Dia Internacional da Democracia e seus paradoxos
A participação nas democracias contemporâneas sofre modificações profundas a partir de meados do século XX e, não há apenas a pluralização de atores políticos, mas também no que se refere aos espaços onde tais processos de mutação ocorrem. De fato, nada é definitivo em política, e são múltiplos os fatores e resultados possíveis a partir de enfrentamento de duas diferentes forças. Os atritos na institucionalidade política impõem a reinvenção da política para a abertura de uma sociedade multifacetada que a obrigue rever seus sujeitos, suas instituições e seus objetivos. Enfim, o Estado, as redes sociais, a mídia, os intelectuais e educação cívica são instâncias e processos vitais para concretização e difusão de metáforas mobilizados para a participação política e reformulação do exercício da ação política.
O dia foi devotado para ser o
Dia Internacional da Democracia e, em face dos progressos sociais das
derradeiras décadas, as exigências referentes à qualidade das políticas
públicas majoraram ao mesmo tempo em que se deu uma redução de confiança nas
instituições políticas por uma parcela da população, o que representa novo
desafio aos partidos políticos.
Ademais, devido ao
financiamento privado das campanhas políticas, ocorre intensa ampliação da
influência de empresas nas decisões políticas.
Reconhece-se que o sistema político
pátrio ainda apresenta uma série de problemas estruturais e debilidades
institucionais patológicas. E, tais questões somadas à crise que a democracia
ocidental vem sofrendo, deixam evidente a necessidade de se intensificar os
debates sobre o futuro da democracia, a participação política e as reformas indispensáveis.
O melhor entendimento sobre o
que seja democracia e, dessa forma, abrange princípios e características de uma
conduta democrática, incluindo governos e sociedade, como forma de uniformizar
os conceitos indispensáveis para o desenvolvimento humano.
Um dos princípios, por
exemplo, que compõem a Declaração Universal da Democracia diz: “A democracia é
um ideal universalmente reconhecido, uma meta que se baseia em valores comuns
partilhados pelos povos de todo o mundo, independentemente de diferenças
culturais, políticas, sociais e econômicas”.
“É, portanto, um direito
básico de cidadania, a ser exercido em condições de liberdade, igualdade,
transparência e responsabilidade, com o devido respeito à pluralidade de pontos
de vista, no interesse da comunidade.”
A democracia é o ponto inicial
para o desenvolvimento de qualquer sociedade humana, baseada no respeito aos
direitos humanos e às liberdades fundamentais bem como a liberdade de imprensa
e de pensamento[1].
No Dia Internacional da
Democracia é dever de todos reafirmar nosso compromisso com a solidificação de
uma democracia inclusiva, justa e igualitária e, ainda, enfocar a valorização
de nossa diversidade e, na preservação da dignidade humana.
Em nosso país, nesse glorioso
dia, há uma cifra estarrecedora apesar de as mulheres serem mais da metade da
população brasileira, estas representam somente dezoito por cento do Congresso
Nacional, segundo dados do TSE. E, tal sub-representação agrava quando uma
maioria de cinquenta e seis por cento se autodeclara preta ou parda.
O acesso aos espaços de poder
é dificultado e obstaculizado por muitas questões complexas, que vão desde os
estereótipos sobre os papéis sociais da mulher que permeiam a sociabilização e
distanciam as mulheres de locais de liderança, às dificuldades de acesso aos
recursos para a campanha política.
Em teoria, os partidos
políticos deveriam atender à obrigação de trinta por cento de vagas para
candidatas mulheres, como demanda de gênero e imposta pela Lei 9.504/97, a Lei
das Eleições e, ainda, sua obrigação derivada, a reserva de pelo menos trinta
por cento de recursos do Fundo Eleitoral para financiar campanhas de candidatas
mulheres, entendimento firmado pelo STF na ADIn 5.627/2018.
Porém, os obstáculos são
colocados firmas para mulheres, principalmente, as negras que continuam com
baixo acesso a tais recursos, e como resposta às possíveis punições pelo
descumprimento flagrante da legislação, foi apresentada a Proposta de Emenda à Constituição
que anistia os partidos políticos pelo descumprimento de cotas.
Além disso, nesse cenário há a
violência política, pois no Brasil afeta desproporcionalmente as mulheres,
principalmente as mulheres negras e LGBTQIA+[2].
A pesquisa do Instituto Marielle
Franco, de 2020, identificou que, das 142 (cento e quarenta e duas)
entrevistadas, 80% sofreram violência virtual, 60% sofreram violência moral ou
psicológica e 50% sofreram violência institucional. 60% foram ofendidas em
decorrência de suas campanhas eleitorais. O feminicídio político de Marielle
Franco permanece sem identificação de culpados.
No último mês, oito
parlamentares foram ameaçadas de estupro. Uma breve consulta em serviços de
busca traz casos novos de ameaças e violências contra mulheres na política
quase todos os dias. É altíssima a taxa de feminicídio que é o homicídio
qualificado pelo simples fato da vítima ser mulher.
Exemplos como esse não apenas
desafiam a promessa democrática, mas também refletem sistemas patriarcais e
racistas profundamente enraizados que necessitam de ações efetivas para o seu
desmantelamento.
Nesse sentido, tampouco basta
que as mulheres acessem mais cargos políticos. Enquanto não for possível
garantir a segurança mínima para o exercício profissional das parlamentares, a
democracia continuará sendo uma promessa vazia.
A Lei 14.192/2021 que
reconhece a violência política contra mulheres é, de fato, um avanço, mas é um
ponto de partida e, está bastante longe de ser um ponto de chegada. Ainda
estamos distantes de uma solução.
Comemorados, recentemente,
dois anos da lei em agosto de 2023, a violência política continua a ocorrer
diuturnamente em todo o país, forçando mulheres a internalizar todos os custos
dela para prosseguirem com suas carreiras.
O Dia Internacional da
Democracia erige-se como um compromisso de todos em concretizar uma democracia
inclusiva, justa e igualitária.
Cumpre recordar que em 2019
foi apresentado o Projeto de Lei 6.183 para instituir o Dia Nacional da
Democracia no dia 13 de dezembro com o objetivo de promover o sentimento
democrático positivado pela Constituição Federal brasileira de 1988 e, ainda,
com o fito de contribuir com a sensibilização social de forma que se impeça as
manifestações de apoio às ditaduras e aos instrumentos como o famigerado Ato
Institucional 5 de 1968.
No mais recente pleito, ou
seja, as eleições de 2022, mais de 156 (cento e cinquenta e seis) milhões de
eleitoras e eleitores estiveram aptos a votar. A maior parte do eleitorado
brasileiro é composta por mulheres pois equivalem a 52,65% do total. Já os
homens representam 47,33% do eleitorado. E, o TSE atuou de forma firme para
garantir que todos participassem do pleito.
O voto direto, secreto e com o
mesmo valor para todas as eleitoras e eleitores – as mulheres passaram a ter o
direito de votar em 1932 – é assegurado aos não alfabetizados, às pessoas com
deficiência e aos jovens, a partir dos 16 (dezesseis) anos, independentemente
de classe social, raça, sexo ou grau de instrução.
Mais recentemente, em 2018, pessoas
transgênero, transexuais e travestis passaram a ter garantido o direito ao nome
social – aquele pelo qual o eleitor prefere ser designado – impresso no título
de eleitor e no caderno de votação. (Portaria Conjunta 1, de 17 de abril de
2018).
Mesmo diante da maior crise
sanitária da história, brasileiras e brasileiros não deixaram de votar. Em meio
à pandemia de covid-19, o TSE instituiu grupos de trabalho, editou resoluções e
adaptou o calendário eleitoral a fim de garantir que as Eleições Municipais de
2020 ocorressem de maneira segura e democrática.
Em nosso país, o processo
democrático é algo relativamente novo. Após o surgimento da pseudodemocracia na
República Velha, inspirada na constituição de Weimar, entre 1934 e 1937, o
governo de Getúlio Vargas seguiu a constituição de 1934, mas, foi interrompido.
Registraram-se novas
tentativas de retomada da democracia em 1945, mas isso só durou até 1964,
quando um golpe militar estabeleceu a ditadura. Depois disso, foi somente em
1985, com o fim da ditadura militar, que se iniciou a redemocratização do
Brasil[3], com a marca das eleições
indiretas para presidente. A eleição direta ocorreu apenas em 1989, após 29
anos com eleições presidenciais indiretas.
Somente em 1988 foi promulgada
a Constituição Federal, que vigora até hoje e é considerada a guardiã da
democracia brasileira. Conforme expresso em seu preâmbulo, ela garante "o
exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o
bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de
uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia
social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica
das controvérsias.
Infelizmente, o país amarga a
triste cifra total de nove golpes de Estado, o que torna a tarefa de defender
os valores democráticos pertence a cada cidadão e comunidade como um todo, seja
direta ou indiretamente, na esfera pública ou privada nas nossas relações e nas
instituições às quais pertencemos.
Em uma democracia realmente
forte se estabelece a partir do respeito às diferenças e às diversidades, da
igualdade de direitos e oportunidades, da saúde, da educação, do emprego e da
renda. E, assim, combater a intolerância, o racismo e todo tipo de
discriminação é, portanto, consolidar a democracia.
O ocorrida em oito de janeiro
desse ano explicitou, por um lado, a dimensão autoritária e violenta de certas
pessoas, e, por outro lado, os grandes desafios para o enfrentamento desse
problema no âmbito político, institucional, econômico e ideológico. Conforme
leciona Marilena Chauí, a democracia propicia uma cultura da cidadania e a luta
contra o medo e a violência.
Faz-se necessário que se
voltem a vigorar os marcos definidos em 1988 para a vigência dos direitos e
para disciplina de disputas políticas. Para mais da metade dos brasileiros
(58%), a democracia é sempre a melhor forma de governo. Por outro lado, 17%
acreditam que, em algumas situações, um governo autoritário é melhor.
E, 15% dizem que tanto faz um
governo democrático ou autoritário. Os dados fazem parte de amplo levantamento
sobre assuntos ligados a política, economia e atitudes sociais realizado pelo
DataSenado junto à população brasileira. (In: https://www12.senado.leg.br/institucional/datasenado/materias/pesquisas/para-a-maioria-dos-brasileiros-a-democracia-e-a-melhor-forma-de-governo
Acesso em 30.9.2023).
Foi pelos meados dos anos
oitenta, com o término de ditaduras na América Latina, a Queda do Muro de
Berlim em 1989[4],
a dissolução da URSS em 1991, o mundo vivenciou um florescimento democrático.
Eram tempos de otimismo
conhecido como a terceira onda da democracia e que começou a fenecer a partir
dos meados de 2000. Progressivamente, começou-se a 111perceber que a
globalização não favorecia a todos, deixando esquecidas parcelas da população
de países menos desenvolvidos. Nesse contexto adverso, abriu-se espaço para
fortalecimento de movimentos antidemocráticos na Europa, nas Américas
(inclusive os EUA) e, em outras partes do mundo, até nosso país.
O doutrinador Oscar Vilhena
analisa o comportamento das instituições de defesa da democracia brasileira,
especialmente, a postura do Supremo Tribunal Federal, a partir da ascensão ao
poder, em 2018, de um Presidente da República ostensivamente hostil à
democracia. O referido doutrinador aponta que o STF teve que agir porque outros
órgãos federais se omitiram. Adverte, contudo, que o STF não deve
"comprar" todas as brigas, pois corre o risco de sucumbir.
A Lei de Defesa do Estado
Democrático de Direito[5] que entrou em vigor em
2021 e tipificou os crimes contra a democracia representa um marco relevante,
porém, ainda suscinta muitas dúvidas. Afinal, o STF ao atuar em defesa do Estado
Democrático de Direito, quando necessário, poderá atuar sem ultrapassar os
limites constitucionais do que pode fazer do ponto de vista procedimental.
Portanto, é preciso haver maior clareza sobre a fronteira entre a proteção da
democracia e o respeito aos princípios fundamentais do Estado de Direito.
A obra "Como as
Democracias Morrem" de autoria de Steven Levitsky e Daniel Ziblatt teve grande
em impacto em meio a tamanha polarização política, e vem erguendo discussões
pontuais e contundentes. Pois os autores se propuseram a contextualizar o
processo democrático e, como vem sendo ferido de forma mais intensa nos
derradeiros anos.
Até pouco tempo, preocupava-se
o fato de que algumas nações e sociedades ainda não vivessem em uma democracia
e sim sob regimes autoritários ou monárquicos, mas nos últimos anos vem se
tornando pauta o fato de que democracias já consolidadas estão passando por transformações
preocupantes e intrigantes.
Levitsky e Ziblatt trabalham
exatamente essas democracias, com foco na democracia norte-americana, que vem
sendo questionada com mais força desde a ascensão de Donald Trump à presidência
dos Estados Unidos.
Levitsky e Ziblat fazem, em
poucas páginas, um resumo de como funciona a democracia norte-americana,
explicam o que e quem seriam os guardiões dessa democracia que se reuniam em
salas esfumaçadas e como o sistema foi sendo moldado até que os chamados outsiders
pudessem ganhar espaço dentro da política.
A obra é extremamente focada
na democracia norte-americana e em suas nuances. Por diversos capítulos os
autores vão delineando os passos da democracia norte-americana, explicando
contextos históricos e exemplificando com grandes nomes da política
estadunidense. Em determinado capítulo os referidos autores demonstram como se
fortaleceu a polaridade política nos Estados Unidos, chegando a extremos que
podemos facilmente compreender ao olharmos para a nossa própria política.
O maior paradoxo da democracia
é, enfim, um dos três paradoxos que já foram apontados pelo filósofo Karl
Popper[6] em seu livro “The Open
Society e and its Emnemies” (A sociedade aberta e seus inimigos)[7]. Popper destacou em uma
nota de rodapé sobre a possibilidade através de um processo democrático, a
maioria decidir ser governada por um tirano.
Todavia, muitos milênios
anteriores, com o filósofo grego Platão já se tinha percebido tal paradoxo,
pois afirmou: "a democracia pode facilmente se transformar em uma tirania
se os governantes receberem demasiada confiança para decidir por um grande
número de pessoas, se não forem submetidos a escrutínio".
Outro questionamento foi feito
por Bryan Magee, in litteris: "Qual medida a ser tomada quando a
maioria leva ao poder, por meio de um sufrágio legítimo, um partido como o
fascista ou o comunista, que não creem em instituições livres e quase sempre as
destroem ao alcançarem o poder?"
Larry Diamond identificou três
paradoxos que são: 1. conflito versus consenso; 2. representatividade versus
governabilidade e 3. consenso versus efetividade. Ainda em relação ao primeiro
paradoxo, a fórmula democrática é baseada na competição eleitoral, ou seja, no
conflito de ideias e propostas. Não obstante, tal conflito não pode ser tão
intenso a ponto de polarizar a sociedade, inviabilizando o debate e a
convivência social. No dizer de Diamond, “democracia requer conflito, mas não
tanto”.
O segundo paradoxo se
estabelece no fato de que se, por um lado, a democracia impede a concentração
de poder e demanda a representação plural da sociedade por intermédio de
mandatários eleitos, por outro lado, o governo eleito não pode ser “refém” de
interesses de grupos de eleitores.
O terceiro paradoxo é o de que
a democracia parte da premissa de que o poder político deve ser legitimado pelo
povo, mas a confiança e consenso popular somente se estabilizam no momento em
que os regimes democráticos conseguem entregar resultados efetivos no campo
econômico e social.
A dificuldade em lidar com
tais paradoxos é um dos fatores que pode explicar o “desencantamento” que
atinge o mundo democrático como um todo, em especial os Estados que iniciaram
sua transição para a democracia nos anos 1990.
É o registro de pesquisa
recente do Centre for the Future of Democracy (2020), da Universidade de
Cambridge, que trouxe como conclusão central o fato de que, desde 1990, a
parcela da população mundial insatisfeita com a democracia cresceu mais de dez
pontos percentuais, alcançando o maior nível de insatisfação global desde o
início da série de pesquisas em 1995.
A democracia brasileira bem
ilustra nossa notável dificuldade em lidar com os paradoxos, especialmente, nos
contemporâneos dias. O primeiro sintoma é a polarização e corresponde ao
primeiro paradoxo. Pois, a polarização é resultante do paradoxo versus
conflito.
Não obstante o país tenha
mantido a institucionalidade na competição eleitoral desde a redemocratização, para
o que foi particularmente relevante o bom grau de confiabilidade e idoneidade
dos pleitos, a disputa política tem ultrapassado aos limites democráticos
vindos a dialogar com sinceros retrocessos autocráticos;
Segundo sintoma, a disputa
entre os poderes que é uma constante em toda história do país redemocratizado. O
alcunhado fenômeno do presidencialismo de coalizão demonstra a crise de
governabilidade constante no Estado brasileiro.
Apesar de que seja salutar, em
termos democráticos, a exigência de que o Presidente da República venha a
negociar com o Parlamento a condução do país, é bem perceptível, através da
análise de políticas públicas vigentes na economia, no setor social, cultural
e, ainda, a existência de capturas e privilégios de certos grupos e segmentos.
O terceiro sintoma a ascensão
do populismo e a propagação de soluções fáceis. Convém sublinhar que o
populismo traz à baila uma tensa complexidade e divergência em seus próprios
contornos conceituais, mas há algumas características bem peculiares, como o
personalismo do poder e os discursos antissistêmico de seus representantes.
A divisão de mundo entre maus
e bons, corruptos e anticorruptos, entre outros tantos maniqueísmos é uma
peculiaridade crescente no debate político, especialmente, em redes sociais, o
que só favorece a plataforma populista e a exposição de soluções fáceis e ilusórias
para tantos problemas complexos.
A democracia não tem tido
êxito em entregar resultados concretos para muitas dificuldades humanas, espaço
que o populista aproveita para então explorar a relação de parasitismo.
Enfim, Popper realmente
questionou[8] até que ponto a sociedade deve
ser tolerante com os intolerantes. A liberdade de expressão é um dos pilares de
uma sociedade democrática e, essencialmente, esta garante a todo indivíduo o
direito de exprimir sua opinião.
Todavia, a incitação à
violência e ao ódio revelam-se como crimes. Para o filósofo, a chamada
sociedade tolerante pode ser levada a destruição porque uma ilimitada
tolerância a torna vulnerável a todo e qualquer ataque intolerante sob o
disfarce de que há o exercício da liberdade de expressão.
Winston Churchill afirmava que
a democracia é a pior forma de governo, à parte todas as outras antes
experimentadas. Assim, sabia que o melhor argumento contra a democracia são
alguns minutos de conversa com o eleitor ou político. Já Georges Bernard Shaw
definia a democracia como a garantia de não sermos governados melhor do que
merecemos. Acrescentou que seu advento substituíra a nomeação de poucos
corruptos pela eleição de muitos incompetentes.
A seu turno, Gustave Flaubert
identificava o sonho da democracia como a elevação do proletariado ao mesmo
nível de estupidez alcançado pela burguesia. O filósofo Bertrand Russel, por
sua vez, observava que os eleitos não podem jamais ser mais estúpidos de que
seus eleitores. Diante de tantas provocações
literárias, além de questões lógicas e matemáticas, os paradoxos da democracia
são, realmente, variados e enganosos, pois nenhum direito fundamental é
absoluto, pois nenhuma liberdade é infinita e ilimitada e, assim, a prática
democrática exige atenção e monitoramento para que exista uma justiça
inclusiva, social e igualitária.
Historicamente, temos o
paradoxo de Condorcet cujo nome era Marie Jean Antoine Nicolas de
Caritat, porém, mais conhecido apenas como Marquês de Condorcet (1743-1794),
Tendo vivido na época da Revolução Francesa, o marquês fora primeiramente
enciclopedista e depois girondino.
Com a chegada ao poder dos
jacobinos, escondeu-se por vários meses. Quando, finalmente, se decidiu por
fugir, travestido pelos campos, traiu a si mesmo pedindo, como bom aristocrata,
uma omelete com um número despropositado de ovos. Morreu na prisão três dias
depois; talvez suicida, visto que levava veneno sempre consigo.
Em 1785, poucos anos antes que
a revolução pretendesse, paradoxalmente, instaurar um sistema democrático com a
guilhotina, o marquês descobrira o seguinte problema.
Ele sabia, mesmo sem a
demonstração de May, que a votação por maioria era um método eficiente de
escolha entre duas alternativas. Na presença de mais alternativas, uma ideia óbvia
seria votar duas de cada vez, optando por aquela que obtivesse a maioria contra
todas as remanescentes. Condorcet[9] demonstrou que,
infelizmente, não é certo que haveria tal alternativa: mesmo se as preferências
dos votantes singulares, em respeito às diversas alternativas, fossem ordenadas
linearmente, a votação poderia de fato produzir uma ordem social circular.
Para ilustrar o paradoxo,
consideremos outra das eleições presidenciais estadunidenses: aquela de 1976.
Na ocasião Jimmy Carter vence Gerald Ford, que obtivera a nomination
republicana vencendo Ronald Reagan. Mas, as pesquisas diziam que Reagan teria
vencido Carter (como depois acontece efetivamente, não obstante fosse com um
outro eleitorado, em 1980).
Uma situação circular, na qual
três candidatos têm condições de vencer, é obviamente embaraçante para um
sistema no qual os dois candidatos são selecionados em eleições sucessivas,
dois a dois.
O vencedor depende, de fato,
somente da ordem em que são realizadas as votações. Por exemplo, para que
vencesse Ford em 1976 teria bastado fazer primeiro a votação entre Carter e
Reagan, e depois a votação entre o vencedor (Reagan) e Ford.
O paradoxo de Condorcet não
deixa escolhas. Ou se votam todas as alternativas, umas contra as outras,
podendo assim obviamente acontecer que nenhuma obtenha a maioria; ou se votam
as várias alternativas em uma certa ordem, caso em que a vencedora dependerá da
ordem escolhida. Como se não bastasse, uma ordem particular de votações pode
permitir a uma alternativa que vença ainda quando exista outra unanimemente
preferida.
Considerando que a votação por
maioria sobre mais de duas alternativas é um sistema largamente aplicado em
contextos locais, nacionais e supranacionais, a relevância do paradoxo é
evidente.
Entre outros, explica as
denominadas batalhas procedimentais, por vezes furiosas, sobre a ordem das
votações. Distante de assumir bizantinismos, como poderia parecer, são na
verdade essenciais para determinar o resultado final segundo a direção
desejada, relegando as votações ao papel de cobertura democrática de
verdadeiros golpes.
Cumpre destacar para que o
paradoxo de Condorcet seja possível, não pode haver uma alternativa a qual
ninguém considere como a pior. De fato, se A vence B por maioria, ao menos a
metade mais um dos votantes prefere A a B. Se B vence C por maioria, ao menos a
metade mais um dos votantes prefere B a C. Logo, ao menos um dos votantes
prefere A a B e B a C, e C é considerada a pior alternativa por alguém. Por
simetria, o mesmo vale para A e B. Para que a ordem social produzida pela
votação por maioria possa ser circular, é, portanto, necessário que cada
alternativa seja considerada a pior por alguém.
Expõe-se assim uma
incompatibilidade entre liberdade individual, que permite a cada um optar por determinada
ordem de preferências, e harmonia social, que por sua vez requer uma certa
uniformidade entre as ordens individuais.
E explica, também, tanto a
inadequação da votação por maioria nos momentos de instabilidade política como
a sua impotência nos momentos de transformação. Nos primeiros, há alternativas
que ninguém considera as piores: aquelas de centro. Já nos segundos, a
radicalização das preferências cria as condições para o paradoxo.
A votação por maioria proposta
no parágrafo anterior não é, obviamente, a única solução possível para a
escolha entre mais alternativas. Outra é a votação por pluralidade:
apresentam-se todas as alternativas simultaneamente, cada votante escolhe uma,
e vence aquela que recebe o maior número de votos.
Em 1781, porém, Jean-Charles
de Borda[10]
(1733-1799) percebeu que se impunha uma escolha entre os dois métodos, visto
que pluralidade e maioria são incompatíveis entre eles. Consideram-se quinze
votantes, por exemplo, que devam optar entre alternativas A, B e C. Suponhamos
que as ordens de preferências individuais sejam as seguintes:
- 6 Votantes preferem A a B, e
B a C.
- 4 Votantes preferem B a C, e
C a A.
- 5 Votantes preferem C a B, e
B a A.
Quando se coloca em votação as
alternativas por pluralidade, A vence C por 6 a 5, e C vence B por 5 a 4. Já
quando se coloca a votação por maioria, B vence C por 10 a 5, e C vence A por 9
a 6. Os dois sistemas de votação produzem, portanto, ordens sociais
contrapostas.
Borda não se deu conta que a
votação por maioria poderia não ser transitiva, mesmo porque no exemplo
precedente o é: B vence A por 9 a 6. Mas identificou um problema no fato de que
na votação por pluralidade se considera somente uma parte das informações
contidas nas várias ordens de preferência individuais: precisamente, a primeira
alternativa.
A coisa pode ser remediada com
sistemas de voto por peso, no qual os votantes associam, direta ou
indiretamente, pesos numéricos às várias alternativas. Por exemplo, no
assegnamento canônico se dão N pontos à primeira de N alternativas, N-1 pontos
à segunda, e assim por diante.
A construção da ordem social
se efetua, neste caso, somando os pesos das alternativas nas várias ordens
individuais. Mas, já como no caso da votação por maioria, também os sistemas de
voto por peso apresentam situações paradoxais.
Estabelecer a atribuição dos
pesos coloca de imediato várias dificuldades. Em primeiro lugar, psicológicas:
como medir as intensidades das preferências de cada indivíduo? Em segundo
lugar, sociológicas: como equiparar, entre si, os vários sistemas de medida
individuais? Em terceiro lugar, e sobretudo, lógicas: o resultado pode, de
fato, depender da atribuição dos pesos.
Por exemplo, considere-se
cinco votantes, que devam optar entre alternativas A, B e C. Suponhamos que as
ordens das preferências individuais sejam as seguintes:
- 3 Votantes preferem A a B, e
B a C.
- 2 Votantes preferem B a C, e
C a A.
Caso se assinale um ponto à
primeira de cada lista e nenhum às demais, como na votação por pluralidade, A
vence B por 3 a 2. Mas se forem assinalados dois pontos à primeira, um à
segunda e nenhum à terceira opção, de cada lista, B vence A por 7 a 6.
De qualquer forma, quando
estiverem fixadas a atribuição dos pesos e as ordenações individuais, a ordem
social entre duas alternativas dependerá da presença ou não de outras
alternativas em jogo.
Por exemplo, se a atribuição é
da maneira canônica e as ordens individuais são aquelas do exemplo precedente,
então A perde de B por 11 a 12. Sendo a alternativa C não apenas a última em
absoluto, com 7 pontos, mas também não sendo a preferida por nenhum votante de
B, que é a primeira opção em absoluto, poder-se-ia pensar que a presença de C
fosse irrelevante para a vitória de B. Ela resulta, porém, determinante. Se a
alternativa C for efetivamente eliminada, permanece-se com três votantes que
preferem A a B e dois que preferem B a A. Desta vez, portanto, A vence B por 8
a 7.
Os problemas de tal gênero
tornaram os sistemas de voto por peso, em regra mais complicados que os
sistemas de voto por maioria, pouco praticáveis. São usados, hoje, quase
exclusivamente em multicompetições esportivas, como o decatlon.
Neste caso, as alternativas
são os atletas participantes, os votantes são as várias competições, as
preferências são as ordens de chegada, e os pesos são os pontos assinalados.
Os paradoxos de Condorcet e
Borda expuseram algumas dificuldades dos sistemas de votação então conhecidos,
sem, porém, parar a história. A guilhotina era, de fato, tema dos mais afiados
dentre os paradoxos, e a democracia se mostrou historicamente inevitável, não
obstante logicamente inconsistente.
A discussão de Condorcet caiu
no esquecimento, sendo redescoberta periodicamente, de Lewis Carroll em 1876 a
Duncan Black em 1948, para ser pontualmente esquecida novamente.
Foi, enfim, retomada em 1951
por Kenneth Arrow, um jovem economista que havia estudado lógica matemática com
Alfred Tarski. Sua formação o estimulou a não parar diante do paradoxo e ir
além, fazendo-o perguntar se era tudo fruto do acaso ou da necessidade.
Em outras palavras, Arrow se
questionou sobre a possibilidade de se encontrar ao menos um sistema de votação
que permitisse estender a transitividade das preferências individuais àquelas
sociais.
Até então, tanto os idealistas
à la Kant como os racionalistas à la Bentham haviam suposto que a ordem
social existisse, e divergiam somente na crença que essa fosse,
respectivamente, independente ou deduzível das ordens individuais.
Já o realista Arrow descobriu
que ambos se equivocavam, porque a ordem social não existe. Mais precisamente,
demonstrou que nenhum sistema de votação que satisfaça as seguintes condições
preserva a transitividade das preferências:
1) Liberdade de escolha: toda
ordem transitiva de preferências individuais é aceitável.
2) Dependência do voto: o
resultado da votação entre duas alternativas é determinado univocamente pelos
votos a elas conferido.
3) Monotonicidade: se uma
alternativa vence uma votação, continua a vencer em toda votação na qual
obtenha mais votos.
4) Rejeição da ditadura: não
existe ninguém cujas preferências individuais ditem o resultado de cada
votação, independentemente das preferências dos demais votantes.
A analogia com as condições de
May salta aos olhos. Em particular, dado que o anonimato implica a rejeição da
ditadura, o teorema de Arrow demonstra que o teorema de May não pode ser
estendido a mais de duas alternativas.
Não obstante o resultado seja
exatamente um teorema, para exorcizá-lo se costuma o chamar de paradoxo. Em
inglês soa bem, pois Arrow’s paradox é traduzido como “paradoxo da
Flecha[11]”, invocando um outro
homônimo: aquele de Zenão[12], segundo o qual uma
flecha em movimento não pode se mover, porque em cada instante está parada.
Isto não impediu que o teorema
de Arrow fosse objeto de estudos aprofundados, que agora compõem a denominada
teoria das escolhas sociais. Nem descuidou o comitê de Estocolmo, que em 1972
conferiu a Arrow o prêmio Nobel de economia (paradoxalmente, com uma votação).
O fato de que um teorema de
ciência política como o de Arrow, sobre a impossibilidade de um sistema
democrático de votações, tenha lhe concedido um prêmio Nobel de economia, não
deve surpreender. À parte as óbvias e hoje evidentes conexões e acordos entre
economia e política, pela sua natureza abstrata o resultado se aplica a
qualquer situação na qual seja necessária uma escolha coletiva entre um
conjunto limitado de alternativas.
Por exemplo: de produtos em um
mercado, de políticas comerciais em um conselho de administração, de
representantes em uma assembleia de acionistas... O teorema de Arrow torna
manifesta, portanto, uma dificuldade na passagem da microeconomia dos sujeitos
individuais, tais como produtores e consumidores, à macroeconomia dos grupos,
como os mercados
Exemplificando26, mais
genericamente, uma série de situações análogas, nas quais fica difícil, ou
impossível, justificar o comportamento global de um sistema sob a base dos
comportamentos individuais de seus componentes.
Quanto às consequências
filosóficas do teorema de Arrow, não se pode tratar de maneira melhor da que
fez Paul Samuelson[13], prêmio Nobel de economia
em 1970.
Em primeiro lugar, ele admite
candidamente que “a busca da democracia perfeita por parte das grandes cabeças
da história se mostrou como a busca de uma quimera, de uma autocontradição lógica”.
Sem querer ofender os políticos e meios de informação mundiais que hoje apenas
cantam, incessantemente, o mantra do suposto triunfo da referida quimera.
Em segundo lugar, Samuelson
traça um paralelo que é para nós extremamente significativo: “A devastadora
descoberta de Arrow é, para a política, o que o teorema de Gödel[14] é para a matemática”.
Em particular, ambos os
resultados mostram limitações intrínsecas de seus respectivos âmbitos de
maneira simples e inequívoca, destruindo assim ingênuas ilusões.
Nem mesmo o teorema de Arrow[15] é, porém, a última
palavra em termos de limitações da democracia. Um resultado igualmente
impressionante, se não mais, foi obtido em 1970 por Amartya Sen, prêmio Nobel
de Economia em 1998. Partindo de hipóteses análogas àquelas de Arrow, Sen
efetivamente demonstrou que, em uma sociedade, um indivíduo pode no máximo ter
direitos!
Os teoremas de Arrow e de
Balinsky e Young impuseram golpes mortais ao princípio de proporcionalidade.
Muitas democracias o abandonaram, por isso, com mais ou menos pudor. Também a
democracia italiana, sob o golpe de referendum e mattarellum, por
alguns anos pensou que a solução dos problemas da democracia estivesse na
adoção de alguma forma de sistema majoritário.
Infelizmente para tais
pensadores, os sistemas majoritários não estão em melhor situação que os
proporcionais. No majoritário puro, por exemplo, é possível que um partido com
quase 50 (cinquenta) por cento dos votos nacionais não obtenha nem mesmo uma
cadeira, ao passo que cada posto pode ir para partidos locais de representação
mínima.
Portanto, é suficiente de
fato, que em cada colégio um mesmo partido nacional obtenha 50 (cinquenta) por
cento dos votos menos um, e que um partido local obtenha 50 (cinquenta) por
cento dos votos mais um, para que o lugar fique com o segundo.
Um outro paradoxo dos sistemas
que, assim como o majoritário, apresentam a opção entre somente dois candidatos
ou grupos, pode ser eficazmente ilustrado com o exemplo dos sorveteiros (sem o
intento de denegrir ninguém).
Imaginemos, assim, que nos
encontramos em uma praia ensolarada ao longo de um quilômetro, plena de
banhistas acalorados, quando chegam dois sorveteiros vendendo seus produtos.
Para os banhistas, o mais
sensato seria que ambos se colocassem a 250 (duzentos e cinquenta) metros do
extremo da praia, ou seja, a um quatro e três quartos. Dessa maneira, de fato,
nenhum banhista teria de caminhar mais de 250 (duzentos e cinquenta) metros
para alcançar o mais próximo dos sorveteiros.
A verdade eleitoral é expressão
digna de maior mérito do sistema majoritário, na eleição de parlamentares, onde
os candidatos mais votados são sempre os eleitos[16]. Por outro lado, os
sistemas proporcionais, de lista aberta ou fechada, carecem dessa desejável
propriedade, uma vez que, por esses mecanismos, nem sempre os candidatos mais
votados ascendem ao legislativo, enquanto outros, menos votados, podem fazê-lo.
Todos os sistemas eleitorais
têm distorções. Não existe nenhum sistema perfeito e não há nenhum método de
divisão proporcional justo (teorema de Arrow e teorema da impossibilidade de
Balinsky e Young, respectivamente). Concluindo, a mudança de um sistema para
outro envolve ganhos e perdas, já que todos os sistemas têm méritos e
deméritos.
A proposta de Popper considerou a noção de que é preciso romper com qualquer ideia dogmática. E, o modo como o filósofo propôs sua teoria da história parte do pressuposto de que precisamos assumir o controle de nossas ações. Popper preconizou a ação humana como valor, propondo a luta por uma sociedade aberta e democrática sendo guiada pela razão e pelo ideal de justiça.
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Acesso em 30.9.2023.
Notas:
[1] As
experiências traumáticas desencadeadas pelos regimes totalitários na primeira metade do século XX deram impulso à
crítica de Karl Popper (1992 – 1994) aos
sistemas de ideias que abrigam a crença, quer por leis ou por alguma razão
histórica, no ordenamento dos destinos dos indivíduos. Objetivamos apresentar a
crítica de Popper ao conjunto de ideias nomeadas por ele de historicismo, isto
é, a visão de que caberia às Ciências Sociais a função de fazer predições a
partir da compreensão das e leis de uma história
teleológica.
[2] Cada letra representa um grupo de pessoas. A seguir, o que cada uma dessas sete letras e o sinal de soma + representam: L: Lésbicas; G: Gays; B: Bissexuais: Transgêneros: Queer ou Questionando; I: Intersexuais. A: Assexuais ou Aliados+: Outras identidades de gênero e orientações sexuais.
[3]
A redemocratização é o processo de reconstrução da democracia em países que
passaram por um regime político ditatorial. No caso brasileiro, houve dois
momentos de redemocratização: em 1945 após o Estado Novo e outra entre 1974 e
1985 que ocorreu, progressivamente, durante o fim do Regime Militar. O processo
de redemocratização do Brasil envolve uma série de medidas que ocorreram entre
os anos 1975 e 1985 Foi um período em que, progressivamente, foram ampliadas
novamente as garantias individuais e a liberdade de imprensa, levando a eleição
do primeiro presidente civil após 21 anos de ditadura militar. Contudo, é
importante pontuarmos que esse processo foi composto por momentos de avanço e
recuo dos militares. Afinal, eles desejavam garantir uma transição controlada,
sem que os setores mais radicais da oposição chegassem ao poder. Por isso, é
comum ver nesse momento da história medidas de distensão, como a Lei da
Anistia, convivendo com medidas de repressão, como o Pacote de Abril e a recusa
da Emenda Dante de Oliveira, que pedia eleições diretas para presidente da
república — veremos mais à frente esse fato. Dentre as principais medidas que
caracterizaram o processo de distensão, encontram-se: O fim da censura prévia à
espetáculos e publicações; A revogação do AI-5; O retorno ao pluripartidarismo;
A Lei da Anistia.
[4] A queda do Muro de Berlim foi um ato apenas simbólico, mas marcou o início de um processo político que culminou com a reunificação da Alemanha. O chanceler da Alemanha Ocidental, Helmut Kohl, engajou-se para isso e, no dia 3 de outubro de 1990, a Alemanha reunificava-se e o lado socialista deixaria de existir. A queda do Muro de Berlim foi consequência da crise enfrentada pelo bloco socialista na década de 1980. Levando em consideração o contexto da Alemanha Oriental, a população do país estava insatisfeita, pois o país enfrentava uma grande crise econômica. A insatisfação era amplificada pela repressão e censura do governo. O Muro de Berlim caiu dia 9 de novembro de 1989. A Queda do Muro de Berlim significou o fim da Guerra Fria, a reunificação das duas Alemanhas, o término dos regimes socialistas e o início da globalização. Simbolicamente, representa a vitória do capitalismo sobre o socialismo. Sua queda foi possível devido à pressão internacional, e às manifestações registradas nas duas Alemanhas.
[5]
LEI Nº 14.197, DE 1º DE SETEMBRO DE 2021 Acrescenta o Título XII na Parte
Especial do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal),
relativo aos crimes contra o Estado Democrático de Direito; e revoga a Lei nº
7.170, de 14 de dezembro de 1983 (Lei de Segurança Nacional), e dispositivo do
Decreto-Lei nº 3.688, de 3 de outubro de 1941 (Lei das Contravenções Penais).
Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2019-2022/2021/lei/l14197.htm Acesso
em 30.9.2023.
[6]
Na conferência proferida por Karl Popper, no Congresso Internacional de
Filosofia, em 1948, Amsterdam, o autor demarca o significado do que ele nomeou
de historicismo. A crítica de Popper se dirige à necessidade que as ciências
sociais têm de instrumentalizar as análises sociais por meio de profecia
histórica como racionalização da atividade política. Para o autor, tal postura
é considerada “relíquia de antiga superstição, embora os historicistas estejam
convencidos de que se trata de uma teoria nova, progressista, revolucionária e
científica” (POPPER, 2002, p. 512).
[7]
É uma obra de filosofia política de autoria de Karl Popper, em dois volumes,
durante a Segunda Guerra Mundial. Foi publicada pela primeira vez em Londres,
pela Editora Routledge, em 1945. A obra integrou a lista dos modernos cem
melhores livros de não-ficção da Modern Library. Popper criticou as teorias do
historicismo teleológico em que a história se desenrolaria inexoravelmente de
acordo com leis universais. Acusou Platão, Hegel e Marx de totalitários, por
confiarem cegamente no historicismo para sustentar as suas filosofias
políticas. O filósofo debruçou-se sobre três paradoxos: o da tolerância, o da
liberdade e o da democracia. O principal inimigo da sociedade aberta, de acordo
com Popper, é Karl Marx. Popper admite que, ao contrário de Hegel, Marx se
preocupava profundamente com a situação das pessoas comuns e com as injustiças
que prevaleciam em sua época nas sociedades capitalistas. Da mesma forma, os
escritos de Marx oferecem perspicácias econômicas, sociológicas e históricas.
No entanto, mesmo onde Popper considera as opiniões de Marx como tendo valor,
Popper considera que o historicismo de Marx o levou a exagerar - por exemplo, a
importância da luta de classes. Popper rejeita abertamente a visão
historicista, antirracional e totalitária de Marx.
[8] O historicismo, como foi mostrado, é um conjunto de pensamentos e ideias onde não se encontra uma estrutura coesa, homogênea, mas multifacetada. Procuramos mostrar, neste artigo, que o historicismo de Karl Popper é de outra dimensão, se comparado com a Escola Alemã. Karl Popper parte de seu próprio campo teórico, a saber, que é impossível elevar qualquer teoria à categoria de verdade absoluta em termos epistemológicos. Ao propor que a possibilidade do erro é um elemento central para a constituição científico, Popper indica o mesmo caminho na sua análise acerca da natureza do conhecimento histórico.
[9]
Em discursos e escritos, argumentava contra a discriminação a protestantes e
judeus e pregava o fim da escravidão e o direito de cidadania dos negros.
Educação, dizia Condorcet, era uma questão política. Em 1791, Condorcet
defendia que o sistema de instrução da França precisava ser gratuito, universal
e independente, fixando as bases teóricas e ideológicas de um projeto
pedagógico que ainda hoje soa arrojado e inspirador. As ideias de Condorcet a
favor da liberdade econômica, da tolerância religiosa, das reformas legais e
educacionais e contra a escravidão fazem dele uma figura típica do Iluminismo,
ainda que pertencente à nobreza.
[10]
Jean-Charles, Chevalier de Borda (4 de maio de 1733 - 19 de fevereiro de 1799)
foi um matemático, físico e oficial da Marinha francesa. Com o advento do
sistema métrico, após a Revolução Francesa, decidiu-se que o quarto círculo
deveria ser dividido em 100 unidades angulares, atualmente conhecido como
gradiano, em vez de 90 graus, e o gradiano em 100 minutos centesimais de arco
(centígrados) em vez de 60 minutos de arco.
Isso exigiu o cálculo de tabelas trigonométricas e logaritmos
correspondentes à nova unidade e instrumentos para medir ângulos no novo
sistema. Borda construiu instrumentos para medir ângulos nas novas unidades (o
instrumento não poderia mais ser chamado de "sextante") que mais
tarde foi usado na medição do arco do meridiano entre Dunquerque e Barcelona por
Delambre para determinar o raio da Terra e, assim, definir o comprimento do
metro. As tabelas de logaritmos de sines, secantes e tangentes também eram
necessários para fins de navegação. Borda era um entusiasta do sistema métrico
e construiu tabelas desses logaritmos a partir de 1792, mas sua publicação foi
adiada para depois de sua morte e só publicada no Ano IX (1801) como Tabelas de
Logaritmos de sines, secantes e tangentes, cossecantes, cosseno, e cotangente
para o Quarto do Círculo dividido em 100 graus, o grau em 100 minutos, e o
minuto em 100 segundos a dez decimais, e incluindo suas tabelas de logaritmos a
7 decimais de 10.000 a 100.000 com tabelas para obtenção de resultados a 10
decimais.
[11]
O Paradoxo da Flecha: Se o espaço e o tempo são discretos, então uma flecha não
pode se mover através do ar, pois a cada instante de tempo ela está em um ponto
definido e, portanto, em repouso naquele instante. Assim, ela está sempre em
repouso.
[12] Zenão de Eleia (490-430 a.C) é bem conhecido por causa de seus paradoxos, como aquele da corrida de Aquiles com a tartaruga. De fato, escreveu um livro com em torno de 40 paradoxos, mas este se perdeu. O que sabemos de Zenão nos foi transmitido por Platão, Aristóteles e pelo comentador Simplício do séc. VI a.C. Oque Zenão queria provar com seus paradoxos? Como eles foram encarados na Antiguidade? Como eles são resolvidos hoje em dia? Zenão era discípulo do grande filósofo Parmênides (515-450 a.C), da cidade de Eleia (atual Itália), que defendia que a pluralidade (o estado de haver muitas coisas distintas, ao invés de uma só) não existe e que qualquer mudança é impossível. O ponto de partida de Parmênides era a razão, o intelecto, em oposição à observação. É verdade que nossos sentidos veem uma aparente mudança, mas isso seria pura ilusão, pois a realidade não poderia mudar. Afinal, “o que é não pode deixar de ser”: se alguma coisa tem uma essência, como é que essa essência pode desaparecer desta coisa? Por outro lado, “do não-ser não pode surgir o ser”: como é que algo pode surgir do nada? Assim, o Universo seria uno, e não mudaria (algo parecido com a ideia de um único Deus imutável).
[13] Paul Anthony Samuelson (Gary, 15 de maio de 1915 — Middlesex, Massachusetts, 13 de dezembro de 2009) foi um economista norte-americano, amplamente reconhecido como um dos formuladores mais importantes da ciência economia moderna e figura de particular relevância na história do pensamento econômico em geral. Samuelson obteve seu doutorado em economia na universidade de Harvard, onde também lecionou por um tempo e, mais tarde, foi para o MIT. Muito basicamente, a economia contemporânea pode ser definida como uma espécie de síntese da microeconomia neoclássica com a macroeconomia keynesiana; e foi Samuelson, a partir de sua busca em encontrar pontos de coerência entre as duas disciplinas, quem construiu essa unidade.[6] Por isso, o historiador econômico Randall E. Parker o chamou de "Pai da Economia Moderna". Samuelson é peça-chave no estabelecimento da matemática como o método analítico principal da ciência econômica. Em sua obra Fundamentos de Análise Económica, revelou a presença de estruturas comuns em diversos ramos da economia, as quais poderiam ser representadas por meio de expressões matemáticas. Já com o Economics (livro), de longe o livro-texto de introdução à economia mais vendido e utilizado nos cursos de nível superior, Samuelson fez-se um dos mais famosos e bem sucedidos autores da área. Samuelson foi o primeiro norte-americano a receber o Prémio de Ciências Económicas em Memória de Alfred Nobel, fato que ocorreu na segunda edição do evento, em 1970. A designação do trabalho de Samuelson feita pela instituição na ocasião da premiação ressalta a importância múltipla de sua contribuição à disciplina econômica: "pelo trabalho científico através do qual desenvolveu teoria nos campos da economia estática e dinâmica, contribuindo ativamente para aumentar o nível da análise da ciência econômica".[8] Seu trabalho gerou impacto importante sobre a teoria do consumo, a a teoria do capital, o comércio internacional, o mecanismo de preços, a economia matemática, o equilíbrio geral e a dinâmica da economia, as finanças públicas e outras áreas mais, fato que o fez ser considerado um dos grandes economistas generalistas, isto é, um economista cujas pesquisas foram úteis para variados ramos da economia.
[14]
O Teorema de Gödel foi provado por Kurt Gödel em 1936, demonstrou que existem
teoremas cujas provas podem ser drasticamente reduzidas ao se trabalhar em
sistemas axiomáticos mais fortes. Em qualquer sistema formal axiomático
consistente que possa expressar feitos sobre aritmética básica, existem
enunciados verdadeiros que não podem ser provados, e que a consistência do
sistema não pode ser provada dentro do mesmo sistema. Esses são teoremas da
incompletude.
[15]
É um teorema atribuída ao economista Kenneth Arrow, geralmente aplicável aos
sistemas de votação. Reflete o fato de que a agregação de ordens de preferência
individuais não produz uma ordem de preferência coletiva obedecendo, todas, a
certos critérios desejáveis. E, Arrow afirmou que se o corpo de tomada de
decisão tiver pelo menos dois membros e pelo menos três opções para decidir,
então será impossível projetar uma função de bem-estar social que satisfaça a
todas essas condições, assumidas como um requisito razoável de um sistema
eleitoral justo de uma só vez.
[16] A teoria da escolha social ou a escolha social é uma estrutura teórica para a análise da combinação de opiniões, preferências, interesses ou bem-estar individuais para alcançar uma decisão coletiva ou bem-estar social em algum sentido. Um exemplo não-teórico de uma decisão coletiva é a promulgação de uma lei ou conjunto de leis sob uma constituição. A teoria da escolha social data da formulação de Condorcet do Paradoxo de Condorcet. A Escolha Social e os Valores Individuais (1951) de Kenneth Arrow e o teorema da impossibilidade de Arrow são geralmente reconhecidos como a base da teoria da escolha social moderna. Além do teorema de Arrow e do paradoxo da votação, o teorema de Gibbard-Satterthwaite, o teorema do júri de Condorcet, o teorema do eleitor mediano e o teorema de May estão entre os resultados mais conhecidos da teoria da escolha social. A escolha social combina elementos da economia do bem-estar e da teoria do voto. É metodologicamente individualista, na medida em que agrega preferências e comportamentos de membros individuais da sociedade. Usando elementos da lógica formal para a generalidade, a análise procede de um conjunto de axiomas aparentemente razoáveis da escolha social para formar a função do bem-estar social (ou constituição). Os resultados revelaram a incompatibilidade lógica de vários axiomas, como no teorema de Arrow, revelando um problema de agregação e sugerindo reformulação ou triagem teórica ao eliminar alguns axiomas.
*Antônio dos Santos Gama Junior, advogado há dezessete anos. Professor universitário de Direito, Especialista em Direito Civil e Processual Civil. Colunista na Rádio CBN, colunista em Direito do consumidor. Jurista da cidade de Belém do Pará- PA.
*Gisele Leite. Mestre em Direito, Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Articulista e colunistas dos principais sites jurídicos brasileiros. 34 obras jurídicas. Presidente da Seccional RJ da ABRADE (Associação Brasileira de Direito Educacional).