em movimento, de acordo com os diversos modos de seu emprego. Como
a qualidade do trabalho é a circunstância mais importante para o atendimento
das demandas da sociedade e como a proporção de trabalhadores empregados em
trabalhos úteis depende da quantidade da reserva de capital empregada para
colocá-los para trabalhar, isso justifica esse Segundo Livro. O Terceiro Livro
trata da forma como a política de algumas nações privilegiou mais as atividades
das cidades do que as do campo e como ocorreu notadamente na Europa. A
diferença na forma como as atividades são fomentadas implica diferenças na grandeza
de sua produção.
[16]
Saint-Simon foi considerado um notável socialista utópico, o primeiro a admitir
a necessidade de uma economia planificada. Dava grande importância a uma
produção abundante e eficiente, a utilização do conhecimento científico e
tecnológico voltados para a produção, em benefício ao interesse geral Um dos
primeiros socialistas utópicos foi Conde de Saint-Simon (1760 - 1825), que
teorizou a divisão da sociedade entre “produtores” e “ociosos”. Nesse aspecto,
ele acreditava que a sociedade deveria ser composta por uma maioria de
produtores capazes de gerar riquezas. Segundo Saint-Simon, as empresas
capitalistas poderiam existir desde que assumissem várias responsabilidades
sociais para com a classe trabalhadora. Saint-Simon (1760 – 1825), acreditava
que uma sociedade se dividia entre os produtores e ociosos. Por isso, defendeu
outra sociedade onde a oposição entre operários e industriais deveria ser
reconfigurada.
[17]
É em Hobbes que a luta por autoconservação se torna a base de uma teoria
contratualista, afinal os sujeitos até podem viver em comunidade, mas não cabe
a estes a constituição intersubjetiva das normas de convívio social e sim a um
agente externo regulador, o Leviatã. A natureza humana torna-se, para Hobbes,
uma situação problemática e ininterrupta, uma guerra de todos contra todos –
pois são conduzidos pela autoconservação individual. O contrato social surge,
então, como decisivo para interromper esta luta, ao mesmo tempo em que encontra
nesta a justificativa para seu surgimento. O que resta de similar entre Hobbes
e Maquiavel é que “eles veem do mesmo modo como o fim supremo da práxis
política impedir reiteradamente aquele conflito sempre iminente”. Honneth
entende que esta luta por autoconservação é insuficiente para conceber uma
sociedade justa, pois o que fundamenta o contrato não é a vontade interna dos
sujeitos e sim algo externo a eles. A primeira etapa da formação da identidade
dos indivíduos é o que Honneth chama de dimensão do amor. Esta deve ser
compreendida como a esfera das relações primárias, a esfera das relações
íntimas, da amizade e da família. É necessária essa pontuação, pois é claro
para o autor que o reconhecimento amoroso não se aplica a todas as relações
sociais, e sim é restrito a pequenos grupos sociais. Nesta esfera têm-se como exemplo máximo as
relações entre mãe e filho, pois é a esfera das ligações emotivas fortes e está
intimamente relacionada ao reconhecimento corporal dos outros seres.
[18]
A diferenciação do conceito de poder no pensamento de Habermas nasceu em duas
obras. A primeira, a Teoria da ação comunicativa, onde introduziu a concepção
de poder reduzida à ação racional com respeito aos fins, enquanto que na
segunda obra, Facticidade e Validade. Habermas introduziu o conceito de poder
comunicativo, em oposição ao poder administrativo. E, tal diferenciação indica
uma abertura da própria ideia de ação comunicativa para a política e para os
princípios do Estado de Direito. Pois o procedimentalismo e o uso público da
razão implicam em constantes disputas que envolvem a comunicação e o poder. O
conceito, portanto, fornece as bases para a esfera pública influenciar
politicamente o sistema político por meio de meio extraordinário de circulação
do poder político.
[19]
A teoria de Winnicott sobre a comunicação contempla uma dimensão paradoxal. Ao
reconhecer diferentes necessidades do self individual, Winnicott salienta tanto
a necessidade de que o sujeito possa comunicar-se com os objetos, como a necessidade
de que certos aspectos do self permaneçam continuamente não-comunicados. O
percurso profissional e teórico de D. W. Winnicott que exerceram influência
marcante no seu pensamento. São ainda destacadas algumas linhas do debate que
ele, implícita ou explicitamente, travou com as diferentes áreas do
conhecimento científico de sua época - a pediatria, a psiquiatria, em especial
a infantil, a psicologia acadêmica e sua principal interlocutora, a psicanálise tradicional,
representada por Freud e Melanie Klein - sobre temas centrais de sua obra, tais como a natureza do psíquico, a
hereditariedade, o desenvolvimento humano e a saúde e a doença psíquicas.
[20]
A teoria de Marshall sobre a cidadania enfoca os interesses dos grupos e a
criação de direitos de cidadania pelo Estado e sustenta, com base nos estudos
sobre a sociedade inglesa, que esses direitos tendem a progredir do âmbito
legal para o político, e então para os direitos sociais.
[21]
Para Honneth, a solidariedade é uma espécie de relação interativa em que os
sujeitos tomam interesse reciprocamente por seus modos distintos de vida, já
que se estimam entre si de maneira simétrica. Em resumo, a distinção das três
esferas do reconhecimento a dos afetos e da autoconfiança; a das leis e
direitos, do autorrespeito; a da solidariedade social e da autoestima.
[22]
Para Walzer a pluralidade é uma constatação inevitável que a reflexão sobre a
realidade social deve incorporar e não tentar dissipar. A teoria da justiça de
Walzer assume esta pluralidade de duas
formas complementares: por um lado, tal como vimos na análise que atrás
efetuamos, são as concepções culturais de uma comunidade que devem servir de ponto de partida para a
reflexão filosófica sobre a justiça; mas por outro lado, como teremos
oportunidade agora de demonstrar, sendo os múltiplos bens diferentes entre si, os princípios que
regem a sua distribuição devem ser também eles diferentes e adequadas à
respectiva natureza social de cada bem. A justiça é plural não só porque a sua
configuração pode diferir de sociedade para sociedade, mas também porque as
distribuições justas de uma comunidade são distribuições diferenciadas
internamente.
[23]
Nancy Fraser nasceu em Baltimore, nos Estados Unidos, em 1947. Graduou-se em
1969 no Bryn Mawr College, uma faculdade privada exclusiva para
mulheres, e defendeu seu doutorado em 1980 na City University of New York
(CUNY). Lecionou no departamento de filosofia da Universidade de Northwestern
por muitos anos antes de se mudar para a New School for Social Research, em
1995, onde é professora titular de filosofia e política. Também já foi
professora visitante em universidades na Alemanha, França, Espanha e Holanda.
[24] [O direito da liberdade], o livro mais recente de Axel Honneth representa, por um lado, a tentativa mais sistemática de organizar sua teoria, que - como se sabe - tem seu centro no conceito de reconhecimento, e, por outro, a tentativa de atualizar o pensamento hegeliano. É necessário considerar este último objetivo para melhor entender os alcances e os limites do primeiro. Em geral, tem-se a impressão de que o autor, ao seguir de perto a estrutura da Filosofia do direito de Hegel, coloca sua própria teoria em um corpete rígido e justo demais. A proximidade com Hegel parece mais evidente na segunda parte do livro, a mais propriamente sistemática, que é estruturada de forma tripartida e segue de perto a estrutura da seção "Eticidade" da Filosofia do direito. À parte sobre família do texto hegeliano corresponde, no texto de Honneth, a parte sobre relações pessoais; àquela sobre sociedade civil corresponde a parte sobre o mercado; finalmente, à parte sobre o Estado corresponde a parte sobre o Estado democrático. Não se trata de meras analogias formais, já que a pretensão é atualizar o pensamento hegeliano, livrando-o da sobrecarga metafísica
[25] A teoria sistêmica de Luhmann enfatiza os sistemas autopoiéticos, ou seja, os sistemas vivos, psíquicos e sociais, sobretudo este último, uma vez que o intuito do autor foi o de elaborar uma teoria geral da sociedade. Esses três sistemas, além de autopoiéticos, são também autoreferentes e operacionalmente fechados. Luhmann apresenta a sua descrição da sociedade como sistema social que envolve a totalidade das comunicações. Sem comunicação não há sociedade, e fora da sociedade não há comunicação. Os limites da sociedade são os limites da comunicação; limites estes, que variam historicamente. Niklas Luhmann (1927-1998) foi um dos mais influentes sociólogos do final do século XX, tendo deixado uma vasta obra que soma cerca de 14 mil páginas e uma série de seguidores que se dedicam atualmente a refletir e dar continuidade a seu pensamento. Tendo concluído o bacharelado em direito, foi advogado e trabalhou na administração pública de Lüneburg, Alemanha, cidade onde nasceu. Ao passar um período de um ano nos Estados Unidos, na Universidade de Harvard, foi aluno de Talcott Parsons, referência no debate sociológico e autor de uma original teoria estrutural-funcionalista. Após retornar à Alemanha, abandonou a administração pública para se dedicar à vida acadêmica, consolidando-se como professor no recém-criado Departamento de Sociologia da Universidade de Bielefeld, onde atuou entre 1969 e 1993. Confrontado com a exigência de nomear o projeto de investigação em que trabalharia, respondeu que o seu projeto seria o de uma teoria da sociedade. E complementou: tempo estimado: trinta anos; custo do projeto: nenhum (Luhmann, 2006). O relato citado encontra-se no prefácio da sua última e mais importante obra publicada em vida: Die Gesellschaft der Gesellschaft (A Sociedade da Sociedade), publicada originalmente em 1997, pouco antes de seu falecimento.