Considerações sobre a Magna Carta de 1215. A fonte de todas as leis fundamentais do Reino
O regime político que se consolidou na Inglaterra, sobretudo, a partir do século XVII, foi o parlamentarismo monárquico. Assim, o poder do rei, ao contrário do que ocorria em outras nações modernas, passou a ser limitado, dando vazão ao controle político do país pelo parlamento. Para se compreender esse modelo saiu vitorioso justamente, é necessário relembrar o primeiro embate entre os nobres ingleses e o rei, ocorrido no século XIII e, ao principal fator resultante disso: Magna Charta Libertatum, assinada em 1215.
De
acordo com René David, em sua obra intitulada Os grandes sistemas do direito
contemporâneo, traduzida por Hermínio A. Carvalho, identificam-se quatro
períodos principais na história do direito inglês. O primeiro é anterior à
conquista da normanda de 1.066[1], é chamado de período do
direito anglo-saxônico.
O
segundo período que compreende de 1.066 até 1.485, com advento da dinastia Tudor.
É correspondente ao período da formação da common law[2].
Nesse momento se desenvolveu um sistema de direito novo, comum a todo o reino,
passando a substituir os costumes locais.
E, o
terceiro período é de 1485 a 1832, foi marcado pelo desenvolvimento de um
sistema complementar e, por vezes, antagônico à common law, que se
manifesta nas regras de equidade, a equity.
O
quarto período é aquele em que a common law fez frente a um notável
desenvolvimento da lei e, se adaptar a uma sociedade dirigida progressivamente
pela administração.
Registre-se
que as condições da common law têm exercido firme influência que
subsiste e, a sua aplicação ocorria em circuitos periódicos nos condados e
posteriormente em Londres, nas Cortes Reais.
Por
motivo de coerência, os juízes depositavam muita confiança nos julgamentos
anteriores de casos semelhantes, o que deu origem à doutrina do precedente
judicial.
Por
volta do século XIII, começaram a circular as decisões dos magistrados,
reduzidas a termo. Criaram-se anuários que foram os precursores dos law
reports.
O
sistema da common law desenvolveu-se na estrita dependência de processos
formalistas e, a partir de um determinado momento, passa a encontrar
dificuldades para desenvolver-se e atender as necessidades da época.
O terceiro
período corresponde à época de maior florescimento da common law. Surge
a equity[3], caracterizada por
ser um recurso à autoridade real diante da injustiça flagrante de alguns casos
concretos.
Encaminhavam-se
petições ao rei ou ao seu conselho, que eram despachadas pelo Chanceler (Kepper
of the Kings Conscience), encarregado de orientar e guiar o rei em sua
decisão. Aos poucos, o Chanceler vai se constituindo em juiz autônomo.
Em
determinadas matérias, o tribunal do Chanceler foi capaz de criar direitos não
conhecidos na common law (caso de fideicomisso e do direito de
propriedade[4],
mesmo que limitado, para mulheres casadas). Em outros casos, ofereceu
alternativa eficiente para prover um remédio ou algum direito que se perdera.
Ajudou a forçar a revelação de fatos e documentos.
Assegurou
ao querelante, caso vencedor, os benefícios do litígio, bem como a proteção de
terceiros diante de eventuais danos decorrentes da lide. As regras da equity
foram se tornando sistemáticas, sem, contudo, se contraporem à common law,
havendo, pelo contrário, uma complementação entre ambas. (In: STRECK,
Lenio Luiz. Jurisdição constitucional e decisão jurídica. 3ª. ed. reformulada
da obra Jurisdição constitucional e hermenêutica. São Paulo: Editora Revista
dos Tribunais, 2013, p. 351-352).
Foi no
quarto período que surgiu a primeira Lei de Organização Judiciária (Judicature
Act) que, no ano de 1873, fundiu as jurisdições de common law e de equity,
porém, manteve a distinção dos remédios baseados na common law e
daqueles tratados na equity[5].
A
partir dos Judicature Acts, uma única corte passou a aplicar as
diferentes regras para o caso. Outra contribuição importante dos Judicature
Acts para o direito inglês foi a edição de um código procedimental: Rules of
the Supreme Court, denominado The White Book, emendado de
tempos em tempos.
Já o Apellate
Act de 1876 estabeleceu regras para a revisão das decisões por uma corte
superior. As reformas processuais de 1873- 1875 implicaram uma nova organização
judicial centralizada, uma vez que desapareceu a distância entre tribunais de
common law e tribunais de equity.
A
partir de então, todas as jurisdições inglesas resultaram competentes para aplicar
tanto um como outro sistema. Assim, os juízes de equity inspiraram-se
nas soluções dadas por seus antecessores, e essa evolução institucional levou o
parlamento a assumir a função inovadora que teve a seu cargo – nas centúrias
precedentes – o chanceler.
Outro
período é desde 1.832 até os nossos dias e, nos interessa para analisar o que
representou a Magna Carta inglesa ou Magna Charta Libertatum,
cuja data fundamental foi o ano de 1.066, quando a Inglaterra fora conquistada
pelos normandos.
Observa-se
que o domínio romano que perdurou por quatro séculos na Inglaterra, do
Imperador Cláudio até o começo do século V, deixou poucos vestígios. Para seus
historiadores, a história do Direito inglês, tem início, portanto, na época em
que, cessado o domínio romano, diversas tribos de origem germânica, saxões,
anglos, dinamarqueses e partilharam entre si a Inglaterra.
Foi
nesta época que a Inglaterra, com a missão de Santo Agostinho de Canterbury, em
596, converte-se ao Cristianismo. E, as leis foram redigidas após a conversão,
ao contrário das outras leis bárbaras redigidas em latim, doravante foram
redigidas em língua anglo-saxônica.
Tais leis
tanto as bárbaras como as anglo-saxônicas apenas regulam aspectos muitos
limitados das relações sociais. É o caso das leis de Aethelbert, Rei de Kent,
redigidas em língua anglo-saxônica em 600, que comportam apenas noventa breves
frases.
Sobre
as leis do rei dinamarquês Canuto (1017-1035), quatro séculos posteriores, são
mais elaboradas e anunciam a clara passagem da era tribal para a feudal. O
princípio da personalidade das leis, então, cede espaço para uma lei
territorial.
Não
obstante o país estar submetido a um único soberano, o direito em vigor
mantém-se como um direito estritamente local, não havendo um direito comum para
toda a Inglaterra antes da conquista normanda.
O
principal acontecimento da história do direito inglês está relacionado com a
Magna Carta porque a fomentou é a conquista normanda. Quando Guilherme, o Conquistador,
intenta reinar na Inglaterra como o sucessor do Rei Eduardo, o Confessor[6], e não pelo direito de
conquista. E, proclamou expressamente que o direito anglo-saxônico se mantém em
vigor. Com Guilherme veio para a Inglaterra um poder forte e centralizado,
enriquecido pela experiência vivida no Ducado da Normandia.
É
exatamente neste período da história que a época das tribos desaparecerá, vindo,
então, a se instalar o feudalismo. Porém, esse feudalismo é diferente do que se
verificou na França, na Alemanha e mesmo na Itália[7].
E, há
uma razão estratégica que justifica essa diferença, pois Guilherme veio para a
Inglaterra acompanhado de senhores normandos. E, esses senhores doravante,
encontram-se num país conquistado, cuja língua lhes é estranha e cujos
habitantes e costumes são por estes desprezados. Enfim, para defender a
conquista e as suas propriedades, eles sentem a necessidade de se agrupar em
torno de seu soberano.
E, Rei
Guilherme, a seu turno, sabia que os vassalos muito poderosos podem ser
ameaçadores e perigosos. E, então, na distribuição das terras aos seus súditos
não formar nenhum grande feudo a afim de que nenhum barão possa com ele
rivalizar em poder.
E,
assim os senhores ficam dependentes diretamente do rei, podendo ser comparados
com exército acampado na Inglaterra, dotado pois, de um espírito de organização
e disciplina. E, tal espírito se manifestará a partir de 1.086 na redação Domesday,
documento onde foram referenciados os quinze mil domínios ou manors e os
duzentos mil lares então existentes na Inglaterra.
´Foi
esse caráter militar e muito organizado que irá permitir o desenvolvimento da common
law, o direito comum de toda a Inglaterra, em oposição aos costumes locais.
E, foi depois da conquista normanda que surgiu a Carta Magna.
A
Magna Carta na condição de legislação alicerce, tornou-se uma espécie de lei de
salvação nacional. Afinal, as invasões normandas acabaram de fincar os
sentimentos nacionalistas anglo-saxônicos e as espoliações dos soberanos
fizeram com que tivesse que buscar um documento para regular a conduta do rei
em face do clero, da nobreza, da burguesia e, indiretamente, das classes
servis.
E, o
desgosto contra o invasor, então viria atingir seu auge durante o reinado
despótico de João Sem Terra (Lackland) que era o quarto filho de
Henrique II e de Leonor de Aquitânia, quando os ingleses que eram habituados
com as antigas leis baseadas nos costumes, se conjuraram na luta pela segurança
e estabilidade do passado, realidade que lhes havia sido retirada.
A
propósito, João Sem Terra[8] ganhou tal apelido porque
seu pai, ao repartir seus domínios, apenas distribui-os entre seus três filhos
maiores, ficando João prejudicado.
Apesar
disso, João começou a reinar em 1199, em decorrência do falecimento prematuro
de seus irmãos Henrique e Godofredo, e como sucessor de seu outro irmão,
Ricardo Coração de Leão. Dita sucessão, porém, era discutível, pois seu direito
à coroa não era claramente melhor que o do seu sobrinho Artur, filho de
Godofredo.
A
candidatura de João pareceu ter prevalecido sobre a de Arthur porque este, na
condição de Conde da Bretanha, se achava sob a influência do Rei da França
Felipe Augusto (Felipe II), sendo considerado um terrível perigo para a
independência da Inglaterra, o que, de fato, viria se confirmar na guerra
posterior entre João e Felipe Augusto, este ajustado por Arthur.
É
nesse contexto que se situa um acontecimento de certo modo lendário e que
terminou por marcar a imagem pública de João Sem Terra como uma pessoa cruel e
traiçoeira. João prendeu o sobrinho Arthur durante o assédio do Castelo de
Mirabeau, depois mandando encerrá-lo em um calabouço Rouen,
Supostamente,
o próprio rei tê-lo-ia assassinado. João não tinha escrúpulos e se dispunha a
fazer tudo para obter e conservar o poder.
E,
teria intentado depor do trono seu irmão Ricardo quando este se encontrava
ausente, na terceira cruzada e, durante o seu cativeiro posterior na Alemanha.
E, nesse período, também rendeu vassalagem ao Rei da França e depois lhe cedeu
parte das posses na Normandia com a esperança da sua ajuda para ganhar a coroa
inglesa.
Mais
tarde, já no trono, tornou-se vassalo do Papa, doando-lhe o Reino da Inglaterra
e da Irlanda. Por isso, afirma-se que três poderes[9] rivais constantemente
desafiavam o poder de João: o do Rei da França, o da Igreja Católica e, ainda,
o dos barões ingleses[10]. Em tais situações de
fraqueza, João não pestanejou em fazer a cada um destes concessões relevantes
que logo viria desrespeitar.
Em sua
origem, a Magna Carta, portanto, encontra-se sua luta contra esses três
poderes. A guerra de João contra Felipe Augusto, cujo objetivo era recuperar a
Normandia e foi ganha pela França, que, assim, acabou com as perspectivas de um
império continental (o Conde de Flandres e o Imperador Otto, da Alemanha,
haviam se aliado a João). Todos os fatos ocorreram em 1214, antes do
aparecimento da Magna Carta, enfraquecendo João e debilitando seu poder.
Também
foi relevante o conflito de João com a Igreja e, surgiu tal conflito como um
pleito pela designação do sucessor de Hubert Walter no arcebispo de
Canterburry, assento de primazia da Inglaterra.
Os
monges elegeram dois candidatos, sendo um deles patrocinados pelo Rei João e, o
pleito sucessório ficou subordinado ao Papo Inocêncio III, que rechaçou os dois
candidatos eleitos e nomeou Stephen Langton como arcebispo.
João
negou-se, terminantemente, a reconhecer Langton que era um inglês formado pela
Universidade de Paris e que detinha notável reputação intelectual porque não
queria renunciar àquela que considerava uma das suas principais
prerrogativas. Em resposta Inocêncio
III, decretou
um
interdito da Inglaterra, no sentido de proibir a administração dos sacramentos,
com exceção do batismo. A pressão papal majorou tanto até o ponto de ser
decretada a excomunhão do Rei João que, inclusive, teve lançada contra si uma
cruzada, cabendo, então, a Felipe Augusto a tarefa de sua destituição.
Já em
1213, às vésperas da temida invasão francesa, o Rei João aceitou os termos da
reconciliação com a Igreja, sugeridos pelo legado papal chamado Pandolfo de
Milão, proclamando-se vassalo feudal do Papa e também aceitando Langton como
arcebispo de Canterbury em prestigiada e solene cerimônia de arrependimento.
Em
pouco tempo depois de seu retorno para a Inglaterra, Stephen Langton conseguiu
agrupar os barões em torno de um programa de reformas que ficaria plasmado na
Magna Carta. E, boa parte dos barões já queria há algum tempo rebelar-se contra
João. O descontentamento, em boa parte, era provocado pelo aumento e pela
arbitrariedade das exações exigidas por João Sem Terra no exercício de seus
direitos feudais a fim de financiar suas campanhas da França.
Esse
desconforto foi que Langton, então, conseguiu canalizar, desconforto que restou
patente ante a negativa de alguns barões de homenagear o Rei em 5 de maio de
1215 e, que foi convertido em s suporte a um documento chamado "Os artigos
dos barões", que é, basicamente, o modelo da Magna Carta.
Assim,
os barões ingleses, então, impuseram a João Sem Terra a outorga da Magna Carta.
Jayme de Altavila, na verde campina de Runnymede, condado de Surrey, foi
levantado um suntuoso pavilhão, sobre o qual tremulavam as flâmulas inglesas,
bordadas de leões ameaçadores e inofensivos.
E,
sentado sobre um trono e, tendo à frente toda a fidalguia não submissa apoiada
nos punhos de espadas embainhadas, João Sem Terra ouviu o preâmbulo e as
sessenta e sete cláusulas da Magana Carta.
Segundo
F. Uchoa de Albuquerque, seriam 63 (sessenta e três)[11] artigos, e não 67,
incorrendo em erro, portanto, nesse aspecto, Jayme de Altavila. Os textos
encontrados na Enciclopédia Britânica e em Constitutions of Nations,
de Amos J. Preslee, e em Development of European Civilization, de
Clarence Perkins, dão conta de 63 (sessenta e três) artigos tão-somente, não se
sabendo o porquê do excesso dos quatro artigos referidos por Altavila.
Após
um longo silêncio perigoso e angustiante, o Rei João assinou o compromissou e
mandou apor o selo de autenticidade. (In: ALTAVILA, Jayme de. Origem dos
direitos dos povos. 4ª. ed. São Paulo: Edições Melhoramentos, 1964, p. 114).
F. Uchoa de Albuquerque é da opinião de que, por
ser João Sem Terra um analfabeto, não podia ter procedido em relação à
aceitação da Magna Carta da maneira como indica Jayme de Altavila.
Outros
juristas, segundo Uchoa de Albuquerque, também se mostrariam indignados com
quem quer que afirme ter sido a Magna Carta assinada por João Sem Terra. (In:
ALBUQUERQUE, F. Uchoa de. Sobre a carta política de João sem Terra. In: Revista
da Faculdade de Direito. UFC, p. 153-163. http://www.revistadireito.ufc.br/index.php/revdir/article/viewFile/380/323 Acesso
em 17.4.2023).
Questiona-se
se a Magna Carta seria uma criação original? O que é, afinal, a Magna Carta?
Para o doutrinador Jayme de Altavila aconselha que não seria bom tentar
conceituar preliminarmente a Magna Carta como sendo uma criação original,
tampouco sendo um modelo constitucional.
De
fato, foi espelho de seu tempo e de seu mundo, fruto de uma realeza
fraudulenta, pois no tempo do Rei João Sem Terra, o que havia na Inglaterra era
um desajuste entre a coroa e os homens herdeiros de uma tradição de honra e
liberdade.
Assim,
a Magna Carta retratou tais fatores decisivos de sua elaboração e das lutas de
mais de meio século para haver seu pleno reconhecimento e aplicação. Dessa
forma, a Magna Carta encerra uma era histórica e reabre outra, devendo ser
vista como uma crisálida de ou modelo imperfeito de constituições posteriores.
Realmente
a Magna Carta não representou um código original na Inglaterra e, desde 1213, o
arcebispo Langton, considerado o cérebro da conspiração, havia despertado
tamanho entusiasmo ao reunir secretamente os barões para lhes lera Carta de
Henrique I, de que todos haviam esquecido e garantia o respeito dos direitos e
costumes dos súditos.
A
Magna Carta, assim, tem origens longínquas, pois reproduz com maiores detalhes
uma carta de Henrique I, que, por sua vez, pretendia estar vinculado às leis de
Eduardo, retomando assim a cadeia que liga as instituições da Inglaterra
anglo-normanda às da época anglo-saxã. (In: PACHECO, Cláudio. Novo
tratado das constituições brasileiras. v. 2. Brasília: Offset, 1992, p. 3).
Segundo
Altavila, o recuo histórico porém foi amparado num estudo de Hersílio de Sousa,
vai além de Rei Henrique I e, a ascendência da Carta Magna encontrar-se-ia no
doutrinador Hersílio de Sousa também reivindica para o direito romano a
instituição democrática do júri, enraizando, ainda, o habeas corpus no
direito romano.
Destacou
ainda que o habeas corpus, a mais eficaz e pronta garantia que se supõe
ter o povo inglês descoberto para felicidade do gênero humano civilizado, já
encontra suas raízes no Digesto 4.4., Título 29, I, I, pelo interdito homine
libero exhibiendo por força do qual o pretor ainda protegia a liberdade do
cidadão, de qualquer modo violada, sem prejuízo do respectivo processo criminal
e que servia também para defender o exercício do pátrio poder dominical.
Ressalte-se
que o objetivo da Magna Carta era o de corrigir os abusos que provinham dos
costumes feudais sob o despotismo de Guilherme, o Conquistador e, seus
sucessores. A condição dos europeus, na época, era de pauperismo.
A
situação do povo inglês era pior do que a da plebe romana antes das Doze
Tábuas. E, não havia órgão legal, nem palavra autorizada em defesa de sua honra
e de seus bens. Praticamente era impossível a existência pacífica de uma
propriedade livre, encravada no latifúndio feudal.
Assim,
a Magna Carta realizou apologia as velhas leis inglesas, dos antigos soberanos
e do tempo de Henrique II, o imaginador de um tribunal em cada província
visando evitar que os litigantes tivesse de correr durante anos no encalço de
seus juízes, criando, com isso, um freio às investidas das autoridades
judiciárias, deixando nitidamente gravado o que era proibido vexar a quem quer
que seja. o Lácio e teve por principal redator um doutor da Universidade de
Bolonha, portanto, do direito romano.
Portanto,
a Magna Carta não firmou apenas privilégios para a nobreza e a prelazia e, seus
princípios jurídicos eram corretivos e democráticos e, a sua influência é
visível em todas as Constituições modernas.
Seus
redatores e defensores perante a Corte Inglesa tivera, a compreensão da
imperiosa necessidade da união nacional da solidariedade ativa de todos os que
seriam por esta beneficiados e protegidos. Apesar da indiferença da nobreza em
relação ao povo, a prelatura que constituíra a alma do movimento era culta.
Daí, a possibilidade de sua influência extensiva às classes mais humildes da
nação.
A
Magna Carta veio corporificar princípios e normas específicas a fim de
preservar uma legalidade que, inserida num ambiente de alto nível de
consciência e sofisticação jurídica, predominante em todo o Ocidente nos
séculos XII e XIII, exigia muito mais que preceitos abstratos de justiça,
equidade, consciência e razão.
Embora
tenha influenciado as constituições modernas, a Magna Carta não é a
Constituição inglesa. Ela é apenas um antecedente do direito constitucional da
Inglaterra. Juntamente com outros documentos, cartas e petições, decisões e
precedentes[12],
a Magna Carta é formadora da constituição dos ingleses; é, pois, um dos
elementos que concorrem para a formação da constituição inglesa. Não há, assim,
na Magna Carta o esquema de uma Constituição ou de um sistema de governo.
O
conteúdo da Magna Carta, portanto, não se assemelha à declaração de direitos de
uma Constituição. Os sujeitos dos direitos não são os cidadãos contemplados em
abstrato, como titulares de uma relação jurídica frente ao Estado. Ao contrário, na Magna Carta há uma enumeração
prolixa e bastante desordenada dos direitos dos participantes nas relações de
autoridade e submissão, diversas e desiguais, típicas do feudalismo
Apesar
da indiferença da nobreza em relação ao povo, a prelatura que constituíra a
alma do movimento era culta; daí a possibilidade de sua influência e de sua
clarividência extensiva às classes inferiores da nação.
A
Magna Carta veio corporificar princípios e normas específicas a fim de
preservar uma legalidade que, inserida num ambiente de alto nível de
consciência e sofisticação jurídica, predominante em todo o Ocidente nos
séculos XII e XIII, exigia muito mais que preceitos abstratos de justiça[13], equidade, consciência e
razão.
As
constituições modernas, a Magna Carta não é a Constituição inglesa. Ela é
apenas um antecedente do direito constitucional da Inglaterra. Juntamente com
outros documentos, cartas e petições, decisões e precedentes, a Magna Carta é
formadora da constituição dos ingleses; é, pois, um dos elementos que concorrem
para a formação da constituição inglesa.
Trata-se,
sim, explicou Miguel Satrústegui Gil-Delgado, de uma miscelânea de normas de
mais diversa índole e significação, e somente algumas tratam de assuntos que
hoje se consideram próprios do Direito Constitucional[14].
O conteúdo
da Magna Carta, portanto, não se assemelha à declaração de direitos de uma
Constituição. Os sujeitos dos direitos não são os cidadãos contemplados em
abstrato, como titulares de uma relação jurídica frente ao Estado.
Ao
contrário, na Magna Carta há uma enumeração prolixa e bastante desordenada dos
direitos dos participantes nas relações de autoridade e submissão, diversas e
desiguais, típicas do feudalismo.
A
Magna Carta confirmou e precisou solenemente as relações entre o rei e os
súditos, que vinham sendo observadas desde sempre em forma consuetudinária;
relações essas que garantiam a liberdade dos súditos.
Portanto,
apesar de se encontrar na Magna Carta a base da evolução posterior do
constitucionalismo inglês - que para ela sempre remete -, o documento era um
dos pactos jurados entre rei e vassalos, muito frequentes no Direito feudal.
A
Magna Carta limitou-se, em boa medida, a confirmar os direitos feudais
existentes ou a restabelecê-los, quando haviam sido alterados
discricionariamente pelo poder dos reis.
A principal garantia processual da Magna
Carta, por exemplo, está no seu Capítulo XXXIX, estabelecendo que nenhum homem
livre será detido ou aprisionado ou despossuído ou colocado fora da lei ou de
qualquer maneira destruído, nem o condenaremos, nem lhe imporemos prisão,
exceto pelo juízo legal de seus pares ou conforme às leis do país.
A
Magna Carta deve sua fama a essa cláusula. O texto, como já referido, não cria
o procedimento de habeas corpus, mas consagra a dupla garantia do iudicium
parium suorum e da lex terrae.
O
primeiro significa o julgamento por jurados, excluindo que alguém pudesse ser
condenado por um tribunal ou uma comissão especial dependente do rei.
A
segunda exigência, alternativa ou complementar a anterior, consiste em que o
julgamento se faça conforme as leis do país. Trata-se, diz Satrústegui Gil-Delgado, de um
requisito ambíguo, que chegou a ser entendido às vezes como equivalente ao
primeiro (afinal, as leis do país, o Common Law, exigiam o julgamento
por jurados desde o século XII).
Acabou
prevalecendo, porém, uma interpretação da lX terrae como uma garantia de
conteúdo mais amplo, como o direito ao devido processo legal (due process of
law), ou seja, o direito à legalidade processual em todos os seus aspectos
ou o direito a um julgamento justo.
Quando
se trabalha com o due process of law, a atenção se volta aos chamados
princípios fundamentais, que são aqueles princípios adotados pelo sistema
jurídico, pela Constituição de um país, mediante critérios
político-ideológicos.
Dentre
eles destaca-se o princípio do devido processo legal, previsto no art. 5º, LIV,
da Constituição da República Federativa do Brasil, podendo ser considerado a
base de todos os outros princípios, nestes termos: Art. 5º (...) LIV - ninguém
será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal. Dito
princípio tem origem na Magna Carta inglesa de 1215, onde, no art. 39, fez-se
referência à law of the land.
O uso
da expressão, todavia, aparecerá somente em 1354, na Lei inglesa baixada no
reinado de Eduardo III, denominada Statute of Westminster of the
Liberties of London, por meio de um legislador desconhecido (some
unknown draftsman).
Posteriormente,
aparecerá também na Declaração dos Direitos de Maryland, em 1776, nos Estados
Unidos. A chamada cláusula due process of law, em que pese trazer
ínsita a ideia de processo, não indica apenas a tutela processual.
Ela é
bipartida de tal forma que podemos dividi-la em substantive due process, que é
a incidência do princípio em seu aspecto material, e procedural due process,
que representa a tutela do direito material por meio do processo.
O
devido processo legal, assim, manifesta-se em todos os campos do direito em seu
aspecto substancial, tais como: o princípio da legalidade no direito
administrativo: o administrador só faz o que a lei permite; age secundum
lege; a proibição da retroatividade da lei penal; a garantia dos direitos
fundamentais no direito constitucional, etc. Em sentido processual, a
expressão, porém, é mais restrita: diz respeito aos padrões próprios do
processo.
No
processo penal, por exemplo, ela se manifesta de várias formas: direito à
citação e ao conhecimento do teor da acusação; direito a um rápido e público julgamento;
direito ao contraditório; direito a arrolar testemunhas; direito à igualdade
entre acusação e defesa; direito de não ser acusado nem condenado com base em
provas ilícitas; direito à assistência judiciária gratuita.
No
processo civil, a cláusula manifesta-se nos seguintes direitos e garantias,
dentre outros: igualdade das partes; garantia do direito de ação; direito de
defesa; direito ao contraditório, etc.
A
cláusula procedural due process of law é, portanto, a possibilidade
efetiva de a parte ter acesso à justiça, deduzindo pretensão e se defendendo do
modo mais amplo possível. (In: NERY JÚNIOR, Nelson. Princípios do
processo civil na Constituição Federal. 2ª. ed. rev. e aum. São Paulo: Revista dos Tribunais,
1995, p. 33-38).
A
Magna Carta manifesta-se como uma ordenação que invoca e se justifica na
tradição. Aliás, a interpretação
prevalecente - exposta, por exemplo, no século XVIII, por um jurista liberal do
porte de Blackstone – é a de que a Magna Carta recupera os princípios do velho
direito saxão, anterior aos normandos, e tempera, atenua o rigor do sistema
feudal estabelecido pelos conquistadores.
Blackstone
tentara dar uma aura transcendental ao common law. Segundo ele, o common law
tinha raízes no direito costumeiro saxônico, que, na verdade, era direito
natural, especificamente a lei de Deus do modo como a razão humana a havia
percebido em épocas mais esclarecidas.
Assim,
Blackstone deu ao common law um pedigree de direito natural. (In:
POSNER, Richard A. Problemas de filosofia do direito. Tradução Jefferson Luiz
Camargo; revisão técnica e da tradução Mariana Mota Prado. São Paulo: Martins
Fontes, 2007 (Coleção justiça e direito), p. 17-18).
Esse
significado tradicional e restaurador da Magna Carta, porém, não dá conta
suficiente de alguns dos seus preceitos que supuseram uma inovação indiscutível
e revolucionária: uma revolução antimonárquica de caráter nobiliário.
Em
primeiro lugar, o Capítulo XII, que requeria a autorização do common council
of our kingdom, um órgão que pode ser considerado o antecessor do
parlamento, para a imposição do scutage (do latim scutagium ou
serviço de escudo), que era uma contribuição substituta do serviço de armas que
os feudatários do rei eram obrigados a prestar quando não se incorporavam pessoalmente
ao exército real.
Esse
preceito exigia também a aprovação do conselho comum do reino para as aids, que
eram uma classe de contribuições solicitadas pelo rei, sem fundamento em uma
obrigação feudal precisa.
Essa
cláusula atribuía um poder muito importante ao conselho comum do reino, por
mais que possa ser exagerada a interpretação posterior de que aqui está o
embrião do poder tributário do parlamento, pois o termo parlamento ainda não é
utilizado nesse documento e porque o direito a ser convocado ao conselho comum
do reino é reservado exclusivamente aos prelados da Igreja, os príncipes nobres
e aos demais feudatários do rei.
Qualquer
violação da carta poderia ser denunciada
ante o rei ou, se ausente do reino, ante seu ministro da justiça (Justiciary),
por quatro desses barões, e, no caso de não se remediar o excesso denunciado, em um prazo de
quarenta dias, esses quatro barões poderiam apelar ao conselho dos vinte e
cinco que, com o concurso de todo o país
– segundo proclama o Rei na Magna Carta-, nos atacarão e nos assediarão com
todos os meios de que sejam capazes, isso é, tomando nossos castelos, terras e
posses e por quaisquer outros meios em
seu poder, até que o excesso haja sido remediado, com a única exceção de
preservar a pessoa real ilesa, a rainha e os filhos do Rei.
Adicionalmente,
a Magna Carta justificava a rebelião popular contra o rei, ao autorizar
qualquer pessoa a jurar obediência às ordens dos vinte e cinco barões, chegando
inclusive a ordenar que prestassem esse juramento aqueles que estavam
relutantes em fazê-lo.
Esse
preceito, na realidade, evidenciava que os barões não tinham fé num pacto com
João Sem Terra e que se preparavam para depô-lo, como já haviam intentado fazer
com anterioridade. Sua rebelião podia agora justificar-se na própria Magna
Carta, o que era muito ruim para João.
Por
isso, embora se tenha chegado a eleger o primeiro conselho dos vinte e cinco, o
Rei nem respeitou a Magna Carta e sequer se submeteu aos seus vinte e cinco
guardiões, amparado que estava pela posterior declaração de nulidade do
documento pronunciada pelo Papa Inocêncio III.
As
cláusulas mais revolucionárias da Magna Carta – as relativas ao poder
tributário do conselho comum do reino e a eleição dos vinte e cinco barões –,
mais tarde, foram, então, depuradas da versão posterior da Magna Carta, que foi
confirmada pelo sucessor de João, o jovem Rei Henrique III, com a desculpa
genérica de que em alguns capítulos da primeira Carta havia conteúdos que
pareciam gravosos e duvidosos (weighty and doubtful).
A
revolução operada no mundo britânico com a Magna Carta foi, assim, uma revolução
de caráter jurídico. E, isso representa uma vantagem porque, possivelmente, uma
vitória armada, com o destronamento de João Sem Terra[15], não iria produzir, por
séculos afora, uma impressão tão demarcadora dos princípios constitucionais.
Até a
Magna Carta ser definitivamente reconhecida e respeitada pela coroa, levou mais
de meio século. Seus favores políticos, portanto, não foram gozados de
imediato.
Nem
pelo alto clero, nem pela nobreza, nem pelos burgueses e nem pelos servos. E,
embora nem sempre tenha sido respeitada, sempre foi invocada como salvaguarda;
e, neste caso, com êxito.
A
Magna Carta, portanto, nem sempre conseguiu exercer a função controladora sobre
o poder real; foi mais de uma vez repudiada e nem sempre teve um cumprimento
correspondente à finalidade para a qual foi criada. Isso, porém, não se deu
porque sua estrutura não condissesse com as razões da sua existência.
O seu
relegamento, explicou Jayme de Altavila, foi uma reação da autocracia tocada
pela letra de fogo da lei de salvação nacional. E, a benemerência de uma
legislação nem sempre está na sua imediata objetividade. Ela pode existir em
potencial, até o momento em que se evidencie em toda a plenitude, reparando as
injustiças anteriores e exercendo um sentido de realidade benéfica.
A
redação definitiva da Magna Carta remonta a 1225. Foi assim mantida viva no
reino inglês e, foi constantemente evocada nos séculos subsequentes, de modo
que as mesmas fórmulas foram adquirindo significados novos. Edward Coke,
jurista e juiz no século XVII, viria qualificá-la, então, como a fonte de todas
as leis fundamentais do reino[16].
As
diferenças básicas existentes entre o common law e o direito brasileiro,
é que o common law possui uma filosofia pragmática, portanto, ele parte
do caso concreto para solucionar as controvérsias presentes e futuras, enquanto
o direito brasileiro é de dedutivo, ou seja, ele parte das construções teóricas
para então estabelecer princípios. Desta forma, tem-se o último constituído por
elementos formais e o primeiro por elementos variáveis.
À
primeira vista, o Common Law é o oposto do direito romano-germânico e,
por ser essencialmente jurisprudencial, enquanto o último é lastreado em leis
devidamente votadas. Tais diferenças não aparecem de surpresa, pelo contrário, estas
ocorreram devido à história.
O
Direito inglês se deixou influenciar pelo direito romano desde 1731 e, mesmo
sendo a influência muito tênue, até essa data o latim ainda era usado na
linguagem jurídica inglesa, acarretando algumas influências do ponto de vista
factual, como no caso da Constituição inglesa, que foi escrita em latim por um
doutor da Universidade de Bolonha e, posteriormente, no século XVI, traduzida
para o inglês. Além da Magna Carta, o Common Law tem como influência
romana o habeas corpus, mortgage(hipoteca) e o júri.
Apesar
das revoluções do século XX, o Common Law demonstrou adaptar-se bem às
leis sem perder sua característica fundamental. E, a rivalidade existente entre
as duas famílias jurídica dá alguns lugares para semelhanças, em matéria de
ordem social, tanto o common law quanto o direito continental consideram
os direitos subjetivos do indivíduo; quanto ao Estado de Direito, em ambas
ocorre a separação dos poderes e, há outras semelhanças como a extensão de
conceitos, harmonização dos textos de leis, trocas de juristas, comparação de
soluções jurisprudenciais e de processos.
Atualmente,
com o Código de Processo Civil brasileiro de 2015 ampliou sensivelmente as
hipóteses de decisões vinculantes no ordenamento jurídico brasileiro, o que
acirro a controvérsia a respeito da compatibilidade ou não da utilização de tal
mecanismo com nosso sistema jurídica de tradição da civil law.
A
vinculação a determinadas decisões judiciais anteriores, estabelecida e
ampliada pelo Código Fux, não equivale à instituição de sistema do precedentes
judiciais, instrumento integrante do common law[17].
De
qualquer forma, a vinculação a decisões judiciais anteriores busca o mesmo
objetivo pretendido com a efetivação dos precedentes vinculantes, utilizado
pelo common law, a partir do século XIX, para a garantia da segurança
jurídica.
Na
verdade, o que tem sido observado no mundo todo é uma aproximação entre estas
duas famílias de direito, com a adoção de normas gerais e abstratas pelo common
law, enquanto o civil law se utiliza, cada vez mais, do mecanismo de
vinculação a precedentes.
A evolução do sistema jurídico de tradição civil law[18], que resultou em uma maior liberdade dos magistrados na interpretação dos textos legais para criação da norma adequada ao caso concreto, acabou por gerar a necessidade de adoção de mecanismos para uma maior coerência e integridade das decisões judiciais.
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Generale Dalloz, 1971.
Notas:
[1]
O ano de 1066 é sempre considerado como o marco efetivo do nascimento da
monarquia britânica. Em 14 de outubro desse ano, o duque normando Guilherme
(1035-1087), cujo agnome é “o conquistador”, venceu as tropas anglo-saxãs do
rei Harald, iniciando o longo domínio normando sobre as ilhas britânicas e
refundando a história daquele país. O conflito ocorreu no velho Sussex e passou
à posteridade como Batalha de Hastings. Com Guilherme vieram nobres
franco-normandos que constituíram a elite nacional por séculos e, até os dias
de hoje, a referência a alguma antepassado que chegou às ilhas “com o
Conquistador” é algo que confere enorme status.
[2]
A common law é aquela parte do direito que não tem a sua
fonte/nascedouro nas leis ou regulamentos emanados dos poderes legislativos ou
executivos da Federação ou dos Estados dos Estados Unidos da América. Em sua origem a common law era uma síntese
mais ou menos arbitrária daqueles princípios consuetudinários que pareciam como
os mais razoáveis ao juiz julgador. O surgimento da common law não tem uma data
precisa. É um corpo de normas que se formaram, passo a passo, através dos
séculos, até tomar corpo e forma separados dos usos e costumes que lhe deram
origem. Se há uma data aproximada que pode ser tomada como marco referencial,
há certa concordância entre os diversos autores que esta data deveria ser 1066
A. D. (século XI) quando Guilherme, o
Bastardo, Duque da Normandia (William the Conqueror), derrota o rei
inglês Harold que fora eleito Rei da Inglaterra após a morte de Eduardo, o
confessor – e coroado em Westminster. Registra ANDRÉ TUNC que o normando
invasor introduziu o feudalismo na Inglaterra, mas decidiu manter em vigor o
direito anterior à sua conquista.
[3]
Considerando que normas legais da common law não podem ser formuladas com tal
precisão que resolvam adequadamente toda e qualquer contingência ou hipótese
legal possível, pode acontecer que ocorram injustiças pela aplicação inadequada
da norma da common law. Para resolver e remediar tais injustiças da common
law, é que se desenvolveu o direito de equidade (equity). Na Idade
Média em vez de usar a expressão law of equity era muitas vezes usada a
expressão direito da consciência law of conscience. Fundamentalmente a law of equity é tão antiga
quanto a common law escrita mas a lei de equidade não era ainda necessária ser
aplicada ou utilizada pois a common law ainda era bastante flexível,
fluida e informal. No entanto na medida em que a common law se tornava mais
rígida e consolidada, as suas regras estritas quanto à produção de provas
começaram a criar problemas e injustiças.
[4]
Na área da LAW OF PROPERTY (propriedade), continua existindo e
funcionando o TRUST e continua a jurisdição da Equity em relação às hipotecas.
Até 1926 não era possível na Inglaterra hipotecar uma propriedade sem criar “um
interesse em equidade”, ou seja, “equitable interest”. O devedor hipotecário
(MORTGAGOR) ou transmitia ao credor (MORTGAGEE) a plena propriedade do bem dado
em garantia, retendo para si apenas um interesse em equidade, com o direito de
resgatar o domínio sobre a coisa dada em hipoteca pagando a dívida, ou então
fazendo o contrário, isto é, retendo o pleno domínio sobre a coisa hipotecada
outorgando ao credor hipotecário apenas um “equitable interest” no bem. Esta
última fórmula ainda é praticada hoje em dia, embora desde o advento dos
Property Acts haja uma regulamentação para as hipotecas (LAW OF PROPERTY ACT
1969, LAND CHARGES ACT 1972, LAND REGISTRATION ACT 1966 E LAND REGISTRATION AND
LAND CHARGES ACT 1971).
[5]
As decisões tomadas por equity merecem observação à parte. Pois é sabido pelos
estudiosos de hermenêutica jurídica, a equidade é o ideal de justiça aplicado
ao caso particular. Não tem regra própria, por impossível prever todas as
situações a que aquela se impõe. Na hierarquia dos valores jurídicos estão, em
grau ascendente, a Lei que é mera serva do direito e o Direito, que é servo da
Justiça. O direito inglês é também
reverente a esse princípio sublime e por condizer a equity com o caso
particular, ela só se incorpora à regra do precedente quando perde sua
característica originária, por ser uma pluralidade de decisões semelhantes,
noutras palavras, deixa de ser equity para converter-me em common law.
[6]
Eduardo, o Confessor (1003 — Palácio de Westminster, 5 de janeiro, 1066) foi o
penúltimo Rei saxão da Inglaterra, entre 1042 e 1066 e um santo da Igreja
Católica. Era filho de Etelredo II e de Ema da Normandia. O exílio na Normandia
teve bastante influência no reinado de Eduardo, nomeadamente no favor que
concedia aos nobres normandos em desfavor dos saxões e dinamarqueses. A
discórdia entre os súditos aumentou e Eduardo acabou por casar-se com Edite,
filha de Goduíno de Wessex, em 1045 para acalmar a situação. O pai de Edite mostrou-se
inicialmente favorável, mas depois se revelou um opositor, interessado nas
regalias que poderia o reinado inglês oferecer. O casamento não durou e gerou
dois filhos. Edite e Eduardo se tornaram profundos amigos. Quando Eduardo
morreu em 1066, o seu primo Guilherme, Duque da Normandia declarou-se seu
sucessor baseado numa alegada promessa de Eduardo em lhe deixar a coroa da
Inglaterra. Os nobres ingleses elegeram Haroldo II, filho de Goduíno de Wessex,
mas Guilherme invadiu Inglaterra com um exército de 7 000 homens e derrotou-o
na Batalha de Hastings.
[7]
Se o Direito alemão é um “direito dos professores”, na Inglaterra tem-se um
“direito dos juízes”. Embora não se encontre na Inglaterra uma realidade na
formação jurídica como a norte-americana, o modelo inglês diferencia-se
fundamentalmente de seus congêneres continentais pela ausência de centralidade
do professor. Os ingleses atribuem essa posição de preeminência ao juiz e ao
advogado, neste último caso, mais precisamente, aos barristers, que “são geralmente
juristas altamente qualificados, gozando de grande prestígio social” e que
“constituem a elite da profissão e é entre eles que são recrutados os juízes
dos tribunais superiores”.
[8]
Nem João, nem seu irmão Ricardo nasceram para serem reis. Dentre os homens (na
Inglaterra da época, as mulheres não podiam ocupar o trono), João era o quinto
filho do Rei Henrique II e de Leonor de Aquitânia; Ricardo, o terceiro. Logo,
nenhum dos dois poderia sequer sonhar que um dia herdariam a coroa. Mas, a
vida, com os seus destinos incertos, surpreendeu a ambos _ morreram cedo os
irmãos mais velhos, Guilherme e Henrique (e, mais adiante, também Geoffrey, o
quarto filho homem do casal), e o cetro e a coroa do Reino da Inglaterra caíram
nas mãos de Ricardo _ que, na realidade, praticamente sempre morou na França,
no ducado da Aquitânia, então de domínio inglês.
[9]
O autor da obra “The Spirit Of Laws” Charles de Secondat, Baron de
Montesquieu analisando o sistema de travas e balanceamentos da constituição
inglesa afirma: “este belo sistema foi encontrado nas florestas
germânicas”. Este amor e dedicação à
liberdade e à independência pessoal passou a ser superposto às instituições que
estes povos germânicos fundaram e elaboraram.
Há divergências acadêmicas sobre e até que ponto o direito romano
existente à época da invasão e colonização germânica na Inglaterra, teria sido
adotado ou incorporado em leis, usos e costumes e instituições inglesas. Mas há
concordância geral que o espírito libertário anglo-saxão estava embutido nas diversas
cortes locais e que era nestes tribunais populares que os princípios de direito
germânicos e de governança local eram cultivados e disseminados. Os saxões insuflaram o governo e instituições
públicas inglesas de um espírito de equidade e liberdade que jamais deixou de
caracterizar estas instituições.
[10]
Constitui, na realidade, uma convenção firmada entre o monarca e os barões
feudais, através do qual estes passavam a ter alguns privilégios especiais
reconhecidos pelo rei. Seu significado maior foi o de deixar implícito, pela
primeira vez na história, que o rei estava limitado pelas leis que editava.
Mas, certamente, o maior legado da Magna Charta foi o seu art. 39, que
desvinculava da pessoa do monarca as funções legislativas e jurisdicionais, instituindo
o ‘due process of law’”. E, para reafirmar, Canotilho se referindo ao
mencionado artigo 39 menciona que: “Embora assegurasse apenas direitos a
determinada classe social, as dos barões feudais, a Magna Charta “fornecia já
‘aberturas’ para a transformação dos direitos corporativos em direitos
humanos”.
[11]
Uma das cláusulas que maior importância teve ao longo do tempo é o artigo 39
(tradução livre a partir de uma versão em inglês): "Nenhum homem livre
será preso, aprisionado ou privado de uma propriedade, ou tornado fora-da-lei,
ou exilado, ou de maneira alguma destruído, nem agiremos contra ele ou
mandaremos alguém contra ele, a não ser por julgamento legal dos seus pares, ou
pela lei da terra."
[12]
Lenio Streck com razão afirma que o distinguishing não enfraquece
precedentes. Então, como se enfraquece os precedentes. Ou são diferentes ou não
são. E, então como a recomendação do CNJ é no sentido de não fazer distinguishing.
Um precedente é um fim em si mesmo, que não pode ser enfraquecido? E, quando os
casos concretos forem diferentes? (In: STRECK, L.L. Precisamos falar sobre os
precedentes à brasileira. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2022-out-15/observatorio-constitucional-precisamos-falar-precedentes-brasileira
Acesso em 17.4.2023.).
[13]
O artigo 40 dispõe: "A ninguém vendemos, a ninguém recusaremos ou
atrasaremos, direito ou justiça."
Algumas cláusulas mostravam-se
como uma trava ao poder do Rei, entre estas as citadas. Este foi o capítulo
inicial de uma longa jornada histórica que conduziu à monarquia constitucional
e ao constitucionalismo.
[14]
A primeira ideia de Common Law é de “direito comum”, nascido das sentenças
judiciais dos Tribunais de Westminster, constituídos e subordinados ao rei, que
suplantou o direito costumeiro e particular de cada tribo dos povos primitivos
da Inglaterra, antes da Conquista Normanda em 1066. Mas esse direito
anglo-saxônico constituído de direitos locais e costumeiros pouco influenciou
no sistema do Common Law que hoje conhecemos, formado a partir da
Jurisprudência (“jus scriptum”). Neste, prevalece a “teoria de que o
juiz verdadeiramente cria o direito” e é regido pela “regra dos precedentes”. O
caráter de fonte normativa de que aparecem revestidas as sentenças resulta no
princípio do “stare decisis”, conforme o qual os juízes devem resolver seus
casos de acordo com o decidido por juízes em casos semelhantes. Uma decisão
judicial se constitui em regra importante, em torno da qual outras decisões
decorrerão posteriormente, com especificações, exceções interpretativas e
extensiva, criando um “leading case”.
[15]
Rei inglês, nascido em 1167 e falecido em 1216, foi o quinto filho de Henrique
II, não herdou nenhuma terra aquando da morte de seu pai, facto que lhe deu o
seu cognome. Apoderou-se do trono após a morte do seu irmão Ricardo Coração de
Leão, em 1199, desaparecendo com o seu sobrinho Artur, herdeiro do trono.
Procurou fortalecer o poder régio, facto que lhe valeu a exigência da nobreza
inglesa da assinatura da "Magna Carta", em 1215, para restabelecer o
parlamentarismo britânico. João I, também conhecido por João Sem Terra
(Lackland em inglês) (24 de dezembro 1166 - 18 de outubro, 1216) foi Rei de
Inglaterra, Duque da Normandia e Duque da Aquitânia de 1199 a 1216. Era o mais
novo entre os cinco filhos do rei Henrique II de Inglaterra e Leonor da
Aquitânia e não se esperava que sucedesse no trono, daí o seu cognome. Foi, no
entanto, o único dos filhos legítimos de Henrique II que não se revoltou contra
o seu poder. Talvez como compensação, João foi nomeado Senhor da Irlanda em
1185. A sua governação foi desastrosa e foi obrigado a abandonar o território
poucos meses depois. Em 1188, Henrique tentou tornar João Duque da Aquitânia,
em substituição de Ricardo Coração de Leão que considerava de pouca confiança.
O resultado foi catastrófico para Henrique II, que morreu durante a expedição
punitiva que organizou contra Ricardo. Entre 1189 e 1194, João foi a figura
mais importante de Inglaterra durante a ausência de Ricardo, primeiro em
cruzada, depois no cativeiro na Alemanha. Foi a si que coube a tarefa de reunir
os 150,000 marcos necessários para pagar o resgate de Ricardo a Henrique VI, Imperador
do Sacro Império. Esta soma representava na altura uma verdadeira fortuna que
obrigou à imposição de impostos especiais e deixou Inglaterra na bancarrota.
Talvez devido a isto, João não foi um regente popular e é frequentemente
retratado como vilão em histórias como Ivanhoe ou nas lendas de Robin dos
Bosques.
[16]
O Sistema do common law (lei comum) o Direito é declarado pelo juiz (judge
made law), sendo o precedente judicial (case Law) a principal fonte
jurídica. O common law, originalmente, se ocupava de grandes questões,
principalmente financeiras, territoriais e criminais (direito público),
consolidando-se através de práticas processuais com validade geral (força
vinculante), definidas durante séculos pelas Cortes. E, foi substituindo,
gradativamente, os costumes locais, de julgamentos baseados na moral e na
religião, ao assumir a tarefa de apreciar também questões menores e até
particulares (direito privado). Ainda hoje, no Reino Unido, a maioria dos
litígios se resolve na alçada de tribunais inferiores, ou mesmo, por comissões
do contencioso administrativo e por árbitros privados (mediação e arbitragem).
Já o Alto Tribunal, por sua vez, envolve três seções, a saber: Seção da
Chancelaria, Seção do Banco da Rainha e Seção da Família. E, a Corte Suprema
tem por principal atribuição dizer o que é o Direito, através do pronunciamento
sobre os precedentes judiciais que serão obrigatoriamente observados. Apenas na
aparência a função judiciária sendo desempenhada, em grau superior, por um
órgão do Legislativo, sobretudo pelo grau de independência do Poder Judiciário
no Reino Unido.
[17]
“Note-se que na Magna Carta aponta a judicialidade um dos princípios do Estado
de Direito, de fato, ela exige o crivo do juiz relativamente à prisão do homem
livre. (...) Nela igualmente está a garantia de outros direitos fundamentais: a
liberdade de ir e vir (n. 41), a propriedade privada (n. 31), a graduação da
pena à importância do delito (n. 20 e 21). Ela também enuncia a regra 'no
taxation without representation' (n. 12 e 14). Ora, isto não só provocou mais
tarde a institucionalização do Parlamento, como lhe serviu de arma para assumir
o papel de legislador e de controlador da atividade governamental”.
[18] O sistema romano-germânico, também denominado civil law, tem sua origem na Europa continental, podendo-se afirmar que, do ponto de vista científico, surgiu no século XIII. Até esta época existem, sem dúvida alguma, elementos com a ajuda dos quais o sistema será constituído, mas parece prematuro falar de sistema, e talvez mesmo de Direito. O civil law pode ser dividido em períodos. Um primeiro período começa, no século 13, com o renascimento dos estudos de Direito Romano nas universidades. [...] Durante cinco séculos o sistema vai ser dominado pela doutrina, sob a influência principal da qual a própria prática do Direito evoluirá nos diferentes Estados. A doutrina preparará, com a Escola do Direito Natural, o despertar do período seguinte, aquele em que ainda atualmente nos encontramos – período no qual o sistema será dominado pela legislação (DAVID, 2002, p. 35).