Casa Velha e o Direito de Família brasileiro
Grande parte da crítica reconhece as obras de Machado de Assis publicadas a partir de 1881, tidas como grandes romances. Ao analisar “Casa velha” que merece figurar ao lado dos grandes romances e, sua protagonista, Lalau, uma agregada que tem atitudes diametralmente opostas às personagens que, também, de mesma posição social, habitam os famigerados romances do escritor. A especificidade de Lalau é flagrante através de análise comparativa das personagens femininas machadianas. O contexto propicia abordar o tema dos Impedimentos Matrimoniais no vigente Direito de Família brasileiro. Uma frase merece destaque: "Assim é a vida humana: um nada basta para complicar tudo".
Casa
Velha nos traz uma narrativa relativamente curta, feita em prosa, e que
corresponde ao que chamamos de novela. Esse trabalho de Machado de Assis saiu
publicado pela primeira vez na Revista Estação de 1885 a 1886. Apenas em 1943 a
história se tornou um livro por conta dos esforços da crítica literária Lúcia
Miguel Pereira[1],
que fez o lançamento e a introdução de “Casa Velha”.
Retratou
o Rio de Janeiro em 1839, sobre um casarão antigo, uma casa velha tendo como
personagens Antônia, a viúva do ministro de Dom Pedro I, existe ainda uma
capela no exterior.
A
trama tem o padre narrador que nos brinda com a história política nos tempos de
Dom Pedro I, por indicação, indo até uma casa velha porque há documentos que
podem ajudar a pesquisa, vez que o dono do casarão, já era falecido, e tinha
sido o Ministro do Imperador, o padro desconfiava de um amor entre Félix (filho
de Antônia) e Cláudia (Lalau).
Há
subtemas como o cenário urbano, a história do Brasil e o funcionário público
que se entrecruzam, sendo divisionais, como forma e método de abordagem. De fato, o Rio de Janeiro sofreu inúmeras
transformações urbanas no início do século XX e, Machado não fez menor alusão a
estas.
Preferiu
enfocar um país e uma cidade que estava deixando de existir na época em que
essa obra fora publicada. O olhar machadiano está voltado para o passado.
Apesar de que a visão do escritor não era sentimento, porém, também não era
indiferente. Pareceu ter um conservadorismo ou saudosismo no seu amor pelo Rio
de Janeiro em que viveu e cujo crescimento presencio um conservando um naco
importante da dimensão humana.
A
viúva e mãe de Félix não desejava a relação pelo fato da moça ser paupérrima, e
por insistência na liberação do namoro do casal, o padre acaba descobrindo,
através da viúva, que os jovens poderão ser irmãos, isso porque o falecido
ministro teve ruidoso caso extraconjugal com a mãe de Lalau, e quando os jovens
tomam ciência do fato, ficaram tristes e angustiados e se separaram.
Bem
mais tarde, as pesquisas realizadas pelo padre narrador acaba por descobrir que
o filho que o falecido ministro teve com a mãe de Cláudia teria falecido com
poucos meses de vida. Portanto, Lalau e Félix não eram irmãos e poderia
casar-se. O Padre também descobre que Antônia,
a viúva, tinha conhecimento que os dois amantes não eram irmãos, tanto que tentou reaproximá-los, porém, não
dá certo, pois a jovem com razão prefere ficar longe da casa pois o tal
ministro envergonhou sua família,
A Casa
velha pode ser considerada uma representação figurada do Império brasileiro,
sendo que o clero (na figura do padre) que atua como narrador. E, já existia
Dom Pedro II desejoso de maioridade (tal qual como Félix). Outros assuntos como
a Guerra dos Farrapos e a maioridade iminente do filho de Dom Pedro I permeiam
toda a narrativa. É fácil fazer um paralelo entre o casarão de Antônia e o
Império brasileiro.
Outro
aspecto relevante, novamente envolvendo o Padre narrador e sua personalidade
que se expressa através de uma citação de um livro, que fora encontrado dentro
da casa: storia fiorentina e mostra uma nova visão sobre a relação do
religioso com os dois jovens amantes, o que torna bem significativo toda a
obra.
A
questão é que esse imóvel, a “Casa Velha”, pertencia a um ex-ministro, e, agora
era habitada por sua viúva esposa, D. Antônia, seu filho Félix e agregados,
como a jovem Lalau.
O
enredo gira em torno, na verdade, da história de amor entre o herdeiro Félix e
agregada, Lalau, e os seus desdobramentos e intrigas. O romance entre os dois é
criticado por D. Antônia, por conta das
hierarquias sociais da época.
Enfocando
pela história, principalmente, o período
do Primeiro Reinado. Embora o padre, no fim das contas, não cumpra ao que se
propôs no início da novela, é possível fazer um paralelo entre esse período e a
trama que envolve a história de amor narrada, com ex-ministro representado a
figurado Imperador Dom Pedro I, o padre representante da Igreja Católica e,
Félix que representava o Dom Pedro II.
Nesse
contexto, podemos abordar os impedimentos matrimoniais presentes no Direito de
Família brasileiro[2].
Os impedimentos matrimoniais são hipóteses previstas em lei que, quando
configuradas, impossibilitam que determinadas pessoas contraiam matrimônio com
outras. Trata-se de regras de ordem pública, isto é, tem natureza de proibição
absoluta, não negocial.
As
hipóteses legais previstas no art. 1.521 do Código Civil. In litteris:. Não podem casar: I - os ascendentes com os descendentes, seja o
parentesco natural ou civil; O inciso I
do dispositivo veda o casamento entre pais e filhos, e avós e netos.
Sendo certo que ainda que a relação não seja
sanguínea, a vedação persiste, de modo que filhos e netos adotados não podem se
casar com pais adotantes e avós.
A
vedação de casamento entre afins em linha reta, decorre do parentesco firmado
por casamento anterior. Assim, não é possível se casar com ex-sogro ou
ex-sogra. A regra se assemelha a vedação de casamento entre pais e filhos, os
sogros seriam como pais por afinidade.
Já o
inciso III proíbe (i) o casamento entre o pai ou mãe adotivo com ex-marido ou
ex-esposa de seu filho(a) adotivo(a) e (ii) o casamento entre o filho(a)
adotivo(a) e o ex-marido ou ex-esposa de seu pai ou mãe adotivo.
O
inciso IV impede o casamento entre irmãos de mesmos pais, entre meios-irmãos, e
entre sobrinhos e tios.
Também
há vedação de casamento entre o filho adotado e o filho do adotante, até
porque, mesmo que não haja relação sanguínea, ambos serão criados como se
irmãos fossem. A regra está em consonância com a vedação do inciso anterior que
impede o casamento entre irmãos.
Art.
1.521. Não podem casar: VI – as pessoas casadas;
Eis o
impedimento não guarda relação com parentesco, mas decorre da existência de
casamento anterior. Em outras palavras, ninguém poderá se casar com duas
pessoas diferentes ao mesmo tempo, em razão da natureza monogâmica do instituto
do casamento.
A
exceção dessa regra é a figura do casamento putativo previsto no art. 1.561 do
CC, cujo estudo será profundado em momento apropriado. Nessa hipótese, ainda
que nulo ou anulável, o casamento será válido em relação aos filhos e aos
cônjuges de boa-fé. Apenas após prolação de sentença anulando o casamento
cessarão os seus efeitos civis.
Constata-se
que os cônjuges que de má-fé (cientes de que o outro nubente já era casado)
contraem matrimônio não poderão aproveitar os seus efeitos civis, especialmente
patrimoniais. Isso porque ninguém pode se beneficiar da própria torpeza[3]. Importa reiterar que o
casamento sempre será válido e produzirá efeitos em relação aos filhos, já que
eles não promoveram o ato ilícito e nem poderiam evitá-lo.
Além
de ilícito civil, a sabida contração de novo casamento por pessoa já casada
configura o crime de bigamia previsto no art. 235 do Código Penal, punível com
pena de 2 a 6 meses de reclusão.
Art.
1.521. Não podem casar: VII - o cônjuge
sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra o
seu consorte.
Esse
impedimento visa a desestimular que um terceiro mate alguém para se casar com
seu cônjuge, até mesmo com o consentimento deste último.
A
oposição aos impedimentos matrimoniais será realizada na fase de habilitação
para o casamento ou no momento de sua celebração, que serão adiante estudados.
São
legitimados para se opor ao casamento qualquer interessado e, de ofício, o juiz
ou o oficial do cartório de registro civil. Ademais, em vista da natureza de
ordem pública dos impedimentos matrimoniais, a doutrina estende essa
legitimação ao Ministério Público.
Caso
haja oposição[4],
o casamento será imediatamente sustado e somente será realizado após julgamento
judicial afastando essa oposição.
Ocorrido
o casamento, a despeito da oposição, ele será nulo, sem prejuízo da
responsabilização funcional e penal por crime de prevaricação da autoridade
judiciária ou do oficial de registro civil. Nesse cenário, os impedimentos
poderão ser arguidos por meio de ação declaratória de nulidade.
Conforme
leciona Rolf Madaleno, “os impedimentos traduzem a proibição imposta pela lei à
realização de um casamento” ou seja, desrespeitada a previsão legislativa, o
casamento será nulo, em conformidade com o que estabelece o artigo 1.548,
inciso II do Código Civil .
Milton
Paulo de Carvalho Filho, ao discorrer sobre a classificação dos impedimentos
matrimoniais, assim prescreve:
“A lei
divide em três classes os impedimentos: a) os que resultam do parentesco
(incisos I a V); b) os que resultam de casamento anterior ou impedimento de
vínculo (inciso VI); e, por fim, c) os que são decorrentes de crime ou
impedimento de crime (inciso VII). Os impedimentos resultantes do parentesco
podem ainda ser divididos em 1) impedimentos de consanguinidade, previstos nos
incisos I e IV deste artigo, que resultam de parentesco próximo; 2) impedimento
de afinidade, previsto no inciso II; e 3) impedimento de adoção, previsto nos
incisos III e V”.
Superadas
a conceituação e classificação dos impedimentos matrimoniais, passaremos a
tratar especificamente sobre cada um deles, utilizando como diretriz a própria
redação do artigo 1.521 do Código Civil, que em seu caput determina
expressamente aqueles que “não podem casar”.
Milton
Paulo de Carvalho Filho, ao tecer comentários sobre o inciso VI do artigo
1.521, dispõe que:
“O
vínculo conjugal só se extingue com a morte, com a invalidade do casamento e
com o divórcio (...). Aquele que se casa sem que o vínculo anterior esteja
extinto comete bigamia, que constitui crime previsto no art. 235 do CP. O
casamento religioso anterior não constitui impedimento enquanto não estiver
inscrito no registro civil (...). Será declarado nulo o segundo casamento
quando realizado ainda na existência do primeiro, não podendo ser convalidado
mesmo que este tenha sido dissolvido antes da decretação de nulidade daquele,
por ser já preexistente o impedimento legal”.
Ainda
no que atina ao impedimento constante do inciso VI, deve-se salientar que ele
não se aplica àqueles que convivem em união estável, justamente em razão do
disposto no §1º do artigo 1.723 do Código Civil, que em sua redação estipula
expressamente que: “A união estável não se constituirá se ocorrerem os
impedimentos do art. 1.521; não se aplicando a incidência do inciso VI no caso
de a pessoa casada se achar separada de fato ou judicialmente”.
Por
fim, o inciso VII do artigo 1.521 do Código Civil, prevê que não podem casar “o
cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio
contra o seu consorte”.
O
impedimento supra nitidamente almeja resguardar a moral e a ética, pois seria
reprovável imaginar a hipótese de alguém pretender casar com pessoa condenada
pela prática de homicídio, ainda que tentado, contra o seu consorte.
Para
sua caracterização, necessária será a existência de sentença condenatória
transitada em julgado, não existindo, conforme leciona Rolf Madaleno, tal
impedimento “para a hipótese de homicídio culposo, porque o impedimento
justamente encontra a sua razão no sentido ético da intenção criminal” .
Reprisemos
o conceito de impedimentos matrimoniais: São circunstâncias em que a lei proíbe
que o casamento entre determinadas pessoas ocorra.
O rol
dos impedidos de casar-se consta no artigo 1.521 do Código Civil de 2002[5], que possui a seguinte redação:. Não podem casar”:
‣ I -
os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil;
‣ II -
os afins em linha reta;
‣ III -
o adotante com quem foi cônjuge do adotado e o adotado com quem o foi do
adotante;
‣ IV -
os irmãos, unilaterais ou bilaterais, e demais colaterais, até o terceiro grau
inclusive;
‣ V - o
adotado com o filho do adotante;
‣ VI -
as pessoas casadas;
‣ VII -
o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio
contra o seu consorte.
Plano
da juridicidade afetado.
‣
Afeta-se o plano da validade. Os impedimentos ao casamento são vícios de
legitimação, isto é, incapacidade específica
que atinge pessoas com determinadas características (normalmente transitórias) para a celebração de
determinados negócios.
A consequência
será que o casamento será nulo (vício de validade), vide o CC/2002, art. 166,
inc. VII, segunda parte.
Depois
do divórcio, é possível casar com afim em linha reta? Não. Lembrar que o art. 1591, do CC/20022,
determina que a dissolução do casamento
ou da união estável não provoca o rompimento do parentesco por afinidade com relação à linha reta.
Assim,
não dá para casar com sogro(a) e/ou enteado(a),
mesmo que a relação matrimonial tenha terminado. Como se diz popularmente, “sogro(a) e enteado(a) é para
sempre”.
Questiona-se
se os cônjuges e companheiros são parentes entre si? Não. Os cônjuges não são
parentes entre si. São os parentes do cônjuge que se tornam parentes por afinidade do outro
cônjuge.
É
possível casar com o cunhado? Sim. É
possível casar com o cunhado após o relacionamento com o irmão dele. Isso ocorre porque ele é parente afim em linha
colateral e, desse modo, o irmão do marido deixa de ser parente por afinidade
da esposa quando o irmão dissolve o
casamento.
Outro
impedimento consta: “III - o adotante com quem foi cônjuge do
adotado e o adotado com quem o foi do
adotante”.
- Isso
porque o cônjuge do adotado equivale à nora ou genro do adotante, e o cônjuge do adotante equivale à mãe ou pai do adotado.
- Essa
hipótese é despicienda, pois é a mesma hipótese que o inc. II, segundo o Prof. Cristiano Cassetari. Entretanto, o Prof. André Barros diz que não é
a mesma coisa, porque os demais parentes
por afinidade em linha reta estão liberados para o casamento.
Então,
o inciso III restringe o casamento a
menos pessoas. Só estarão impedidos os pais adotantes (sogros) ou os filhos adotivos do cônjuge
(enteados).
Uma curiosidade[6]: Em algumas religiões,
caso o homem faleça e seu irmão ainda está solteiro, ele deverá assumir a viúva
de 3 seu irmão. Para mais, vide: Trecho
da Bíblia, Deuteronômio, 25: “Quando dois irmãos moram juntos e um deles morre
sem deixar filhos, a mulher do morto não
sairá para casar-se com um estranho à família.
O
irmão do marido se casará com ela e cumprirá com ela o dever de cunhado. O primeiro filho que ela
der à luz tomará o nome do irmão falecido, para que o nome deste não se apague em Israel.…”, In: disponível em: https://bibliaportugues.com/deuteronomy/25-5.htm Acesso
em 25.5.2023[7].
Em qual situação em que é possível o casamento
avuncular? O Decreto-lei 3.200/41 autoriza o casamento entre tios e sobrinhos,
desde que haja autorização judicial, que
por sua vez depende de comprovação médica
de inexistência de problemas com prole futura.
O
laudo é um laudo médico de eugenia[8] cujo resultado deve ser o
de que a união não é inconveniente do
ponto de vista genético, In: Legislação disponível em http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/Del3200.htm Acesso em: 23.5.2023..
“Com o
advento do Código Civil brasileiro de 2002, a matéria sofreu uma alteração,
mantendo-se a essência da legislação anterior, mas agora disposta em duas
partes: impedimentos[9], aqueles de ordem pública e que continuam
gerando a nulidade do casamento; e causas suspensivas, aquelas dirimente
privadas e que possuem como consequência a anulabilidade”, explica a docente.
Segundo
ela, as causas de nulidade do casamento e da união estável estão elencadas em
caráter taxativo no artigo 1.521, e “o dispositivo reforça a corrente
contratualista, que advoga pela natureza negocial do casamento, dominante na
doutrina e jurisprudência pátrias.”
“Trata-se
de norma cogente, instituindo vícios absolutos, insanáveis, comprometedores da
validade do matrimônio e passíveis de arguição a todo tempo pelos interessados
e pelo Ministério Público”, aponta a coautora do artigo. Para Maria Helena Diniz,
“uma observação preliminar das hipóteses insculpidas na norma, reforça a
preocupação com certos valores morais, caros ao legislador – os quais,
supostamente, refletiriam a percepção social dominante –, bem como a intenção
de evitar riscos a eventual prole do casal.”
A
especialista comenta que as pessoas com deficiência gozam de capacidade legal
para os diversos aspectos da vida. “Ante a capacidade civil plena para o
casamento e para a união estável, todas as regras aplicáveis aos dois
institutos serão observadas, incluindo assim os impedimentos previstos no artigo
1.521 do Código Civil”, avalia.
De
acordo com ela, o Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015)
materializou, no âmbito normativo interno brasileiro, a Convenção Internacional
sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, introduzindo assim uma nova
redação para a disciplina das incapacidades contidas no Código Civil brasileiro
vigente.
Conforme
previsto no caput do artigo 6º, a pessoa com deficiência afigura-se com
capacidade civil plena, inclusive para casar e constituir união estável.
Registre-se
um caso verídico: Ana e Daniel Parra são irmãos por parte de pai e só se
conheceram quando tinham, respectivamente, 20 e 17 anos. Tudo aconteceu após a
jovem buscar pela internet a família do progenitor, com quem não tinha
contato há décadas. Eles se tornaram amigos íntimos, passaram a morar juntos em
Barcelona, na Espanha, acabaram se apaixonando e deram o primeiro beijo durante
uma festa.
Segundo
o relato feito ao periódico espanhol, o casal consultou médicos para avaliar
quais seriam os riscos de ter descendentes (por exemplo, filhos com doenças
graves causadas pelo cruzamento de genes recessivos) e, ainda assim, resolveram
gerar as crianças.
Graças
a uma mudança que aconteceu na Lei do país em 2012, motivada por outro caso
parecido, Ana e Daniel puderam, os dois, registrar os pequenos.
Antes
da alteração, não era permitido que irmãos fossem registrados como pais. Vale
lembrar que o incesto[10] deixou de ser crime na
Espanha em 1978, mas o casamento continua sendo proibido. No Brasil, o incesto só
é crime se envolver menores de 14 (quatorze) anos.
A
Constituição Federal brasileira vigente (artigo 226) apenas exige o requisito
da heterossexualidade na formação da união estável e determina que a lei
facilite sua conversão em casamento, mas, com isso, não está a exigir que se
submeta, enquanto união estável, aos mesmos requisitos do casamento.
Na Lei
8.971/1994[11]
(art. 1º) constam requisitos pessoais relativos ao estado civil dos
companheiros, mas a Lei 9.278/1996 (art. 1º) modificou a conceituação da união
estável, nada mais referindo a esse propósito.
O tema
suscita sérias controvérsias, em face da imprecisão do texto legal. A muitos
parece que a proteção jurídica a todas as espécies de entidade familiar estaria
condicionada ao requisito básico da inexistência de impedimentos, seja para o
matrimônio, seja para a união estável.
A
outros se afiguram distintas essas situações de união familiar, com a
necessidade de tratamento diferenciado no plano dos requisitos para sua
formação, em face da informalidade da união estável, não lhe importando a
existência de impedimentos matrimoniais.
Sem
radicalizar, predominante se mostra corrente doutrinária intermédia de
pensamento, tanto em doutrina quanto na jurisprudência, fazendo a necessária
distinção entre casamento e união estável, para que a esta se apliquem os
impedimentos matrimoniais absolutos, decorrentes de parentesco (incesto) ou de
anterior casamento (bigamia), com as exceções decorrentes de separação de fato
ou judicial de um ou de ambos os conviventes.
Em
2013, uma resolução publicada pelo Conselho Nacional de Justiça garantiu o
casamento homoafetivo no país, determinando que tabeliães e juízes são
proibidos de se recusar a registrar o casamento civil e a conversão de união
estável em civil entre homossexuais.
No
Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em Brasília, resolução[12] que determina que
cartórios civis sejam obrigados a celebrar casamento civil homoafetivos. A
decisão acontece dois anos após a união estável entre pessoas do mesmo sexo ter
sido aprovada pelo STF (Supremo Tribunal Federal). Os cartórios também não
podem se recusar a converter união estável homoafetiva em casamento. civil.
Em
2017, segundo o IBGE, foram registrados cerca de 5.900 casamentos homoafetivos.
Esse número é 60% maior que o observado em 2013 (quase 3.700), mas representa
menos de 1% do total de casamentos heterossexuais celebrados no ano passado.
Machado
de Assis enquanto ficcionista não tinha olhar crítico apenas sobre a construção
de elementos narrativos com fim em si mesmo, apurou sua crítica sobre a
sociedade da época. Enfatizando o dado histórico-social conforme estruturou a
obra Casa Velha.
Assim passamos a compreender o texto literário através de estudo sociológico, capaz de reconhecer dentro da trama, a sociedade que lhe corresponde. Onde se notou que o paternalismo era um elemento estruturador que aproximaria Casa Velha dos primeiros romances machadianos[13].
Referências
BOSI,
Alfredo. A escravidão entre dois liberalismos. In: Dialética da colonização.
São Paulo: Companhia das Letras, 1992,
p. 194-245.
______.
História concisa da Literatura Brasileira. São Paulo: Cultrix, 2003.
______.
Machado de Assis: o enigma do olhar. São Paulo: Ática, 1999.
CANDIDO,
Antonio [et al.]. A personagem de ficção. 11ª. ed. São Paulo:
Perspectiva, 2007.
______.
Formação da Literatura Brasileira: momentos decisivos. Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo: Edusp, 1975.
______.
Introdução à Literatura Brasileira. Rio de Janeiro: Ouro sobre Azul,
2004.
CARVALHO
FILHO, Milton Paulo de. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência/Claudio
Luiz Bueno de Godoy [et al.]; Coordenação Cezar Peluso. 16ª ed., rev. e atual.
– Barueri [SP]: Manole, 2022.
DIAS,
Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 12ª ed. rev. ampl. e atual.
São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017.
DINIZ,
Maria Helena. Curso de direito civil brasileiro, vol. 5: direito de
família. 32ª ed. São Paulo: Saraiva, 2018.
FREYRE,
Gilberto. Sobrados e mucambos: decadência do patriarcado rural e desenvolvimento do urbano. Rio de
Janeiro: Livraria José Olympio Editora, 1968.
MADALENO,
Rolf. Manual de Direito de Família. 3ª. ed. Rio de Janeiro: Forense,
2020.
MIGUEL-PEREIRA,
Lúcia. Prefácio. In: ASSIS, Machado de. Casa Velha. São Paulo: Livraria Martins Editora, 1952, p. 7-26.
______.
Prosa de ficção (de 1870 a 1920) – História da Literatura Brasileira.
Belo Horizonte: Itatiaia; São Paulo:
Edusp, 1988.
PAMPLONA
FILHO, Rodolfo; GAGLIANO, Pablo Stolze. Manual de Direito Civil. Volume Único.
7ª edição. São Paulo: SaraivaJur, 2023.
PEREIRA,
Caio Mário da Silva. Instituições de direito Civil: direito de família.
18ª.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2010.V.5.
SARAIVA,
Juracy Assmann. O circuito das memórias em Machado de Assis. São Paulo: Edusp, 2008.
STEIN,
Ingrid. Figuras femininas em Machado de Assis. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1984.
TARTUCE,
Flávio. Manual de Direito Civil. Volume Único. 13ª edição. São Paulo:
Método, 2023.
Notas:
[1] Lúcia Miguel-Pereira faz parte de um contexto da crítica literária brasileira no qual os estudos sobre literatura se preocupavam em relacionar a vida e a obra dos autores. Para ela, os primeiros romances machadianos seriam românticos e discutiriam especialmente o tema da “mudança de classe” (MIGUEL-PEREIRA, 1988, p. 156), e nisso estaria uma questão particularmente cara a Machado, pois revelaria sua própria trajetória biográfica. No que diz respeito a Casa Velha, a autora sustenta a tese de que a peça faria parte dos romances da dita primeira fase do escritor, embora tivesse sido publicado entre os anos de 1885 e 1886: “podemos concluir com segurança que esta novela [Casa Velha] foi escrita antes de 1880 – antes de Brás Cubas que é um marco, um divisor de águas na obra de Machado de Assis” (MIGUEL-PEREIRA, 1952, p. 16).
[2]
Os impedimentos são causas que proíbem o casamento. No caso do impedimento,
então, o casamento será nulo. A causa suspensiva, contudo, impõe uma punição,
qual seja a imposição do regime de separação obrigatória de bens. As causas
suspensivas do casamento são situações de menor gravidade, relacionadas a
questões patrimoniais e de ordem privada. Não geram a nulidade absoluta ou
relativa do casamento, mas apenas impõem sanções patrimoniais aos cônjuges. A
sanção principal é o regime da separação legal ou obrigatória de bens.
[3] A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu que não é lícito à parte arguir vício para o qual em tese concorreu em sua produção, sob pena de se violar o princípio de que ninguém pode se beneficiar da própria torpeza – nemo auditur propriam turpitudinem allegans. (AgRg no RHC 145.895/PA, Rel. Ministro JESUÍNO RISSATO (DESEMBARGADOR CONVOCADO DO TJDFT), QUINTA TURMA, julgado em 28/09/2021, DJe 05/10/2021)
[4]
As oposições de causas suspensivas podem ser arguidas por pessoas legitimadas
(ascendentes, descendentes, e colaterais em segundo grau). Para serem
apresentadas, seguem o mesmo padrão do art. 1529 do Código Civil (por escrito e
instruídas com provas). A sua oposição poderá ocorrer até o momento da
celebração, por QUALQUER PESSOA; Se o oficial do registro ou qualquer juiz
tenha conhecimento do impedimento, deverá reconhecê-lo DE OFÍCIO (ex officio);
Caso o casamento seja celebrado, será ele NULO de pleno direito, havendo
nulidade ABSOLUTA.
[5]
No Código Civil brasileiro de 1916, segundo Pereira (2010, p. 82), os
impedimentos matrimoniais dispunham em 16 incisos, e existia a aplicação de
sanções a aqueles que desobedeciam a essas regras. Num primeiro momento, mencionavam
os impedimentos dirimentes, aqueles que invalidavam o casamento, de outro lado,
os impedimentos impedientes, que acarretavam outras sanções ao infrator,
diferentes da anulação. Os que invalidavam o matrimônio constituído se
subdividiam em públicos e privados.
[6]
Com relação ao posto que assumira Machado de Assis há uma curiosidade, no
quadro pessoal da Secretaria, anexo aos Relatórios apresentados pelo Ministro
ao Presidente, já após a República, Brasil não encontramos a referência a
função como ajudante do diretor (Secretaria da Agricultura). Quando o escritor
vem aparecer como Primeiro Oficial, cargo mais importante e de terceiro escalão
na hierarquia do órgão, nomeado em 31.12.1873 através de decreto.
[7]
O levirato é conhecido no direito hebraico, sendo ainda mencionado no Antigo
Testamento. Um pressuposto para a ocorrência do levirato é o falecimento do
irmão sem filhos, ou seja, sem herdeiros, levando a terra a uma situação de
risco. No período patriarcal já ocorria o casamento de uma viúva sem filhos com
o irmão de seu marido (cf. Gênesis 38:8). Mais tarde, o casamento levirato foi
incorporado e regulamentado na Lei de Moisés (Deuteronômio 25:5-10). A
desobediência à lei do levirato era considerada um delito grave. Um homem até
poderia se recusar a se casar com sua cunhada viúva, mas ele seria exposto à
execração pública. Contudo, o casamento levirato só poderia ocorrer depois da
morte do primeiro marido que não deixou filhos. Caso contrário, era
expressamente proibido que um homem se casasse com sua cunhada (Levítico 18:16;
20:21).
[8]
O termo ‘’Eugenia’’, foi desenvolvido no ano de 1883 por Francis Galton
(1822-1911), um importante antropólogo, meteorologista, matemático e
estatístico inglês e significa “bem nascido”. Primo de Charles Darwin, e baseado
em suas ideias, criou o conceito de eugenia e pregava a necessidade de se
impedir a procriação dos humanos “inferiores” biológica e sociologicamente. Em
área de diâmetro oposto, dizia que os casamentos e procriação entre seres
humanos considerados superiores deveriam ser incentivados. Galton também foi um
dos responsáveis por desenvolver testes de inteligência, no intuito de
selecionar homens e mulheres brilhantes que teriam a destinação à reprodução
seletiva. Deu ainda à “eugenia” a definição como sendo o estudo dos agentes sob
o controle social que podem melhorar ou empobrecer as qualidades raciais das
futuras gerações, sejam físicas ou mentais.
[9]
No Brasil, a teoria dos “impedimentos matrimoniais” teve vinculação com a Lei
de 3 de novembro de 1827, que seguia normas ditas pelo Concílio de Trento e a
Constituição Primeira do Arcebispo da Bahia. Os impedimentos ao casamento são
mencionados desde o Direito Romano, mas ganharam grande força no Direito
Canônico, tendo em vista que este via o casamento como um ato de grande
importância para o indivíduo que está contraindo matrimônio e para a sociedade.
[10]
As polêmicas envolvendo o
assunto já rondaram a internet e a mídia (como na série Game of Thrones).
Apesar de qualquer opinião externa, o ato foi descriminalizado em países como a
França, Espanha e Portugal. Há muitos países desenvolvidos que não aplicam
punições para as relações sexuais entre adultos que sejam familiares direta ou
indiretamente, ou seja, para o incesto. Esse é o caso da Espanha, por exemplo,
onde não existe o crime de incesto, embora esteja proibido o casamento civil
entre adultos com o vínculo familiar até o terceiro grau colateral. Em vista
disso, tios e sobrinhos não podem se casar. Do mesmo modo, a Suécia permite o
casamento entre meios-irmãos com um pai em comum, desde que seja especialmente
autorizado pelo governo. A Holanda também não condena o incesto, embora proíba
o casamento entre irmãos de sangue ou adotivos.
[11]
O casamento é um vínculo jurídico estabelecido entre duas pessoas, para
constituírem uma família. Esse vínculo é realizado mediante uma autoridade
competente e baseado em condições descritas pelo direito civil. União estável é
a relação mantida entre duas pessoas que vivem sob o mesmo teto. No casamento,
o casal pode optar por um regime específico para a partilha de bens, que deve
ser definido em pacto pré-nupcial. As opções são: separação obrigatória de
bens, comunhão parcial de bens, comunhão universal de bens, participação final
nos aquestos e separação de bens. Caso não seja pré-definido, o que vigora é a
comunhão parcial de bens. No caso da união estável, é a comunhão parcial de
bens que vigora.
[12]
Antes da Resolução CNJ n. 175/2013, o casal precisava entrar na Justiça para
que a união fosse reconhecida e, mesmo assim, corria o risco de não conseguir
realizar seu sonho. No primeiro ano em vigor, a norma viabilizou 3.700
casamentos em todo o país. Os números foram aumentando: em 2015, foram
realizados 5.614 casamentos – um acréscimo de 52%.
[13] Machado, nos deu a mocinha, o mocinho, a bruxa e o mago, nos abandonou e depois nos organizou. Quer percebamos claramente ou não, o caráter de coisa organizada da obra literária torna-se um fator que nos deixa mais capazes de ordenar a nossa própria mente e sentimentos; e, em consequência, mais capazes de organizar a visão que temos do mundo. A organização da palavra comunica-se ao nosso espírito e o leva, primeiro, a se organizar; em seguida, a organizar o mundo. Ela [a literatura] não corrompe nem edifica, portanto; mas trazendo livremente em si o que chamamos o bem e o que chamamos o mal, humaniza em sentido profundo, porque faz viver. In: CÂNDIDO, Antonio. “Direito à Literatura”. In: Cândido, Antonio (org.). Vários Escritos. 4ª ed. São Paulo: Duas Cidades, 2004. p. 176, 177.