Ailton Krenak na ABL
Por Gisele Leite
O
escritor e ativista ambiental Krenak foi eleito para a Academia Brasileira de
letras e recebeu vinte e três votos e se tornou o primeiro indígena a ocupar
uma cadeira, a de número cinco que pertenceu a José Murilo de Carvalho,
falecido em agosto do ano passado, e de Rachel de Queiroz. Paulo Paim,
Presidente da Comissão de Direitos Humanos destacou o impactante significado da
eleição de Krenak.
Disputaram
com Krenak a historiadora Mary del Priore e o escritor, também indígena, Daniel
Munduruku, que obtiveram, respectivamente, 12 e 4 votos. Ele nasceu em Itabirinha, em Minas Gerais, na
região do Vale do Rio Doce. Nos anos 70,
participou da criação da União das Nações Indígenas, primeiro movimento de expressão
nacional, que enfrentou resistência da ditadura militar. Ailton Krenak teve
papel decisivo na Assembleia Constituinte e protagonizou um dos momentos mais
emocionantes, quando subiu à tribuna para defender o direito à terra e o
respeito às populações indígenas.
De
fato, é uma repaginação histórica e a reafirmação do compromisso com a
representatividade além do reconhecimento da literatura oral. Para o presidente
da ABL, Merval Pereira, Krenak é um poeta com “visão de mundo muito própria e
apropriada para este momento, em que o mundo está preocupado com o meio
ambiente, em que os povos originários lutam por seus direitos. Tudo isso está
embutido na vitória de Krenak na Academia. É um indígena que trabalha com a
cultura indígena, com a valorização da oralidade”. Krenak é autor de livros
como "O amanhã não está à venda" e "Ideias para adiar o fim do
mundo", Ailton Krenak já teve obras traduzidas em treze países.
Destaque-se
que nas décadas de 1970 e 1980 foi determinante para a conquista do “Capítulo
dos índios”, o capítulo 8º na Constituição de 1988, que passou a garantir, no
papel, os direitos indígenas à cultura e à terra. Entre os livros mais
recentes, estão Ideias para adiar o fim do mundo (2019), A vida não é útil
(2020), Futuro ancestral (2022) e Lugares de Origem (2021), escrito junto com
Yussef Campos. Krenak valoriza a cultura indígena e mostra que a forma de lidar
com a natureza e o mundo têm muito a ensinar a sociedades capitalistas. Ter
indígena na ABL é admitir duzentas línguas diferentes, diz Krenak.
Presenciamos
um movimento que amplia as fronteiras da ABL, entre a literatura e a sociedade.
Uma indicação que sugere uma possível mudança de rumo numa academia
aparentemente mais conectada com os desafios da contemporaneidade, seja na
indicação de nomes como Fernanda Montenegro e Gilberto Gil, em novembro de
2021, no contexto em que a existência da cultura vinha sendo desafiada, ou de
Heloísa Teixeira, em abril de 2023, que reforçou o discurso contra a
desigualdade de gênero dentro da academia e na sociedade brasileira.