Anistia, indulto e graça
São formas de extinção da punibilidade constantes no artigo 107, II do Código Penal brasileiro. São benefícios concedidos aos presos e que instituem espécie de perdão que extingue as punições aplicadas. Enquanto a anistia é concedida pelo Congresso Nacional através de lei federal e extingue a pena e todas suas consequências. A graça e o indulto apesar de similares, são concedidos por meio de Decreto do Presidente da República, mas só extingue a pena, porém, seus efeitos secundários permanecem.
O vocábulo anistia se origina
do grego amnestia, cujo significa é amnésia, ou seja, esquecimento tem
raízes conectadas com alterações significativas na ordem política e social em
certa sociedade ou comunidade jurídica. Trata-se de mais ampla modalidade de
clemência e extingue todos os efeitos penais do crime, e até para fins de
reincidência, exceto os efeitos extrapenais como a obrigação de indenizar
vítimas.
Extrai-se do artigo 9º do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias da CFRB/1988 que a anistia não se
reporta aos atos praticados pelos anistiados, mas, aos direitos que são destes
subtraídos. A anistia[1] em muito se diferencia por
ser essencialmente motivada por questões de ordem política, o que a torna
peculiar numa democracia relativamente recente.
Não se trata de
descriminalização dos fatos típicos e puníveis, mas sim, da retirada de todos
ou parte dos principais efeitos ainda pendentes, em que são impedidos efeitos
jurídico-penais. Exemplificando, a Lei 6.683/1979[2] concedeu a anistia aos
autores de delitos praticados com motivação política, entre setembro de 1961 e
agosto de 1979, e alcançou aqueles que tiveram suspensos os direitos políticos,
bem como os servidores públicos civis e militares, além de os dirigentes e
representantes sindicais vítimas de perseguição no período indicado.
Caberá anistia[3] que pode ser concedida
antes de início da persecução penal, durante a ação penal ou mesmo após a
condenação. Sendo vedado a concessão desta prerrogativa à prática de tortura,
tráfico de entorpecentes e demais delitos definidos como hediondos[4].
A graça, ao contrário da
anistia, apesar de extinguir a punibilidade do fato, tem os efeitos limitados à
execução da pena aplicada na condenação criminal, não abolindo os demais
efeitos dessa decorrente. Em geral, é concedida por questões humanitárias ou
compensatórias em que um certo indivíduo é beneficiado a partir de situações ou
condições peculiares a este.
Também é chamada de indulto
individual e concedida pelo Presidente da República. É o ato de vontade
exclusiva do Chefe do Poder Executivo, praticado por meio de decreto conforme
prevê o artigo 84, XII da Constituição vigente.
O conceito de graça consiste
em espécie de clemência soberana, como afirma Noronha. Na dicção de Hungria, a
expressão graça utilizada pelo Código Penal brasileiro teria sido empregada em
sua expressão estrita, como uma modalidade de causa extintiva da punibilidade.
De forma que prossegue o
doutrinador, a utilização das três espécies de clemência (anistia, graça e
indulto) não permite a sinonímia, ao argumento de que não se compreende em dispositivo
legal o uso de duas expressões com o mesmo sentido. É característica essencial
ao instituto é a sua ordinária solicitação pelo interessado, ao contrário do
indulto que de regra é uma espécie de graça espontânea do poder público. A
graça é sempre individual, o indulto será sempre coletivo.
A análise da graça como
modalidade abstrata de perdão já foi examinada diversas vezes pelo STF como nos
casos do HC77.528/SP, HC 90.364/MG, HC 118.213/SP, HC 103.618/RS e, etc. Em
todos estes casos se analisava a constitucionalidade da regra que vedava aos
crimes hediondos a concessão de graça ou anistia. O entendimento firmado foi o
de que a graça[5]
seria modalidade de perdão, sendo o indulto uma espécie (individual ou
coletivo).
O indulto é termo advindo do
latim indultus, proveniente do verbo indulgere que significa
concessão, permissão, perdão. Insere-se entre as prerrogativas do Presidente da
República, em regra, tem caráter coletivo, porém, poderá ser individual, extingue
os efeitos penais da condenação, porém, não os efeitos secundários, tal como o
registro de antecedente criminal.
Também não se ignora que a
atribuição do caráter de instituto ao indulto se deu já na Constituição de
1824, em que, no artigo 101131, era previsto ao Imperador, no gozo do Poder
Moderador, perdoar e moderar as penas impostas e os condenados.
Ademais, com o advento da
República, na Constituição de 1891 e seguintes, foi prevista a atribuição de
perdoar a pena (embora nem sempre mantendo os mesmos termos) como privativa ao presidente
eleito, além de regulamentos infraconstitucionais que também faziam menção a
essa prerrogativa.
Mas, a fim de construir a
análise em determinado período da história recente, a escolha da referência
temporal se deu para possibilitar a observação de tendências (ou a inexistência
delas) na construção dos decretos a cada governo estabelecido na vigência da Constituição
atual.
Observa-se que existiram
modificações ao longo da publicação de decretos de indultos a cada ano, seja
para proferir abrandamento ou mesmo enrijecimento das possibilidades de
clemência presidencial.
A primeira parte da obra de
Ann M. Schneider[6]
(Amnesty in Brazil: Recompense after Repression, 1895-2010)
abordou o período entre as décadas de 1890 e 1910, quando a anistia emergiu
como ferramenta para apaziguar os ânimos acirrados da Velha República.
E, há três personagens
principais, a saber: o almirante Eduardo Wandenkolk, João Cândido Felisberto, o
"almirante negro" e, Rui Barbosa, o elo entre a história dos dois.
Wandenkolk foi ministro da Marinha no governo do marechal Deodoro da Fonseca e
senador da República de 1890 a 1900. Seu papel mais relevante, contudo, foi o
de ser inimigo ferrenho de Floriano Peixoto.
Em 23.11.2891, Deodoro da
Fonseca, foi o primeiro presidente da República, renunciou ao cargo. Peixoto,
seu vice de índole autoritária assumiu a Presidência da República. E, poucos
meses depois, um grupo de militares de alta patente circulou documento exigindo
novas eleições para presidente. Wandenkolk foi um dos signatários do Manifesto
dos treze generais, como o texto ficou conhecido, um ato de sedição aos olhos
do novo presidente, e acabou banido para Tabatinga, na longínqua fronteira
amazônica.
Dentro de seu exílio interno,
Wandenkolk escreveu carta a Rui Barbosa, reclamando da desumanidade com que
estão sendo tratados os presos políticos em Tabatinga. Barbosa como grande advogado comprometido com
as promessas cívicas da Constituição republicana, entrou com habeas corpus
no STF[7] em nome de Wandenkolk, os
outros signatários do manifesto e mais trinta pessoas presas ou banidas por
decreto presidencial.
O STF sitiado pelo arbítrio do
governo Peixoto[8],
rejeitou o pedido, mas, em 1894, o contexto político mudou com a posse de
Prudente de Morais. Wandenkolk e seus pares foram anistiados em 1895 e
aproveitaram a nova dinâmica política para alegar que o perdão por si só não
bastava, pois o Estado tinha o dever de garantir que os anistiados recuperassem
seus antigos cargos. Schneider contrasta a magnanimidade do Estado com
militares de alto escalão, nesse período com o tratamento dos envolvidos na
Revolta da Chibata, em 1910.
Aliás, o corriqueiro uso do
chicote por oficiais da Marinha, brancos em sua maioria para punir marinheiros,
predominantemente negros fora o estopim do motim. Após liderar, o levante, João
Cândido mandou telegrama com as exigências dos rebeldes: "Não queremos o
retorno da chibata (...) Queremos uma resposta imediata. Se não recebermos tal
resposta, destruiremos a cidade e os navios que não são revoltantes".
Enquanto os jornais
demonstravam pânico sobre o potencial explosivo da revolta, tanto por motivos
bélicos quanto raciais, Rui Barbosa mais uma vez solidarizou-se com os supostos
inimigos da ordem. Tanto que discursou afirmando que era um levante honrado.
Encontrando dificuldades incontornáveis nos planos de repressão do motim, o
Senado aprovou uma anistia aos amotinados.
Quando a revolta terminou,
pouco havia mudado no cotidiano de marinheiros, mas a anistia como prática de
reconciliação sofreu declínio na opinião pública.
Assim, a anistia passou a ser
reconhecida como marco de vergonha, sustenta a autora Schneider, e não de
restituição, como no caso de Wandenkolk e seus colegas. A raça dos anistiados
de 1910 obviamente impulsionou a reavaliação da prática. Por isso, o governo federal
brasileiro praticamente deixou de usar a anistia como ferramenta até a
Revolução de 1930.
O primeiro decreto de indulto
brasileiro ocorreu em 1822 e cuidou de estender ao Reino do Brasil o perdão concedido
aos réus no Reino de Portugal por ocasião do juramento das bases da
constituição, assemelhando-se mais ao conceito moderno de anistia do que há na
configuração atual do indulto propriamente dita.
O próximo decreto editado foi
apenas em 1930, sendo anterior à promulgação da Carta Constitucional vigente,
por mais de 66 (sessenta e seis) documentos da mesma natureza, ou seja, aptos a
conceder o perdão da pena e autorizados pelo Presidente da República.
Nota-se certa instabilidade
dos institutos como indulto e graça principalmente a partir da previsão
constitucional.
Os decretos editados durante o
governo de José Sarney[9] no período de 1988 a 1989,
foi o indulto de número 97.164 editado em 1988, embora outro decreto, de 11 de
maio de 1988, já houvesse sido editado no mesmo ano, em comemoração do centenário
da abolição da escravatura, porém fora da vigência da Constituição Federal de
1988.
Quanto aos três decretos
editados durante o governo de José Sarney, os dois primeiros (o mencionado no
parágrafo anterior e, também, outro publicado em comemoração à Páscoa, em 15 de
março de 1989) seguiram as mesmas diretrizes. Diferenciou-se em alguns
aspectos, todavia, o documento análogo expedido em 13 de novembro de 1989, de
número 98.389.
Os iniciais permitiram, como
regra, a concessão do indulto às penas privativas de liberdade não superior a
quatro anos que fossem cumpridas, até a data de edição, na fração de um terço
aos apenados não reincidentes ou metade aos reincidentes.
Mas, também foi admitida a
clemência às condenações superiores a quatro anos se, no cumprimento frações idênticas
às já expostas, as pessoas presas houvessem completado 70 (setenta) anos de
idade, praticado a conduta ilícita com menos de 21(vinte e um) anos de idade ou
fossem mães com filhos menores de 14 (quatorze) anos. Ou que, independentemente
da fração já resgatada, sofressem de doença grave, comprovada por laudo médico.
No entanto, a novidade mais
significativa diz respeito à criação de uma nova hipótese de perdão da pena,
que contemplou os condenados que, conforme o texto utilizado, “tenham
completado 10 (dez) anos de efetivo cumprimento de pena e hajam praticado o
crime com 18 (dezoito) a 21 (vinte e um) anos de idade”.
Ou seja, foi previsto o
indulto por cumprimento ininterrupto da pena, levando em conta que longos
períodos de encarceramento favorecem o processo de dessocialização do
indivíduo, dificultando gradualmente a reinserção social, sem mencionar os
demais transtornos de ordem psicológica, familiar e até mesmo física que o
recolhimento acarreta[10].
Por fim, menciona-se, que foi
estabelecida uma nova hipótese relativa à comutação. No artigo 4º foi previsto
que a redução do montante de pena seria possível também para os condenados a
penas superiores a 20(vinte) anos - o que antes não era mencionado, pois só
consideradas as penas de quatro a oito anos e, com critérios diversos e mais
restritivos, as penas de oito a vinte anos.
Dessa forma, os reincidentes
que cumprissem metade da reprimenda impostam poderiam obter a redução de 60
(sessenta) dias e os não reincidentes que cumprissem um terço da pena poderiam
ter diminuídos 90 (noventa) dias do montante total.
Decretos durante o governo de Fernando Collor[11] (1990-1991)
O primeiro decreto de indulto
de 1990 foi o de número 99.915, apresentou algumas mudanças substanciais. Dentre
estas, cabe pontuar que foi retirada a possibilidade de indulto para o
cumprimento ininterrupto de pena, mas adicionada a hipótese do perdão ao ter
cumprido dois terços, caso o montante total fosse inferior ou igual a doze
anos, considerados apenas os crimes cometidos por indivíduos com idade de
dezoito a vinte e um anos de idade. Trata-se de indulto na hipótese etária.
Quanto as reprimendas
superiores a vinte anos, fora ampliada a diminuição da pena, a comutação, que
no documento expedido no ano anterior poderia ser apenas de sessenta ou noventa
dias.
E, neste, houve a previsão de
redução de um décimo aos não reincidentes e de um vigésimo aos reincidentes,
porcentagens que, tratando-se de penas maiores de vinte anos, são bem expressivas
e representam, portanto, avanço significativo. E, foram adicionados ao rol de
crimes impeditivos de concessão, o tráfico de mulheres e crimes hediondos
conforme a Lei 8.072/1990 que pela primeira vez fora citada para referir-se às restrições.
Em 1991, o indulto foi
regulado pelo Decreto 245, de 28 de outubro e manteve idêntica projeção quanto
às penas não superior a quatro anos, no entanto, inovou quanto à idade senil
relativa ao indulto para penas maiores de quatro anos, a qual passou a ser de sessenta
anos para ambos os sexos, embora tenha sido, anteriormente, de sessenta anos
apenas para as mulheres e sessenta e cinco para os homens.
O indulto assistencial das
mães aos filhos menores de quatorze anos foi mantido e a viabilidade da
clemência por cumprimento ininterrupto da reprimenda foi resgatada, se não houvesse
falta grave nos cinco anos anteriores e demonstrado bom comportamento
carcerário, desde que cumpridos quinze anos, aos não reincidentes, ou vinte
anos, aos reincidentes.
Outra modificação se deu na
comutação: em que foi aumentado o percentual de pena a ser abreviado de um
quinto para um quarto aos reincidentes com penas entre quatro e oito anos e de
um sexto para um quinto aos reincidentes com penas de oito a vinte anos.
Além disso, as penas superiores a vinte anos também passaram a contemplar a possibilidade de serem reduzidas em um quinto aos não reincidentes e um sexto aos reincidentes.
Decretos editados no governo Itamar Franco[12] (1992 a 1994)
O primeiro decreto foi o de
número 668, de 16 de dezembro de 1992, resguardou as mesmas características dos
anteriores, diferenciou-se apenas por exigir ao indulto assistencial da mulher
presa, sendo mãe de filho menor de quatorze anos, que este necessitasse de
cuidados da genitora e, que isso fosse constatado pelo Juízo da execução penal.
Já, no Decreto 953, de 8 de
outubro de 1993, uma inovação relevante ocorreu, pois, foi considerada, pela
primeira vez, a decisão do Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária, que é o órgão encarregado de elaborar a minuta dos decretos que preveem
o indulto e a comutação.
O esboço, após análise do
Ministro da Justiça, é enviado à Presidência da República, para que o presidente
exerça a competência constitucional que o impele a conceder o indulto, ato que
tradicionalmente é exercido por meio dos decretos.
O CNPCP é o primeiro órgão da
execução penal a ser citado na Lei de Execução Penal, e, no artigo 64 da
referida lei, são dispostas as atribuições do Conselho, as quais são focadas na
busca de alternativas que possam sanar alguns dos problemas notoriamente
identificados nas unidades prisionais, bem como reunir informações que podem
corroborar tais indicativos e repassá-las aos demais responsáveis pelo
funcionamento adequado do sistema prisional.
Houve mudança significativa no
tempo de pena relativo ao indulto comum que até então era considerado para as
reprimendas de até quatro anos, mas, neste decreto, foi indicada como sanção
máxima aquela com seis anos de duração.
A mudança na comutação também
beneficiou as pessoas presas, pois diminuiu a fração de pena a ser cumprida
para haver a possibilidade de redução do montante total.
Passou, então, a ser de um
quarto para não reincidentes e de um terço para reincidentes. No mais, o
critério subjetivo para aferição da benesse passou a ser específico, pois, no
artigo 6º, inciso I, o requisito exigido é a demonstração de bom comportamento
durante os últimos doze meses de cumprimento de pena – nos decretos anteriores,
era previsto de maneira vaga, sem a especificidade utilizada neste.
O último decreto referente ao
governo Itamar Franco, de número 1.242, editado em 1994, ofereceu a chance de
também o pai, e não mais apenas a mãe, de filho menor de 14 (quatorze) anos
cujo auxílio dos genitores fosse necessário, poder ser agraciado pelo indulto.
Os três decretos editados no
governo de Itamar Franco trazem previsões diferentes em relação ao impedimento
referente à pessoa presa já ter sido alcançada pela mesma benesse nos anos
anteriores. O primeiro, de 1992, como de costume, aborda como requisito o
apenado não ter sido beneficiado nos dois anos pretéritos à publicação, se não
reincidente, ou nos quatro anos anteriores, se reincidente.
Quanto ao segundo decreto, de 1993, não foi especificada restrição nesse sentido – não se sabe se propositalmente ou por descuido, o assunto não foi tratado. Já no terceiro e último, de 1994, o artigo 6º especificou que, se o condenado já houvera sido favorecido com comutação, o cálculo das porcentagens se faria com base na pena restante e, no parágrafo único, foi apresentada uma proibição mais específica, referente, apenas, àqueles que tiveram a pena diminuída com fundamento nas premissas do decreto expedido no ano anterior.
Decretos durante o governo
Fernando Henrique Cardoso (1995 a 2003)
Nove decretos foram publicados
durante o lapso temporal em que o presidente supracitado exerceu os dois
mandatos aos quais foi eleito. O primeiro destes reprisou o abordado no
anterior quase na integralidade, exceto por alguns pontos modificados, quais sejam:
a diminuição da idade máxima que o filho poderia ter para que os genitores
possam ser beneficiados com o perdão da pena em caso de dependência dos seus
cuidados e a alteração dos delitos
elencados no rol dos crimes impeditivos à concessão da benesse (por exemplo:
inserção da restrição àqueles que, nos três anos anteriores, tinham participado
de rebelião e, também, aos condenados por delitos contra a administração
pública).[13]
Já no decreto número 1.860,
não foi tratado acerca de comutação, e foi exposta pela primeira vez a figura
do indulto condicional, em que a aplicação do instituto só se aperfeiçoaria após
24 meses da expedição de termo circunstanciado, em ocasião de cerimônia solene
na qual a autoridade responsável exporia aos indultandos agraciados as
condições estabelecidas no decreto.
Neste período, deveria ser
mantida a primariedade e o bom comportamento do apenado e, ao final deste tempo
e após manifestação do Conselho Penitenciário e do Ministério Público, o
magistrado declararia definitivamente extinta a pena.
Não foram observadas mudanças
significativas no decreto natalino do mesmo ano, que seguiu as diretrizes daquele
publicado em 1995, mas, o de número 2.365, editado em 1997, demonstrou algumas
variações.
Inicialmente, para a permissão
da comutação deixou de ser utilizado o critério que atentava para o montante de
pena total, sendo que se passou a considerar apenas a primariedade e, assim, o
não reincidente teria a pena reduzida em um quarto se cumprisse a mesma
porcentagem, ao passo que o reincidente, quando cumprido um terço do tempo
total, teria diminuído um quinto da pena. Em 1998, foram classificadas três
hipóteses inéditas de indulto, que alargaram consideravelmente as
possibilidades de angariar o benefício.
De plano, foram abarcados os
condenados em gozo da suspensão condicional da pena até 31 de dezembro de 1998,
também aqueles em livramento condicional até a mesma data e, por fim, os
submetidos às condições do regime aberto, concedido até o referido dia.
Na mesma esteira, o decreto de
1999 trouxe dois novos modelos: para quem teve a pena privativa de liberdade
substituída por restritivas de direitos, desde que cumprido metade do período
total, e aos condenados pelo regime aberto como inicial se, em 31 de dezembro
de 1999, já estivesse cumprida ao menos metade da pena.
Todavia, a previsão
relacionada à suspensão condicional da pena, inédita no decreto do ano
anterior, passou a ser restrita pelo cumprimento de metade da pena, assim como
as hipóteses recém tratadas.
Além disso, o indulto
humanitário remeteu à doença em estágio avançado, não mais “em estado
terminal”, como anteriormente. Também foi estabelecido critério mais rígido quanto
aos sancionados pelo cometimento de crimes dolosos, com violência e grave
ameaça, pois foi indicada a necessidade de avaliação do juiz, que deveria
aquilatar as condições pessoais a fim de perquirir se o apenado provavelmente
não tornaria a delinquir.
O decreto número 3.667, de 21
de novembro de 2000, claramente objetivou o enrijecimento das condições para a
concessão do indulto.
De início, nota-se mudança
substancial tendo em vista que o indulto comum teve o limite máximo da
quantidade de pena imposta reduzido para 4 (quatro) anos. Além disso, as possibilidades
de indulto etário aos que haviam cometido o crime com menos de 21(vinte e um)
anos e de indulto assistencial àqueles que tinham filhos que dependiam do seu
auxílio foram excluídas.
No mais, também foi endurecida
a possibilidade de indulto por cumprimento ininterrupto da pena, pois passou a
ser de vinte anos para não reincidentes e de vinte e cinco anos para
reincidentes. Quanto ao condicionamento da extinção definitiva da pena ao
período passado de 24 (vinte e quatro) meses, passou a ser obrigação do
beneficiário não praticar outro delito e manter bom comportamento, não apenas
uma recomendação, como havia sido feito em decretos pretéritos.
Assim, nota-se que rígidas
foram as regras estabelecidas para a concessão do perdão da pena no primeiro
decreto expedido no novo seria retrógado?
Em 2001, tem-se que, no único
decreto publicado, houve apenas uma mudança, porém significativa, na qual a
pena máxima para a concessão do indulto comum voltou a ser de 6 (seis) anos,
não mais 4, como foi previsto no antecedente. De resto, manteve-se análogo ao
anterior.
No último documento do gênero
produzido durante o governo de Fernando Henrique Cardoso, a clemência por
cumprimento continuado da pena retornou ao parâmetro de 15 anos aos não
reincidentes e 20 (vinte) anos aos reincidentes. Percebe-se, a princípio, que o
decreto em comento procurou retomar algumas prerrogativas que haviam sido
perdidas nos anteriores.
Assim, deixou de condicionar a
extinção da pena ao transcorrer de 24 (vinte e quatro) meses, voltou a prever o
indulto etário àqueles que cometeram a conduta delituosa com menos de 21 (vinte
e um) anos, bem como apresentou novas possibilidades de concessão do benefício.
Dentre essas, houve uma nova
previsão de indulto humanitário, para “cego, paraplégico ou tetraplégico,
desde que tais condições tenham ocorrido supervenientemente à condenação”, e
outra conjectura inédita, relativa àqueles que, cumprindo pena no regime
semiaberto, já teriam usufruído de ao menos cinco saídas temporárias – esta,
segundo Rodrigo Duque Estrada Roig, “(...) tem por objetivo premiar a pessoa
condenada que demonstrou, com o regular cumprimento das saídas ou com o desempenho
do trabalho, estar apta à extinção de sua punibilidade por parte do Estado.”.
Todavia, aos crimes cometidos
com grave ameaça e violência à pessoa, a concessão passou a ficar subordinada à
inexistência de prática de falta grave nos últimos dois anos, bem como da
avaliação do magistrado atinente às condições pessoais que pudessem sinalizar a
provável não reincidência.
Para a pena que não
ultrapassasse quatro anos, foi permitida a concessão da benesse mesmo com o
cometimento dos crimes elencados no rol de impeditivos do mesmo decreto.
Observa-se ainda, que o
parágrafo único do artigo 6º indicou que, na hipótese de haver concurso com
alguma das infrações descritas na lista de crimes impeditivos, o condenado não
teria direito ao indulto enquanto não cumprisse integralmente a pena respectiva
ao crime proibitório cometido.
Portanto, foi possível notar a
oscilação entre enrijecimento e afrouxamento dos critérios estipulados para a
concessão dos benefícios que circundam a extinção da pena ou a diminuição do
montante total. Na tentativa de elucidar alguns dos motivos que levam os decretos
de indulto[14]
a tal imprevisibilidade, serão reunidas alegações a este respeito no capítulo terceiro.
Decretos editados durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva[15] (2003 a 2010[16]).
O primeiro decreto deste período,
de número 4.904179, foi na contramão da abertura possibilitada pelo anterior e
retirou algumas garantias que haviam sido conquistadas.
Inicialmente, voltou a prever
a concessão da benesse de maneira condicional (que só se perfectibiliza após o
transcorrer de 24 meses). Ademais, também se observa que foram excluídas as
hipóteses do indulto ao condenado com menos de 21 (vinte e um) anos na data do
crime, além daqueles em caso de suspensão condicional da pena, substituição por
pena restritiva de direitos, livramento condicional e pelo retorno da pessoa
presa de, ao menos, cinco saídas temporárias.
No entanto, o rol dos crimes
impeditivos foi formado apenas pelos hediondos e equiparados, bem como os
correspondentes a estes no Código Penal Militar. Junto a isso, o decreto também
deixou de exigir a reparação do dano ao condenado solvente como requisito para
a concessão da extinção ou diminuição da pena aplicada.
Outro ponto a ser considerado
é de que a ausência de cometimento de faltas graves nos últimos doze meses
passou a ser o único requisito subjetivo para a concessão do benefício, também
para os crimes cometidos com violência ou grave ameaça – antes era exigida
também avaliação do magistrado para atestar a improbabilidade de reincidência.
Por fim, adição a se destacar
se deu quanto ao requerimento da benesse, pois foi incluída a Defensoria
Pública na relação dos legitimados a realizarem o pedido, provavelmente pois o
decreto é datado do mesmo ano da promulgação da Emenda Constitucional número 45/2004
que, dentre outras muitas medidas estabelecidas, também buscou equiparar as
Defensorias Públicas estaduais ao Ministério Público e Magistratura.
O decreto de indulto
subsequente, de 2005, reiterou o disposto no anterior quase na integralidade,
inovou apenas na limitação ao indulto relativo às saídas temporárias, que só poderia
ser efetivado se a pena fosse de 6 (seis) a 15 (quinze) anos e estivesse
cumprida a fração de um terço se não reincidente e metade se reincidente.
Da mesma forma se deu quanto ao decreto número 5.993, de 2006, que repetiu o disposto no último, mas apresentou uma mudança significativa: o indulto deixou de ser condicional, ou seja, tornar-se definitivo após 24 (vinte e quatro) meses, e passou a se concretizar no ato de verificação dos requisitos[17] realizado pelo magistrado.
Interessante observação quanto
a este ponto realizou a conselheira do CNPCP, Eleonora de Souza Luna, a qual
aduziu que a pessoa presa não teria interesse no indulto condicional pois se
mostrava mais benéfico apenas seguir o cumprimento ordinário da pena, sem a
vinculação ao sistema penitenciário ser postergada ainda mais em decorrência
deste tempo de espera para a perfectibilização da benesse. No mesmo sentido,
não foram mais editados no Brasil decretos de indulto que seguissem tal
exigência.
O decreto de 2007 manteve a
quase integralidade do antecedente, mas alterou o limite máximo de pena para a
concessão do indulto comum para oito anos – nota-se que tal sugestão já havia
sido apresentada pelo CNPCP em 2006, mas não havia sido acolhida e veio a ser
aplicada neste decreto.
Também foram modificadas as
regras para a extinção da pena quando usufruídas cinco saídas temporárias pelo
condenado em regime semiaberto, ao qual se exigiu que a pena fosse ente 6 e 12
anos (não mais 15 seria o extremo permitido) e as porcentagens de cumprimento aumentaram
de um terço para dois quintos aos não reincidentes e de metade para três
quintos aos reincidentes.
Neste decreto, também, o
governo passou a exigir que o Departamento Penitenciário Nacional mantivesse
publicado online quadro estatístico com informações relativas à quantidade de
indultos e comutações concedidos.
O decreto número 6.706, de 22
de dezembro de 2008, apresentou duas novas modalidades de indulto: da pena de
multa e da medida de segurança. O primeiro foi possibilitado ao condenado a
pena de multa aplicada cumulativamente com pena privativa de liberdade, desde
que não quitada àquela e cumprida esta até a data de publicação.
O segundo foi direcionado aos
submetidos à medida de segurança que, até a data da publicação do decreto, tivessem
a liberdade privada, sob internação ou tratamento ambulatorial, por período
igual ou superior ao máximo da pena cominada à infração penal correspondente.
Conforme Rodrigo Duque Estrada
Roig: “Essa modalidade de indulto visa a impedir que pessoas submetidas a medidas
de segurança, especialmente por delitos de menor gravidade, permaneçam
internadas em estabelecimentos de natureza penal durante anos, não raramente décadas.”.
Além disso, indicou previsão
de indulto às mães de filhos com deficiência mental ou física, ou menor de
dezesseis anos que necessite de cuidados, tratando especificamente acerca de
deficiências, como ainda não havia sido feito, e aumentado a idade máxima do
descendente de quatorze para dezesseis anos. Também passou a permitir comutação
para os condenados a pena restritiva de direitos e especificou a possibilidade
de aplicação dos benefícios àqueles em cumprimento de livramento condicional.
O decreto número 7.046, de 22
de dezembro de 2009, apresentou modificações consideráveis. Inicialmente,
aumentou a idade do filho que possibilita o indulto da genitora caso tenha
deficiência ou necessite de seus cuidados para dezoito anos.
Quanto ao indulto humanitário,
possibilitou que fossem alcançadas as pessoas paraplégicas, tetraplégicas ou portadoras
de cegueira total, ainda que tais condições fossem anteriores ao cometimento do
delito – nos decretos antecedentes a clemência só era permitida se as condições
elencadas não fossem anteriores à prática da conduta delituosa.
Ainda, quanto ao indulto por
saídas temporárias, passou a ser permitido aos condenados cumprindo pena em
regime aberto e não mais apenas aos que estavam no regime semiaberto.
Ainda, no mesmo decreto foram
estabelecidas duas novas possibilidades para o indulto: a) em caso de
substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos e, também,
b) por tempo remanescente de pena aos condenados que estivessem cumprindo a reprimenda
em regime aberto na data da publicação do edito.
Na primeira hipótese (a), o
tempo de pena já adimplido, na data de expedição do documento presidencial,
teria de somar um terço do montante total da pena em relação aos não reincidentes,
ou metade para os reincidentes.
Na segunda (b), a quantidade
que restaria ao tempo da publicação teria de ser inferior a seis anos para os
não reincidentes, desde que já houvessem cumprido um terço, e inferior a quatro
anos para os reincidentes, se já houvessem cumprido metade da pena total.
No mais, mudança importante se
deu em relação à interrupção da contagem do lapso temporal para a obtenção do
benefício quando do cometimento de falta grave. A partir deste decreto, a falta
grave só seria capaz de prejudicar a contagem se devidamente apurada, garantidos
o contraditório e ampla defesa, com homologação do juiz competente.
Também, a partir deste edito,
foi alterada a condição necessária para a consecução do indulto se o delito
cuja pena se objetivasse a extinção houvesse sido realizado em concurso com algum
dos crimes dispostos como impeditivos.
Assim, passou a ser necessário
o cumprimento de dois terços da pena relativa ao delito impeditivo para que a
extinção da pena correspondente ao crime diverso pudesse ser extinta – nos
decretos antecedentes, era imprescindível o adimplemento total da pena
atribuída ao delito considerado proibitório.
Neste mesmo ano foi alargada a
possibilidade quanto à comutação, que poderia incidir também sobre a pena já
cumprida – não mais sendo alternativa única o cálculo sobre a pena remanescente.
Por fim, também afastou o impedimento da concessão dos benefícios pela prática dos
chamados crimes impeditivos em relação ao indulto humanitário, indulto de pena
de multa e de medida de segurança.
Ou seja, nestes casos, mesmo
que o apenado tenha sido condenado pela prática de crimes hediondos ou
equiparados também seria possível o consentimento para a diminuição ou extinção
da pena.
Finalmente, o último decreto
de indulto expedido no governo Lula se deu em 31 de dezembro de 2010. Neste,
foram estabelecidas quatro novas hipóteses de indulto.
A primeira destas privilegiou
os condenados por crimes praticados sem violência ou grave ameaça, com pena
entre oito e doze anos. A segunda opção constituiu alternativa aos condenados
com mais de setenta anos, que já houvessem cumprido um quarto da pena, se não
reincidentes, ou um terço, se reincidentes.
Ainda, à hipótese de indulto
por saída temporária foi incluída a variação relativa ao trabalho externo,
exercido por ao menos doze meses nos três anos contados retroativamente à data
de publicação do decreto.
Por fim, também foi inserida a
possibilidade de indulto às pessoas que cumprem pena em regime aberto e que
haviam cumprido, em sede de prisão provisória, um quarto da pena, se não
reincidentes, ou um terço, se reincidentes.
No mais, mesmo se cometida
falta grave, foi possibilitada a concessão do indulto humanitário e de medida
se segurança. Além do que o cabimento dos benefícios foi possibilitado também à
pessoa condenada que responde a outro processo criminal, mesmo que este tenha
por objeto um dos crimes impeditivos dispostos no decreto.
Cabe apontar que, em sentido
idêntico, foi editada a Súmula 444 do Superior Tribunal de Justiça, no mesmo
ano de expedição do decreto em questão, a qual dispõe que “É vedada a
utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a
pena-base.”
Decretos editados durante o governo de Dilma Rousseff[18] (2011 a 2015).
O primeiro decreto expedido no
intervalo temporal indicado já inicia abarcando uma previsão expressa que ainda
não havia sido feita: a de possibilitar categoricamente a concessão do
benefício às pessoas estrangeiras.
Ainda, o Decreto número 7.648,
de 2011, também criou duas novas possibilidades de incidência da benesse: o
indulto por estudo, que objetiva a valorização e fomento do estudo em âmbito
penitenciário, e o indulto para crimes contra o patrimônio cometidos sem
violência ou grave ameaça, desde que reparado o dano – salvo se comprovada a
incapacidade econômica para tal[19].
Foram alargadas as
possibilidades previstas anteriormente em relação ao perdão da pena em
decorrência de filhos e filhas deficientes ou dependentes de cuidados, o qual
passou a ocorrer estando os genitores em cumprimento de pena em qualquer
regime, ao passo que nos decretos antecedentes só eram mencionados os regimes
fechado e semiaberto.
Não obstante, em relação à
clemência por cumprimento da prisão provisória, passou-se a contemplar as penas
restritivas de direito e em suspensão condicional, não só os condenados em
regime aberto.
No mesmo inciso, também foram
diminuídas as porcentagens necessárias para a concessão do benefício. Por fim,
ampliou aos condenados em livramento condicional a oportunidade de extinção da
pena pela quantidade remanescente na data da publicação do decreto, a qual era
prevista só para o regime aberto. Também foi aumentada a quantia restante, que
passou de seis para oito anos aos não reincidentes e quatro para seis anos aos
reincidentes.
Destaca-se que, no mesmo ano,
foi criado o Plano Nacional de Política Criminal e Penitenciária, no qual foram
estabelecidos apontamentos no sentido de reduzir as taxas de encarceramento,
descriminalizar condutas, combater a seletividade penal, buscar menos justiça criminal
e mais justiça social, investir na justiça restaurativa, dentro outros.
No Decreto número 7.873, de
2012, nova alternativa de indulto também foi adicionada, em relação aos crimes
contra o patrimônio cometidos sem grave ameaça ou violência à pessoa, com
prejuízo ao ofendido não superior ao valor de um salário mínimo e pena entre
dezoito meses e quatro anos, desde que cumpridos três meses de pena e realizado
depósito do montante referente ao prejuízo causado, salvo se em situação de
hipossuficiência.
Seria, portanto, uma espécie
de “indulto por insignificância”, tendo em vista os requisitos semelhantes
àqueles estabelecidos pelas Cortes Superiores em relação à absolvição fundamentada
no princípio da insignificância.
No indulto aos genitores com
filhos que necessitam de cuidados, separou-se as condições para o pai e para a
mãe e se estabeleceram porcentagens distintas de adimplemento de pena para cada
gênero. Nos casos de perdão por número de saídas temporárias cumpridas adequadamente,
por trabalho externo e por estudo, foi reduzida a fração exigida para um terço
aos não reincidentes e metade aos reincidentes.
Ainda mais importante
modificação se deu em relação ao requisito subjetivo, pois passou a ser
necessária a audiência de justificação, além da aplicação da sanção homologada por
juízo competente que garantisse o direito ao contraditório e ampla defesa –
prerrogativas que haviam sido incorporadas em 2009 a fim de estabelecer
critérios condizentes com o devido processo legal para a aferição do
cometimento de falta grave.
Também extremamente significativa
foi a redação do artigo 6º, o qual estendeu o indulto ou comutação da pena
privativa de liberdade ou restritiva de direitos para a pena de multa aplicada
cumulativamente.
Em 24 de dezembro de 2013,
quando da publicação do decreto número 8.172, mais duas outras possibilidades
de indulto foram previstas. A primeira delas era referente ao estudo, pois
passou a conceder a benesse àqueles que concluíram, nos três anos anteriores à
publicação, curso de ensino fundamental, ensino médio, ensino
profissionalizante ou superior, mediante certificação de autoridade educacional
local e cumprimento de pena superior a doze anos, na porcentagem de dois
quintos aos não reincidentes e três quintos aos reincidentes.
A outra hipótese criada foi o
indulto para vítimas de tortura com decisão transitada em julgado se praticada
por agente público ou investido em função pública durante a privação de
liberdade.
Em 2013, portanto, havia quinze
possibilidades de extinção da pena por indulto. No mais, foi limitado o indulto
de multa apenas para valores não superiores ao valor mínimo para inscrição de
débito na Dívida Ativa da União, se estiver o condenado em situação que não
tenha capacidade econômica de quitação da despesa.
Além disso, foi adicionado ao decreto
os dizeres do artigo 11, §3º, que optou pela preferência da declaração de
indulto e comutação de penas sobre a decisão de qualquer outro incidente no
curso da execução penal.
Por fim, importante mudança se
deu mediante a retirada da necessidade expressa de manifestação do Conselho
Penitenciário como condição para o deferimento dos benefícios, resultado do
acolhimento da proposta feita pela Defensoria Pública paulista, que demonstrou
a legalidade da medida.
Quanto ao decreto de 2014,
nota-se que preservou integralmente a redação dada pelo anterior. Já o decreto
número 8.615, de 23 de dezembro de 2015, último publicado no governo Dilma,
inovou em dois dispositivos que contemplam a mesma situação: mulheres, com pena
não superior a oito anos, que cometeram crimes sem violência ou grave ameaça e
que tenham filho ou filha com menos de dezoito anos, doença crônica grave ou
deficiência que necessite de seus cuidados.
Nesse sentido, para a extinção
da pena, requereu o cumprimento de um quinto às não reincidentes e um quarto às
reincidentes. Já para a diminuição do montante total da reprimenda, estabeleceu
o adimplemento de um quarto às não reincidentes e um terço às reincidentes, com
redução respectiva de dois terços e metade.
RETROCESSO DO DECRETO Nº 8.940/2016.
O primeiro decreto de indulto
do governo de Michel Temer[20] se diferenciou consideravelmente
da previsão dos demais e, principalmente, dos mais recentes.
Na contramão da ampliação das
possibilidades de concessão do perdão da pena demonstradas pelos documentos de
mesma natureza anteriores, a importância do instituto foi apequenada e, nesse
sentido, a mudança foi atribuída ao caráter considerado repressor e punitivista
do ocupante do cargo de Ministro de Justiça.
Cabe salientar que o processo
de elaboração dos decretos de indulto é dividido entre diferentes agentes e o
líder do Ministério citado ocupa lugar de relevante posicionamento no
desenvolvimento do conteúdo, considerando que encaminha ao Presidente da
República a minuta do texto legislativo, cuja responsabilidade de produção é do
Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.
Inclusive, alguns membros
deste Conselho, responsáveis pela proposta que orienta o edito a ser publicado,
participaram de uma renúncia coletiva no mês subsequente à edição do
Decreto nº 8.940, em que
solicitaram o desligamento das vagas ocupadas e, por meio de uma carta aberta,
expuseram suas razões para a tomada de decisão.
Todas essas regidas pelo descontentamento
dos renunciantes com a forma pela qual o governo federal estaria lidando com a
temática penitenciária e, com notório destaque, foi tratada a questão atinente
ao decreto de indulto em comento, como se vê: “(...) a minuta de decreto de
indulto aprovada pelo colegiado do CNPCP foi deixada integralmente de lado,
optando-se pela formulação de um texto normativo que é, talvez, o mais
restritivo em termos de liberdades já editado na história recente e
republicana.”
Algumas medidas tomadas
causaram especial impacto, como a exclusão do instituto da comutação. A última
oportunidade em que havia sido publicado um decreto de indulto sem esta
previsão se concretizara em 1996, no entanto, outro decreto de natureza
idêntica foi publicado no mesmo ano prevendo a redução da pena.
Foi, então, em 1974, com o
Decreto 75.076, durante o governo de Ernesto Geisel206, em pleno curso da
ditadura militar que assolou o país entre 1964 e 1985, o último ano em que não
houve previsão de comutação nos decretos.
Portanto, tem-se que se
passaram mais de 40 (quarenta) anos consecutivos em que fora anualmente
prevista a comutação. Considerando, ainda, que, se não mencionado este termo expressamente,
ainda assim se previa a redução da pena, efeito prático da comutação, como no decreto
de 1990.
Tal exclusão foi singularmente
comentada pelos membros do CNPC na carta aberta já citada, por meio da qual
renunciaram, os quais, ao exporem divergências com a política empregada,
versaram acerca da comutação, nos seguintes termos:
"Símbolo máximo disso é a exclusão do
instituto da comutação. Conquistas gradativa (sic) e progressivamente
obtidas foram abandonadas. A peculiar situação do encarceramento feminino, as
dificuldades dos miseráveis presos brasileiros em arcarem com o pagamento das
penas de multa, as enfermidades incuráveis do ambiente prisional e que afetam
mortalmente centenas de condenados, a perpetuidade em que se transformam as
medidas de segurança no Brasil, enfim. Tudo foi relegado ao esquecimento, a
desprezar, inclusive, inúmeras pesquisas e trabalhos científicos a respeito da
relevância da abordagem dessas peculiaridades no decreto de indulto".
Sendo assim, indicaram a
preocupação com o possível impacto das medidas tomadas no cotidiano do sistema
prisional, expondo as precariedades e inconstitucionalidades identificadas.
Para que, então, torne-se mais
claro o motivo de tão intensa preocupação, cabe comentar pontualmente as
alterações, exclusões e adições do Decreto nº 8.940/2016.
Inicialmente, nota-se que a
clemência presidencial não mais contempla os condenados à pena privativa de
liberdade substituída por restritivas de direitos ou multa.
Ao passo que, em comparação ao
último documento análogo, concedia-se o perdão às situações de substituição da
pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou de suspensão
condicional da pena, desde que cumpridos um quarto se não reincidentes e um
terço se reincidentes.
Anteriormente, o que também
foi suprimido pelo decreto em questão, os condenados com a liberdade tolhida em
sede de prisão provisória teriam as penas indultadas quando em cumprimento do
regime aberto, pena restritiva de direitos ou suspensão condicional da pena.
Desde que adimplidos, em prisão provisória, um sexto se não reincidentes e um
quinto se reincidentes. Era, portanto, vedado o indulto à restritiva de
direitos apenas nos casos de penas inferiores a oito anos, se cumpridos um
terço se não reincidente ou metade se reincidente.
Além disso, também não foi
prevista a extinção da pena em decorrência de idade senil, antes prevista como
60(sessenta) anos a idade mínima, se a pena fosse de até oito anos - mas com a possibilidade
de indulto aos condenados idosos com pena superior a oito anos se cumprido um terço,
se não reincidentes, e metade, se reincidentes.
Quanto aos idosos de 70
(setenta) anos ou mais, a clemência passou a depender do montante de pena
aplicado e do cumprimento de um quarto se não reincidentes e um terço se
reincidentes.
O que se entende
descaracterizar o objetivo de conceder o perdão da pena por idade avançada
pois, ao se estabelecer mínimos de tempo de pena ou montante já adimplido, não
se está priorizando o fato de a pessoa presa ser idosa. No mais, também se
deixou de abarcar o indulto por cumprimento ininterrupto de pena, novidade em
1989, que beneficiava a pessoa presa há 15 (quinze) anos, se não reincidente, e
20 (vinte) anos, se reincidente.
Quanto ao indulto assistencial
dos genitores com filho ou filha com deficiência ou necessidade de cuidados especiais,
passou-se a depender da quantidade de pena aplicada. A idade máxima do
descendente passou a ser de 12 (doze) anos no presente decreto, enquanto
costumava ter de ser menor de 18 (dezoito) anos.
Na hipótese de deficiência,
houve a inclusão da necessidade de cuidados diretos da pessoa condenada. Também
nesta situação, não há mais distinção para as mulheres quanto à exigência de
menor tempo de cumprimento de pena.
Outras possibilidades passaram
a não mais integrar a previsão da Presidência da República para o perdão da
pena. Cabe expor que foi extinta a possibilidade do indulto pelo gozo de no
mínimo cinco saídas temporárias, além de também ser impedida a concessão da clemência
aos condenados por crime com violência ou grave ameaça com reprimenda superior a
8 anos e por qualquer crime acima de 12(doze) anos.
A extinção da multa, que
simboliza tentativa de efetiva reintegração do apenado ao meio social,
possibilitando a inserção econômica – já tão limitada pois, como se sabe, a
parcela da sociedade mais criminalizada se insere em classe de menor poder
aquisitivo – também não foi mais prevista, em nenhuma hipótese, o que pode
significar desprezo quanto à realidade social daqueles que costumam ser os
destinatários do sistema penal.
Já quanto às pessoas em
livramento condicional, em regime aberto ou em regime domiciliar, não houve
regras que as abarcassem, nem especificações mais brandas aos crimes contra o
patrimônio exercidos sem violência ou grave ameaça, mediante reparação do dano.
Em relação às vítimas de tortura, a conjectura foi restrita à determinação de
que tenha ocorrido no curso do cumprimento da pena em questão.
Outro ponto importante diz
respeito às faltas graves, que, se ocorrerem no ano anterior à publicação, mas
ainda não estiverem homologadas em juízo quando do pleito de indulto, terão o
condão de suspender a declaração da extinção da pena enquanto não for apreciado
pelo juiz competente o cometimento da falta grave.
Foi a primeira vez em que esta
previsão foi contida em um decreto, muito embora algumas decisões das Cortes
Superiores fossem neste sentido.
Em suma, nos decretos
antecedentes a falta grave não homologada sob os princípios do contraditório e
ampla defesa não poderia ser considerada, mas, no decreto em análise, a prática
da falta disciplinar já pode macular a concessão do benefício, pois este
consentimento ficará suspenso até a homologação da falta. Inclusive, tal
vedação é aplicada também quanto ao indulto humanitário.
Em relação a este, nos
decretos anteriores não era condicionado a quaisquer requisitos relativos ao
tempo de cumprimento de pena, mas apenas à comprovação da doença e, em alguns
casos, à restrição de participação e impossibilidade de tratamento no estabelecimento
penal.
Ao rol de crimes impeditivos,
os quais passaram a obstar também o indulto humanitário, foram acrescentados os
referentes à pornografia infantil e os equiparados a hediondo.
Outrossim, prevê a necessidade
do adimplemento da integralidade da pena referente ao crime proibitório para se
iniciar a análise do indulto do crime comum, cometido pelo mesmo apenado. O
“pedágio” dos crimes impeditivos, como é conhecido na prática da execução
penal, nos últimos decretos era de dois terços do cumprimento da pena relativo
ao delito proibitório.
Também cabe apontar que não
consta em qualquer dispositivo regulamentação atinente ao processamento do
indulto, tais como as que indicavam a obrigação de envio ao juízo de listas das
pessoas que poderiam ser contempladas e que previam a realização de mutirões.
Por fim, não foram elencados
os legitimados a requerer a declaração do indulto, nem previsão de envio de
dados dos órgãos da administração penitenciária para o Departamento Penitenciário
Nacional ou atuação fiscalizatória do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária.
Além de que também não é mais notada a regra que exige o cômputo da detração e
da remição a fim de estabelecer os critérios para aferimento da benesse.
DECRETO DE 12 DE ABRIL DE 2017: O “INDULTO DE DIA DAS MÃES”[21]
Os decretos de indulto, mesmo
que editados em ocasião do Natal, não são necessariamente exclusividades de tal
data festiva.
Assim, utilizando como
referência o dia 14 de maio de 2017, dia das mães, foi excepcionalmente
publicado, em abril de 2017, um decreto de indulto que fugiu aos costumes.
Este representa o primeiro
documento da natureza que atenta especificamente às necessidades das mulheres
inseridas no sistema prisional - muito embora a reinvindicação seja considerada
antiga por movimentos sociais voltados aos direitos das mulheres.
Cabe apontar, também, que a
proposta formulada pelo CNPCP já havia sido enviada à presidência no ano anterior,
em ocasião do dia da mulher, mas não havia sido acatada.
De toda forma, a possibilidade
de extinção da pena passou a alcançar mães e avós condenadas por crimes sem
violência ou grave ameaça, que tenham cumprido um sexto da pena total, que
possuam filhos ou netos de até 12 (doze) anos de idade ou com alguma
deficiência independentemente da idade.
Também grávidas com gestação
de alto risco (para estas não é exigido um tempo mínimo de cumprimento de pena,
destaca-se) e, como hipóteses de indulto etário (desde que cumprido um sexto da
reprimenda), as mulheres com mais de 60 ou com até 21(vinte e um) anos. Alcança
também as mulheres deficientes que não tenham sido condenadas por delitos cometidos
sem violência ou grave ameaça.
Outra possibilidade é
referente àquelas que cumprirem um sexto da pena na data estipulada, se
cometido o crime do artigo 33, da Lei de Drogas, com a primariedade, bons antecedentes,
não dedicação às atividades criminosas e não integração à organização criminosa
reconhecidas em sentença e, portanto, aplicada a causa de diminuição de pena
prevista no §4º do dispositivo citado.
Ainda, se condenadas à pena
privativa de liberdade não superior a oito anos, por crime praticado sem
violência ou grave ameaça, também podem receber o benefício caso cumprirem um
terço da pena (se reincidentes) ou um quarto (se não reincidentes).
Quanto à comutação, que não
havia sido prevista no decreto de indulto coletivo anterior, foi possibilitada
neste às mulheres, nacionais e estrangeiras, em três hipóteses.
A primeira prevê a diminuição
de um quarto da pena às reincidentes com reprimenda menor de oito anos, desde
que cumprido um terço da pena. Depois, também há a opção às não reincidentes
que tenham filho menor de dezesseis anos, deficiente em qualquer idade ou portador
de doença crônica grave, se cumprido um quinto da pena, em que se diminuiriam
dois terços da pena.
Por fim, prevê a redução de
metade da pena às mulheres enquadradas na mesma situação que a hipóteses
anterior, mas reincidentes.
Cabe salientar que todas essas
possibilidades se aplicam apenas se cometidos delitos sem violência ou grave
ameaça. O decreto borda, ainda, a possibilidade de realização de mutirões e a
oitiva da defesa e Ministério Público antes da concessão definitiva do
benefício pelo juiz responsável pela execução penal
Para a elaboração do decreto,
como já tratado, houve proposta elaborada pelo Conselho Nacional de Política
Carcerária e Prisional, entregue em fevereiro de 2016 à presidência da República
e pautada na necessidade de atenção ao alarmante aumento da população
carcerária feminina.
Deu-se no sentido de que seria
imprescindível a realização de novas políticas criminais voltadas às mulheres,
para evitar consequências de diversas ordens, com destaque à perda ou
fragilização das relações familiares, primordialmente em relação aos filhos. Prova
desse quadro foram os dados levantados pelo relatório Infopen Mulheres, realizado
a partir do Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias, com registros fornecidos
por 1.424 unidades prisionais no sistema penitenciário estadual e federal.
De qualquer forma, a pena é
violência institucional que cumpre a função de instrumento de reprodução da
violência estrutural e, mesmo que a prisão estivesse de acordo com os padrões
mínimos para tutelar o interesse da pessoa presa, também se consubstanciaria em
uma situação de privação e sofrimento, atingindo o indivíduo e seu entorno.
Sobretudo em momentos de
desequilíbrio nos governos e/ou na democracia, legitima-se tal violência como genuíno
combate ao “inimigo interno”. Confunde-se o momento de guerra com o da política
e se realiza um combate ostensivo a este inimigo
Não se ignora que algumas antigas cadeias foram reformadas e que se construíram novas prisões, mas, desde o final da década de 1930, os sistemas carcerários da maioria dos países[22] da América Latina[23] demonstram sinais claros de esgotamento, ineficiência e corrupção.
A prisão, de qualquer forma,
ofende a dignidade humana pois oferece a proposta de castigar e ao mesmo tempo
reformar, ou seja, pretende a ressocialização privando o indivíduo da vida em sociedade,
evidenciando contrariedade em si mesma.
A intimidação a ser obtida
pelo castigo demanda que este seja apto a causar terror, condições
reconhecidamente impeditivas de fazer com que sejam sucedidas ações pedagógicas[24].
Ao contrário, as significações
desse espaço, afastando-se da “ressocialização” pretendida, costumam ser muitas
outras. Como, por exemplo, representação do poder e autoridade do Estado;
conflito, negociação e resistência; polos de criação de formas subalternas de
socialização e cultura; ambiente onde amplos segmentos da população vivem parte
da vida, formam visões de mundo e interagem com outros indivíduos.
Conforme essas premissas, que
apresentam as consequências da realidade penitenciária, a imagem do “criminoso”
se afasta ainda mais do padrão exigido socialmente, fazendo com que a pessoa
não pertença (e não se sinta pertencente) à sociedade. Pois, numa visão
sociológica, ela rompe as regras impostas pelos grupos de poder - e, por isso,
é segregada.
Nessa senda, Augusto Thompson[25] aborda a questão penitenciária
por meio da analogia a outros sistemas, como o educacional. Na interessante
análise, o autor inicia o pensamento ao indicar a entrada no sistema, com
pequena perda quantitativa em relação aos réus que obtêm relaxamento de
flagrante ou revogação da prisão preventiva.
Em seguida, expõe a saída do sistema,
pelo término da pena ou outros meios, e o possível retorno, no caso da
reincidência, em que se reiniciaria o ciclo.
Mas, ao contrário de outras
organizações sociais, como o referido sistema educacional, em que os
estabelecimentos de entrada são autorizados a recusar parcela de alimentação
que ultrapasse a capacidade ideal e ameace o equilíbrio (como crianças que
ficam sem vagas em escolas), no sistema penitenciário a lógica é adversa[26].
Em verdade, as unidades
prisionais são forçadas a subsidiar a atividade das autoridades judiciárias e
policiais, a fim de suportar a carga recebida, gerando enorme desproporção
entre o contingente que entra no sistema e o que o deixa.
Desproporcionalidade que pode
ser amenizada pelo emprego de alternativas viáveis e urgentes, tais como o
perdão da pena por meio do instituto do indulto.
Diante disso, imperioso se faz
o afastamento dos discursos legitimadores da pena em razão da ressocialização
ou reintegração social, pois tais proposições se dão em sentido oposto à
realidade carcerária. E, nessa mesma perspectiva, urgente se faz a reflexão
acerca dos mecanismos que podem oferecer alternativas ao panorama atual de
superpopulação carcerária e aniquilação de direitos básicos.
Por conseguinte, da mesma
forma pela qual a pena é uma opção política (bem como seu abrandamento ou
enrijecimento), o indulto é uma contramedida à situação exposta alhures que se
coloca também com viés político, mas a fim de reduzir os danos causados pela experiência
penal.
As legislações penais
asseveram as sanções direcionadas aos crimes patrimoniais ou com relação a
entorpecentes, enquanto atenuam aquelas para crimes ambientais ou contra a
administração pública, com um objetivo específico: selecionar o “cliente” do sistema
prisional. Dessa forma faz aumentar vertiginosamente a população carcerária no
Brasil e, por consequência, faz crescer exponencialmente o déficit de vagas no
sistema.
O indulto, neste diapasão, é
verdadeiro instrumento de política criminal e penitenciária, que vem sendo,
larga e continuamente, utilizado no Brasil e em outros Estados Modernos[27].
Há de ser considerado que o
atual contexto é de falência do sistema[28] e, assim, deve-se pensar
em redução dos gravíssimos problemas que assolam milhares de indivíduos, a fim
de cumprir uma função humanitária e de regulação das deficiências da custódia
estatal.
O instituto do indulto, embora
seja fundamentado em previsão constitucional, tem o conteúdo inserido com base
no arbítrio do governo atuante quando da expedição do decreto.
Não se ignora a participação
do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, por meio das minutas
dos editos, as quais são também embasadas nas sugestões de inúmeras entidades
do país, mas se deve ter em mente que é ato de competência exclusiva do
Presidente da República e é a vontade do respectivo governante que prevalece.
Nesse sentido, muitas
observações são extraídas da análise realizada no capítulo anterior, em que foi
possível verificar algumas influências externas na edição dos decretos, as
quais se pretende comentar na presente seção. Assim, pontuar-se-ão percepções
acerca das mudanças substanciais que se destacaram pelo afastamento
considerável da tendência que vinha sendo adotada ou da proposta do grupo
político em questão.
Inicialmente, algumas
considerações gerais podem ser traçadas quando se evidencia, por exemplo, que,
no decreto inicial da maioria dos governos - comumente publicado ao final do
exercício do primeiro ano de mandato -, pouco ou nada se altera em relação ao
indulto do ano anterior.
Assim, observa-se uma clara
falta de atenção em relação ao perdão da pena, o qual pode ser decisivo (ou
definitivo) para milhares de pessoas em situação de encarceramento.
Também se nota que, apesar de
os projetos políticos dos governantes em período de campanha se apresentarem
como diametralmente opostos entre si, em alguns quesitos se assemelham ou, até,
são idênticos, como o destacado acima, tendo em vista que nessas ocasiões apenas
são reutilizadas propostas idênticas àquelas dos governos anteriores.
De outro lado, como exemplo de
interferência externa ao conteúdo elaborado pelo governo anualmente, tem-se que
em 1999 foi suprimida da proposta enviada pelo CNPCP ao Ministro da Justiça a
expressão “em estágio terminal” quando referido ao indulto humanitário.
Por esse motivo, um apenado
acometido por AIDS recebeu o benefício e, por essa razão, deixou a unidade
prisional em que se encontrava. Então, em junho de 2000, cometeu conduta
criminosa de repercussão nacional: assassinou um casal em Brasília em um
contexto que, aliado ao oportunismo midiático, abalou o país.
O caso foi noticiado em
diversos meios de comunicação, com destaque à forma pela qual o acusado teria,
em decorrência do decreto no ano anterior, a pena extinta. Assim, segundo o
ex-conselheiro do CNPCP, Mario Júlio Pereira da Silva, houve grande comoção da
sociedade em decorrência do fato citado e, por isso, os requisitos para o
decreto de indulto do ano 2000 foram brutalmente enrijecidos.
Inclusive, em um veículo de
comunicação de grande circulação, à época, foi expressamente apontado que “A
principal razão do “aperto” nos critérios para a concessão do indulto foi a
preocupação da população com a liberação dos presos, demonstrada durante a campanha
eleitoral deste ano, para prefeitos.
Outra razão foram casos de
crimes cometidos por presos indultados (...)”. Ao se levar em consideração,
também, que se vivia um período de campanha política, faz-se claro que o endurecimento
percebido no decreto tratado foi motivado.
Fica evidente que a pressão
popular, aliada ao fato de que o país passava por processo eleitoral para
escolha de governantes nos municípios, fez com que fosse refletida tal situação
no decreto publicado pelo Presidente no referido ano.
É sabido que o direito de
punir do Estado surge diante do autor que pratica a infração penal, acarretando
o poder-dever e aplicar a lei penal objetiva no caso concreto, sendo, portanto,
a manifestação do seu poder de império e soberania, exercício do monopólio
jurisdicional de forma a devolver à sociedade a paz que fora abalada pelo
cometimento do delito.
Ocorrido o fato-crime, deve
seu autor suportar a punibilidade como consequência lógica de sua conduta
lesiva ou ameaçadora aos bens jurídicos protegidos vindo, em forma de pena, nas
modalidades privativas de liberdade, restritivas de direito ou multa, consoante
artigo 32 do Código Penal brasileiro.
As causas extintivas de punibilidade, em geral, atingem apenas o jus puniendi permanecendo o crime em sua integridade, com todos os seus demais efeitos e, quando operarem após o trânsito em julgado[29] da sentença a pena condenatória, atingirão a primariedade do agente.
Excepcionalmente, a causa de
extinção in casu atinge o crime em sua totalidade, eliminando-o, simplesmente,
conforme se dá no caso de abolitio criminis e da anistia. Quando a causa
operar antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, extinguindo o
direito estatal de punir o infrator da norma, este não será julgado e, de
consequência, garantirá a situação de primariedade, se existente até então.
Com o advento da Lei
11.106/2005, as causas extintivas da punibilidade, os incisos VI e VII do
artigo 107 do Código Penal, ligadas ao casamento da vítima com o agente, ou com
terceira pessoa, no crime de estupro, hoje crime contra a dignidade sexual
foram revogadas. Antes da referida revogação, o Código Civil de 2002 em seu
artigo 1.520 previa que excepcionalmente será permitido o casamento de quem
ainda não alcançou a idade núbil (artigo 1.517) para evitar a imposição ou
cumprimento de pena criminal ou em caso de gravidez, fato que deve ser
analisado à luz da preservação do direito de família.
Parte da doutrina entende que
o artigo 1.520 do Código Civil não estaria revogado por força da interpretação
do artigo 9 da Lei Complementar 95, de 1998, que trouxe a regra referente à
atividade legislativa, determinando que toda revogação legal deva ser expressa.
Em verdade, o rol do artigo 107 do Código Penal brasileiro é apenas
exemplificativo, pois existem outras causas extintivas da punibilidade e que
estão presentes no Código Penal brasileiro e em leis esparsas.
É o caso de suspensão
condicional da pena, conforme o artigo 82 CP, o livramento condicional, no
artigo 90 CP. No artigo 312, §3º CP no caso de peculato culposo. Na Legislação
especial, na Lei 9.099/1995 quando a pena mínima cominada for igual ou inferior
a um ano, abrangidas ou não por esta lei, o MP, ao oferecer a denúncia poderá
propor a suspensão do processo, por dois a quatro anos, desde que o acusado não
esteja sendo processado, ou não tenha sido condenado por outro crime, bem como estejam
presentes os demais requisitos que autorizam a suspensão condicional da pena,
conforme o artigo 77 do CP.
A Lei 9.249/1995, em seu
artigo 34, quando o agente promover o pagamento de tributo ou contribuição
social, inclusive acessórios, antes do recebimento da denúncia.
Há outras causas extintivas de
punibilidade tais como a morte do agente, pois a morte tudo apaga (mors
omina solvit). em face do princípio da intranscendência penal, pois a pena
não passará da pessoa do condenado.
Em tempo, é importante frisar
que o critério legal para a morte é proposto pela medicina, na chamada morte
cerebral, nos termos
da Lei 9.434/1997, que regula
a retirada e transplante de órgãos. É nesse momento que a pessoa deverá ser
declarada morta e, autorizando-se por atestado médico, o registro do óbito no
Cartório de Registro de Pessoas Naturais.
A morte do agente igualmente
extingue a pena de multa, uma vez que esta não poderá ser cobrada de seus
herdeiros. O art. 29, III, da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73)
determina a obrigatoriedade do registro do óbito no Cartório de Registro Civil
das Pessoas Naturais, e seu art. 77, caput, estatui que “nenhum
sepultamento será feito sem certidão de óbito”.
A declaração de extinção da
punibilidade pelo juiz exige a prévia manifestação do Ministério Público.
Embora a lei se refere à extinção da punibilidade pela morte do agente, artigo
107, inciso I do Código Penal, nas ações de iniciativa privada, personalíssima,
também a morte da vítima opera a extinção da punibilidade.
Num processo mnemônica, a
doutrina conhecia esta causa extintiva de punibilidade pela sigla GIA (graça,
indulto e anistia[30]). E, que são espécies de
indulgência, clemência ou graça em sentido amplo. Refere-se à renúncia do
Estado ao direito de punir.
O indulto individual ou graça
em sentido amplo é concedido mediante a provocação da parte interessada, ao
passo que o indulto tem caráter coletivo sendo concedido espontaneamente. São
providências de ordem administrativa que são deixadas ao crivo do poder
discricionário do Presidente da República para extinguir ou comutar penas. O
não-exercício da pretensão punitiva acarreta a perda do direito de impor sanção
e, só corre antes de transitar em julgado a sentença final.
Por sua vez, o não-exercício
da pretensão executória extingue o direito de executar a sanção imposta.
Portanto, só ocorre, após o trânsito em julgado da sentença condenatória.
Cumpre estabelecer a diferença
entre a prescrição e a decadência. A prescrição extingue o direito de punir do
Estado, enquanto a decadência atinge o direito do ofendido em promover a ação
penal privada. A prescrição, atinge, portanto, em primeiro lugar, o direito de punir
do Estado e, em consequência, extingue o direito de ação.
A imprescritibilidade só
existe em duas hipóteses em que não correrá a prescrição penal: crimes de
racismo definidos na Lei 7.716/1989, as ações de grupos armados civis ou
militares, contra a ordem constitucional e o Estado Democrático, assim definidos
na Lei 7.170/1983, a chamada Lei de Segurança Nacional.
Em verdade, a doutrina ainda
aponta várias espécies de prescrição. A saber: a prescrição da pretensão
punitiva (PPP) que é a perda do poder-dever de punir, em face da inércia do
Estado durante determinado lapso temporal.
Produzem os seguintes efeitos:
I - impede o início
(trancamento de Inquérito Policial) ou interrompe a persecução penal em juízo;
II - afasta todos os efeitos,
principais e secundários, penais e extrapenais, da condenação;
III - a condenação não pode
constar da folha de antecedentes, exceto quando requisitada por juiz criminal.
Oportunidade para declaração:
nos termos do art. 61, caput, do CP, a prescrição da pretensão punitiva pode
ser declarada a qualquer momento da ação penal, de ofício ou mediante
requerimento de qualquer das partes.
O artigo 109 do Código Penal é
o marco do prazo da pretensão punitiva do Estado.
Art. 109. A prescrição, antes de transitar em julgado a
sentença final, salvo o disposto no § 1o do art. 110 deste Código, regula-se
pelo máximo da pena privativa de liberdade cominada ao crime, verificando-se:
I - em vinte anos, se o máximo
da pena é superior a doze;
II - em dezesseis anos, se o
máximo da pena é superior a oito anos e não excede a doze;
III - em doze anos, se o
máximo da pena é superior a quatro anos e não excede a oito;
IV - em oito anos, se o máximo da pena é
superior a dois anos e não excede a quatro;
V - em quatro anos, se o
máximo da pena é igual a um ano ou, sendo superior, não excede a dois;
VI - em 3 (três) anos, se o
máximo da pena é inferior a 1 (um) ano
Exame do mérito: o
reconhecimento da prescrição impede o exame do mérito, uma vez que seus efeitos
são tão amplos quanto os de uma sentença absolutória. Ademais, desaparecendo o
objeto do processo, este não encontra justificativa para existir por mais
nenhum segundo.
Subespécies de prescrição da
pretensão punitiva – PPP: dependendo do momento processual em que o Estado
perde o seu direito de aplicar a pena, e de acordo com o critério para o cálculo
do prazo, a prescrição da pretensão punitiva se subdivide em:
I - PPP propriamente dita:
calculada com base na maior pena prevista no tipo pena (pena abstrata).
II - PPP intercorrente ou
superveniente à sentença condenatória: calculada com base na pena efetivamente
fixada pelo juiz na sentença condenatória e aplicável sempre após a condenação
de primeira instância.
III - PPP retroativa:
calculada com base na pena fixada pelo juiz na sentença condenatória e
aplicável da sentença condenatória para trás.
IV - PPP antecipada,
projetada, perspectiva ou virtual: reconhecida, antecipadamente, com base na
provável pena fixada na futura condenação.
O Código Penal, em seu artigo
110, ensina que a prescrição, depois de transitar em julgado a sentença
condenatória, regula-se pela pena aplicada e verifica-se nos prazos fixados no
artigo anterior, os quais se aumentam de um terço, se o condenado é
reincidente.
A prescrição, depois da
sentença condenatória com trânsito em julgado para a acusação, ou depois de
improvido seu recurso, regula-se pela pena aplicada, não podendo, em nenhuma
hipótese, ter por termo inicial data anterior à da denúncia ou queixa.
A decadência é a perda do
direito de promover a ação penal exclusivamente privada e a ação penal privada
subsidiária da pública e do direito de manifestação de vontade de que o autor
seja processado, por meio de ação penal pública, condicionada à representação,
em face de inércia do ofendido ou de seu representante legal, durante
determinado tempo fixado por lei.
A decadência também está
elencada como causa de extinção de punibilidade, mas, em verdade, o que esta
extingue é o direito de dar início à persecução penal em juízo. Pois o ofendido
perde o direito de promover a ação e provocar a prestação jurisdicional e o
Estado não tem como exercer seu direito de punir.
Já a perempção é considerada
como causa de extinção da punibilidade, consistente em sanção processual ao
querelante desidioso, que deixa de dar andamento normal à ação penal
exclusivamente privada. Trata-se de uma pena ao ofendido pelo mau uso da
faculdade, que o Poder Público lhe outorgou de agir preferentemente na punição
de certos crimes.
Importante é a causa extintiva
da punibilidade é o perdão judicial consistente em uma faculdade do juiz de, nos
casos previstos em lei, deixar de aplicar a pena, em face de justificadas
circunstâncias excepcionais.
O juiz deve analisar
discricionariamente se as circunstâncias excepcionais estão ou não presentes.
Entendendo que sim, não poderá recursar a aplicação do perdão judicial, pois,
nesse caso, o infrator condenado tem o direito público subjetivo ao benefício.
No perdão judicial é o juiz
quem deixa de aplicar a pena, independente da natureza da ação nos casos
permitidos por lei. O perdão do ofendido dependerá de aceitação do querelado
para surtir os efeitos, enquanto o perdão judicial independe da vontade do réu.
Importante ressaltar que o julgador somente poderá deixar de aplicar a pena nos
casos expressamente previstos em lei, a saber:
1)
art. 121, § 5º, do CP.
§ 5º - Na hipótese de
homicídio culposo, o juiz poderá deixar de aplicar a pena, se as consequências
da infração atingirem o próprio agente de forma tão grave que a sanção penal se
torne desnecessária.
2)
art. 129, § 8º, do CP.
§ 8º - Aplica-se à lesão
culposa o disposto no § 5º do art. 121.
3)
Art. 140, § 1º, I e II do CP.
§ 1º - O juiz pode deixar de
aplicar a pena:
I - quando o ofendido, de
forma reprovável, provocou diretamente a injúria;
II - no caso de retorsão
imediata, que consista em outra injúria.
4)
Art. 176, parágrafo único do CP.
Art. 176 - Tomar refeição em
restaurante, alojar-se em hotel ou utilizar-se de meio de transporte sem dispor
de recursos para efetuar o pagamento:
Pena - detenção, de quinze
dias a dois meses, ou multa.
Parágrafo único - Somente se
procede mediante representação, e o juiz pode, conforme as circunstâncias,
deixar de aplicar a pena.
5)
Art. 180, § 5º, do CP.
5º - Na hipótese do § 3º, se o
criminoso é primário, pode o juiz, tendo em consideração as circunstâncias,
deixar de aplicar a pena. Na receptação dolosa aplica-se o disposto no § 2º do
art. 155.
6) Art. 249, § 2º, do CP.
Art. 249 - Subtrair menor de
dezoito anos ou interdito ao poder de quem o tem sob sua guarda em virtude de
lei ou de ordem judicial:
Pena - detenção, de dois meses
a dois anos, se o fato não constitui elemento de outro crime.
§ 1º - O fato de ser o agente
pai ou tutor do menor ou curador do interdito não o exime de pena, se
destituído ou temporariamente privado do pátrio poder, tutela, curatela ou guarda.
§ 2º - No caso de restituição
do menor ou do interdito, se este não sofreu maus-tratos ou privações, o juiz
pode deixar de aplicar pena.
Na Lei das Contravenções
Penais, existem dois casos:
I - art. 8º - erro de direito.
Art. 8º No caso de ignorância
ou de errada compreensão da lei, quando escusáveis, a pena pode deixar de ser
aplicada.
II - art. 39, § 2º do DL
3688/41.
Art. 39. Participar de
associação de mais de cinco pessoas, que se reúnam periodicamente, sob
compromisso de ocultar à autoridade a existência, objetivo, organização ou
administração da associação:
Pena: prisão simples, de 1(um)
a 6(seis) meses ou multa.
§ 1º(omissis)
§2º O juiz pode, tendo em
vista as circunstâncias, deixar de aplicar a pena, quando lícito o objeto da
associação.
O perdão judicial também aparece na Lei nº 9.807, de 13 de julho de 1999 (Leis de Proteção às testemunhas[31]).
Art. 13 – “Poderá o juiz, de
ofício ou a requerimento das partes, conceder o perdão judicial e a consequente
extinção da punibilidade ao acusado que, sendo primário, tenha colaborado
efetiva e voluntariamente com a investigação e o processo criminal, desde que
dessa colaboração tenha resultado:
I - a identificação dos demais
coautores ou partícipes da ação criminosa;
II - a localização da vítima
com a sua integridade física preservada;
III - a recuperação total ou
parcial do produto do crime.
Parágrafo único. A concessão
do perdão judicial levará em conta a personalidade do beneficiado e a natureza,
circunstâncias, gravidade e repercussão social do fato criminoso.
Outro importante motivo de
perdão judicial[32]
que tem suscitado acirradas discussões no meio jurídico é o previsto para a
delação premiada, por força do artigo 4º da Lei nº 12.850/2013, que introduziu
os meios legais de prova de combate às organizações criminosas.
Art. 4º O juiz poderá, a
requerimento das partes, conceder o perdão judicial, reduzir em até 2/3 (dois
terços) a pena privativa de liberdade ou substituí-la por restritiva de
direitos daquele que tenha colaborado efetiva e voluntariamente com a
investigação e com o processo criminal, desde que dessa colaboração advenha um
ou mais dos seguintes resultados:
I - a identificação dos demais
coautores e partícipes da organização criminosa e das infrações penais por eles
praticadas;
II - a revelação da estrutura
hierárquica e da divisão de tarefas da organização criminosa;
III - a prevenção de infrações
penais decorrentes das atividades da organização criminosa;
IV - a recuperação total ou
parcial do produto ou do proveito das infrações penais praticadas pela
organização criminosa;
V - a localização de eventual
vítima com a sua integridade física preservada.
Existem duas correntes sobre a
natureza jurídica da sentença concessiva:
Primeira Corrente: é
condenatória: a sentença que concede o perdão judicial é condenatória, uma vez
que só se perdoa a quem errou. O juiz deve, antes de conceder o perdão
judicial, verificar se há prova do fato e da autoria, se há causa excludente da
ilicitude e da culpabilidade, para, só então, condenar o réu e deixar de
aplicar a pena concedendo o perdão.
É a orientação seguida pela
STF. Essa posição acabou reforçada pelo art. 120 do CP, que expressamente diz
que a sentença o perdão judicial não prevalece para efeito de reincidência.
Segunda Corrente: é declaratória da extinção da punibilidade – a sentença que concede o perdão judicial é meramente declaratória da extinção da punibilidade, não surtindo nenhum efeito penal ou extrapenal. É a posição do STJ – Súmula 18 - "A sentença concessiva de perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório".
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Notas:
[1]
Por meio da ADPF 153, proposta em outubro de 2008, o que pede a OAB é “uma
interpretação conforme a Constituição, de modo a declarar, à luz dos seus
preceitos fundamentais, que a anistia concedida pela citada lei aos crimes
políticos ou conexos não se estende aos crimes comuns praticados pelos agentes
da repressão contra opositores políticos durante o regime militar”. O alvo da
demanda é, portanto, o §1º do artigo 1º da referida Lei.
[2] Em consequência da anistia houve dezenas de atentados
com o intuito de intimidar a sociedade ocorridos entre 1978 e 1981. Foram anos marcados por atentados
terroristas praticados por grupos de militares radicais e paramilitares que
resistiam à distensão política no Brasil. A abertura política, ainda lenta,
vacilava a cada novo atentado terrorista. Em todo o País, multiplicavam-se
ligações anônimas com ameaças e falsos alarmes de bomba, que obrigavam a
evacuação de prédios inteiros. No Rio de Janeiro, em 30
de abril de 1981, uma bomba que
deveria ser detonada durante um show no Riocentro explodiu dentro do carro dos dois
militares que a transportavam.
[3]
José Carlos Arouca, o primeiro no ranking dos anistiados políticos e a soma de
R$ 25.439.875,94 em indenizações. Todas as indenizações foram aprovadas pela
Comissão de Anistia, mas nenhum integrante do ranking recebeu integralmente o
dinheiro pago em parcelas. Aos 75 anos, instalado na banca de advogado perto do
centro paulistano, Arouca foi aprovado em 1° lugar num concurso para juiz do
Trabalho em 1965. Ele se inscrevera para garantir a sobrevivência financeira
ameaçada pela suspensão, decorrente de pressões do governo militar, da
assistência jurídica que prestava a vários sindicatos. Não apenas fora impedido
de assumir o cargo de juiz como se viu processado com base na Lei de Segurança
Nacional e passou até algumas semanas na prisão. Em 1999, 20 anos depois da
anistia, o resultado do concurso foi formalmente reconhecido e Arouca se tornou
juiz do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo. Aposentou-se em 2005 e, no mesmo ano, foi
contemplado com indenização milionária.
Outro, no terceiro lugar do ranking foi Paulo Cannabrava Filho que
conseguiu R$ 2,7 milhões além de pensão de 15.784,80 por mês. Presidente da
Associação Brasileira da Propriedade Intelectual dos Jornalistas Profissionais.
O quarto da lista, Renato Leone Mohor, igualmente premiado por R$ 2,7 milhões,
teve a reparação equiparada ao salário médio de um chefe de redação, ou seja,
R$ 15,3 mil reais mensais. O décimo do ranking, o jornalista e ex-deputado
federal Hermano de Deus Nobre Alves não viveu para receber integralmente a
indenização de R$ 2,1 milhões de reais. Morreu em julho de 2010, em Lisboa,
onde já morava desde 1991. Segundo as regras da anistia, o direito à reparação
não é transferível para algum herdeiro.
[4]
Os crimes hediondos são aqueles considerados como os mais repugnantes e dignos
de forte repressão social. Questiona-se, portanto, os métodos utilizados para
se determinar quais crimes devem ser detentores do status de hediondo e quais
não devem. Quando os crimes hediondos são previstos por meio do sistema legal,
há expressa previsão normativa em rol taxativo de crimes hediondos. Dessa forma,
não caberá ao julgador realizar qualquer juízo de valor quanto à hediondez do
delito, inerentemente de circunstâncias fáticas em questão. Não se cogita,
portanto, em discricionariedade judicial. In: CAPEZ, Fernando. Curso de Direito
Penal. Volume 4, 7ª edição. São Paulo: Saraiva, 2012.
[5] O primeiro problema de validade do decreto de graça resulta de não respeitar o trânsito em julgado da decisão condenatória. Havendo recurso possível na jurisdição brasileira, não se pode tomar como consolidada a coisa julgada. Como há uma diferença ontológica entre o instituto da graça e do indulto, o ato do Presidente da República é juridicamente inexistente, uma vez que não respeito o mais comezinho requisito desta modalidade de clemência. Comenta-se que o atual decreto presidencial não passa de mero salvo-conduto anômalo, potencialmente maculado pelo desvio de finalidade.
[6]
A historiadora afirma que a obra não é uma história do ato de anistia, e sim,
dos anistiados. O que não é demérito do livro. O momento comemorativo de
concessão da anistia representa, em quase todos os casos, o auge de muitos
esforços e negociações, importante quanto a mobilização da qual este resulta.
[7]
Habeas-corpus a favor dos Srs. Almirante Wandenkolk, Capitão Tenente
Huet Bacellar e Tenente Antão Corrêa da Silva: petição dirigida ao Supremo
Tribunal Federal. Como desdobramento dos episódios da Revolta da Armada, de
1892, o Senado Federal, no dia 28 de agosto de 1893, concedeu licença para que
o Senador Almirante Wandenkolk fosse processado no foro civil e não submetido
ao Conselho de Guerra, sugestão esta do Presidente da República. Ruy Barbosa
encaminhou, então, uma nova petição de habeas corpus ao Supremo Tribunal
Federal, em 30 de agosto daquele ano, com o propósito de libertar o Senador e
dois militares que estavam presos havia quarenta dias nas fortalezas de Santa
Cruz, Laje e Villegaignon, todos envolvidos no incidente do navio Júpiter. Ruy
Barbosa utilizou como argumentos o excesso de prazo para a formação de culpa e
a imunidade parlamentar, para defender o Senador; e a condição de oficiais
reformados, portanto sujeitos ao foro comum e não ao foro militar, para
defender os outros. Disponível em: http://www2.senado.leg.br/bdsf/handle/id/227404
Acesso em 09.05.2022.
[8]
O habeas corpus nº 300 foi um importante marco para o Brasil, adquirindo
até status de julgamento histórico. Recém-constituído, no período, em sua forma
republicana, o país encontrava-se em um momento histórico de embates políticos pelo
poder. Porém, diferente das revoluções republicanas que ocorriam pelo mundo, no
Brasil, a disputa era travada entre as elites dominantes, sendo essa forma d governo
mero pretexto para fugir do império. No caso do Habeas Corpus 300 de
1892, o advogado Rui Barbosa impetra medida em favor do Senador Almirante
Eduardo Wandenkolk e outros cidadãos, indiciados por crimes de sedição e
conspiração, presos ou desterrados em face de decretos expedidos pelo
Vice-Presidente da República, Marechal Floriano Peixoto, na função de
presidente. Tais atos determinaram a suspensão de garantias constitucionais,
decretando-se o estado de sítio. Fundamenta-se o pedido na crassa inconstitucionalidade
do estado de sítio e na ilegalidade das prisões ocorridas. Algumas dessas
restrições de liberdade ocorreram mesmo antes de decretada a medida provisória
de proteção e, outas foram determinadas quando ao término de sua vigência, período
em que devem imediatamente ser restabelecidas as garantias constitucionais.
Cumpre realizar análise da Constituição brasileira de 1891 vigente à época do
fato. Sendo a primeira Constituição republicana e que teve protagonismo em
estabelecer no país, os princípios dessa forma de governo, seguindo o sistema
de governo presidencialista.
[9]
O governo de Sarney fora marcado pela frustração ideológica do retorno à
democracia com a morte de Tancredo Neves. E, por ocupar a vice-presidência,
Sarney foi o primeiro civil a tomar posse da Presidência da República após a
ditadura militar. Era figura ligada às tradicionais oligarquias nordestinas, e
tinha a difícil missão de recuperar a economia nacional sem abrir mão de
privilégios das elites que o apoiavam. A ineficiência do campo econômico, só
não ganhou maior destaque na época devido às movimentações políticas em torno
da Constituição de 1988. Esperada como uma nova lei que acabasse com os últimos
entraves do sistema repressivo militar e garantisse as liberdades civis e
políticas, a nova constituição ofereceu ganhos significativos nas questões das
liberdades e dos direitos individuais.
[10]
Em agosto de 1963, João Goulart, em comemoração ao “Dia do Encarcerado”,
concedeu indulto e comutação àqueles que preenchiam as condições ali previstas
(Decreto 52.377).
[11]
A Era Collor foi período da história brasileira iniciado pela posse como
Presidente da República em 15 de março de 1990, e encerrado por sua renúncia em
29 de dezembro de 1992. Foi o primeiro presidente eleito pelo povo desde 1960,
quando Jânio Quadros venceu a última eleição direta para presidente antes do
início do Regime Militar. Seu afastamento em 2 de outubro de 1992 foi
consequência da instauração de seu processo de impeachment no dia anterior,
seguido por cassação.
[12]
O Governo de Itamar Franco começa em 29 de dezembro de 11992 com a renúncia de
Fernando Collor de Mello e vai até o 01 de janeiro de 1995, o país vivia um
período conturbado, mas procurou realizar uma gestão transparente, buscando
apoio dos partidos políticos e procurando realizar uma gestão transparente,
buscando apoio de partidos políticos e, buscando atender aos anseios da
sociedade brasileira. Sua equipe era composta majoritariamente por mineiros
daí, ser conhecida informalmente como a República do Pão de Queijo.
[13]
Desde a redemocratização, sucessivos governos lidaram, por meio de medidas
variadas, com o legado traumático do período autoritário. Fernando Henrique
Cardoso, exilado pelos generais, aprovou tanto a Lei dos Mortos e Desaparecidos
em 1995 quanto a Lei 10.559, de 2002, que permitiu ao Estado promover
reparações às vítimas de perseguição da ditadura e criou a Comissão de Anistia
para julgar os pedidos de indenização.
[14] Em sua decisão, a ministra Cármen Lúcia pontuou que o indulto é providência garantidora, num sistema constitucional e legal em que a execução da pena definida aos condenados seja a regra, possa-se, em situações específicas, excepcionais e não demolidoras do processo penal, permitir-se a extinção da pena pela superveniência de medida humanitária. "Indulto não é prêmio ao criminoso nem tolerância ao crime. Nem pode ser ato de benemerência ou complacência com o delito, mas perdão ao que, tendo-o praticado e por ele respondido em parte, pode voltar a reconciliar-se com a ordem jurídica posta. Se não for adotado na forma da legislação vigente transmuda-se o indulto em indolência com o crime e insensibilidade com a apreensão social que crê no direito de uma sociedade justa e na qual o erro é punido e o direito respeitado. Mas a humanidade com os que purgaram pelo seu erro criminal, na forma do direito estabelecido, encontra o veio do perdão pela nova chance oferecida ao condenado." A decisão da ministra suspendeu os efeitos dos dispositivos do decreto apontados PGR como inconstitucionais até o exame do caso pelo relator da ADIn 5874, ministro Luís Roberto Barroso, ou pelo plenário do STF, o que ainda não tem data prevista para ocorrer.
[15]
O governo de Lula se caracterizou pela baixa inflação que restou controlado,
redução de desemprego e constantes recordes da balança comercial. Na gestão do
presidente Lula observou-se o recorde na produção da indústria automobilística
em 2005, o maior crescimento real do salário mínimo e redução do índice de
Gini. Na área do ensino superior, o ProUni (Programa Universidade Para Todos)
foi, segundo as declarações do MEC, o maior programa de bolsas de estudo da
história da educação brasileira.[104] De 2005 a 2009, o ProUni ofereceu quase
600 mil bolsas de estudo em aproximadamente 1,5 mil instituições de ensino em
todo o país, que receberam para isto o benefício da isenção de tributos. Entre
os beneficiados com bolsas, 46% eram autodeclarados afrodescendentes.
[16]
Lula deu indulto no último dia de sua presidência, em 31.12.2010 a Cesare
Battisti, terrorista italiano que matou pelo menos quatro pessoas em um
atentado. Postagens enganam ao afirmar que o ex-presidente Lula teria concedido
indulto a Cesare Battisti, condenado na Itália. Em verdade, negou a extradição
solicitada pelo país europeu. A postagem equiparou o ato de perdão da pena do
atual Presidente da República ao caso do deputado Daniel Silveira, mas são
situações distintas.
[17]
Em relação aos requisitos subjetivos, houve uma redução dos dispositivos
referentes ao cumprimento de uma série de requisitos cuja subjetividade
dificultava a concessão do benefício. Atualmente, exige-se tão somente a
inexistência de aplicação de sanção, por falta disciplinar de natureza grave,
prevista na Lei de Execução penal, cometida nos doze meses de cumprimento da
pena, contados retroativamente à data de publicação do decreto.
[18]
No início do governo Dilma, foram implementadas medidas que incluíam políticas
de forte intervenção governamental na economia que combinaram política
monetária com a redução da taxa de juros e política fiscal com dirigismo no
investimento, elevação de gastos, concessões de subsídios e intervenção em
preços. Essa política ficou conhecida como nova matriz econômica, e foi
apontada como uma das causas da crise de 2014.[44] Entre 2010 e 2014, o Brasil
foi o país que mais perdeu posições no ranking mundial de competitividade,
caindo do 38º lugar para o 54º entre as sessenta economias analisadas pelo International
Institute for Management Development (IMD) e pela Fundação Dom Cabral. O
estudo avalia as condições oferecidas pelos países para que as empresas que
neles atuam tenham sucesso nacional e internacionalmente, promovendo
crescimento e melhorias nas condições de vida da sua população. Na análise, os
critérios avaliados são: desempenho econômico, infraestrutura e eficiência dos
seus governos e empresas.
[19]
Já durante o governo de Dilma Rousseff foi instalada a CNV, a Comissão Nacional
da Verdade, visão à produção de narrativa oficial acerca de abusos do Estado
durante o período de exceção, por razões políticas, a CNV não focou apenas a
ditadura instalada em 1964 e investigou violações a partir de 1946. O país
avançava na questão da reparação histórica. Não surpreende que o atual governo
federal do Brasil tenha procurado extinguir a Comissão de Anistia.
[20]
Pesquisa da Pastoral Carcerária mostra que apenas 3,5% das presas que tinham
direito ao indulto do Dia das Mães no ano passado receberam o benefício, criado
por decreto do presidente Michel Temer. Foi a primeira vez que a Presidência
concedeu perdão de pena exclusivamente para mulheres.
[21] A 6ª turma do STJ entendeu que o decreto presidencial de 2017, que concedeu indulto especial às mulheres presas por ocasião do Dia das Mães daquele ano, também abrange presas em regime aberto. Para o colegiado, não seria razoável impedir a extensão do indulto a mulheres em regime aberto. A 6ª turma negou o recurso do MP/SC. O parquet alegava que o decreto presidencial prevê a concessão de indulto às apenadas presas, sem qualquer ressalva em relação àquelas que se encontram em regime aberto. Para o colegiado, todavia, essa interpretação restritiva iria contra os compromissos assinados pelo Brasil nas Regras de Bangkok, que buscam formas alternativas ao cárcere em razão da condição especial da mulher. Relator, o ministro Sebastião Reis Júnior apontou que o caput do artigo 1º do decreto presidencial se refere apenas a mulheres presas, nacionais ou estrangeiras, sem acrescentar qualquer outra restrição. Não foi esclarecido, por exemplo, que seriam agraciadas com o indulto apenas as presas em cumprimento de pena no regime fechado ou semiaberto. Processo: REsp 1.762.043
[22] Em Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa No primeiro ano da pandemia de covid-19, em 2020, o presidente de Portugal aprovou indulto especial para liberar parte da população carcerária e evitar a contaminação por coronavírus. A medida causou polêmica e Souza precisou esclarecer que o mecanismo “não se aplica a homicidas e pedófilos”. Também não contemplava pessoas condenadas por violência doméstica. Na Espanha, Pedro Sánchez O Conselho de Ministros, presidido por Sánchez, aprovou o indulto parcial para 9 pessoas integrantes do movimento a favor do separatismo na Catalunha em 2021. Eles foram condenados à prisão com pena de 9 a 13 anos em 2019. O indulto foi uma tentativa de amenizar os conflitos políticos no país. Na época da decisão, Sanchez disse: “queremos encerrar de uma vez por todas a divisão e o confronto. A sociedade espanhola demonstra hoje sua grandeza. É hora de voltar à política “.
[23]
Na América Latina há o caso peruano ocorrido em 2017, quando o então presidente
do Peru, Pablo Kuczynski, concedeu indulto humanitário ao ex-presidente Alberto
Fujimori (1990 e 2000). Fujimori cumpria uma pena de 25 anos em regime fechado
por abusos de direitos humanos, corrupção e anuência a esquadrões da morte. O
perdão causou polêmica no direito do país e no internacional e acabou sendo
revogado 10 meses depois. Mas, em março de 2022, a Corte Constitucional do Peru
aprovou um recurso que permitiu sua libertação.
[24]
Na Argentina em 2007, foi o caso da
Justiça hermana que anulou os indultos concedidos em 1990 aos ex-ditadores
Jorge Videla e Emilio Massera. Eles foram condenados à prisão perpétua em 1985
como responsáveis por planos terroristas de Estado. Entre os crimes, estão o
roubo de bebês durante a ditadura (1976-1983), responsabilidade no Plano Condor
e a apropriação de bens de desaparecidos. Foram indultados em 1990 pelo
ex-presidente Carlos Menem (1989-1999).
[25]
Augusto Frederico Gaffrée Thompson (1933-2007) conhecido apenas como Augusto
Thompson foi um advogado criminalista, jurista, autor, penitenciarista e
professor brasileiro. Iniciou sua carreira como assistente de Alfredo Tranjan,
famoso advogado criminal, que escreveu sua história nos tribunais do júri em um
clássico: A Beca Surrada - meio século de advocacia criminal. Tranjan dedicou
um capítulo a Augusto Thompson, narrando a sua fascinante personalidade e a
forma original com que Thompson ingressou no escritório ("Capítulo - Sobre
o insólito"). Ali, Alfredo Tranjan afirma que Thompson tornou-se "um
dos mais completos tribunos de uma geração que nos deu Serrano Neves, Humberto
Teles, José Bonifácio Diniz de Andrada. (...) produziu obras jurídicas de
respeito. Ao lado de Antônio Vicente da Costa Junior faz par como dos mais
acatados conhecedores do Direito Penitenciário.
[26]
Nos Estados Unidos, o poder de perdoar os delitos foi amplamente utilizado de
forma política. Alexander Hamilton, em um de seus artigos publicados como O
Federalista, de n. 74, tratou do comando pelo Presidente da República, das
Forças Armadas e o Seu Poder de Perdão. Hamilton defendeu a concentração deste
poder no chefe do Executivo, que somente não poderia aplicar o perdão nos casos
de impeachment. O constitucionalista conclui o artigo argumentado que o
principal fundamento para o poder de perdoar repousar no Supremo Magistrado é
que em épocas de rebelião, ou insurreição, uma oferta oportuna de perdão aos
insurgentes ou rebeldes pode rapidamente restaurar a paz da comunidade.
Defendia que, para esses casos, o processo dilatório de convocar o legislativo,
ou um de seus ramos, poderia ser fatal à agilidade necessária ao Executivo.
[27]
No direito francês, no absolutismo do Antigo Regime, o indulto encontrou
correspondentes nas lettres d'abolition générale, também conhecidas como
cartas de remissão, que poderiam solicitar o benefício a um indivíduo ou a uma
generalidade. Perdoar o condenado foi uma faculdade que, desde a Antiguidade,
se reservaram aos monarcas, tendo sido já qualificada como a "mais bela
das prerrogativas régias". O perdão é uma das formas mais antigas de se
obter a liberdade e, atualmente sobrevive em todos países do mundo, exceto na
China. Atualmente, o instituto encontra-se nas constituições de países em todos
os continentes: Afeganistão, Alemanha, Argentina, Bélgica, Chile, Colômbia,
Coréia do Sul, Cuba, Dinamarca, Egito, Espanha, EUA, Geórgia, Holanda, Hungria,
Índia, Luxemburgo, França, México, Noruega, Nova Guiné, Paraguai, Portugal,
República Tcheca, Suécia, Suíça, Uruguai e Uzbequistão.
[28]
A grande maioria das nações confere ao Presidente da República, ou ao monarca,
o poder de clemência, o que é condizente com a visão popular de que o perdão é
um poder discricionário confiado à pessoa mais importante do país. Outros
países, como a Bulgária, Alemanha (onde o presidente pode transferir o poder ao
Chanceler ou ao Ministro da Justiça), Polônia, România e Coréia do Sul,
submetem tal análise ao crivo de colegiado ao invés de concentrar a decisão em
uma só pessoa. Alguns, reservam o Poder Legislativo tal função, como Uruguai,
Suíça, e, em algumas situações, a Turquia.
[29]
Verifica-se a possibilidade de se receber o indulto antes do trânsito em
julgado (em execução provisória, como por exemplo, o artigo 5, do Decreto de
2013 e, alhures, antes mesmo de qualquer investigação ter sido instaurada. Para Aníbal Bruno, o indulto é medida de
caráter coletivo, mas no ato que o concede podem vir mencionados nominalmente
os que dele se beneficiam. O Ministro Maurício Corrêa, do STF, na MC na ADIn
2795/DF, definiu o indulto como instrumento de política criminal colocado à
disposição do Estado para a reinserção e ressocialização dos condenados que a
ele façam jus, segundo a conveniência e oportunidade das autoridades
competentes. E, nessa doutrina aponta como fundamento para a existência do
indulto, a conveniência de se reduzir a penalidade imposta àquele apenados que
dão provas de seu arrependimento. De fato, em países como Canadá, EUA e Suécia,
o perdão poderá ocorrer antes do trânsito em julgado, ou mesmo antes da
denúncia, sendo possível antes de qualquer investigação. Um caso histórico de
clemência foi o do presidente Gerald Ford que perdoou Richard Nixon, antes de
qualquer acusação ter sido apresentada.
[30]
A obra intitulada "Amnesty in Brazil: Recompense after Repression,
1895-2010", a historiadora norte-americana Ann M. Schneider traçou a
trajetória das anistias ao longo da experiência republicana brasileira. Não é
apenas um relato meramente cronológico. A obra é dividida em três partes, a
obra fornece uma reflexão complexa sobre os fatores que moldaram os esforços de
reconciliação, restituição e perdão em períodos tensos da vida brasileira. A
autora traz à tona reflexões mais essenciais sobre a qualidade cambiante da
democracia brasileira, mais generosa em alguns momentos que outros, e lembra
que processos democráticos fazem parte de herança a ser cuidada e aperfeiçoada
e não tomada como certa.
[31]
A solicitação é feita pelo Programa a um juiz, que determinará a mudança e nome
e a emissão de novos documentos. A Lei n° 9.807/99 também assegura que, uma das
medidas a ser aplicada, caso necessário, é a transferência de residência ou
acomodação provisória da vítima/testemunha para um local compatível com a
proteção. Criada em 1999, por meio da Lei Federal nº 9.807/99, a política de
proteção a vítimas e testemunhas ameaçadas atende à demanda de toda a
federação, seja por meio dos Programas Estaduais ou do Programa Federal, que
com o forte apoio das Organizações da Sociedade Civil, protegem atualmente,
cerca de 500 pessoas, entre testemunhas e seus familiares.