As origens da República brasileira
Enfim, desde sua nobre origem, a república é um ideal a se aperfeiçoar pela luta e concretização da preservação da dignidade humana, onde vige a progressiva e definitiva inclusão do cidadão superando todos os preconceitos, racismos e discriminações. A diversidade e pluralidade são as joias mais preciosas da legítima e autêntica república
Reclamam
os historiadores sobre a oitiva dos testemunhos e da dificuldade de se realizar
uma reflexão crítica, pois na descrição do momento traçam imagem superficial e
deformada dos fatos e da dinâmica vigente naquela época.
O jaez
de comprometimento do observador, a qualidade e a quantidade de informações que
se dispõem e influenciam na capacidade de análise e, podem mover tanto as
paixões como os ódios que contaminam o depoimento.
Eis
que há a regra básica da pesquisa histórica que é submeter a documentação a um
crivo crítico rigoroso, no entanto, tal regra é difícil de ser implementada e,
principalmente, de ser bem-sucedida quando se trata de criticar o depoimento
meramente testemunhal.
A
dificuldade é maior quando se estudam as reformas políticas, econômicas ou
sociais e, ainda, os processos revolucionários. Os temas que provocam
controvérsias que ora envolvem posições opostas e, as situações históricas que
produzem vencedores e vencidos e, também, dão origem a uma documentação
testemunhal contraditória.
Como é
frugal, cada grupo explicou a realidade à sua maneira de forma diversa, quando
não oposta aos demais, o que torna complexa a tarefa do historiador e prejudica
a crítica histórica. Um mero confronto das opiniões entre si não basta para
esclarecer o que realmente se passou.
Não se
trata de optar por esta versão e, não por aquela, porque esta nos parece mais
lógica. É preciso utilizar outros tipos de documentos mais objetivos para poder
julgar o grau de veracidade da informação testemunhal.
Para
que se possa entender um golpe de Estado ou uma revolução é preciso ter informações
que se processem no quadro econômico, social e institucional. Foi preciso
também familiarizar-se com as ideias em voga.
Não
basta conhecer os homens e os episódios, nem mesmo é suficiente saber quais suas
respectivas opiniões e ideias, para definir qual foi a cada forma de
participação.
Desta
forma, não basta conhecer as razões que os contemporâneos invocam, uns para
justificar o movimento, outros para criticá-lo ou detê-lo. Ao estudar um golpe
de Estado ou uma revolução é necessário que o historiador procure além dos atos
aparentes e explícitos indo até as razões de ordem estrutural que o motivaram e
que frequentemente escapam à consciência dos contemporâneos.
É
preciso questionar quais os grupos sociais que se associavam para dar o golpe
ou fazer uma revolução, contra quem e contra a que se dirige o movimento e, em
favor de quem e de que e, ainda, saber quais as forças que se aglutinam na
resistência.
Registra-se
que, entre os fatores da proclamação da República, a constituição etnográfica, a
transição para um regime de trabalho agrícola (abolição da escravatura) e
industrial de tipo europeu, as relações entre as nações norte-americanas, a
propaganda em favor da República movida pela literatura e pelos jornais, a
corrupção política e a deficiente administração do Império brasileiro, a
perniciosa influência do poder pessoal, a atuação do numeroso partido
republicano existente em São Paulo, Minas, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul,
a repercussão da Lei Áurea, a atitude da Armada e do Exército, a má disposição
em relação a um terceiro reinado e, derradeiramente, um fator desencadeante do
movimento: a política levada a efeito pelo 7 de junho contra os republicanos e as classes armadas.
Atribui-se
grande importância à atuação do partido republicano e seus órgãos de
propaganda, salientando o papel de alguns elementos, entre os quais Silva
Jardim[1].
Afirma-se
que o Ministério Ouro Preto se apresentara com tendências exclusivamente
políticas, relegando ao segundo plano os problemas econômicos e industriais,
despertando desde o início forte oposição.
Na
ocasião da apresentação do seu programa à Câmara, dois deputados fizeram
profissão de fé republicana. O padre João Manuel dera vivas à República e Cesário
Alvim gritara “Abaixo a Monarquia”.
Com a
intenção de demonstrar a falta de prestígio da Monarquia, relatou, entre outros
fatos, alguns episódios ocorridos durante uma viagem que o Conde D’Eu fez ao
norte do país. Silva Jardim, um jovem e ardente republicano, embarcou no mesmo
navio, com o intuito de promover a propaganda republicana, recebendo por toda
parte os aplausos que o povo negava ao príncipe.
Nos
últimos meses de 1889, a ideia republicana recebia numerosas adesões e os
conflitos entre os elementos da Guarda Negra- (defensores da monarquia) e os
republicanos multiplicavam-se.
Analisando,
finalmente, a intrincada questão militar, procura demonstrar que, ao assumir a
liderança do movimento, o Exército foi o veículo das aspirações populares: “o povo
selecionado no Exército foi o grande operário do movimento”.
“O
povo e o Exército têm sido os maiores contribuintes da realização das
aspirações nacionais.” “Provindo dos elementos mais democráticos têm
conjuntamente vibrado os mesmos sentimentos e concorrido para o mesmo fim, nas
grandes emergências da pátria.”
Acusou-se
o imperador de ter governado só para dominar e de dividir para governar,
abusando dos golpes de Estado e, fazendo os conservadores realizarem as
reformas propostas pelos liberais com o intuito evidente de anular os partidos.
Para
comprovar essa afirmação, transcreve-se as críticas feitas por monarquistas e
pela imprensa conservadora e liberal ao regime monárquico e ao imperador.
Algumas críticas já tinham sido divulgadas em 1870 pelo Manifesto Republicano[2] com o objetivo de
desmoralizar o regime.
A
seleção das citações é arbitrária apud Viotti da Costa: “Felício Buarque
reúne frases pronunciadas pelos políticos do Império em momentos de mau humor:
durante as crises ministeriais, quando partidos e políticos eram atingidos pela
ação do Poder Moderador”.
A
maioria das acusações tinha sido pronunciada durante acalorados debates
parlamentares, quando os ânimos se exaltaram e as palavras ultrapassaram os
limites das reais intenções.
Havia
muito ressentimento dos políticos feridos na sua susceptibilidade e cerceados
na sua ambição do que retratavam o regime monárquico.
E,
denotavam menos os desmandos da monarquia do Imperador do que, propriamente, a
sua vulnerabilidade oriunda da instituição do Poder Moderador, em virtude do
qual o imperador fora colocado no centro das disputas pessoais e partidárias,
comuns ao sistema parlamentar.
Os republicanos
iniciantes consideravam, entretanto, aquelas críticas justas e verdadeiras. Aos
seus olhos, a Monarquia era o regime de corrupção e de arbítrio, de violência e
de injustiças e, sobretudo, do governo do poder pessoal, discricionário e
alheio aos interesses do povo.
Essa
visão personalista e emocional dos fatos foi aceita sem restrições por alguns
historiadores. Ao tentar a reconstituição da história do período exageram o
papel da Coroa, atribuindo-lhe uma atuação muito maior do que esta poderia de
fato ter, responsabilizando-a por todos os males, como se a vontade de um só homem
pudesse explicar o processo histórico.
Não é
difícil verificar através de um estudo atento da bibliografia referente ao Império
e à República a persistência dessa versão. Em algumas obras, esta manteve-se
quase intacta, embora apareça disfarçada com as roupagens da erudição.
No
estudo de Felício Buarque reside a maioria das explicações que deram os
historiadores, e a partir de então, para o movimento republicano e ara a
proclamação da República. (In: BUARQUE, Felício. Origens republicanas:
estudos de gênese política em refutação ao livro ao Sr. Dr. Affonso Celso, O
Imperador no exílio. Disponível em:
https://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/242467 Acesso em 19.11.2023).
A sua
versão dos fatos era a versão de um republicano, com a qual evidentemente não
concordavam os monarquistas.
Os protestos
de Eduardo Prado e de Afonso Celso, o retrato que da República traçaram os
autores de “A década republicana”[3], a imagem do Império e da
República pintada pelo Visconde de Taunay[4] demonstraram que havia uma
interpretação diferente dos fatos. O coro dos adesistas, presunçoso em
demonstrar fidelidade ao novo regime. Mas, a versão dos monarquistas não
desapareceu.
Os adeptos
do regime deposto continuaram a dar a sua interpretação dos fatos e, a esta
aderiram em breve os desiludidos da República. Os livros, panfletos, manifestos
e protestos divulgados pela imprensa “sebastianista” registraram a versão
monarquista, segundo a qual a Proclamação da República[5] não passava de um levante
militar, alheio à vontade do povo.
Fora fruto
da indisciplina das classes armadas que contavam com o apoio de alguns
fazendeiros descontentes com a abolição dos escravos. Tinha sido grande equívoco. Afinal, o regime
monárquico dera ao país setenta anos de paz interna e externa, garantindo a unidade
nacional, o progresso, a liberdade e o prestígio internacional.
Uma simples
parada militar substituíra esse regime por um outro instável, incapaz de
garantir a segurança e a ordem, ou mesmo, de promover o equilíbrio econômico e
financeiro e, que além de tudo, restringia a liberdade individual.
Não
tinham ainda decorridos dois anos da proclamação da República e, já o Visconde
de Ouro Preto, último ministro da Monarquia, refutava a versão dos republicanos
criticando, especialmente, o depoimento de Cristiano Benedito Ottoni[6].
O
retrato que faz do Império é completamente diverso daquele pintado pelos
republicanos. O Império não foi a ruína, foi a conservação e o progresso.
Durante meio século manteve-se íntegro, tranquilo e unido o território
colonial.
Uma nação
atrasada e pouco populosa converteu-se em grande e forte nacionalidade,
primeira potência sul-americana, considerada e respeitada em todo o mundo. Aos
esforços do Império, três povos vizinhos deviam o desaparecimento do despotismo
mais cruel e aviltante. Então, o Império foi generoso com seus adversários.
Proscreveu
e aboliu de fato a pena de morte, extinguiu a escravidão, deu ao Brasil
“glórias imorredouras”, paz interna, ordem, segurança, liberdade individual
como jamais houve em país algum.
A
síntese mais completa, nesse período, é apresentada na obra de Felício Buarque:
“Origens republicanas – Estudos de gênese política”, publicada em 1894 com a
intenção de refutar as afirmações feitas por Afonso Celso em “O imperador no exílio”.
Começava
afirmando que a democracia no Brasil tem origens étnicas no povoamento e que o
regime republicano sempre constituiu aspiração nacional.
Os
tronos estavam por toda parte do mundo e estavam abalados pelas transformações
econômicas e sociais que, uma vez desencadeadas, determinariam necessariamente
o desaparecimento do regime monárquico.
Não era
muito diferente a ideia de Oscar Araújo[7] ao publicar em 1893 uma
pequena obra em francês sob o título “L’idée républicaine au Brésil”. Enfatizou
também as arbitrariedades e os abusos do Poder Moderador, considerando que a
manutenção da escravidão por tantos anos, a má gestão financeira, as guerras
contra nações estrangeiras são devidas mais à incapacidade do soberano, do que
à incompetência de seus ministros.
Ao
analisar a origem da ideia republicana, afirmava que a monarquia brasileira
estava isolada na América e, não tinha bases no Brasil.
Atribuiu
aos republicanos o papel principal na proclamação da República e aos militares
um papel não só secundário, como acidental.
Como o
problema originava-se de causas econômicas e sociais, sua resolução poderia ser
retardada, mas nunca impedida. Partindo de uma concepção mecanicista da
história, afirma que a substituição das monarquias pela forma republicana de
governo “é sobretudo uma fatalidade mecânica”.
Analisando,
finalmente, a questão militar, procurou-se demonstrar que, ao assumir a
liderança do movimento, o Exército fora o veículo das aspirações populares selecionado
no Exército foi o grande operário do movimento”.
“O
povo e o Exército têm sido os maiores contribuintes da realização das
aspirações nacionais.” “Provindo dos elementos mais democráticos têm
conjuntamente vibrado os mesmos sentimentos e concorrido para o mesmo fim, nas
grandes emergências da pátria.”
Acusaram
o imperador de ter governado só para dominar e de dividir para governar,
abusando dos golpes de Estado e fazendo os conservadores realizarem as reformas
propostas pelos liberais com o intuito evidente de anular os partidos.
Repetindo
uma opinião tantas vezes emitida, escreveu: “A política do Império de feição
inteiramente pessoal só visou desprestigiar os caracteres insubmissos ao
servilismo e elevar os que se curvavam aos acenos do poder supremo. Abusando das atribuições do Poder Moderador D.
Pedro aniquilou a independência dos outros poderes políticos com a onipotência
do seu indômito querer”.
Para
comprovar essa afirmação, transcreveu críticas feitas por monarquistas e pela
imprensa conservadora e liberal ao regime monárquico e ao imperador. Algumas
críticas já tinham sido divulgadas em 1870 pelo Manifesto Republicano com o
objetivo de desmoralizar o regime.
O
retrato que fizeram do Império é completamente diverso daquele pintado pelos
republicanos. O Império não foi a ruína, foi a conservação e
o progresso. Durante meio século manteve-se íntegro, tranquilo e unido o
território colonial.
O
Império foi generoso com seus adversários. Proscreveu e aboliu de fato a pena
de morte, extinguiu a escravidão, deu ao Brasil “glórias imorredouras”, paz interna,
ordem, segurança, liberdade individual como jamais houve em país algum.
Ao
lado dessas interpretações eivadas de subjetividade, apareciam outras mais
serenas, porque menos comprometidas. Max Leclerc, viajante francês que
percorria o Brasil por ocasião da proclamação da República, deixou suas
impressões num livro que se chamou Cartas do Brasil.
In
verbis: “A revolução está terminada e ninguém parece discuti-la,
mas aconteceu que os que fizeram a revolução não tinham de modo algum a intenção
de fazê-la e há atualmente na América um presidente da República à força. Deodoro
desejava apenas derrubar um ministério hostil. Era contra Ouro Preto, mas, não
contra a Monarquia. A Monarquia caíra. Colheram-na sem esforço como um fruto
maduro.”
Cogitara-se
em cumplicidade dos fazendeiros, mas a seu ver a verdadeira cumplicidade era a
do silêncio e da força de inércia. “O
edifício imperial, mal construído, edificado para outros tempos e outros destinos,
já não bastava às necessidades dos novos tempos. Incapaz de resistir à pressão
das ideias, das coisas e dos homens novos já se tornara caduco e tinha seus
alicerces abalados.”
Quais
forças eram essas? Quais os grupos novos que exigiam uma mudança de regime? Max
Leclerc não cogitou, limitando-se a invocar as razões conhecidas para explicar
o movimento de 15 de novembro.
Atribuiu
a queda da Monarquia ao fato de o poder estar concentrado nas mãos do imperador
que envelhecera perdendo o controle da situação, alude à má disposição
existente em relação às perspectivas de um terceiro reinado, refere-se, enfim,
a causas meramente circunstanciais.
Restam,
assim configuradas algumas das versões sobre a proclamação da República que
acabaram por se fixar na historiografia.
Durante
algum tempo, os historiadores optaram ora por uma ou outra versão, ora dando
crédito à versão monarquista, ora à republicana. Alguns procuraram acomodar as
duas versões em uma interpretação eclética, tentando conciliar as contradições.
A
crise do pensamento constitucional da Primeira República trouxe turbulências
políticas e instabilidades institucionais na década de 1920 que levaram ao seu
fracasso como sistema político.
Em
verdade, o declínio do constitucionalismo liberal brasileiro seguiu uma
tendência mundial e, o cenário brasileiro apresentava a grave crise e
verdadeira deterioração da autoridade estatal.
Não foram,
em geral, muito além do que já havia sido dito pelos seus contemporâneos. Os
estudos parecem decalcar-se uns nos outros. Repetem as mesmas ideias, citam os
mesmos fatos, transcrevem as mesmas palavras, incluindo-se as citações.
As
primeiras doutrinas jurídicas elaboradas sobre a Teoria Constitucional no
momento de crise severa do discurso liberal da Primeira República foram
hesitantes e, mesmo diante do silêncio dos juristas sobre o período entre 1920
a 1930, quando a crise republicana atingiu seu clímax.
O
pensamento constitucional da época era voltado à construção de ideais de uma
nação que precisava se modernizar e superar o que era considerado um “forte
atraso histórico” nos âmbitos econômico, social e institucional. E, o vácuo de
poder deixado pela queda do Segundo Império e de suas instituições o que levou
a comunidade jurídica a debater a extensão dos instrumentos de manutenção da
ordem.
Em grande
medida, o Direito Constitucional brasileiro visava consolidar a unidade do
poder do Estado o que era árduo em um país dotado de dimensões continentais. E,
assim era um desafio severo aglutinar uma nação tão plural e dispersa em vasto
território, com fortes debilidades e, ainda, com uma frágil infraestrutura e a
solução eleita foi consolidar um sistema cuja unidade restava assentava no
federalismo.
No
alvorecer do século XX, deu-se o degaste da Teoria do Direito e do Pensamento
Constitucional que já se fazia notar nos EUA no que se convencionou a chamar de
crise do pensamento jurídico clássico[8].
Em
nosso país, o controle social e político que fazia a Federação permanecer unida
dependida de instituto do estado de sítio[9] e da intervenção federal,
isto é, do uso constitucional de medidas de força por parte do governo
federativo.
O uso
reiterado de medidas de exceção foi a tônica dos governos republicanos e, o
Direito Constitucional pouco funcionava no sentido de proteção de direitos e
garantias individuais e de efetivação do controle de constitucionalidade das
leis.
Registre-se que em quase todos os governos
republicanos se discutiu com profundidade sobre a natureza e os limites do
estado de sítio e da intervenção federal. E, um dos principais questionamentos
é o papel das garantias individuais nesse constante estado de lei marcial.
O
cenário próprio de instabilidade política nos Estados da Federação elevava o
descrédito da experiência republicana. Foi o caso do Rio Grande do Sul, com a
Revolução de 1923, que somente teve termo com o Pacto de Pedras Altas.
A
guerra civil travada entre chimangos (partidários de Borges de Medeiros) e
maragatos (aliados de Assis Brasil) durou onze meses, e foi nesse momento em
que houve a reorganização constitucional do Estado do Rio Grande do Sul,
restando vedada, finalmente, a reeleição de Borges.
Em São
Paulo, um dos símbolos da instabilidade da República foi a Revolta Paulista de
1924[10], o segundo grande levante
tenentista.
Nos
anos 1920, a Primeira República dava sinais claros de desgaste, de fadiga dos
metais. Havia forte dúvida sobre a capacidade de a República oligárquica
modernizar o País e reorganizar uma política efetivamente democrática.
O
fenômeno do tenentismo jogou ainda mais lenha na fogueira nesses cenários de
turbulências incessantes.
José
de Castro Nunes foi quem talvez tenha escrito o mais consistente estudo sobre a
crise da década de 1920 e as perspectivas de futuro do Brasil, definindo a
experiência republicana como um “estado de sítio crônico” (NUNES, 1924), que
gerava o “desamor pela liberdade”.
A
recorrente decretação do estado de sítio era vista como “ação insidiosamente
tóxica” que apassivava o cidadão. A
consequência era que as pessoas se habituavam a “ver no uso e no gozo dos seus
direitos fundamentais uma graça do soberano”.
O
jurista fluminense era enfático em definir que se tratava de uma forma de
cesarismo adaptado à realidade brasileira.
Já na
década de 1920, o jurista Castro Nunes[11] diagnosticou que os
ideais constitucionais, não raro, estavam desnorteados em face do forte volume
de arbitrariedades cometidas pelo Executivo hipertrofiado.
Entendia-se
que a crise do ideal no Brasil estava longe de ser resolvida, e que o “jogo
constitucional dos poderes” seria conduzido a “golpes de
reformas legislativas” (NUNES, 1924), por mais que tal remédio fosse flagrantemente
ineficaz contra os abusos de um poder hipertrofiado[12].
Entretanto,
os excessos do Executivo ainda eram vistos como “mal menor”, que “é preciso
tolerar para evitar a anarquia, a dispersão, a ineficiência administrativa” (NUNES,
1924), pois tais sintomas eram responsáveis pela “ruína das democracias novas,
visceralmente turbulentas e com formidável programa econômico a realizar”.
Dentre
as inúmeras preocupações dos publicistas brasileiros do começo do século,
buscava-se a estrutura constitucional ideal para um país tão complexo e
desigual como o Brasil.
As
polêmicas que se repetiam década após década diziam respeito à lisura do
processo eleitoral, à inviolabilidade do voto secreto e universal (FREIRE,
1910), à independência do Poder Judiciário[13], à separação de poderes e
à organização de partidos políticos de âmbito nacional.
Clamava-se
pela modernização da gestão pública, apontando para o problema da corrupção
e a crônica ineficiência governamental.
Na
década de 1920, estava evidente para muitos juristas que a efetivação das
liberdades individuais dependia de um processo eleitoral justo, leal e liso.
Sampaio Doria era taxativo nesse sentido, afirmando categoricamente que o que
“constitui e singulariza a forma republicana, é a eleição do chefe do Estado
pelo povo”, ou seja, “o carácter eletivo da sua magistratura suprema” (DORIA,
1926).
O voto
secreto era colocado como condição da liberdade. Alberico Fraga, professor de
Economia Política e Direito Constitucional na Faculdade de Direito da Bahia,
asseverava que “a verdade eleitoral é o princípio basilar da nossa regeneração
política” (FRAGA, 1928).
O que
estava em pauta para alguns juristas como Fraga era a regeneração dos costumes
políticos, tão combalidos pelas más práticas da Primeira República, e isso,
passava pela criação de uma “opinião nacional”, o que não se confundia com a
“campanha difamatória de certa imprensa, nem pelos pronunciamentos criminosos
dos quartéis, mas pelo civismo, pela vitória da lei, pela verdade do voto, pelo
desprezo dos nossos maus hábitos” (FRAGA, 1928).
A
consequência do processo de modernização dos hábitos da nação iria, na visão do
jurista baiano, propiciar o surgimento de novos partidos, “nascidos
espontaneamente dos movimentos das grandes massas eleitorais” (FRAGA, 1928).
Foi um longo processo de sedimentação da
crítica jurídica ao sistema representativo que, efetivamente, logrou êxito anos
mais tarde no varguismo com Oliveira Vianna, Themístocles Cavalcanti, Monte
Arraes[14], Almir de Andrade. Os
diagnósticos doutrinários sobre os fracassos da República são fontes
interessantes para se compreender como se deu seu ocaso.
Criticada
de todos os lados, inclusive por parte de muitos daqueles que foram ativistas
desse momento histórico, a Constituição de 1891 foi duramente analisada na obra
coletiva organizada por Vicente Licínio Cardoso[15], à margem da história da
República.
A obra
de Pedro Lessa[16]
talvez represente a derradeira grande tentativa de sistematizar o liberalismo
jurídico brasileiro antes da Revolução de 1930.
Antônio
Paim definiu a postura de Pedro Lessa como um “positivismo ilustrado”, pois
contraposto às práticas autoritárias da Primeira República e, também, às
doutrinas do castilhismo.
Contudo,
aponta que Lessa não conseguiu jamais formular uma plataforma teórica clara
capaz de superar as anomalias do sistema político. O jurista
que tentaria dar o passo à frente na defesa da doutrina do liberalismo no
Brasil foi João Arruda[17], que assumiu à vaga de
professor catedrático da Faculdade de Direito de São Paulo com a morte de Lessa
em 1921.
A Primeira República ou a Velha República foi o período de 1889 até 1930 e foi caracterizada pela Presidência de dois marechais do exército o que conferiu o nome de República da Espada. Esses dois mandatos bancados por uma elite rural paulista e mineira que passaram se revezar no poder do governo federal, garantindo o poder da oligarquia agrária. Conheceu uma série de revoltas urbanas e rurais devidas as mudanças sociais e políticas pelas quais passaram o país. Com destaque à Guerra dos Canudos, a Revolta da Vacina de 1904. E, foi quando o país iniciou sua industrialização, alterando a paisagem urbana de muitas cidades e criando condições para a formação da classe operária no país[18].
Essas
mudanças resultaram em novas pressões políticas e sociais, que as oligarquias
paulistas e mineiras não poderiam mais controlar. A Revolução de 1930[19] foi o ápice desse
processo, o que resultou no período conhecido como Era Vargas.
Enfim, desde sua nobre origem, a república é um ideal a se aperfeiçoar pela luta e concretização da preservação da dignidade humana, onde vige a progressiva e definitiva inclusão do cidadão, superando todos os preconceitos, racismos e discriminações. A diversidade e pluralidade são as joias mais preciosas da legítima e autêntica república.
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Notas:
[1]
Antônio da Silva Jardim (1860-1891) foi um ativista político brasileiro.
Formado em Direito, defendeu principalmente as causas dos escravos. Foi o mais
atuante propagandista da República. Em 1888, com a crise do império, participa
de comícios em prol da República. Por sua iniciativa pessoal, realizou em
Santos, em 28 de janeiro, o primeiro comício republicano do país. No dia 13 de
maio de 1888 foi promulgada a lei de libertação dos escravos e Silva Jardim
junta-se às comemorações populares, mas, republicano, procura evitar o
excessivo louvor à Princesa Isabel. Silva Jardim percorre diversas cidades
fluminenses, paulistas e mineiras para divulgar o novo regime político. Ao
mesmo tempo, colaborava na Gazeta de Notícias. Por seu radicalismo e discursos
violentos foi excluído do Partido Republicano. Depois de instalada a República
foi aos poucos sendo afastado do primeiro governo republicano. Em 1890,
candidata-se para compor o Congresso Constituinte, pelo Distrito Federal, mas é
derrotado. Retira-se da vida política.
[2]
Um grupo de fazendeiros do oeste paulista e profissionais liberais, com o
objetivo de aumentar seu espaço na política, divulgaram, em 1870, o Manifesto
republicano que defendia o federalismo e a República. O Manifesto era favorável
que o Brasil seguisse a república como os outros países da América. A revolução
de 7 de abril de 1831, trazendo à superfície as ideias e as aspirações
sufocadas pela reação monárquica, deu novamente azo ao princípio federativo
para manifestar-se e expandir-se. A autonomia das províncias, a sua
desvinculação da Corte, a livre escolha dos seus administradores, as suas
garantias legislativas por meio das assembleias provinciais, o alargamento da
esfera das municipalidades, essa representação resumida da família política, a
livre gerência dos seus negócios, em todas as relações morais e econômicas,
tais foram as condições características desse período de reorganização social, claramente
formuladas ou esboçadas nos projetos e nas leis que formaram o assunto das
deliberações do governo e das assembleias desse tempo.
[3]In: Disponível em: http://www.gustavofranco.com.br/uploads/files/A%20D%C3%A9cada%20Republicana.pdf. Acesso em 19.11.2023.
[4]
Visconde de Taunay (Alfredo Maria Adriano d'Escragnolle Taunay) nasceu em 22 de
fevereiro de 1843, na cidade do Rio de Janeiro. Mais tarde, foi militar,
professor, deputado, senador e presidente dos estados de Santa Catarina e do
Paraná. Além disso, o romancista participou da Guerra do Paraguai. Além de
escritor entusiasta da cultura nacional, Taunay também foi engenheiro,
professor, artista plástico, político, músico, historiador e sociólogo. Sua
obra Inocência pode ser considerada a obra prima do romance regionalista
(Sertão do Mato Grosso) do nosso Romantismo.
[5]
Muitos historiadores ainda levantam como controvérsias desse acontecimento a
dimensão da participação do marechal Deodoro da Fonseca e a participação
popular no evento. No quadro de Henrique Bernardelli (1857-1936), o militar é
propositadamente recuperado como a figura central, o representante maior dos
ideais de liberdade associados ao novo período. Esses e outros retratos da
época ajudaram a disseminar uma visão parcial do episódio, apagando outros
personagens que desempenharam papel relevante na mudança. Iluminar esses grupos
esquecidos é o ponto de partida para apresentar uma visão crítica da
proclamação da República.
[6]
Cristiano Benedito Ottoni foi capitão-tenente da Marinha, engenheiro, professor
de Matemática, diretor da Estrada de Ferro Dom Pedro II, senador do Império e,
depois da proclamação da República, foi investido do mandato de senador de
República. Nascido na Vila do Príncipe, depois cidade do Serro (MG), em 1811,
Cristiano Benedito Ottoni foi eleito deputado pela província de Minas Gerais em
1835, tendo sido reeleito outras vezes. Foi depois senador do Império pela
então província do Espírito Santo.
[7]
A trajetória de Oscar de Araújo entre o Brasil e a França, segundo o dicionário
biográfico de Augusto Victorino Alves Sacramento Blake, no qual nos forneceu
algumas informações sobre Oscar de Araújo e de sua família. Oscar de Araújo
nasceu no Rio de Janeiro em 28 de março de 1860, sendo sua mãe Elvira Ribeiro
de Araújo e seu pai António de Arvile Araújo. Habilitado a seguir seus estudos
na Escola Polytechnica da capital da Corte, posteriormente Oscar de
Araújo partiu a destino da França para seguir estudos de medicina. Fixado na
capital francesa em data pouco precisa, Oscar de Araújo foi externo dos
hospitais metropolitanos de Paris e, pouco tempo depois, tornou-se sócio do
Instituto Internacional de Sociologia de Paris.
[8]
O processo de
crise e decadência da economia política clássica ocorreu em virtude de um duplo
processo atinente às determinações da crise econômica do capitalismo a partir de 1825 e posterior eclosão das
revoluções na parte ocidental e central do continente europeu em 1848.
[9]
O Estado de Sítio tem origem no Direito Francês do século XVIII, em que se
admitia que em circunstâncias graves, como o sítio de uma cidade por inimigo em
armas, justificava o desrespeito a certos direitos individuais que em situação
de normalidade eram absolutos. O estado de sítio é instituto jurídico que foi
criado na França no contexto da Assembleia Constituinte da Revolução Francesa,
em julho de 1791. "O estado de sítio é um instrumento burocrático e
político em que o chefe de Estado — que, no Brasil, é o(a) Presidente da
República — suspende por um período temporário a atuação dos Poderes
Legislativo (deputados e senadores) e Judiciário. Trata-se de um recurso
emergencial que não pode ser utilizado para fins pessoais ou de disputa pelo
poder, mas apenas para agilizar as ações governamentais em períodos de grande
urgência e necessidade de eficiência do Estado."
[10]
A Revolta Paulista de 1924 foi um levante militar organizado por jovens
oficiais do Exército que faziam parte do Tenentismo. Os rebeldes pretendiam
derrubar o governo de Artur Bernardes, pois não estavam contentes com os rumos
tomados pelos civis enquanto líderes da república brasileira. Por fim, como
consequência da Revolta Paulista de 1924, centenas de pessoas faleceram, e a
maioria das mortes aconteceu por conta dos bombardeios realizados pelas tropas
legalistas (que defendiam o governo) na cidade. Estima-se que cerca de 720
pessoas morreram na revolta.
[11]
O ministro José de Castro Nunes nasceu em Campos, no Rio de Janeiro, em 15 de
outubro de 1882. Filho de João Francisco Leite Nunes – que foi diplomata e
cônsul do Brasil no Uruguai – e Tereza da Conceição Castro Nunes construiu uma
nobre carreira na magistratura, tornando-se ministro de duas das mais
importantes Cortes deste país: o Tribunal de Contas e o Supremo Tribunal
Federal (STF). A partir de 1912 trabalhou como redator do jornal A Noite, de
onde saiu em 1915 para advogar em Niterói na condição de procurador de feitos
da prefeitura daquele município, cargo que exerceu até 1931. Entretanto, em um
breve interregno, José de Casto Nunes exerceu a função de diretor da Caixa
Econômica Federal entre o período de maio de 1927 a janeiro de 1928, quando
chegou a se tornar vice-presidente dessa instituição. A partir da década de
1930 sua carreira como magistrado começou a se consolidar. Entre 1931 e 1934
atuou como juiz federal substituto no próprio Rio de Janeiro, período no qual
ainda fez parte da comissão responsável por elaborar um anteprojeto de
Constituição enviado à Assembleia Nacional Constituinte em novembro de 1933.
[12]
A Constituição de 1891 determinou o fim do voto censitário. Assim, não era mais
necessário comprovar uma renda mínima para poder votar. O eleitor apanhava as
cédulas com os cabos eleitorais antes de entrar no recinto da assembleia
eleitoral. Apesar de ser proibido, muitas vezes elas eram distribuídas por
membros da mesa eleitoral. Havia, por fim, um ponto de destaque na forma de
votação exercida durante a República Velha: o voto não era secreto.
[13] Cogitar que o Judiciário seja uma espécie de caixa de ressonância da política nacional brasileira, conforme propôs Emília Viotti, não é equivocado. Basta lembrar dos anos 1920, em face do grande número de processos envolvendo militares. E, então o STF foi inundado por Habeas Corpus impetrados por pacientes que participaram dos levantes de 1922 a 1924. Ao cogitar da autonomia do Judiciário em face do Executivo, é também problemático e empiricamente desafiador comprovar. Cabe recordar que o STF não libertou os presos políticos apesar dos HCs, apenas liberava algumas demandas.
[14]
Themístocles Brandão Cavalcanti (Rio de Janeiro, 14 de outubro de 1899 — 19 de
março de 1980) foi um político, jurista e magistrado brasileiro. Entre outros
cargos, foi procurador-geral da República e ministro do Supremo Tribunal
Federal. Formado em direito pela Universidade do Rio de Janeiro em 1922, atual
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), exerceu cargos públicos nas
décadas de 1930 e 1940. Elegeu-se deputado da Assembleia Constituinte do antigo
Estado da Guanabara em 1960. Foi consultor geral da república no governo de
Getúlio Vargas, de 24 de maio a 29 de outubro de 1945. Foi diretor da Revista
de Direito Público e Ciência Jurídica e da Revista de Ciência Política,
editadas pela Fundação Getúlio Vargas. Em 1967 foi nomeado ministro do Supremo
Tribunal Federal pelo então presidente Costa e Silva, assumindo a vaga deixada
pela aposentadoria de Hahnemann Guimarães. Exerceu o cargo por dois anos,
aposentando-se em 14 de outubro de 1969, quando completou 70 anos de idade. Na
sua passagem pelo tribunal, foi relator do habeas-corpus 45.232, no qual
declarou inconstitucional o artigo que proibia profissionais liberais de
exercerem suas profissões caso sofressem acusações de violar a Lei de Segurança
Nacional.
[15]
Em 1916 ocupou por seis meses a prefeitura da cidade de São Gonçalo, estado do
Rio de Janeiro. Sua vida profissional não foi, contudo, promissora.
Decepcionado veio a abandonar a engenharia anos mais tarde. Sua atuação na área
da Educação o tornou conhecido na década de 1920, momento em que foi presidente
da Associação Brasileira de Educação (ABE). Veio, em 1927, a ocupar a cadeira
de 'arquitetura civil-higiene dos edifícios-saneamento das cidades' na Escola
Politécnica do Rio de Janeiro. Ainda jovem, foi um dos fundadores do Botafogo
Football Club em 12 de agosto de 1904, que viria mais tarde a se fundir com o
com o Club de Regatas Botafogo, formando o atual Botafogo de Futebol e Regatas.
As viagens ocuparam importante papel em sua vida. Em plena Primeira Guerra
Mundial conheceu os Estados Unidos da América e, posteriormente, a Alemanha. Em
1921 realizou uma longa expedição pelo Rio São Francisco, onde teria contraído
o mal de Chagas. Ficou famoso por ter sido o primeiro brasileiro a fazer a
viagem inaugural do dirigível LZ 127 Graf Zeppelin, da Europa para o Brasil,
tendo aterrissado em Recife no dia 22 de maio de 1930. Sofria de um quadro de
depressão que o afetava desde algum tempo. Vicente Licínio suicidou-se com um
tiro no peito no Hotel Payssandu, no bairro do Flamengo (bairro do Rio de
Janeiro), na cidade do Rio de Janeiro, em 10 de junho de 1931, sete meses após
ter feito uma primeira tentativa.
[16]
Pedro Augusto Carneiro Lessa (Serro, 25 de setembro de 1859 — Rio de Janeiro,
25 de julho de 1921) foi um jurista, magistrado, político e professor
brasileiro. Em 1885, Pedro Lessa iniciou uma fecunda carreira pública, com a
nomeação para o cargo de secretário da Relação de São Paulo. Dois anos mais
tarde, em 1887, alcançou o primeiro lugar em concurso para docente na Faculdade
de Direito de São Paulo. Sem que tivesse conseguido a nomeação, em 1888 voltou
a prestar concurso, obtendo outra vez o primeiro lugar, e sendo nomeado em
seguida como professor catedrático. Foi nomeado chefe de polícia do Estado de
São Paulo e eleito deputado à Assembleia Constituinte de São Paulo em 1891,
tendo tomado parte dos trabalhos de elaboração da Constituição estadual. Poucos
anos mais tarde retirava-se da vida pública, para se dedicar exclusivamente ao
magistério e à advocacia. Entretanto, em outubro de 1907 foi nomeado ministro
do Supremo Tribunal Federal, quando da aposentadoria de Lúcio de Mendonça.
Pedro Lessa era mulato e foi o primeiro afrodescendente a ser ministro do STF
(o segundo foi Hermenegildo Rodrigues de Barros), 96 anos antes de Joaquim
Barbosa. Como ministro do STF, foi responsável pela ampliação do instituto do
"habeas-corpus" a casos não previstos na Constituição brasileira de
1891, contribuindo para a criação do mandado de segurança. Eleito em 7 de maio
de 1910 para a cadeira 11 da Academia Brasileira de Letras, sucedendo a Lúcio
de Mendonça, foi recebido em 6 de setembro deste mesmo ano pelo acadêmico
Clóvis Beviláqua. Recebeu, por sua vez, o acadêmico Alfredo Pujol. Foi ativo
integrante da Liga da Defesa Nacional, da qual foi um dos fundadores, a 7 de
setembro de 1916. Pertenceu a várias instituições culturais, entre as quais o
Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro. Obras: 1899 - Interpretação dos
Arts. 23, 34, 63 e 65 da Constituição Federal; 1900 - É a história uma ciência?
- Introdução à História da Civilização de Buckle (ensaio); 1909 - Dissertações
e polêmicas - Estudos jurídicos; 1912 - Estudos de filosofia do Direito; 1915 -
O determinismo psíquico e a imputabilidade e responsabilidade criminais; 1915 -
Do Poder Judiciário; 1916 - Discursos e conferências.
[17]
Foi o prof. JOÃO ARRUDA um bravo e culto advogado, um dos mais corajosos e
ilustres que o Foro de São Paulo, com tão nobres tradições, conheceu em
qualquer tempo. Com ele, por adversário, tivemos ensejo bastas vezes de terçar
armas, em pleitos renhidos em que delicadíssimas questões de honra e pundonor,
ou avultados haveres e cúbicas, se focalizaram na tela judiciaria, ao mesmo
tempo que as paixões e as intransigências de nossos clientes tornavam as
pelejas sobremodo implacáveis. Pois bem: queremos dar aqui publico testemunho
de que jamais, no maior torvelinho dos recontros, deixou o Prof. JOÃO ARRUDA de
manter aquela linha de superior elegância e de estrita cortesia, que distingue
o verdadeiro advogado do simples postulante forense. In: VAMPRÉ,
Spencer. Professor João Arruda. Discurso pronunciado, a 24 de novembro de 1944
na sala João Mendes Junior, em nome da Congregação da Faculdade de Direito,
quando da comemoração do falecimento do saudoso professor emérito. Disponível em
https://www.revistas.usp.br/rfdusp/article/download/66018/68629/87393
Acesso em 19.11.2023.
[18]
Com a mudança de regime, o Brasil deixou de ser monarquia para adotar um modelo
de república federativa presidencialista. República é a forma de governo de um
país, com poderes constituídos a partir da decisão de cidadãos ou
representantes. Historicamente, trata-se de um contraponto à monarquia, em que
o poder é hereditário. Federativa porque é um país formado por unidades
autônomas, com poder relativamente descentralizado em estados e municípios. É
diferente dos países unitários, em que o governo central é quem manda em quase
tudo. Presidencialista porque a chefia de governo e de Estado estão
concentrados em um só cargo. É diferente do parlamentarismo, em que o Congresso
tem poderes mais amplos de administração, via primeiro-ministro. In:
FÁBIO, André Cabette. República: conceitos, marcos e rearranjos políticos no
Brasil. Disponível em: https://www.nexojornal.com.br/explicado/2019/11/15/Rep%C3%BAblica-conceitos-marcos-e-rearranjos-pol%C3%ADticos-no-Brasil
Acesso em 19.11.2023.
[19]
A Revolução de 1930 é considerada o acontecimento da história do período
republicano brasileiro que pôs fim à chamada República Velha e, mais do que
isso, foi o acontecimento que também deu fim às articulações políticas entre as
oligarquias regionais do Brasil, que sobrepunham os seus interesses
particulares aos interesses do Estado e da Nação como um todo. O principal
protagonista da Revolução de 1930 foi Getúlio Dorneles Vargas, então presidente
(nome que se dava aos governadores da época) do estado do Rio Grande do Sul.
Para melhor compreendermos esse episódio de nossa história.