A tutela jurídica do estrangeiro no Brasil

A condição jurídica do estrangeiro é tema de grande importância e, tanto os estrangeiros como os nacionais compõem aquilo que se chamam de indivíduos no Direito Internacional Público. E, pela supremacia do Estado que possui jurisdição sobre os seus nacionais e estrangeiros que estão em seu território, por isso, é de suma importância o estudo do tema, pois juntos aos cidadãos nacionais circulam indivíduos estrangeiros que residem, trabalham e vivem no solo brasileiro. Ainda se aborda os direitos e deveres do estrangeiro e, o instituto de asilo com maior ênfase a condição do refugiado acolhido em nosso país.

Fonte: Gisele Leite

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"O Estrangeiro" obra de Camus[1] tem como protagonista chamado Meursault que utilizava "Tanto faz, tanto faz...", é um enredo envolvente e o leitor tem um universo paralelo vivido pelo personagem principal. Foi escrita a obra em 1942, às sombras da Segunda Guerra Mundial pelo escritor e filósofo[2] Albert Camus, sendo a obra considerada um autêntico clássico da literatura mundial e, rendeu ao autor o Prêmio Nobel de Literatura de 1957.

Meursault[3] é um pacato funcionário de um escritório na cidade de Argel. Sem nenhuma perspectiva ou objetivos na vida, ele facilmente conduz o leitor à antipatia diante de tamanha passividade. Já nas primeiras linhas da novela Meursault recebe a notícia que sua mãe,  outrora abandonada pelo mesmo em um asilo qualquer, havia falecido (fato este que configura o primeiro parágrafo da novela e que, com certeza, é uma das mais marcantes introduções da literatura mundial).

Durante o enterro, sua indiferença diante do corpo da mãe é notória e o que ele mais deseja é que tudo aquilo acabe o mais rápido possível. Ele é um homem alheio a qualquer espécie de sentimento. Para os padrões morais e éticos da sociedade ele é um cidadão incomum, estranho, um total “estrangeiro” neste mundo.

Totalmente desapegado à vida, às pessoas e ao seu próprio destino, nosso protagonista envolve-se em sérios problemas ao ajudar a um vizinho que está sendo perseguido pelo seu cunhado. Meursault acaba por cometer um assassinato banal, porém hediondo.  É preso e levado a julgamento.

Alguns leitores entendem que o ápice da história é a cena que aponta para um crime cometido pelo protagonista, e ainda, há os episódios do julgamento, a perspicácia e argumentos utilizado pelo acusador para convencer o júri de sua culpabilidade[4].

Não tanto pelo crime em si, porém, particularmente por não ter chorado na morte de sua mãe e por ter se envolvido com ex-colega de trabalho um dia após ao enterro como se nada tivesse acontecido.

A percepção de Meursault ao constatar que o futuro de sua vida está agora nas mãos de pessoas que nem o conhece o aflige.  Após a sentença Meursault mergulha em profundas reflexões, avalia os rumos que sua vida levou e chega a conclusões que causarão um grande impacto psicológico ao leitor.

O romance integra a trilogia “Ciclo do Absurdo”, da qual é também composta por um ensaio (O Mito de Sísifo[5]) e uma peça teatral (Calígula).

“O Estrangeiro” é narrado em primeira pessoa[6] pelo próprio Meursault. Isso possibilita ao leitor entrar no universo particular do personagem, compreendendo (ou não!) seus questionamentos. Fato esse que seria impossível caso fosse narrado por terceiros.

Ao longo da leitura podemos observar vários elementos do pensamento existencialista[7]; o mundo sem sentido, injusto e dominado pelo absurdo (segundo a cosmovisão do protagonista) é um dos principais. Meursault não conquista a simpatia do leitor. Ao mesmo tempo em que é defendido por uns sob a justificativa de ele ser um personagem comum, porém liberto dos padrões morais exigidos pela sociedade, outros leitores o acusam de possuir fortes tendências psicopatas[8].

De qualquer modo, ele é tudo aquilo que não desejamos ser…, mas podemos ser… ou talvez já sejamos. “O Estrangeiro” é, com certeza, um pequeno livro com poder de causar grandes sensações ao leitor. Camus, genialmente, nos leva à angústia várias vezes diante da apatia sufocante de seu personagem. Queremos sacudir fortemente Meursault, gritar com ele e forçá-lo a reagir.

O enredo todo nos dá oportunidade de analisar a tutela jurídica do estrangeiro no Brasil. A condição jurídica do estrangeiro no Brasil atualmente é regida pela Lei nº 13.445, de 24 de maio de 2017, a Lei de Migração, que revogou a antiga Lei nº 6.815, de 19 de agosto de 1980, o Estatuto do Estrangeiro, criado durante da ditadura militar adotava uma postura de segurança nacional e de criminalização do estrangeiro. Já a nova Lei de Imigração trata o movimento migratório como um direito humano, combatendo a xenofobia e a discriminação contra o migrante.

A Lei de Migração, logo em seu artigo 1º, § 1, II e V, realizou a diferenciação da figura do estrangeiro, o subdividindo em duas figuras distintas a serem reconhecidas pelo ânimo de permanência no território brasileiro, entre Imigrante e Visitante.

O Imigrante é a pessoa nacional de outro país ou apátrida que trabalha ou reside e se estabelece temporária ou definitivamente no Brasil e o Visitante é aquela pessoa nacional de outro país ou apátrida que vem ao Brasil para estadas de curta duração, sem pretensão de se estabelecer temporária ou definitivamente no território nacional, a divisão em duas figuras distintas do estrangeiro se fez necessária para a aplicação correta da tipologia de visto de entrada pertinente a cada uma destas.

A Lei de Migração dispõe sobre os direitos e os deveres do migrante e do visitante, regula a sua entrada e estada no País e estabelece princípios e diretrizes para as políticas públicas para o emigrante.

Assim como elucidado na parte histórica apresentada anteriormente desde os primórdios o Estrangeiro era uma figura malvista e sem direitos, com o passar dos anos os mesmos passaram a ter alguns direitos, porém ainda inferiores aos das pessoas originárias da sociedade em que ingressavam.

A Lei de imigração garante aos imigrantes que chegam ao Brasil os mesmos direitos dos cidadãos brasileiros natos, isso colocou o Brasil numa posição de vanguarda em questões migratórias, pois abandona a visão de que o imigrante é uma ameaça à segurança nacional e passa a tratar o tema sob a perspectiva dos direitos humanos.

A Lei de Migração trata o imigrante como um concidadão do mundo, com direitos universais garantidos, todos providos gratuita e legitimamente pelo Estado, em conformidade com a política internacional de Direitos Humanos.

Historicamente, a Carta Régia de D. João VI, de 1808, decretou a abertura dos portos, estimulando a imigração. No Século XX houve a diminuição dessa liberdade, o constituinte brasileiro em 1934 dispôs que “a entrada de imigrantes no território nacional sofrera as restrições necessárias à garantia da integração étnica e capacidade física e civil do imigrante, não podendo, porém, a concorrente imigratória de cada país exceder, anualmente, o limite de dos por cento sobre o número total dos respectivos nacionais fixados no Brasil durante os últimos cinquenta anos”.

A Constituição brasileira de 1946 aboliu o regime de quotas e restabeleceu a norma de liberdade de entrada: “Em tempo de paz, qualquer pessoa poderá com os seus bens entrar no território nacional, nele permanecer ou dele sair, respeitados os preceitos da Lei”.

A Constituição brasileira de 1988, em seu artigo 5º, inciso XV, traz “é livre a locomoção no território nacional em tempo de paz, podendo qualquer pessoa, nos termos da lei, nele entrar, permanecer ou dele sair com seus bens”.

A entrada do estrangeiro no Brasil se dá por meio de visto, porém o Brasil adota uma política de concessão de vistos, que é fixado no princípio da reciprocidade, dispondo o Decreto nº 82.307, de 1978, que “as autorizações de visto para entrada de estrangeiros no Brasil e as isenções e dispensas de visto para todas as categorias somente poderão ser concedidas se houver reciprocidade de tratamento para brasileiros”, Isso significa que nacionais de países que exigem vistos de cidadãos brasileiros para entrada em seus territórios também precisarão de visto para viajar ao Brasil.

O Brasil possui entendimentos bilaterais sobre isenção de vistos com cerca de 90 países, sendo: África do Sul, Albânia, Alemanha, Andorra, Antígua e Barbuda, Armênia, Áustria, Bahamas, Barbados, Belarus/Bielorrússia, Bélgica, Belize, Bolívia, Bósnia e Herzegovina, Botsuana, Bulgária, Cazaquistão, Chile, Chipre, Cingapura, Colômbia, Coréia do Sul, Costa Rica, Croácia, Dinamarca, Dominica, El Salvador, Equador, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Estônia, Fiji, Ilhas, Finlândia, França, Geórgia, Granada, Grécia, Guatemala, Haiti, Honduras, Hong Kong, Hungria, Indonésia, Irlanda, Islândia, Israel, Itália, Jamaica, Letônia, Liechtenstein, Lituânia, Luxemburgo, Macau, Macedônia/ FYROM, Malásia, Maldivas, Malta, Marrocos, México, Micronésia, Mônaco, Mongólia, Montenegro, Namíbia, Nauru, Nicarágua Noruega, Nova Zelândia, Holanda, Palestina (somente Autoridade), Panamá, Paraguai, Peru, Polônia, Portugal, Reino Unido, Rep. Dominicana, Rep. Do Palau, Rep. Tcheca, Romênia, Rússia, Samoa Ocidental, Santa Lúcia, S. Cristovão e Nevis, São Martinho, São Vicente e Granadinas, Sérvia, Seychelles, Ilhas, Suécia, Suíça, Suriname, Tailândia, Tonga, Trinidad e Tobago, Tunísia, Turquia, Tuvalu, Ucrânia, Uruguai, Vaticano, Venezuela.

O passaporte é o principal documento exigido de quem adentre no território brasileiro, sendo este um documento emitido pelas autoridades públicas que é utilizado como uma forma de controle e identificação do ingresso de estrangeiros no país.

No passaporte é inserido o visto de entrada do estrangeiro (no caso de exigência do mesmo), que lhe confere o direito de permanecer no território pelo tempo autorizado.

A Lei de Migração, Lei 13.445 de 24 de maio de 2017, em seu artigo 10, traz as situações que o visto não poderá ser concedido:

Art. 10. Não se concederá visto:

I - a quem não preencher os requisitos para o tipo de visto pleiteado;

II - a quem comprovadamente ocultar condição impeditiva de concessão de visto ou de ingresso no País; ou

III - a menor de 18 (dezoito) anos desacompanhado ou sem autorização de viagem por escrito dos responsáveis legais ou de autoridade competente.

Para o estrangeiro que pretenda entrar no território nacional, existe uma variedade de vistos, cada um com os prazos e objetivo específico.

Uma das maiores mudanças trazidas pela Lei 13.445/2017 – Lei de Migração, é que esta busca garantir uma situação de igualdade entre imigrantes e brasileiros no que tange aos direitos fundamentais.

A Lei regula os direitos e os deveres do imigrante e do visitante e assim, a finalidade precípua passa a ser a proteção destes que são encarados como sujeitos de direitos.

Cabe aqui a definição de migrante e visitante, visto que estes possuem garantias diferentes nos termos legais.

O Visitante é a pessoa nacional de outro país ou apátrida que vem ao Brasil para estadas de curta duração, sem pretensão de se estabelecer temporária ou definitivamente no território nacional a este são garantidos somente os direitos constitucionais à vida, à liberdade, à segurança e à propriedade.

O Migrante é a pessoa que se desloca de país ou região geográfica ao território de outro país ou região geográfica, a este a lei trouxe um hall maior de garantias.

No texto legal repetem-se em grande parte, elementos previstos na Constituição Federal, como o texto constante no caput do artigo 5º, que traz garantia aos direitos à vida, liberdade, igualdade, segurança e propriedade.

Verifica-se, ainda, na Lei de Migração elementos de tratados e instrumentos internacionais como convenções da OIT – Organização Internacional do Trabalho: Convenção nº 97 de 1949, que trata sobre trabalhadores migrantes; Convenção nº 111 de 1958 que trata sobre discriminação em matéria de Emprego e Profissão; Convenção nº 118 de 1962 que trata de igualdade de tratamento entre nacionais e não-nacionais.

Ao imigrante são garantidos os direitos contidos no texto da Lei de migração, artigo 4º caput: “Ao migrante é garantida no território nacional, em condição de igualdade com os nacionais, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, bem como são assegurados”.

O direito à vida, é o direito maior, é o principal direito garantido a todas as pessoas, sem nenhuma distinção. Segundo Alexandre de Moraes “o direito à vida é o mais fundamental de todos os direitos, já que se constitui em pré-requisito à existência e exercício de todos os demais.

A vida é o maior bem existente, devendo ser interrompida apenas por causas naturais, restando proibido que uma pessoa tire a vida de outra. O direito à vida também é um direito à saúde, à alimentação, à educação, e todas as formas que garantam a dignidade da pessoa humana.

Por consequência, cabe ao Estado assegurar tais garantias, para que ao mesmo tempo, se garanta o próprio direito à vida.

O instituto do asilo, chamado de asilo político é uma das formas de admissão de estrangeiros no Brasil, sendo uma forma que detém grande importância como medida protetora de direitos individuais.

A concessão do asilo político[9] é um dos princípios regentes das relações internacionais da República Federativa do Brasil, com previsão constitucional no artigo 4, inciso X. Segundo José Francisco Rezek:

Asilo político é o acolhimento, pelo Estado, de estrangeiro perseguido alhures – geralmente, mas não necessariamente, em seu próprio país patrial – por causa de dissidência política, de delitos de opinião, ou por crimes que, relacionados com a segurança do Estado, não configuram quebra do direito penal comum.

Celso de Albuquerque Mello, meu saudoso professor da UFRJ, informou que “o asilo não está sujeito à reciprocidade e protege indivíduos independentemente de sua nacionalidade”.

O asilo político, que constitui ato discricionário do Estado, poderá ser diplomático ou territorial e será concedido como instrumento de proteção à pessoa que se encontre perseguida em um Estado por suas crenças, opiniões e filiação política ou por atos que possam ser considerados delitos políticos.

As vedações a concessão de asilo estão contidas no artigo 108 do decreto 9.199/2017, o qual determina que não será concedido asilo a quem tenha cometido crime de genocídio; crime contra a humanidade; crime de guerra; ou crime de agressão.

A competência para decidir sobre pedido de concessão ou revogação de concessão de asilo é do Presidente da República, que o faz em consulta ao Ministro de Estado das Relações Exteriores.

Ainda que em caso de decisão denegatória de asilo político ou revogação da concessão do asilo, não poderá ocorrer retirada compulsória do imigrante para território onde a vida e a integridade deste possam ser ameaçadas.

O solicitante de asilo[10] político fará jus à autorização provisória de residência, o qual permitirá o gozo de direitos no País, dentre os quais: a expedição de carteira de trabalho provisória; a inclusão no Cadastro de Pessoa Física; e a abertura de conta bancária em instituição financeira supervisionada pelo Banco Central do Brasil.

Durante o processo de concessão do asilo político o solicitante deve requerer autorização prévia ao Ministro das Relações Exteriores para saída do País, sob pena de arquivamento de sua solicitação.

É considerado renuncia ao asilo político, quando o asilado sai do país sem prévia comunicação ao Ministério das Relações Exteriores

É possível dividir o asilo político por dois aspectos: o territorial e o diplomático. Rezek diz que o asilo na forma territorial é o asilo na sua forma acabada, enquanto o asilo na sua forma diplomática é, de alguma forma, provisório.

O asilo político será territorial quando solicitado em qualquer ponto do território nacional, perante unidade da Polícia Federal ou representação regional do Ministério das Relações Exteriores. Segundo preceitua a Declaração Universal dos Direitos do Homem, no artigo XIV, “todo homem, vítima de perseguição, tem o direito de procurar e de gozar asilo em outros países”.

O asilo político, que constitui ato discricionário do Estado, podendo este conceder ou não pedido de Asilo formulado por imigrante. O a decreto nº 55.929, de 19 de abril de 1965 que promulgou a Convenção sobre Asilo Territorial, em seu artigo I traz que todo Estado tem direito, no exercício de sua soberania, de admitir dentro, de seu território as pessoas que julgar conveniente

O asilo tem por fito proteger a pessoa humana. Entretanto, ele é considerado direito do Estado, que, em decorrência disso, não tem a obrigação de aceitar o indivíduo requerente.

Segundo o Direito Internacional à jurisdição de cada Estado sobre os habitantes de seu território, ou sobre as pessoas que nele entram, procedentes de um Estado, onde sejam perseguidos por suas crenças, opiniões e filiação política ou por atos que possam ser considerados delitos políticos.

O Asilo Diplomático também é conhecido como asilo interno, político, internacional, intranacional ou extraterritorial, este é solicitado no exterior em legações, navios de guerra e acampamentos ou aeronaves militares brasileiras. Esta modalidade de asilo é reconhecida apenas pelos países latino-americanos.

O asilo diplomático consiste na proteção ofertada pelo Estado brasileiro e na condução do asilado até o território nacional, em consonância com o disposto na Convenção Internacional sobre Asilo Diplomático assinada em Caracas em 28 de março de 1954, e promulgada pelo Decreto no 42.628, de 13 de novembro de 1957.

Cabe o pedido de asilo diplomático pelas pessoas perseguidas por motivos ou delitos políticos, todo Estado tem o direito de conceder asilo, mas não é obrigado a concedê-lo, nem a declarar o motivo de negá-lo.

O Decreto 42.628 em seu artigo V traz os “requisitos” para a concessão do asilo, o mesmo só poderá ser concedido em casos de urgência e pelo tempo estritamente indispensável para que o asilado deixe o país com as garantias concedidas pelo governo do Estado territorial, a fim de não correr perigo de vida, de liberdade ou de sua integridade pessoal, ou para que de outra maneira o asilado seja colocado em segurança.

São entendidos como casos de urgência, entre outros, aqueles em que o indivíduo é perseguido por pessoa ou multidões que não possam ser contidas pelas autoridades, ou pelas próprias autoridades, bem como quando se encontre em perigo de ser privado de sua vida ou de sua liberdade por motivos de perseguição política e não possa, sem risco, pôr-se de outro modo em segurança. A competência de avaliação se o caso é ou não considerado de urgência é do Estado que receberá o asilado.

Toda a situação jurídica do apátrida é regulamentada tanto pela Lei de Migração, tanto pelo Decreto 4.246 de 22 de maio de 2002, o qual promulgou a Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas.

O Decreto nº 4.246/2002 foi feito com embasamento no que traz a Carta das Nações Unidas e a Declaração Universal de Direitos Humanos, aprovada em 10 de dezembro de 1948 pela Assembleia-Geral das Nações Unidas. Em tal documento afirma-se o princípio de que os seres humanos, sem discriminação alguma, devem gozar dos direitos e liberdades fundamentais.

As Nações Unidas manifestaram, em diversas ocasiões, o seu profundo interesse pelos apátridas e se esforçaram por assegurar-lhes o exercício mais amplo possível dos direitos e liberdades fundamentais. O Brasil, considerando que era desejável regular e melhorar a condição dos apátridas, trouxe em 2002 o Decreto nº 4.246, visto que o Estatuto dos Refugiados de 1951 compreendia apenas os apátridas que são também refugiados, e que existia muitos apátridas aos quais o referido Estatuto não se aplicava.

Ainda que com a promulgação da Lei de Migração no ano de 2017, a qual revogou inteiramente o Estatuto do Estrangeiro, o Decreto 4.246/2002 se mantém com total aplicabilidade aos apátridas.

Assim, a Lei de Migração, em seu artigo 1º, inciso VI, traz a definição da figura do apátrida como:

Quanto ao conceito de Apátrida é pessoa que não seja considerada como nacional por nenhum Estado, segundo a sua legislação, nos termos da Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas, de 1954, promulgada pelo Decreto nº 4.246, de 22 de maio de 2002, ou assim reconhecida pelo Estado brasileiro.

O Decreto 4.246/2002 também traz a definição da figura do apátrida em seu artigo 1 como: Para os efeitos da presente Convenção, o termo "apátrida" designará toda pessoa que não seja considerada seu nacional por nenhum Estado, conforme sua legislação.

Existem situações em que a convenção dos apátridas não poderá ser aplicada, como traz o item 2, do artigo I do Decreto 4.246/2002:

Esta Convenção não se aplicará:

i) às pessoas que recebam atualmente proteção ou assistência de um órgão ou agência das Nações Unidas diverso do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados, enquanto estiverem recebendo tal proteção ou assistência;

ii) às pessoas às quais as autoridades competentes do país no qual hajam fixado sua residência reconheçam os direitos e obrigações inerentes à posse da nacionalidade de tal país;

iii) às pessoas a respeito das quais haja razões fundadas para considerar:

a) que cometeram um delito contra a paz, um delito de guerra ou um delito contra a humanidade, definido nos termos dos instrumentos internacionais referentes aos mencionados delitos;

b) que cometeram um delito grave de índole não-política fora do país de sua residência, antes da sua admissão no referido país;

c) que são culpadas de atos contrários aos propósitos e princípios das Nações Unidas.

O Ingresso do apátrida dentro de um território obriga que este tenha o dever de acatar com as leis e decretos do país em que se encontra, em contrapartida o Estado contratante deverá realizar a aplicação das disposições legais pertinentes aos apátridas sem qualquer discriminação por religião, raça ou país de origem.

Quando do ingresso do apátrida no território brasileiro, o mesmo, como interessado, deverá requer, ao Ministério da Justiça e Segurança Pública, o reconhecimento da condição de apátrida, para que esse reconhecimento se faça será realizado um processo, o qual tem como objetivo verificar se o solicitante é considerado nacional pela legislação de algum Estado e poderá considerar informações, documentos e declarações prestadas pelo próprio solicitante e por órgãos e organismos nacionais e internacionais.

O artigo 26, § 3º da Lei de Migração traz que se aplicará ao apátrida residente todos os direitos atribuídos ao migrante relacionados no art. 4º da mesma lei, sendo:

Art. 4º. Ao migrante é garantida no território nacional, em condição de igualdade com os nacionais, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, bem como são assegurados:

I - direitos e liberdades civis, sociais, culturais e econômicos;

II - direito à liberdade de circulação em território nacional;

III - direito à reunião familiar do migrante com seu cônjuge ou companheiro e seus filhos, familiares e dependentes;

IV - medidas de proteção a vítimas e testemunhas de crimes e de violações de direitos;

V - direito de transferir recursos decorrentes de sua renda e economias pessoais a outro país, observada a legislação aplicável;

VI - direito de reunião para fins pacíficos;

VII - direito de associação, inclusive sindical, para fins lícitos;

VIII - acesso a serviços públicos de saúde e de assistência social e à previdência social, nos termos da lei, sem discriminação em razão da nacionalidade e da condição migratória;

IX - amplo acesso à justiça e à assistência jurídica integral gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos;

X - direito à educação pública, vedada a discriminação em razão da nacionalidade e da condição migratória;

XI - garantia de cumprimento de obrigações legais e contratuais trabalhistas e de aplicação das normas de proteção ao trabalhador, sem discriminação em razão da nacionalidade e da condição migratória;

XII - isenção das taxas de que trata esta Lei, mediante declaração de hipossuficiência econômica, na forma de regulamento;

XIII - direito de acesso à informação e garantia de confidencialidade quanto aos dados pessoais do migrante, nos termos da Lei no 12.527, de 18 de novembro de 2011;

XIV - direito a abertura de conta bancária;

XV - direito de sair, de permanecer e de reingressar em território nacional, mesmo enquanto pendente pedido de autorização de residência, de prorrogação de estada ou de transformação de visto em autorização de residência; e

XVI - direito do imigrante de ser informado sobre as garantias que lhe são asseguradas para fins de regularização migratória.

Após o reconhecimento da condição de apátrida serão a este assegurados os direitos e garantias reconhecidos no Brasil e os elencados na Convenção sobre o Estatuto dos Apátridas – Decreto 4.246/2002.

Quanto aos direitos contidos no Decreto 4.246/2002, cabe esclarecer que alguns deles serão aplicados nas mesmas circunstâncias que a todos os estrangeiros e outros desses direitos serão garantidos de forma mais ampla, sendo aplicados nas mesmas condições que os nacionais brasileiros.

Quanto as garantias legais trazidas pelo Decreto 4.246/2002:

O Direito à Propriedade Móvel e Imóvel ao apátrida, está garantido no Artigo 13, o qual estabelece que o Estado Contratante dê tratamento tão favorável quanto aquele concedido aos estrangeiros em geral, no que diz respeito à aquisição da propriedade móvel ou imóvel e aos direitos a elas relativos, ao aluguel e a outros contratos relativos à propriedade móvel e imóvel.

No artigo 14 consta a garantia ao direito de Propriedade Intelectual e Industrial ao apátrida, sendo considerados objeto de proteção as invenções, desenhos, modelos, marcas de fábrica, nome comercial e ainda a propriedade literária, artística e científica. O Apátrida gozará da mesma proteção dada aos nacionais.

É garantido ao apátrida, no artigo 15, o direito de Associação sem fim político ou lucrativo e aos sindicatos profissionais, nas mesmas circunstâncias que garantido aos estrangeiros em geral.

O apátrida gozará de livre e fácil acesso aos tribunais, quando no Estado em que possui residência habitual deterá os mesmos direitos que um nacional. Conforme determina o artigo 16 do decreto.

O artigo 17 garante o direito ao apátrida de exercer Profissões Assalariadas, no qual o Estado Contratante deverá garantir a este as mesmas condições que impostas aos estrangeiros em geral. E quando da entrada do apátrida no território em virtude de um programa de recrutamento de mão-de-obra ou de um plano de imigração, o Estado deverá assimilar os direitos dos apátridas aos dos nacionais.

Os apátridas detêm ainda o direito ao exercício de uma profissão não assalariada, conforme previsto o artigo 18. Fica garantido ao apátrida, as mesmas circunstâncias, que aos estrangeiros em geral, no que se reporta ao exercício de uma profissão não-assalariada na agricultura, na indústria, no artesanato e no comércio, bem como quanto ao estabelecimento de firmas comerciais e industriais.

Ainda quanto ao exercício profissional, o artigo 19 traz as disposições quanto as profissões Liberais, pelo qual o Estado Contratante deve garantir aos apátridas que residam regularmente no seu território, portadores de diplomas reconhecidos pelas autoridades competentes do referido Estado e que desejem exercer uma profissão liberal, um tratamento tão favorável quanto o aplicado aos estrangeiros em geral.

Segundo o artigo 20 do citado Decreto, na hipótese de existir um sistema de racionamento ao qual esteja sujeita a população como um todo, e que regulamente a partilha geral de produtos de que há escassez, os apátridas serão tratados como os nacionais.

Quando ao Direito de Habitação, o artigo 21 traz que os Estados Contratantes, concederão aos apátridas que residam regularmente no seu território um tratamento tão favorável quanto possível, e, em todo caso, não menos favorável que aquele concedido aos estrangeiros em geral.

O artigo 22 regulamenta o Direito à Instrução Pública, que no tocante ao ensino primário o apátrida tem o mesmo tratamento dispensado aos nacionais e em se tratando de ensino médio, no que se refere ao acesso aos estudos, ao reconhecimento de certificados de estudos, de diplomas e de títulos universitários expedidos no estrangeiro, a isenção de direitos e taxas e a concessão de bolsas de estudos, o apátrida tem o mesmo tratamento dispensado aos estrangeiros em geral.

O Artigo 23 que trata da Assistência Pública, determina que o Estado Contratante outorgará aos apátridas que residam regularmente no seu território o mesmo tratamento que aquele concedido aos seus nacionais em matéria de assistência e de socorros públicos.

A aplicação da Legislação do Trabalho e Previdência Social para o apátrida é tratada no artigo 24 do decreto. Tal artigo determina que os Estados Contratantes conferirão aos apátridas que residem regularmente no seu território o mesmo tratamento que aquele facultado aos nacionais no que diz respeito a remuneração, inclusive adicionais de família quando estes adicionais fizerem parte da remuneração, a duração do trabalho, as horas suplementares, as férias pagas, as restrições ao trabalho doméstico, a idade de admissão no emprego, o aprendizado e a formação profissional, o trabalho das mulheres e dos adolescentes e o gozo das vantagens oferecidas pelas convenções coletivas.

Determina ainda o direito do apátrida à previdência social, onde as disposições legais relativas aos acidentes do trabalho, às moléstias profissionais, à maternidade, à doença, à invalidez, à velhice e à morte, ao desemprego, aos encargos de família, bem como a qualquer outro risco que, conforme a legislação nacional, seja coberto por um sistema de previdência social.

O artigo traz ainda o direito a uma indenização pela morte de um apátrida ocorrida em virtude de acidente do trabalho ou de doença profissional, o que não será afetado pelo fato de o beneficiário residir fora do território do Estado Contratante.

A Lei determina, ainda, que os Estados Contratantes examinem com benevolência a possibilidade de estender aos apátridas o benefício de acordos semelhantes que estão ou vierem a estar em vigor entre esses Estados Contratantes e Estados não-contratantes.

O Direito a Assistência Administrativa é tratada pelo artigo 25, o qual determina que quando o exercício de um direito por um apátrida exigir assistência de autoridades estrangeiras, às quais não possa recorrer, os Estados Contratantes em cujo território ele residir providenciarão para que essa assistência lhe seja prestada por suas próprias autoridades. Tais autoridades expedirão ou farão expedir, em favor dos apátridas, os documentos ou certificados que seriam expedidos pelas autoridades estrangeiro estrangeiras.

O artigo 26 nos traz o Direito a Liberdade de Movimento, que determina que todo Estado Contratante concederá aos apátridas que se encontrem regularmente no seu território o direito de escolher o local de sua residência e de circular livremente, com as restrições instituídas aos estrangeiros em geral.

Pelo artigo 27, os Estados Contratantes expedirão documentos de identidade a todo apátrida que se encontre no seu território e que não tenha documento de viagem válido.

Os Documentos de Viagem são tratados no artigo 28 do decreto, pelo qual os Estados Contratantes expedirão aos apátridas que residam regularmente no seu território documentos de viagem destinados a permitir-lhes viajar fora desse território, a menos que a tanto se oponham razões imperiosas de segurança nacional ou de ordem pública.

O texto do artigo 29 define que os Estados Contratantes não sujeitarão os apátridas a direitos, taxas, impostos, ou qualquer outra denominação, mais elevados que ou diferentes dos que são ou serão cobrados dos seus nacionais em situações análogas. As disposições deste artigo não se opõem à aplicação de taxas relativas à expedição de documentos administrativos aos estrangeiros, inclusive papéis de identidade.

O artigo 30, traz o último direito contido no Decreto 4.246/2002, do qual se trata da transferência de Bens, o qual traz que todo Estado Contratante, permitirá aos apátridas transferir para outro país, no qual foram admitidos a fim de se reinstalarem, os bens que houverem levado para o território daquele Estado.

Ainda, o Estado Contratante considerará com benevolência os pedidos apresentados pelos apátridas que desejarem obter a autorização de transferir todos os outros bens necessários à sua reinstalação em outro país onde foram admitidos a fim de ali se reinstalar.

Nota-se vastos os direitos aplicáveis aos apátridas, considerando-se todo o hall da de Migração e Decreto 4.246/2002, pode-se verificar que a ideia de acolhimento do apátrida pelo Estado Contratante é enorme, e em diversas situações jurídicas este detém aplicação de direitos de forma equiparada a aplicação dos mesmo perante os nacionais do Estado. Isso demonstra ainda mais toda a mudança forma de se ver o estrangeiro, fazendo-se o máximo para que este se instale na sociedade que o acolhe e garante sua vida digna.

Refugiados são pessoas que estão fora de seu país de origem devido a fundados temores de perseguição relacionados a questões de raça, religião, nacionalidade, pertencimento a um determinado grupo social ou opinião política, como também devido à grave e generalizada violação de direitos humanos e conflitos armados.

É complexa e sofrida situação dos refugiados, é um fenômeno real desde os primórdios da existência do homem. Povoações inteiras se veem sem outra opção a não ser fugir de sua terra, de sua pátria, pois estão sendo perseguidos por diversos motivos de raça, política, grupo social, religião, nacionalidade, etc., tal fato provoca um grande movimento migratório em todos os continentes.

Apesar de todos os avanços da humanidade em diversas áreas, nota-se cada vez mais presente a intolerância entre os povos, a ganância dos governos, a subjugação entre as nações, os conflitos insolúveis.

Vivemos um momento que produzem uma migração intensa, povos que se veem obrigados a buscar outro país para garantir abrigo e proteção de suas famílias, no final de 2016, a população global de refugiados atingiu a marca de 22,5 milhões de pessoas, nível mais alto registrado em duas décadas.

A Síria foi o país que mais gerou refugiados no mundo. Cerca de 824.400 pessoas foram forçadas a fugir dos conflitos que assolam o país. As crises na África subsaariana também levaram a novos deslocamentos.

Quase 737.400 pessoas deixaram o Sudão do Sul para escapar de uma crise humanitária que cresceu consideravelmente em 2016. Burundi, Iraque, Nigéria e Eritréia também geraram grande número de refugiados. Esse fenômeno de grande migração resulta num contingente enorme de refugiados, problema este que antigamente atingia outros países, hoje está à porta do Brasil.

No final de 2016, cerca de 2,8 milhões de solicitantes de refúgio aguardavam uma decisão que poderia mudar suas vidas, são pessoas que solicitam às autoridades competentes serem reconhecidas como refugiado, mas que ainda não tiveram seus pedidos avaliados definitivamente pelos sistemas nacionais de proteção e refúgio.

O documento internacional que rege o tema é a Convenção das Nações Unidas sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, ratificada pelo Brasil. Diante da problemática, o Brasil criou legislação própria para adequar, regulamentar e regularizar a situação desses refugiados, assim, somente em 1997 a citada convenção foi implementada de fato em nosso país com a edição da Lei nº 9.474/97.

Dados da ACNUR – Agência da ONU para refugiados trazem a visão de quão numerosos sem tornaram os refugiados no território brasileiro. Segundo dados divulgados no relatório “Refúgio em Números”, o Brasil reconheceu, até o final de 2016, um total de 9.552 refugiados de 82 (oitenta e dois) nacionalidades.

Dos 9.552 refugiados historicamente reconhecidos pelo Brasil, 8.522 foram reconhecidos por vias tradicionais de elegibilidade, 713 chegaram ao Brasil por meio de reassentamento e a 317 foram estendidos os efeitos da condição de refugiado de algum familiar. Dentre esses números os países com maior quantidade de refugiados reconhecidos no Brasil em 2016 foram Síria (326), República Democrática do Congo (189), Paquistão (98), Palestina (57) e Angola (26). De acordo com o relatório, apenas em 2016, 3.375 venezuelanos solicitaram refúgio no Brasil, cerca de 33% das solicitações registradas no país naquele ano.

Os números por si só demonstram o tamanho da importância do direito internacional, a importância da proteção ao estrangeiro e ao refugiado, atualmente testemunha-se os maiores níveis de deslocamento já registrados, onde quase 20 pessoas são deslocadas a força a cada minuto em decorrência de conflitos ou perseguições.

Cerca de 65,6 milhões de pessoas em todo o mundo foram forçadas a sair de casa, entre elas estão quase 22,5 milhões de refugiados, mais de metade dos quais são menores de 18 anos.

Há também cerca de 10 (dez) milhões de pessoas apátridas às quais foram negadas a nacionalidade e o acesso a direitos básicos como educação, saúde, emprego e liberdade de circulação.

É de suma importância a realização da definição do termo “refugiado”, pois comumente acontece uma confusão entre o instituto do asilo e do refúgio. O instituto do refúgio detém mais amplitude em comparação com o asilo, abarcando diversas situações em que pode ser solicitado no momento em que um indivíduo busca proteção e somente outro Estado pode responder a este pedido.

O termo “refugiado” é uma expressão usada de forma frequente e generalizada, e sem uma distinção clara entre pessoas que se deslocam dentro de sua própria pátria e pessoas que foram obrigadas a sair de seu país, e ainda não se pondera aos motivos que ensejaram essa a fuga, seja por perseguição religiosa, violência política, catástrofes ambientais ou pobreza.

Em 1951, quando foi aprovada a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados, que se definiu claramente quem poderia ser considerada pessoa refugiada e, assim, possuía o direito de proteção internacional.

 Em seu artigo 1º, a Convenção definiu o termo refugiado como sendo toda a pessoa que se encontra fora de seu país por temores de perseguição por diversas situações, entre elas raça, religião, nacionalidade, vinculado ao grupo social ou político, impossibilitando seu retorno:

Art. 1. Para os fins da presente Convenção, o termo "refugiado" se aplicará a qualquer pessoa:

c) Que, em consequência dos acontecimentos ocorridos antes de 1º de janeiro de 1951 e temendo ser perseguida por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas, se encontra fora do país de sua nacionalidade e que não pode ou, em virtude desse temor, não quer valer-se da proteção desse país, ou que, se não tem nacionalidade e se encontra fora do país no qual tinha sua residência habitual em consequência de tais acontecimentos, não pode ou, devido ao referido temor, não quer voltar a ele.

A Convenção apresenta dois problemas que impediam que o refugiado fosse amplamente beneficiado de proteção: a limitação temporal, editada logo após o fim da segunda guerra mundial[11] e a geográfica, que beneficiava apenas os europeus.

O instituto de refúgio e a figura do refugiado são tratados não somente pela Lei de Migração e pelo Decreto 9.445/17, mas também pela Lei nº 9.474, de 22 de julho de 1997, a qual define mecanismos para a implementação do Estatuto dos Refugiados de 1951, e determina outras providências, além é claro o próprio estatuto dos Refugiados.

O conceito mais recente de Refugiado se encontra na Lei 9.474/97, no artigo 1º traz:

Art. 1º Será reconhecido como refugiado todo indivíduo que:

I - devido a fundados temores de perseguição por motivos de raça, religião, nacionalidade, grupo social ou opiniões políticas encontre-se fora de seu país de nacionalidade e não possa ou não queira acolher-se à proteção de tal país;

II - não tendo nacionalidade e estando fora do país onde antes teve sua residência habitual, não possa ou não queira regressar a ele, em função das circunstâncias descritas no inciso anterior;

III - devido a grave e generalizada violação de direitos humanos, é obrigado a deixar seu país de nacionalidade para buscar refúgio em outro país.”

Os efeitos do refúgio são extensivos, conforme determina a Lei, trazendo que os efeitos da condição dos refugiados serão extensivos ao cônjuge, aos ascendentes e descendentes, assim como aos demais membros do grupo familiar que do refugiado dependerem economicamente, desde que se encontre em território nacional.

O artigo 3º da Lei 9.474/97 traz as situações em que não será possível a concessão da condição de refugiado:

Art. 3º Não se beneficiarão da condição de refugiado os indivíduos que:

I - já desfrutem de proteção ou assistência por parte de organismo ou instituição das Nações Unidas que não o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados - ACNUR;

II - sejam residentes no território nacional e tenham direitos e obrigações relacionados com a condição de nacional brasileiro;

III - tenham cometido crime contra a paz, crime de guerra, crime contra a humanidade, crime hediondo, participado de atos terroristas ou tráfico de drogas;

IV - sejam considerados culpados de atos contrários aos fins e princípios das Nações Unidas.

Reconhecidamente, o Brasil está entre os países que detém legislação mais completa para atender e abrigar as necessidades dos refugiados. Isto, no entanto, não significa que o refugiado no Brasil está devidamente amparado e protegido pelas políticas públicas e sociais e até que ponto os organismos não governamentais tem condições de atendê-lo satisfatoriamente.

A respeito do CONARE – COMITÊ NACIONAL PARA OS REFUGIADOS com a promulgação da Lei 9474/97 surgiu como órgão oficial do governo, sediado em Brasília/DF e vinculado ao Ministério da Justiça, o CONARE – Comitê Nacional Para os Refugiados. O artigo 11 da citada lei traz que o comitê tem como responsabilidade e atribuição, a coordenação da proteção, assistência, integração local e apoio jurídico aos refugiados no Brasil, bem como a análise dos pedidos de reconhecimento do status de refugiado, conforme o disposto no art. 12:

Art. 12. Compete ao CONARE, em consonância com a Convenção sobre o Estatuto dos Refugiados de 1951, com o Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados de 1967 e com as demais fontes de direito internacional dos refugiados:

I - analisar o pedido e declarar o reconhecimento, em primeira instância, da condição de refugiado;

II - decidir a cessação, em primeira instância, ex officio ou mediante requerimento das autoridades competentes, da condição de refugiado;

III - determinar a perda, em primeira instância, da condição de refugiado;

IV - orientar e coordenar as ações necessárias à eficácia da proteção, assistência e apoio jurídico aos refugiados;

V - aprovar instruções normativas esclarecedoras à execução desta Lei.

Importante ressaltar, em se tratando de suas competências, que entre as muitas de suas atividades, o CONARE tem autonomia para expedir resoluções e normativas com o intuito de regulamentar questões práticas em relação aos refugiados, como ocorre com a Resolução Normativa 1, que contém em seu anexo um termo de declaração, a ser preenchido pelo refugiado quando de sua solicitação de refúgio, servindo inclusive para reconhecer ou negar a condição de refugiado do solicitante.

Jubilut pontua dois aspectos na questão da composição do CONARE, a saber:

O primeiro relaciona-se à presença de numa entidade da sociedade civil que trabalha com refugiados (a Cáritas) no órgão que trata da elegibilidade dos solicitantes de refúgio, fato este que segundo ponto se refere ao fato de que não encontra paralelo em outros Estados da América do Sul.

O segundo ponto se refere ao fato de que, ao contrário do que acontece na maioria dos Estados da América do Sul, não há no CONARE representante oficial do órgão nacional encarregado de decisões sobre migração, mesmo sendo o representante do Ministério do Trabalho, membro e até presidente do Conselho Nacional de Imigração (CNI) e oferecendo todo o apoio e trabalhando de forma integrada com o CONARE, como denota a possibilidade de aquisição de permanência do refugiado após ter residido no Brasil com tal status por 6 (seis) anos.

Quanto à composição do CONARE, este está difundido a temática para todos os órgãos governamentais que terão, reflexo na vida do refugiado. Isto envolve vários ministérios do governo federal para atendimento pleno às necessidades dos refugiados. O artigo 14 da lei 9.474/97 traz a composição do CONARE:

Art. 14. O CONARE será constituído por:

I - um representante do Ministério da Justiça, que o presidirá;

II - um representante do Ministério das Relações Exteriores;

III - um representante do Ministério do Trabalho;

IV - um representante do Ministério da Saúde;

V - um representante do Ministério da Educação e do Desporto;

VI - um representante do Departamento de Polícia Federal;

VII - um representante de organização não-governamental, que se dedique a atividades de assistência e proteção de refugiados no País.

Os membros do CONARE serão designados pelo Presidente da República, mediante indicações dos órgãos e da entidade que o compõem. E a lei estabeleceu ainda que as reuniões deverão ter o quórum mínimo de quatro membros com direito a voto, deliberando com maioria simples. Em caso de empate, será considerado o voto decisivo da presidência, conforme o art. 16.

O CONARE detém caráter humanitário em suas decisões, tanto quando recebe ou avalia as solicitações feitas para a obtenção de refúgio, ou ainda, quando surgem dúvidas em relação ao pedido, de todas as formas o órgão deve tomar suas decisões de forma que não prejudique o solicitante, objetivando uma solução que o favoreça. Segundo Leão:

O Comitê aplica o princípio do in dubio pro réu pelo seu caráter humanitário. Quando existir alguma questão pontual relativa a um caso específico, sob a alçada da CONARE, capaz de gerar dúvidas na sua tomada de decisão, o desfecho do caso dar-se-á fulcrado no fato de que, ante a dúvida, a decisão do comitê poderá ser favorável ao solicitante do refúgio.

As decisões do CONARE são fundamentadas pelas leis nacionais e internacionais que protegem a dignidade da pessoa humana, conforme explica Koeke a seguir:

Toda e qualquer decisão proferida pelo CONARE deve ser fundamentada na Constituição Federal, na Lei nº 9474/97, na Convenção relativa ao Estatuto do dos Refugiados, de 1951, no Protocolo sobre o Estatuto dos Refugiados, de 1967, ainda fundado nas demais fontes de Direito Internacional dos Direitos Humanos, como por exemplo a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 (determinação está contida no artigo 48 da Lei 9474/1997)

A respeito da solicitação de refúgio que poderá ser solicitado por qualquer estrangeiro que chegue ao território nacional e que se considere vítima de perseguição em seu país de origem, este deverá procurar, a qualquer momento após a sua chegada ao território nacional, qualquer Delegacia da Polícia Federal ou autoridade migratória na fronteira e solicitar formalmente a proteção do governo brasileiro. A lei traz vedação ao pedido de refúgio, trazendo que o mesmo não poderá ser invocado por refugiado considerado perigoso para a segurança do Brasil.

O pedido de reconhecimento da condição de refugiado será encaminhado ao CONARE, o qual realizará uma análise do mesmo e decidirá pelo reconhecimento ou não do refúgio. Para assegurar que os pedidos protocolados tenham fundamento, o CONARE realiza pesquisas por meio de imprensa, internet e consulta às organizações internacionais, essas instituições enviam relatórios ao comitê brasileiro o resultado sobre suas pesquisas que embasem o processo.

Recebida a solicitação de refúgio, o Departamento de Polícia Federal realizará a emissão de um protocolo em favor do solicitante e de seu grupo familiar que se encontre no território nacional, o qual autorizará a estada até a decisão final do processo. Tal protocolo permite que o Ministério do Trabalho expeça carteira de trabalho provisória para que o refugiado possa realizar exercício de atividade remunerada no país.

Enquanto estiver pendente o processo relativo à solicitação de refúgio, ao estrangeiro será aplicável a legislação sobre estrangeiros, respeitadas as disposições específicas contidas nesta Lei e o solicitante recebe um protocolo que lhe garante estabilidade no país, permitindo inclusive o exercício legal e regular de contrato de trabalho.

Nos termos da lei a decisão pelo reconhecimento da condição de refugiado será considerada ato declaratório e deverá estar devidamente fundamentada, sendo concedido o refúgio, o refugiado será registrado junto ao Departamento de Polícia Federal, devendo assinar termo de responsabilidade e solicitar cédula de identidade pertinente e os direitos garantidos ao refugiado se estendem a cônjuges, filhos, pais e outros integrantes da família que dependam economicamente deste refugiado.

Caberá recurso ao ministério de Estado da Justiça, no prazo de 15 (quinze) dias, contra a decisão negativa de pedido de reconhecimento da situação de refugiado, durante a avaliação do recurso, a lei determina que será permitido ao solicitante de refúgio e aos seus familiares permanecer no território nacional.

Da decisão negativa do Ministro de Estado da Justiça não será passível de recurso, assim havendo a recusa definitiva de refúgio, ficará o solicitante sujeito à legislação de estrangeiros, não devendo ocorrer sua transferência para o seu país de nacionalidade ou de residência habitual, enquanto permanecerem as circunstâncias que põem em risco sua vida, integridade física e liberdade, salvo nas situações determinadas em Lei.

Os direitos e deveres dos solicitantes de refúgio e refugiados residentes no Brasil Alguns direitos são garantidos ao solicitante do refúgio no Brasil, assim sendo a partir do momento em que o refugiado solicita o status dessa condição, automaticamente o Estado lhe garante alguns direitos básicos referentes a dignidade e os direitos humanos. No CONARE estão elencados alguns desses direitos, referentes aos direitos dos solicitantes provisórios e dos permanentes:

- Ter acesso ao procedimento legal de solicitação de refúgio, gratuitamente e sem necessidade de advogado; Não ser devolvido para seu país de origem ou para onde sua vida possa estar em risco;

- Não ser devolvido para seu país de origem ou para onde sua vida possa estar em risco;

- Não ser discriminado pelas autoridades governamentais e pela sociedade;

- Não ser punido por entrada irregular no país;

- Receber a documentação provisória assegurada pela legislação: Protocolo Provisório, Cadastro de Pessoa Física (CPF) e Carteira de Trabalho;

- Ter os mesmos direitos e a mesma assistência básica de qualquer outro estrangeiro que resida legalmente no país. Entre os direitos civis básicos estão a liberdade de pensamento, de deslocamento e de não ser submetido à tortura e a tratamentos cruéis e degradantes. Já entre os direitos econômicos, sociais e culturais estão o acesso aos serviços de saúde pública e educação, direito ao trabalho e à liberdade de culto.

A legislação brasileira assegura aos refugiados residentes direitos que visam a sua segurança e estabilidade, sendo:

- Solicitar, por meio da reunião familiar, a extensão da condição de refugiado para parentes (cônjuges, ascendentes e descendentes) e demais componentes do grupo familiar que se encontrem no território nacional, conforme estabelece a Lei 9.474 e a Resolução Normativa n. 4 do CONARE;

- Receber toda a documentação assegurada pela legislação: Registro Nacional de Estrangeiros (RNE), Cadastro de Pessoa Física (CPF), Carteira de Trabalho e passaporte para estrangeiro – no caso de viagens previamente autorizadas pelo CONARE;

- Requerer a permanência após ter vivido quatro anos no país na condição de refugiado;

- Solicitar a permanência no Brasil em razão de ter cônjuge ou filho brasileiro;

- Reivindicar o acesso a procedimentos facilitados para o reconhecimento de certificados e diplomas.

A legislação brasileira determina de forma clara quais são os deveres dos solicitantes de refúgio refugiados residentes no Brasil, quais sejam:

- Respeitar a Constituição Federal e as leis brasileiras, como todos os brasileiros e estrangeiros residentes no país. Qualquer crime ou infração cometida terá o mesmo tratamento legal dado aos cidadãos brasileiros;

- Observar especialmente as leis específicas de proteção das crianças, dos adolescentes e da mulher;

- Não exercer atividades de natureza política, nos termos do artigo 107 da Lei 6.815/80;

- Informar a Polícia Federal e o CONARE, no prazo de 30 dias, qualquer mudança de endereço;

- Manter sua documentação atualizada.

E ainda, a legislação traz deveres específicos para os refugiados residentes no Brasil, visto que estes possuem permanência fixa em território brasileiro, sendo:

- Não sair do território nacional sem autorização prévia e expressa do CONARE, sob pena de perder a condição de refugiado;

- Não praticar atos contrários à segurança nacional ou à ordem pública, sob pena de perder a condição de refugiado.

Percebe-se por tais textos legais, a dimensão do papel do CONARE, e o quanto esse papel é de importante para que sejam preservadas as garantias constituídas dos refugiados bem como o cumprimento das obrigatoriedades impostas aos mesmos, visando ao bem-estar pessoal e social do indivíduo.

Atualmente, poucas instituições no país têm práticas específicas para refugiados: a Universidade Federal de São Carlos (UFSCAR) que garante um vestibular diferenciado, a Universidade de Juiz de Fora, que admite em caráter especial e a Universidade de Santos (UNISANTOS) que se insere no marco da Cátedra Sérgio Vieira de Mello (CSVM), desde 2003 e concede bolsas de estudo integrais para refugiados.

Com uma educação como base, cabe ao refugiado ir à busca do trabalho, quanto a este deveria haver igualdade de direito entre o nacional e o migrante, independentemente deste deter ou não documentação, pois independentemente da nacionalidade todo ser humano possui as mesmas necessidades básicas para sobreviver.

O acesso às vagas no mercado de trabalho, participação em projetos de apoio e assistência aos refugiados e suas famílias, impede o trabalho escravo e ilegal, no qual imigrantes têm sido alvo de tratamento subumano.

Além disso, deveriam oferecer oportunidades que possibilitassem a comprovação de experiências profissionais anteriores, com programas de estágio, treinamento e capacitação.

Tanto o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) têm oferecido cursos profissionalizantes apenas para os refugiados.

Um grande desafio no Brasil para os brasileiros é a garantia ao direito à moradia, tal problema se estende aos refugiados, atualmente o país possui um grande déficit habitacional.

Segundo a doutrina de Silva e Rodrigues, uma das alternativas seria o microcrédito para aquisição de material de construção, lotes ou moradias, o que seria um projeto de autofinanciamento de longo prazo, podendo apresentar bons resultados no decorrer do tempo, ou até mesmo construções ecológicas por terem um custo mais baixo e assim oferecer sua fixação em um determinado local.

De modo geral, o estrangeiro recém-chegado não tem acesso ao crédito, contudo, o ACNUR tem uma parceria com agências de microcrédito que oferecem este benefício aos refugiados.

A enorme preocupação com os direitos econômicos e sociais dos refugiados se estendeu ao nível dos governos desenvolverem novas iniciativas para melhorar a proteção dos refugiados por meio da integração. Uma dessas iniciativas foi a criação de Comitês Estaduais para Refugiados, nos Estados de São Paulo e Rio de Janeiro, com a instalação dos centros de proteção mais importantes do país.

As iniciativas de integração e de políticas públicas para refugiados no Brasil estão baseadas em três situações. Em primeiro momento, o Brasil nos últimos anos começou-se a preocupação quanto ao desenvolvimento e os direitos econômicos e sociais de sua população, se estendendo aos refugiados.

Em segundo lugar, o ACNUR iniciou trabalhos com uma proteção dos direitos dos refugiados em contextos urbanos, e ainda destacando a necessidade de integração e proteção de refugiados.

Por último, o foco na integração de refugiados tem sido um dos eixos do Plano de Ação do México sob o Programa Integral “Fronteiras Solidárias”, o objetivo principal dessa iniciativa é promover o acesso a serviços básicos de saúde, educação, emprego e moradia, por meio de políticas públicas.

É importante ressaltar que os Comitês Estaduais para Refugiados, funcionam como um estimulante para a criação de políticas públicas que ajudam a assegurar a proteção completa dos refugiados no Brasil, garantindo seus direitos civis, políticos, econômicos e sociais.

O Estado não é obrigado a admitir estrangeiros em seu território, contudo, uma vez que os aceitou deve conceder-lhes um mínimo de direitos, no que tange à segurança de suas pessoas e propriedades.

Deste modo, é dever do Estado garantir-lhes certos direitos inerentes à sua qualidade de pessoa humana, como direito à vida, à liberdade, à segurança, à integridade física etc.

Assim, o art. 95 do Estatuto do Estrangeiro estabelece que “o estrangeiro residente no Brasil goza de todos os direitos reconhecidos aos brasileiros, nos termos da Constituição e leis”.

Entretanto, os direitos concedidos aos estrangeiros no Brasil não são absolutos. Vale dizer que um estrangeiro tem direito à liberdade, porém, não significa isentá-lo de eventual prisão, por motivo de crime. Da mesma maneira que o direito de crença o livre do exercício dos cultos religiosos, encontra-se limitado pelas regras do direito de vizinhança, ordem pública e bons costumes.

São três os institutos que possibilitam a retirada forçada do estrangeiro do Brasil, quais sejam: a deportação, expulsão e extradição.

A Deportação é entre as formas de retirada forçada do estrangeiro do Brasil, temos a deportação, regulada nos artigos 57 a 64 e 98 e 99, da Lei 6815/1980 – Estatuto do Estrangeiro (BRASIL-D, 2014)

A deportação consiste na saída forçada do estrangeiro do território nacional, fundamentada no fato de o estrangeiro entrar ou permanecer irregularmente no Brasil (MAZZUOLI, 2010).

Esta não decorre da prática de delito em qualquer Estado, mas sim do não cumprimento dos requisitos para entrada ou permanência no território, quando o estrangeiro não se retirar voluntariamente no prazo determinado (SILVA, 2010).

Neste mesmo sentido Mazzuoli (2010) discorre: “A causa da deportação é o não cumprimento dos requisitos necessários para o ingresso regular ou para a sua permanência no país. Trata-se, portanto, de causa estranha à prática de crime. A prática de delito pode ser motivo para expulsão ou para a extradição de estrangeiros no território nacional, em nada se assemelhando à prática de conduta ilícita”.

A permanência irregular no país quase sempre se dá por excesso de prazo, ou pelo exercício de trabalho remunerado pelos turistas. No Brasil, o Departamento de Polícia Federal é quem tem a competência para deportar os estrangeiros com entrada ou permanência irregular, sem envolvimento do executivo e independente de qualquer processo judicial (MAZZUOLI, 2010).

A deportação tem efeitos imediatos, uma vez verificada a causa que a legitimou, contudo, conforme dispõe o art. 57, caput, da Lei 6815/80, ela somente poderá ser efetivada se o estrangeiro não se retirar voluntariamente do país no prazo que lhe foi concedido, após ter sido notificado para tanto. Esgotado tal prazo deve o Departamento da Polícia Federal proceder à imediata deportação do estrangeiro, para o país de sua nacionalidade ou de sua procedência (MAZZUOLI, 2010).

Nada impede que o deportado retorne ao nosso país desde que com sua documentação regularizada, já que a medida não é punitiva, mas apenas administrativa (MAZZUOLI, 2010,).

A deportação sempre é feita individualmente, não se admitindo a deportação coletiva de pessoas ou grupos (MAZZUOLI, 2010, p. 666).

É vedada a deportação de estrangeiro se esta medida implicar em extradição não admitida pela lei brasileira, segundo art. 63 do Estatuto do Estrangeiro (MAZZUOLI, 2010).

Finalmente, cabe salientar que, eventual habeas corpus a ser impetrado contra o ato de deportação, será de competência da Justiça Federal de primeira instância, nos termos do art. 109, VII, da CF/88, salvo se caracterizar extradição indireta, quando a competência será do STF (LENZA, 2010).

A expulsão é medida repressiva por meio da qual um estrangeiro é retirado do território de um Estado, por que ofendeu e violou as regras de conduta ou as leis locais, praticando atos contrários à segurança e à tranquilidade do país, ainda que tenha adentrado de forma regular no país (MAZZUOLI, 2010).

Dispõe o art. 65 da Lei 6.815/80: “Art. 65. É passível de expulsão o estrangeiro que, de qualquer forma, atentar contra a segurança nacional, a ordem política ou social, a tranquilidade ou moralidade pública e a economia popular, ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais.

Parágrafo único. É passível, também, de expulsão o estrangeiro que:

a) praticar fraude a fim de obter a sua entrada ou permanência no Brasil;

b) havendo entrado no território nacional com infração à lei, dele não se retirar no prazo que lhe for determinado para fazê-lo, não sendo aconselhável a deportação;

c) entregar-se à vadiagem ou à mendicância; ou

d) desrespeitar proibição especialmente prevista em lei para estrangeiro.”

Diferente da extradição, que se funda na prática de delito fora do território nacional, a expulsão dar-se-á quando o delito ou infração for cometido dentro do território nacional, caracterizando-se como verdadeiro instrumento coativo de retirada do estrangeiro do território, dispensando-se a provocação de autoridade estrangeira para tanto, ao contrário do que acontece na extradição (LENZA, 2013).

A expulsão não é pena em sentido criminal, uma vez que o legislador não incluiu no elenco das medidas jurídico-penais, é medida político-administrativa inerente ao poder de polícia do Estado, sem intervenção do Judiciário no tocante ao mérito da decisão (MAZZUOLI, 2010).

É ato discricionário do governo, uma vez que este está condicionado às hipóteses previstas em lei, sendo seu ato irrestrito somente no que tange à conveniência e oportunidade da medida, não estando o Presidente da República obrigado a procedê-la, mesmo nos casos em que todos os requisitos necessários à sua realização se encontrem presentes (MAZZUOLI, 2010).

O estrangeiro expulso é encaminhado para qualquer país que o aceite, ainda que somente seu Estado pátrio tenha o dever de recebê-lo quando este não tiver sido aceito para onde foi anteriormente enviado (MAZZUOLI, 2010).

Sendo o estrangeiro heimatlos, o Estado deve encaminhá-lo para o país da nacionalidade perdida, podendo encaminhá-lo também para o país de onde anteriormente emanou, estando proibido o Estado de mandá-lo para terceiro Estado onde esteja esse estrangeiro sendo procurado pela prática de algum crime, como forma de retaliação, o que se afigura flagrante arbitrariedade estatal (MAZZUOLI, 2010).

O expulsando pode se valer do habeas corpus, bem como do pedido administrativo de reconsideração, porém, uma vez expulso, fica o estrangeiro impedido de voltar ao Estado que o expulsou. No Brasil, seu retorno é considerado crime, tipificado no art. 338 do Código Penal, prevendo a pena de 1 (um) à 4 (quatro) anos, sem prejuízo de nova expulsão após o cumprimento da reprimenda (MAZZUOLI, 2010).

Entretanto, o ato expulsório fica sujeito ao controle de constitucionalidade e legalidade pelo Poder Judiciário. Deste modo, o art. 75 da Lei 6.815/80, dispõe que não se procederá a expulsão do estrangeiro se esta implicar em extradição inadmitida pelo Direito brasileiro ou quando o estrangeiro tiver: (a) cônjuge brasileiro do qual não esteja divorciado ou separado, de fato ou de direito, e desde que o casamento tenha sido celebrado há mais de cinco anos, ou (b) filho brasileiro, que comprovadamente, esteja sob sua guarda e dele dependa economicamente (SILVA, 2010).

Segundo preconiza o art. 5º, XLVII, da CFRB, não é permitido a expulsão de nacional, uma vez que tal medida se caracterizaria como a pena de banimento (LENZA, 2013).

O instituto da extradição está definido nos arts. 76 a 94 da Lei 6.815/80 (BRASIL, 2014-D).

A extradição consiste no ato de entrega por um Estado de um indivíduo, acusado de um crime de certa gravidade ou que já tenha sido condenado à justiça de outro Estado, que o reclama, e que é competente para julgá-lo (CASELLA; SILVA; ACCIOLY, 2011)

“A materialização da extradição decorre do previsto em um tratado ou convenção internacional, ou no Direito interno de determinado Estado, encontrando justificativa num princípio de justiça, sendo o qual a ninguém é lícito subtrair-se às consequências das infrações penais que comete”.

Os tratados de extradição celebrados entre os Estados interessados não criam direito, que preexista à extradição, mas apenas estabelecem as condições para sua efetivação. Contudo, se o Brasil não tiver tratado com o país, isso não prejudica a faculdade que assiste as partes de conceder uma à outra, mediante declaração de reciprocidade, a extradição de pessoas acusadas ou condenadas por outros fatos (MAZZUOLI, 2010).

É condição para a extradição a existência de um processo penal, devendo o fato descrito ser considerado crime em ambos os Estados, e que não tenha sido extinta sua punibilidade pelo decurso do tempo (MAZZUOLI, p.674, 2010).

Podemos identificar a extradição ativa e passiva, a extradição ativa o requerimento é feito pelo Brasil ao Estado estrangeiro, já a passiva o requerimento de entrega é formalizado pelo Estado estrangeiro ao Estado brasileiro (LENZA,2013).

Em se tratando de extradição ativa, o pedido é passado do Ministro da Justiça para o Ministro das Relações Exteriores, que o envia ao governo estrangeiro, geralmente por meio de missão diplomática brasileira efetuada no país onde se encontra o indivíduo a ser condenado (MAZZUOLI,2010).

O procedimento do pedido de extradição comporta três fases no sistema brasileiro, quais sejam: a) administrativa, sob a responsabilidade do Presidente da República, até seu envio ao Supremo Tribunal Federal; b) judiciária, exame pelo STF da legalidade e procedência do pedido; c) administrativa novamente, na qual o Estado procede à entrega do estrangeiro ao país requerente ou comunica a esta sua negativa, caso tenha sido indeferido o pedido de extradição (MAZZUOLI, 2010).

Existem sete hipóteses que vedam a extradição, conforme elenca o art. 77, II a VIII da Lei 6.815/80: a) o fato que motivar o pedido não for considerado crime no Brasil ou no Estado requerente; b) o Brasil for competente, segundo suas leis, para julgar o crime imputado ao extraditando; c) a lei brasileira impuser ao crime a pena de prisão igual ou inferior a 1 (um) ano; d) o extraditando estiver a responder a processo ou já houver sido condenado ou absolvido no Brasil pelo mesmo fato em que se fundar o pedido; e) estiver extinta a punibilidade pela prescrição segundo a lei brasileira ou a do Estado requerente; f) o fato constituir crime político; g) o extraditando houver de responder, no Estado requerente, perante Tribunal ou Juízo de exceção (BRASIL, 2014-E).

Entendendo o STF pela procedência do pedido de extradição, o Presidente da República terá discricionariedade em sua decisão – dentro dos parâmetros estabelecidos na Constituição -, podendo negá-la, diante da ideia de soberania, fundamento da República Federativa do Brasil (LENZA, 2013).

A exemplo da discricionariedade do Presidente da República pode-se citar o famoso caso do pedido de extradição do ex-ativista Cesare Battisti, que havia sido condenado à pena de prisão perpétua pela prática de quatro homicídios na Itália – seu país de nacionalidade -, quando era integrante do grupo guerrilheiro Proletários Armados pelo Comunismo (PAC) (LENZA, 2013).

Battisti fugiu da Itália, e veio para o Brasil, diante do pedido de extradição, foi recolhido preso e a questão passou a ser examinada pelo STF, que em votação apertada (5 x 4), entendeu que os atos praticados por Cesare Battisti não tiveram conotação política, e então deferiu o pedido formulado pelo Governo italiano (LENZA, 2013, p. 1190).

O Estrangeiro no direito internacional foi objeto de diversas discussões doutrinárias, com objetivo de definir se a condição jurídica do Estrangeiro, regida pelo Direito Interno de cada Estado ou pelo Direito Internacional.

No Direito Interno, discute-se ainda se prevalece o Direito do Estado de nacionalidade ou do Estado em que o indivíduo se encontra fisicamente.

Já no Direito Internacional, dedicam se a verificar se trata de um assunto do Direito Internacional Público ou privado. À luz desse pressuposto, pelo Direito interno das normas de Direito Privado Estrangeiro, definiu-se que o Direito Privado Nacional, quando da obediência, aplica-se fora das fronteiras e o Direito Privado Estrangeiro, quando se obedece ou aplica-se dentro do território nacional que constitui conteúdo de certas regras e aplicação ao conjunto das quais deu-se o nome de Direito Internacional Privado.

Quanto ao Direito Brasileiro, diz o artigo 7º da Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, dispõe que: “Art.7º LICC, lei do país em que for domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família”.

E em seu artigo 14: “Não conhecendo a lei estrangeira, poderá o juiz exigir de quem a invocar prova do texto e da vigência”. Segundo se depreende o texto indicado, o juiz aplicará de ofício a lei estrangeira, somente não o fazendo no de não conhecer a o direito estrangeiro.

Porém, a Lei de Introdução ao Código Civil, não indica os meios de que se servirá o juiz para provar a vigência do direito estrangeiro. Todavia, nos casos de conflito entre a lei brasileira e a dos Estados que com o Brasil ratificaram o Código Bustamante, servir-se dos meios indicados no art.410 do referido Código e, subsidiariamente, desses meios ou de outros aceitáveis, nos conflitos entre a lei brasileira e a dos demais Estados.

Em relevância a interpretação da lei do direito estrangeiro, a norma para nós existente é a determinada pelo Código de Bustamante, que manda aplicar a lei estrangeira com a interpretação e a jurisprudência do país de que procede (art. 410). Fica evidente que este sistema prevalecerá nos conflitos entre a lei brasileira e a dos Estados que ratificaram o Código.

O Estrangeiro, no Direito Comparado[12], nos tempos antigos estrangeiros era sinônimo de inimigo. Cada povo considerava-se escolhido pelas suas divindades com a incumbência de vencer, subjugar e escravizar os que rendiam cultos a outros deuses. Na Índia, dominada pelo bramanismo, por exemplo, o estrangeiro estava colocado, na escala social, abaixo dos elefantes, dos cavalos e dos parias, superiores, apenas aos leões, tigres e outros animais selvagens.

Para José Afonso da Silva, "O princípio fundamental é o de que os estrangeiros, residente no País, gozem dos mesmos direitos e tem os mesmos deveres dos brasileiros.

Essa paridade de condição jurídica é quase total no que tange à aquisição e gozo dos direitos civis. Há, no entanto, limitações, dada a sua ligação com o Estado e nacionalidade de origem, que lhes condicionam o estatuto especial, que lhes definem a situação jurídica, quanto aos direitos e aos deveres". 

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Notas:

[1] Foi um escritor, jornalista, romancista, dramaturgo e filósofo argelino. Recebeu o Prêmio Nobre de Literatura em 1957 por sua importante produção literária. Albert Camus nasceu em Mondovi, na Argélia, na época da ocupação francesa, no dia 7 de novembro de 1913. Filho de camponeses ficou órfão de pai em 1914. Com a morte do pai na batalha do Marne, durante a Primeira Guerra Mundial, passou por dificuldades financeiras junto com a família. Mudou-se para Argel, onde faz seus primeiros estudos. Trabalhou como vendedor de acessórios de automóvel, meteorologista, foi empregado no escritório de corretagem marítima e na prefeitura. Com o apoio da família frequentou a escola e com o incentivo de alguns professores formou-se em filosofia e em seguida conclui o doutorado. Acometido de tuberculose ficou impossibilitado de prestar concurso para professor, que tanto desejava. Em 1942, em plena Guerra Mundial, Albert Camus publica seu mais importante romance, “O Estrangeiro”. O romance narra a história de um homem vidente que comete um crime quase inconsciente e é julgado por esse ato. Meursault, que vivia sua liberdade de ir e vir sem ter consciência dela, subitamente perde-a envolvido pelas circunstâncias e acaba descobrindo sua liberdade maior e mais assustadora na própria capacidade de se autodeterminar. A obra é uma reflexão sobre a liberdade e a condição humana que deixou marcas profundas no pensamento ocidental.

[2] Para Camus, era preciso tomar uma decisão: se optarmos por continuar a viver devemos aceitar que não existe um sentido último no que fazemos.  Ao lado dos escritores Franz Kafka e Fiódor Dostoiévski, Camus adotou a estética do absurdo. Essa linha filosófica diz que há uma tendência humana de buscar significado à vida. No entanto, há um conflito quando isso ocorre, já que seria “humanamente impossível” de encontrá-lo.

[3] O personagem-título é Meursault, um indiferente colono francês na Argélia descrito como "um cidadão da França domiciliado no Norte da África, um homem do Mediterrâneo, um homme du midi, mas que dificilmente compartilha da cultura mediterrânea tradicional". Semanas após o funeral de sua mãe, ele mata um homem árabe na Argel francesa, que estava envolvido em um conflito com um dos vizinhos de Meursault. Meursault é julgado e condenado à morte. A história é dividida em duas partes, apresentando a visão narrativa em primeira pessoa de Meursault antes e depois do assassinato.

[4] As raízes do Existencialismo.  Esses conceitos de alienação, angústia e absurdos, fizeram  com que Kierkegaard fosse  considerado o primeiro dos existencialistas. Embora os existencialistas fossem ateus,

que não seguiam as convicções dos filósofos de que a fé em Deus é um aspecto positivo e importante da vida, eles adotaram o credo da importância do individualismo contra a sociedade que era, senão,  evidentemente hostil,  pelo menos apática.  O existencialismo decolou no Século XX, mas tem suas origens na filosofia de Kierkegaard e Friedrich Nietzsche.  Kierkegaard não apenas influenciou as futuras gerações dos filósofos, incluindo Martin Heidegger e Jean-Paul Sartre, mas também figuras como August Strindberg, e Albert Camus.

[5] O mito de Sísifo fala sobre um personagem da mitologia grega considerado o mais inteligente e esperto dos mortais. Entretanto, ele desafiou e enganou os deuses e, por isso, recebeu um castigo terrível: rolar uma grande pedra montanha acima por toda a eternidade.

[6] O que Camus está a fazer é claramente um retrato de um mundo sem sentido que se confundia com o ficcional. Nesse retrato, o homem é apenas um ser que existe sobre a Terra e constrói (ainda que sem saber) a sua própria realidade; no entanto, essa por vezes não tem sentido, por vezes é absurda, e aí nessa ausência de sentido e nesse absurdismo é que se encontra a naturalidade da vida, como ele mesmo diz: “Por um lado era inverossímil. Por outro lado, era natural”.

[7] O existencialismo de Camus se estabelece no absurdo, pois a constatação da ausência de um porquê é a conclusão que se chega ao se debruçar sobre a liberdade do indivíduo. Se não há uma essência prévia, um plano a ser seguido, um destino certo, pode-se tudo.

[8] Na historiografia filosófica e nos dicionários, Camus é classificado usualmente como um filósofo existencialista, embora tenha ele próprio negado esse título afirmando: "Não, não sou existencialista... e o único livro de ideias que eu publiquei” Le Mythe de Sisiph “(O Mito de Sísifo), foi contra os filósofos chamados existencialistas". Seu pensamento filosófico é firmado sobre dois pilares principais: o conceito do absurdo e o da revolta. A sua definição de "absurdo" diz respeito ao confrontamento da irracionalidade do mundo com o desejo de clareza e racionalidade que se encontra no homem. Quanto ao conceito da revolta, está ele vinculado, em última análise, à busca inconsciente de uma moral. Nas palavras de Camus, "ela é um aperfeiçoamento do homem, ainda que cego".

[9] Não se deve confundir asilo político com refúgio. Este último procedimento trata de fluxos maciços de populações deslocadas por razões de ameaças de vida ou liberdade. Já o asilo político é outorgado separadamente; caso a caso.

[10] No que se refere à sua concessão, esta é um ato do Estado, de competência do Presidente da República, e, caso concedido, o Ministério da Justiça lavrará termo no qual será fixado o prazo de estadia do indivíduo asilado no Brasil e, se necessário, as condições adicionais aos deveres imputadas pelo direito internacional e a legislação vigente, às quais o indivíduo ficará sujeito.

[11] Próximo à Segunda Guerra Mundial rompeu ele com o Partido Comunista; com isso ocorreu a consequente dissolução do "Théâtre du Travail" cujo nome passou a ser "Théâtre de L'Equipe", que a partir de então mudou seu enfoque de ação, tornando-se mais "neutro" enquanto movimento de resistência. É nesta época que acontece o primeiro contato entre Albert Camus e Jean P. Sartre. A amizade entre eles foi marcada por fortes momentos de aproximação e distanciamento. Mas, é a partir deste período que Camus inicia seu mais importante de publicações. Em 1940 terminou o romance "O Estrangeiro", começando logo após a escrever "O Mito de Sísifo", terminado em fevereiro, preparando logo em seguida a obra "A Peste" por influência de Moby Dick de Herman Melville. Sua vida em face da guerra sofreu grandes alterações. Em virtude do fechamento do jornal em que trabalhava pela imposição da censura, mudou-se para Paris, tendo aí trabalhado no "Paris-Soir". Contudo, após a ocupação nazista, refugiou-se em Clermont. Veio então o engajamento no movimento clandestino de resistência; o seu principal papel nesta missão foi o de jornalista, profissão esta que o obrigou a participar ativamente dos acontecimentos políticos. Em 24 de agosto de 1944 o jornal de resistência "Combat", do qual Camus era editor, publicou seu primeiro número.


Gisele Leite

Gisele Leite

Professora Universitária. Pedagoga e advogada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Conselheira do INPJ. Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Consultora Jurídica.


Palavras-chave: Direito Internacional Estrangeiro Refugiado Asilo Estatuto do Estrangeiro CF/88

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