A prosa jurídica em Machado de Assis

Sob a máscara esgarçada e múltipla, a voz e legado de Machado de Assis trouxe uma consciência aguda ao reverberar as mazelas da realidade político-social do país. E, apesar de ter sido uma alma mal nascida retomou uma leitura sociológica e profunda da  sociedade dominante brasileira. Trouxe à baila dimensões existenciais e, sinalizou com genialidade em toda sua obra e, suas denúncias sutis e inteligentes. A contemporaneidade de Machado de Assis ainda suscita questões jurídicas que ainda hoje luta a jurisprudência pátria para pacificar.

Fonte: Gisele Leite

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“O coração humano é a região do inesperado”. Machado de Assis.  Iaiá Garcia (1878).

Há diversos aspectos filosóficos, sociológicos e jurídicos na obra do Bruxo do Cosme Velho[2]. Aliás, a filosofia de Machado de Assis não surpreende, pois todas as perplexidades, paradoxos, contrastes da condição humana permeiam seus romances[3], contos, crônicas, poesias e até as críticas.

Ao reler as obras machadianas identifiquei que o autor utiliza o vocábulo "filosofia" em três acepções distintas, porém, complementares.

A primeira acepção apud Reale é usada em tom jocoso e irônico quando se referiu ao grunhir dos porcos, como sendo espécie de troça filosófica, ou, ou quando se referiu ao asno de Sancho que tinha teor filosófico, ou ainda, quando mostrou em Quincas Borba a traçar uma asa de frango como serenidade filosófica.

Não se deve acreditar que o Bruxo tivesse desapreço pela Filosofia, pois demonstrou relevante e constante preocupação, apesar de rabugento e pessimistas.

A transparência dos romances machadianos nos faz identificar os valores introspectivos de Machado de Assis, que ilumina os episódios, e ora oculta o sentido ou nos apresente um interessante leque de perspectivas.

Lembremos da crítica mordaz de Sílvio Romeno que rejeitava com elegância o que expunha Lafayette Rodrigues Pereira[4] nas páginas de Vindíciae, o que resta de válido é apenas reparo sobre "a mania de filosofar" que se insinuara, de forma inquietante, na obra de Machado de Assis.

É a razão[5] pela qual a palavra filosofia adquire, em sua pena, também uma acepção ampla, a que recorre toda vez que deseja nos oferecer o sentido essencial ou dominante de algo.

É a filosofia como “forma de compreensão” ou até mesmo como “súmula de significado”, tal como ocorre quando evoca a “filosofia das folhas velhas”, ou a “filosofia dos epitáfios” (M.P., CXVI e CLI).

Segundo os invocados versos de Camões, a indagação sobre, in litteris: “Uma verdade que nas coisas anda, Que mora no visível e invisível.”

É recorrente o uso da palavra "metafísica" por Machado de Assis sendo entendida como uma tresloucada busca de uma "substância"

que é sempre a mesma, levando muitos indivíduos que, paradoxalmente, em suas bolhas transitórias, mas, isto não obstante, constituem o resumo do universo, visto que o universo é o homem. Contemporaneamente, o homem é o multiverso.

Cumpre esclarecer que a exposição machadiana obedece a uma compreensão da natureza que se subordina sempre a uma teoria do homem, a um certo antropocentrismo fundamental.

A palavra “metafísica” também é usada para indicar algo que se afirma com profundidade, sem maior esforço, nem obrigação de se demonstrar a verdade das asserções realizadas.

Assim, a metafísica política[6], quando desenvolveu a teoria do medalhão, apaixona naturalmente os partidos políticos e o público, chama os apartes e as respostas[7]. Não obriga a pensar nem descobrir.  Por vezes, nem transcende ao nível raso da vulgaridade nem devassa os alforjes da memória.

O alforje ou alforge é um tipo de sacola grande, dividida em dois compartimentos ou bolsas, cada qual com a sua respectiva abertura. O alforge encontra-se fechado nas extremidades e aberto ao meio, por onde se dobra, de feição a manter os compartimentos separados entre si e a fazer uma distribuição equânime do peso.

Machado de Assis é um antidogmático por natureza, apesar de não se considerar cético, o Bruxo do Cosme Velho amava a filosofia, mas desde que fosse, conforme ele advertiu "leve e ridente", como a do gato que por lhe parecer ser um animal metafísico sem jamais ter lido Immanuel Kant (Cf. A Semana, ed. coligida por Mário de Alencar, em 1910,crônica de 18 de novembro de 1894,p. 175,e Q.B.,LXXX.)

Pode-se dizer que ele mesmo cuidou de situar sua atitude perante as perquirições metafísicas nas palavras de Brás Cubas sobre “uma filosofia desigual, agora austera, logo brincalhona, cousa que não edifica nem destrói, não inflama nem regela, e é todavia mais do que passatempo e menos do que apostolado” (M.P., IV).

Apesar dos muitos sentidos atribuídos por Machado de Assis aos vocábulos filosofia e metafísica, esses não se conflitam, mas antes se combinam num plexo pleno de imagens e identificação, ao mesmo tempo,, que se revela como uma cosmovisão transfigurada em representação romântica e artística.  O realismo inicial de Machado padece de um romantismo infectocontagioso.

A constante preocupação por saber o sentido da vida humana, o significado do mundo, o drama vital da humanidade quando se pretende cogitar em filosofia de Macha do Assis, que cotejou os pensamentos de Montaigne[8], Pascal e Schopenhauer, sem esquecer os ensinamentos bíblicos.

Aliás, sobre essa temática há estudos como os de Afrânio Coutinho[9] que abordou os ensaios de Barreto Filho, Augusto Meyer, Lima e Raymundo Faoro .

Todo o mundo conhece o delírio de Brás Cubas: num deserto, o personagem encontra-se em face de um “vulto imenso, figura de mulher”, de impassibilidade egoísta, de eterna surdez; reconhece-a como a natureza, sua mãe e inimiga; ela lhe explica a lei cruel que rege o Universo (“A onça mata o novilho porque o raciocínio é que ela deve viver”); mas afinal o pesadelo cede, e o monstro que trouxe Brás Cubas para aquele deserto transforma-se, sempre diminuindo, na figura familiar do seu gato.

— Agora, num outro documento literário, menos famoso entre nós, leio de um sujeito que encontrou no deserto “um vulto grandíssimo, figura desmesurada de mulher”, de impassibilidade cruel (“Acreditaste que este mundo tenha sido criado para ti?”), mãe mas inimiga de todas as criaturas; ela lhe explica a lei cruel que rege o Universo (“que é um círculo perpétuo de produção e destruição”).

Aí também aparecem monstros, dois leões, que teriam devorado o infeliz, se um vento de areia não o tivesse encoberto e mumificado; “mais tarde, viajantes encontraram a múmia, trazendo-a para a Europa, colocando-a no museu não sei de que cidade” — não importa, porque todos os museus se parecem, assim como, conforme Machado de Assis, todos os cemitérios se parecem.

Esse outro documento, que o autor das Memórias póstumas de Brás Cubas deve ter conhecido, é o Dialogo della Natura e di una islandese, que faz parte do volume Operette morali, de Leopardi.

As poesias de Giacomo Leopardi não eram ignoradas no Brasil, na época do romantismo; até hoje, o maior poeta que a Itália produziu depois de Dante é considerado no Brasil como um romântico melancólico e um poeta elegíaco.

Talvez porque se desconheçam os seus diálogos em prosa, aquelas Operette morali[10] que são uma das grandes obras da literatura universal. Machado de Assis as teria conhecido? Machado foi leitor assíduo de Schopenhauer, e este, por sua vez, foi grande admirador de Leopardi.

Em todo caso, o autor do delírio de Brás Cubas reconhecido teria em Leopardi mais que um poeta melancólico e, sim um pensador poético ao qual o ligavam profundas afinidades.

O delírio de Brás Cubas é da mesma lucidez das Operette morali que são o documento principal da filosofia leopardiana[11].

Pode-se viver com uma filosofia assim no coração? Contudo, esse diálogo do vendedor de almanaques encontra-se traduzido no último livro de Jean Paulhan, que foi editor das Éditions de Minuit e um dos chefes intelectuais da Resistência Francesa, exemplo de comportamento ativo, apesar dos motivos mais fortes de desespero definitivo, “com ânimo forte e sereno”.

Eis a única maneira possível de um pessimista achar (como Machado na agonia) que “a vida é boa”. Pelo menos como filósofo Leopardi não foi elegíaco.

Daí a diferença, já observada por De Sanctis[12], entre o poeta italiano e Schopenhauer, que também foi ateu mas espiritualista: dá testemunho disso a metafisica, “multicolor como a pele de uma onça”, do filósofo alemão.

Toda elegia é, por índole, espiritualista. Mas a filosofia de Leopardi — a unidade filosófica da sua obra já foi demonstrada pelos mais agudos críticos italianos — é o materialismo. No Frammento apocrifo di Stratone di Lampsaco, Leopardi já fala da eternidade da matéria.

Apenas esse materialismo não se baseia no cientificismo físico e biológico do século XIX, que Leopardi ainda ignorava, e sim nos seus estudos de filosofia grega.

E os versos do coro dos mortos, no diálogo deles com o anatomista Ruysch, não deixam dúvidas quanto à fonte dessa filosofia, materialismo cuja finalidade ética é apenas a ausência da dor:

“Nostra ignuda natura — Lieta no, ma sicura Dall’antico dolor…”

"Nossa natureza nua - Não feliz, mas segura Da dor antiga..."

Surge um delicado problema, que é o de saber se há efetivamente identidade ou correspondência entre o que Machado de Assis pensa e aquilo que ele põe na boca de suas personagens.

Ao contrário de termos seis personagens à procura de um autor, à maneira de Pirandello, mas com o mesmo intrincado perspectivismo da arte pirandelliana, tenta-nos a aventura de procurar o autor através de suas personagens, que ora manifestam, ora dissimulam as suas reais convicções.

É claro que uma reconstrução desse tipo corre sempre o risco da mediação hermenêutica, podendo haver tantos Machados de Assis quantos são os seus intérpretes.

Por vezes, há um exagero em ver a vinculação com pensamento de Pascal ou Schopenhauer[13], afinal, a constante teorética dos escritos machadianos, apontada por Silvio Romero[14], como simples mania de filosofar, ou como afirmou Lúcia Miguel-Pereira, como mania raciocinante.

Enfim, temos a teoria da teoria ou a metateoria, isto é, para indicar a inclinação que vai além da explicação do real, a fim de se elaborar, sobre essa base teórica, uma teoria de valor mais amplo e simbólico.

Aliás, Machado reiteradas vezes, a propósito dos temas ou episódios aparentemente banais, eleva-se à instância simbolizante que, atua, como complemento necessário dos tipos e modelos de sua ficção artística.

E, sob esse ângulo, na obra machadiana há muita teoreticidade bem justificável do que a deliberada colocação de temas em termos apropriadamente filosófico.

Assiste, pois, razão a Afrânio Coutinho quando nos diz que ele “transfigura a realidade”, afastando-se, assim, da assepsia egológica que Flaubert estabelecera como regra de seus romances, onde o “ego” é posto entre parênteses para que o real possa surgir em toda a sua pureza original.

Não é o caso de aqui indagarmos se essa já não era uma forma singular de “vivência” da realidade, por parte de um espírito tão subtil como o esteta de Madame Bovary[15], porquanto o que me interessa, a esta altura, por via de contraste, é acentuar que Machado de Assis, por sua natural atitude teorética, não poderia jamais ser um “realista” autêntico, e muito menos poderia aceitar o “naturalismo”, o que, aliás, ele timbrou em deixar claro nas páginas penetrantes dedicadas à “O Primo Basílio”[16] de Eça de Queirós.

É claro que não estou empregando o termo “teoria” no sentido aristotélico de especulação, contemplação, ou mesmo beatitude.

Desde Kant o conceito de teoria implica o de hipótese, podendo ser vista como uma hipótese verificada ainda que provisoriamente. Na teoria estética, porém, as hipóteses científicas sublimam-se na arte.

É inegável, pois, que havia entre o admirável cinzelador de Pensées e o autor de Quincas Borba forre afinidade espiritual, sendo certo, no entanto, que nossa sensibilidade atraída, às vezes, não por motivos de identidade, mas por inexplicáveis razões de contraste.

Pode acontecer, outrossim – e parece ser esse o caso de Machado de Assis perante Pascal –sentido de procura” que domina um filósofo, embora nos divorciemos dele quanto ao “sentido final” de suas meditações.

Afrânio Coutinho exagera, até certo ponto, a correlação “Pascal-Machado”, como o advertiu Sérgio Buarque de Holanda, sobretudo por faltar ao nosso maior prosador qualquer forma de inquietação religiosa, sendo essa “a diferença profunda, vital, que na realidade os separa”.

Lembrando que todo pensamento pascaliano se vincula à “sua fé convulsiva no Cristo, na crença profunda em Deus, no “Deus sensível ao coração”, Sérgio pondera: “Comparado ao de Pascal[17], o mundo de Machado de Assis é um mundo sem paraíso.

De onde uma insensibilidade incurável a todas as explicações que baseiam no pecado e na queda a ordem em que foram postas as coisas no mundo.

Seu amoralismo tem raízes nessa insensibilidade fundamental.” Acrescenta, como fato de suma importância, que o mundo de Machado “não conhece a tragédia”, ou melhor, que “nele, o trágico dissolve-se no absurdo e o ridículo tem gosto amargo”.

Não assiste razão a Afrânio Coutinho quando descobre tanto em Pascal como em Machado “ódio à vida”, “ódio intenso à humanidade”, ou “ódio radical da vida e dos homens”.

Ambos teriam amado o homem e a vida a seu modo; Pascal, tragicamente, na incessante indagação do “Deus absconditus”;

Machado, ironicamente, num halo de absurdo, devendo ser captado o ponto nuclear do pensamento machadiano sobre a existência humana não nas queixas de Ahasverus, mas sim no diálogo das águias:

“– Ai, ai, ai deste último homem, está morrendo e ainda sonha com a vida.

– Nem ele a odiou tanto, senão porque a amava muito.”

Concluiu Sérgio Buarque de Holanda sua crítica, um tanto acerba, afirmando que, se Afrânio Coutinho tem razão ao dizer que a atitude cética não explica toda a obra de Machado, o que prevalece nesta é a ideia de um mundo, não trágico, mas absurdo, somada a um sentimento de penúria encoberta pela ironia, na qual “deveriam ser procuradas as origens do homem de Machado de Assis e também as fontes de sua filosofia’’.

Se Machado não chegou à fé, não é dito que não a tivesse procurado, nem que o desacerto do mundo não lhe gerasse no espírito desconsolada renúncia ao refúgio da crença.

Se, na verdade, como o próprio Sérgio Buarque de Holanda o assinala, “Machado de Assis não parece deliciar-se profundamente em sua própria descrença”, reside nesse inconformismo o elo que o prende a Pascal, por mais diversos que haja sido os respectivos caminhos. outro ponto de contato entre Machado de Assis e Pascal[18]: é a fascinação pela figura de Jesus.

O romancista brasileiro despe-o de sua divindade, mas em bem poucas páginas de nossas letras ressoa, com tanta comoção, a tragédia do Gólgota.

O recalque do ceticismo, em particular  na obra de um monumento da literatura[19] brasileira, não deve surpreender tanto assim.

A postura  cética, por definição, põe sob suspeita todos os  dogmas, sejam eles pedagógicos, patrióticos, ideológicos[20], religiosos ou filosóficos, dificultando sínteses ou classificações a ponto de tirar o chão do  analista.

Logo, suspeito que ainda haja o que dizer a respeito. Como veremos, Machado de Assis  escreve no século XIX, absorvendo aspectos dos  ceticismos moderno e contemporâneo mas tendendo a dar um passo atrás: é ateu, ainda que  não militante, mas desconfia profundamente da  ciência e do cientificismo.

Seu suposto ceticismo  irritou a maioria dos seus comentadores, a ponto  de mais de um ler toda a sua obra e escrever livros inteiros só para combatê-lo, como, por exemplo, Octávio Brandão.

Os argumentos céticos costumam provocar irritação, o que produz um paradoxo: os  céticos procuram a tranquilidade, mas geram dissensão e controvérsia.

Renato Lessa observou, em  recente colóquio sobre o ceticismo realizado na  UERJ, que quem se irrita com os céticos reivindica, com razão, a necessidade do dogmatismo  para qualquer postura civilizatória. De fato, sem  dogmas não se fundam religiões, escolas, filosofias e economias.

Acontece que os céticos não pretendem vencer os dogmáticos, primeiro porque  essa seria uma pretensão vã, e segundo porque,  se vencessem, se tornariam aquilo que combatem.  O ceticismo é antes uma espécie de terapia  da hybris, da razão dogmática e suas manifestações arrogantes.

Para Bertrand Russell, o ceticismo[21] é logicamente impecável mas psicologicamente impossível  (em Watkins, 1984: 16). Não se pode ser cético o  tempo todo, não se pode ser cético sequer na  maior parte do tempo[22].

Enquanto as filosofias dogmáticas supõem implicitamente a possibilidade de cada uma ser a única a ter razão, o ceticismo  é forçado a abdicar dessa possibilidade, logo, de  qualquer pretensão à hegemonia ou à unanimidade. Não faz sentido se pensar em uma eventual vitória do ceticismo.

Ceticismo e responsabilidade se relacionam  estreitamente e intimamente.

A relevância do trabalho filosófico se dá a partir de imperativo duplo: "não desconhecer os fenômenos e objetos da vida ordinária e percebê-los ao mesmo tempo como itens  contingentes de apenas um dos muitos mundos possíveis".

Enquanto o  primeiro imperativo impede um relativismo  absoluto (mas contraditório nos próprios termos) no qual nada possua qualquer valor de  referência, o segundo imperativo impede que  se reifiquem os fenômenos considerados.

Enquanto absolutistas creem que a verdade seja  una e encouraçada, relativistas a afirmam ora  inexistente, ora múltipla: ambos incorrem em  erro. O cético não se pode contentar com a  afirmação fácil de que todas as verdades seriam  iguais ou equivalentes.

Considerar que os primeiros romances de  Machado de Assis pertenciam à fase romântica  e, portanto, são inferiores, enquanto os segundos  pertenciam à fase realista e, portanto, são superiores, leva à conclusão inevitável de que o realismo é superior ao romantismo.

Essa conclusão é  um equívoco porque, como já demonstraram vários pensadores, o realismo não é na essência diferente do romantismo.

Ambos os estilos são no  fundo o mesmo estilo burguês, ocupado em fetichizar a realidade e denegar a imaginação: vistos da altura de hoje, romantismo e realismo  "aproximam-se e descobrem a sua comum raiz  realista" (Ortega Y Gasset, 1925: 28).

No caso específico de Machado de Assis, a  persistência no equívoco realismo versus romantismo  é mortal não apenas para a parte supostamente  menor da sua obra, mas também para a parte supostamente maior, monumentalizada ao ponto de  se tornar inócua ou insuportável.

O equívoco,  todavia, é tão forte, que os estudantes de Letras  saem da faculdade, onde aprenderam a questionar o realismo de Machado, e caem no ensino  médio esquecendo tudo o que discutiram: voltam a repetir que Machado é realista.

A especificação de Alfredo Bosi, atribuindo  ao estilo machadiano a designação de realismo  de sondagem moral, qualifica a discussão, mas  ainda reputo melhor ser o comentário de Gledson (1986: 23):  "encontram-se muitos críticos que nos dizem que  Machado é realista [mas esse realismo] é sobretudo enganoso".

O epíteto de "realismo enganoso", contraditório nos próprios termos, me parece  mais adequado para esta obra, bem como para a  melhor ficção.  Talvez fosse enganoso por apontar para desagradáveis quadros da realidade social que sofriam de invisibilidade diante dos poderosos e intelectuais.

Machado de Assis engana quando é lido  como realista, assim como engana quando é lido  como conservador e até mesmo reacionário.

Essa  última leitura é atualmente facilitada pela sua  condição de monumento da literatura brasileira, mas já se dava com o escritor ainda vivo.

Sua ironia, propriamente cética, complica sua  recepção, uma vez que dificulta encaixá-lo em  qualquer gaveta estética ou ideológica — exatamente por isto, são a sua ironia e o seu ceticismo, combinados, que configuram a sua qualidade e o seu poder.

A frase final da sua crônica — "se eu pudesse ter esta opinião!" — deixa claro que Machado gostaria de ser cético, como se não o fosse... Sua educada ironia se deflagra delicadamente...

Como se ele não suspeitasse de todas as  opiniões, apesar de, ou exatamente por, considerá-las mais necessárias do que a realidade,  como comentara no conto "O segredo do bonzo": "se uma cousa pode existir na opinião, sem  existir na realidade, e existir na realidade, sem  existir na opinião, a conclusão é que das duas  existências paralelas a única necessária é a da  opinião, não a da realidade, que é apenas conveniente". Desse modo, o escritor defende-se  da recorrente acusação de ceticismo, respondendo: quem me dera...

O cético não apenas não tem mestre ou  guru, como não forma discípulos. Ele sabe que  as escolas, tanto faz se políticas, religiosas ou  literárias, se constituem tão-somente sobre dogmas, jamais sobre dúvidas.

Muitos cogitaram da  forte influência do filósofo pessimista Schopenhauer sobre Machado[23], mas poucos observam  como, na crônica "O autor de si mesmo", o escritor leva tanto o seu tema quanto o próprio  Schopenhauer ao absurdo

Defendendo que o amor seja pensado pela  filosofia, o filósofo constrói uma concepção próxima do naturalismo: apenas a metafísica da vontade poderia dar a chave do grande enigma do  amor, que não é função do espírito nem desejo  de unidade no outro, mas, bem o oposto, implica um engenhoso artifício da natureza para preservar a existência.

Na síntese de Rosa Dias, "a  ilusão do amor é um estratagema biológico, por  meio do qual a natureza atinge seus fins”. [24]

O indivíduo pensa perseguir os seus fins próprios,  quando na verdade trabalha para algo universal: a espécie. A vontade atua, dessa maneira,  enganando a consciência do amante no que diz  respeito à perfeição da pessoa amada, a fim de  dirigir seu apetite sexual para os fins da reprodução.

A conversa da criança com o filósofo tem um tom  cômico que contrasta fortemente quer com a gravidade da filosofia, quer com a gravidade do acontecimento.

Não é que Machado de Assis faça o procedimento inverso e desconstrua o pessimismo do  filósofo, mas sim que ele, levando-o ao absurdo e  reforçando-o pela crueldade do próprio humor, acaba por mostrar que o pessimismo também não é uma  explicação suficiente.

Em outras palavras, que a  solene metafísica schopenhaueriana do amor é  "apenas mais uma teoria" no concerto diafônico da  filosofia, restando inexplicado o amor, o ódio, a vida  e a morte — tudo, enfim.

Mesmo numa crônica sobre o terrível, e  terrível de ler, o escritor brasileiro não nos parece isto ou aquilo, pessimista ou otimista, revolucionário ou conservador, promovendo antes 'uma permanente suspensão do juízo tipicamente cética, que não o impede, como a nenhum cético, de continuar pensando, se espantando e levantando dúvidas fundamentais, ou  seja: que fundam o pensamento dos seus leitores de então e de agora[25].

O suposto adultério de Capitu.  "Dom Casmurro” é o romance mais famoso e polêmico de Machado de Assis. Ambientado no Rio de Janeiro do século XIX, é narrado por seu protagonista: Dom Casmurro, um velho solitário e frustrado que, em virtude de sua “simpatia”, recebe esse apelido de um conhecido.

O personagem busca, por meio da narrativa, rememorar e compreender fatos do seu passado, principalmente os que envolvem uma mulher: Capitu, a personagem mais intrigante e misteriosa da literatura brasileira. A polêmica toda se centraliza em uma dúvida:

Capitu é ou não é culpada de adultério? Os fatos até podem indicar que sim, mas o leitor não pode deixar de atentar para um fato: Bento Santiago (o Dom Casmurro), além de narrador, é advogado. A questão relativa à paternidade e, os novos meios de identificação de paternidade, por meio de exame de DNA.

A personalidade de Quincas Borba. Em Quincas Borba, a crítica ao comportamento humano é evidente. Agindo para satisfazer seus interesses, o homem se mostra animal ao extremo. Enquanto isso o cão, solidário e fiel, esbanja afetividade e apreço.

“Quincas Borba” é considerado um dos melhores romances de Machado de Assis, consolidando a chamada segunda fase machadiana, iniciada com a publicação de “Memórias póstumas de Brás Cubas” (1881).

Marcas registradas de suas criações, Machado faz uso do pessimismo e da ironia para criticar os costumes e a filosofia de seu tempo, parodiando o cientificismo e o evolucionismo da época, bem como o positivismo de Comte e a lei do mais forte, com uma prosa bem humorada e de altíssima qualidade.

A obra retrata a figura de Pedro Rubião de Alvarenga, um modesto professor que herda do dia para a noite a fortuna de seu amigo Quincas, passando de professor a capitalista.

No estilo irônico-satírico de Machado, o cão Quincas representa o homem e o cachorro e, de certa maneira, atua como uma resposta à filosofia  do Humanitismo criada por Quincas Borba, na qual o ser humano não é superior ao animal; o que importa é a espécie, e não o indivíduo.

Já em “Memórias Póstumas de Brás Cubas” é um defunto e narrador,  oriundo de família rica do Rio do Janeiro mas sem tradição na política, que não gostava de trabalhar, gozava de vários privilégios com os pais, formou-se bacharel em Coimbra, o pai queria casá-lo com uma filha de político e fazê-lo deputado. Era um típico cidadão da sociedade política, social e cultural do século XIX.

O finado Brás Cubas decide contar sua história por uma ótica bastante inusitada: em vez de começar pelo seu nascimento, sua narrativa inicia-se pelo óbito. Enquanto rememora as experiências que vivera, entre uma digressão e outra, o defunto-autor tece uma série de reflexões sobre a vida e sobre a sociedade da época, com serenidade e bom-humor, e o leitor se surpreenderá ao constatar a atualidade de suas observações.

“Memórias póstumas de Brás Cubas” pôs em xeque o conceito de Realismo literário, de romance e a própria forma de se fazer literatura. Representa um divisor de águas na literatura brasileira, é uma obra à qual não se pode ficar indiferente.

Os relatos do Conselheiro Aires percorrem os anos de 1888 e 1889, ou seja, anos em que ocorreram dois fatos importantes na história[26] do Brasil: a abolição da escravatura e a Proclamação da República.

Os aspectos sucessórios em Esaú e Jacó. A relação parental de irmãos. Em “Iaiá Garcia” que foi o derradeiro[27] romance de Machado de Assis. Publicado no ano de 1878, é considerado como uma obra da fase romântica do escritor. O espaço em que a história se passa é Santa Teresa, bairro tradicional do Rio de Janeiro.  Iaiá era filha de Luís Garcia, viúvo e funcionário público, que nela concentrava todos os seus afetos, a fonte de toda a alegria do pai. Luís Garcia tem uma amiga, também viúva, Valéria Gomes, mãe de Jorge. Jorge está apaixonado pela filha de um ex-empregado de seu falecido pai, Estela, que vive na mesma casa.

O romance Helena revela aspectos socioculturais da sociedade do século XIX, na qual a mulher ocupa uma posição de dona de casa, mãe e esposa dedicada. Helena (1876) é um romance diferente na primeira fase de Machado de Assis, pois, embora tenha inspiração romanesca e o próprio autor reconheça que foi uma fase mais ingênua de sua criação literária, ele foge do romantismo melancólico, optando pela tragicidade na vida da protagonista.

Helena após a morte de seu pai não biológico fica destinada a viver numa nova casa com uma nova família, a qual não sabia de sua existência.

O mote principal é o segredo de Helena, que após ser descoberto culmina com um desfecho inesperado pelos leitores. Machado de Assis foi um assíduo observador dos costumes e da condição humana, e Helena é um retrato analítico do drama da mulher no século XIX.

Machado de Assis utilizou a ironia em seu conto “A Igreja do Diabo”, para compreender a contraditória natureza humana.

Os homens conhecem sua própria natureza, por isso escolheram alguns para serem chamados legisladores, criaram um ordenamento sistêmico de normas para garantir o mínimo bem-estar social, definiram aqueles que terão autoridade para julgar o semelhante. Toda execução é regulada.

O caos pressupõe o cosmo, porque toda definição de alguma coisa evoca seu contraditório, não é possível dizer que algo é “escuro” sem ter a mínima noção do que seja o “claro”. Ou, ainda, todas as coisas tendem ao seu contrário. Machado de Assis usou da contraditória natureza humana com ironia em seu conto “A Igreja do Diabo”, em que o conceito, a definição ou a busca por uma compreensão da natureza humana é o centro. Além de se discutir sobre a liberdade religiosa.

Em tal obra o diabo decide organizar sua igreja, pois seus “meios discípulos” agem indiscriminadamente, algumas vezes obedecendo a Deus outras vezes ao diabo. A luta contra do bem contra o mal aparece numa alternância pacífica e mansa, sem nada lembrar as odisseias.

Em a “Mão e a Luva”, verificamos a importância do casamento e seu significado social. O enredo gira em torno da personagem Guiomar, uma jovem ambiciosa que busca ascender socialmente por meio do casamento.

Machado de Assis explorou a psicologia dos personagens, revelando suas motivações, desejos e conflitos internos e, principalmente, as relações sociais e jurídicas do século XIX, mas que encontram pertinência na contemporaneidade.

Nota-se o uso recorrente de linguagem jurídica na produção literária de Machado de Assis  não pode deixar de ser notado.

Diversas expressões e entendimentos são dados com base na atividade do jurista e, existe uma relação inseparável entre o uso da linguagem e a  atuação  neste  ambiente.  Há  que  se atentar  também para  o  uso  da retórica.

Machado de Assis é todo direito, por isso, ousei chamá-lo de Bruxo Jurídico[28], o que pareceu-me ser mais simpático do Bruxo do Cosme Velho[29].

A parte do “bruxo” é um pouco mais curiosa e até mesmo divertida: afirmam que certa vez, quando morava no Cosme Velho, Machado de Assis queimou algumas cartas em um caldeirão no sobrado onde vivia. A vizinhança viu o ato e passou a chamá-lo de bruxo a partir daquele dia[30].

Em outras funções, o escritor trabalhou no Ministério da Agricultura, Viação e Obras Públicas e, ficou encarregado dos mais aprofundados pareceres, essencialmente os de ordem jurídica[31].

‘Grande escritor, mas péssimo secretário!’, escreveu o ex-presidente da República sobre Machado de Assis. Disse Epitácio Pessoa[32].

“É verdade que uma vez, em conversa, qualifiquei Machado de Assis, não de péssimo funcionário, mas de péssimo secretário” apud França Filho. Esta qualificação, talvez um tanto severa demais, fundava-a eu na falta de método e na demora e confusão de que se ressentia a sua ação no preparo, exposição e despacho no expediente do Ministério da Viação, pelo menos durante os três meses que ali serviu como meu secretário, afirmou de certa feita Presidente Epitácio Pessoa[33].

Machado segundo Magalhães Jr.[34], passou vários anos constrangido e humilhado até encontrar, em Lauro Müller – o grande ministro da Viação que iniciou as obras do Porto do Rio de Janeiro e fez construir a avenida Central, hoje avenida Rio Branco – quem lhe fizesse justiça. Lauro Müller fez Machado voltar a ser diretor.

E diretor-geral de Contabilidade. O sucessor de Lauro Müller, Miguel Calmon, a 16 de dezembro de 1907, aumentou ainda mais suas responsabilidades, nomeando-o juntamente com Luís Rodolfo Cavalcanti de Albuquerque (diretor das Rendas Públicas do Tesouro Nacional) e com o engenheiro Francisco Bicalho, para exercer as funções de membro da Comissão Fiscal e Administrativa das Obras do Porto do Rio de Janeiro, sem prejuízo de suas funções de diretor-geral de contabilidade.

Morreu Machado de Assis sem ter se aposentado, porque teve a preocupação de ser útil à pátria, enquanto teve forças para tanto.

Seus funerais foram custeados pelo governo federal e o Ministério da Viação, Indústria e Obras Públicas, em que ele trabalhava (o da Agricultura já tinha então existência à parte). O expediente da Diretoria Geral de Contabilidade foi encerrado ao meio-dia, para que os funcionários subordinados a Machado de Assis pudessem comparecer ao enterro, que saiu do Silogeu Brasileiro, à rua Augusto Severo, onde então a Academia Brasileira de Letras tinha a sua sede.

Com o direito contemporâneo brasileiro temos a tipificação do crime de racismo, de injúria racial, de assédio moral.

Assédio moral é a exposição de alguém a situações humilhantes e constrangedoras, repetitivas e prolongadas. Geralmente, tal expressão se refere a atos ocorridos durante a jornada de trabalho e no exercício de suas funções. No Brasil, não há uma lei específica para assédio moral, mas esta pode ser julgada por condutas previstas no artigo 483 da Consolidação das Leis do Trabalho.

A primeira lei brasileira específica para o tema, contudo, é datada de 2000, no município de Iracemápolis, de autoria do professor João Renato Alves Pereira, que é também autor do primeiro livro publicado no Brasil, sendo palestrante na área do aperfeiçoamento das relações de trabalho.

Há alguns Estados do Brasil, como Pernambuco, que já publicaram lei específica tratando sobre o tema. A lei estadual nº 13.314, de 15 de outubro de 2007, de autoria do deputado Isaltino Nascimento, foi regulamentada pelo governador Eduardo Campos através da lei nº 30.948, de 26 de outubro de 2007. Foi a primeira lei sobre o tema a ser regulamentada em todo Brasil.

Também no Estado de São Paulo, há lei que veda o assédio moral no âmbito da administração pública estadual direta, indireta e fundações públicas. O projeto de lei criado em 2001 de autoria do deputado Antonio Mentor tornou-se a lei 12 250, de 9 de fevereiro de 2006. Atualmente, está em contestação no Supremo Tribunal Federal pela ADIN 3.980, de 23 de outubro de 2007 (Ação Direta de Inconstitucionalidade).

Em Minas Gerais, foi publicada a Lei Complementar 116/2011, que cuida da prevenção e da punição do assédio moral na administração pública estadual.

Extraímos um trinômio para caracterização do assédio moral no trabalho: a conduta abusiva (não eticamente esperada), desempenho desse assédio por meio do comportamento (palavras, ações, gestos que reforçam as características básicas de assédio moral e visibilidade) e o fator temporal (repetidamente, por tempo prolongado). Provas de assédio moral geralmente são comprovadas por meio de testemunhos puros.

Segundo, a comprovação também pode ser feita fornecendo documentos (por exemplo, e-mails) ou gravações que demonstrem o comportamento do assediador. Nesse último caso, relativo às gravações, é bom o advogado tomar muito cuidado, pois há jurisprudência que considera a gravação (via celular ou gravação em tempo real) como prova legal, mas há alguns tribunais que podem contradizer isso.

No direito positivo brasileiro, in litteris:

Lei 9.029/1995: “Art. 1º É proibida a adoção de qualquer prática discriminatória e limitativa para efeito de acesso à relação de trabalho, ou de sua manutenção, por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar, deficiência, reabilitação profissional, idade, entre outros, ressalvadas, nesse caso, as hipóteses de proteção à criança e ao adolescente previstas no Inciso XXXIII do art. 7º da Constituição Federal”.

Vide Jurisprudência: “O assédio moral pode ser conceituado como o abuso praticado no ambiente de trabalho, de forma antiética, intencional e maliciosa, reiterado no tempo, desvinculado da conotação sexual ou racial (que configuram hipóteses com definições específicas, quais sejam, assédio sexual e racismo, respectivamente), com o intuito de constranger o trabalhador, através de ações hostis praticadas por empregador, superior hierárquico ou colega de trabalho, que causem intimidações, humilhações, descrédito e isolamento, provocando na vítima um quadro de dano físico, psicológico e social. Sua natureza é predominantemente psicológica, atentando sempre contra a dignidade da pessoa humana.” (TRT-2, 1001119-20.2017.5.02.0028, Rel. RICARDO ARTUR COSTA E TRIGUEIROS – 4ª Turma – DOE 05/06/2018)”.

Já a Lei nº 14.532/2023, que equipara a injúria racial ao crime de racismo, foi publicada em edição extra do Diário Oficial da União em 11.01.2013. Sancionada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva ao final da cerimônia de posse das ministras Anielle Franco (Igualdade Racial) e Sonia Guajajara, (Povos Indígenas), realizada no Palácio do Planalto, a legislação já está em vigor.

A norma altera a Lei do Crime Racial (7.716/1989) e o Código Penal (Decreto-Lei nº 2.848/1940) para tipificar como racismo a injúria racial. A mudança aprofunda a ação de combate ao racismo, porque cria elementos para interpretação dos contextos e evidencia algumas modalidades de racismo que não eram, propriamente, evidentes.

A agressão a atletas, juízes, torcedores e torcidas, em um ambiente de prática de esportes, é compreendido como racismo esportivo. O deboche ou as piadas ofensivas disfarçadas de humor caracterizam o racismo recreativo. O preconceito e a desqualificação das religiões afrobrasileiras é racismo religioso.

Os crimes previstos na Lei terão penas aumentadas de um terço (1/3) até a metade, quando ocorrerem "em contexto ou com intuito de descontração, diversão ou recreação". Da mesma forma, terão as penas aumentadas os crimes praticados por funcionário público, conforme definição prevista no Código Penal, "no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las".

O STF decide que crime de injúria racial não pode prescrever O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu nesta quinta-feira (28), por 8 votos a 1, que o crime de injúria racial pode ser equiparado ao de racismo e ser considerado imprescritível, ou seja, passível de punição a qualquer tempo. (Vide: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=475646&ori=1 ).

Infelizmente, ainda não existe legislação brasileira específica para punir o racismo institucional.

Já o racismo estrutural é a discriminação racial sistemática presente nas estruturais sociais. Ou seja, é o racismo enraizado na sociedade, que acaba estando presente em todas as instâncias sociais, sejam institucionais, políticas ou econômicas.

Trata-se do tipo de racismo[35] que já faz parte da cultura de um povo e contribui para a perpetuação de desigualdades. O racismo estrutural no Brasil tem origem no processo de colonização e escravização da população indígena e africana a partir do século XV.[36]

Obs.: Aproveito a oportunidade para parabenizar minha filha Ingrid Louise Alves Pereira que é meu maior tesouro afetivo e humano.

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Notas:

[1]  O sociólogo Roger Batiste francês também considera que para Machado a paisagem  não pode funcionar como um mero enfeite, ela tem que ser personagem do  enredo, ter significação própria. A paisagem, na obra do escritor, está em toda  parte, mesmo onde não aparece à primeira vista: “está nos conflitos do homem,  no íntimo das almas”.

[2] Joaquim Maria Machado de Assis (1839-1908) é considerado o maior  nome da literatura brasileira de todos os tempos. Sua obra foi e ainda é objeto  de estudo dentro e fora do Brasil. Um dos temas mais relevantes acerca da  obra do escritor carioca é a questão da nacionalidade. Este assunto passou a  ser relevante, principalmente no Romantismo, época em que o Brasil deixou de  ser colonizado e sentiu a necessidade de se afirmar como pátria independente.

[3] Segundo romance de Machado de Assis, A mão e a luva, com base no novo conceito de “pessimismo galhofeiro”. O objetivo é argumentar que o narrador se apropria do pessimismo schopenhaueriano para fazer galhofa do suicídio romântico como tentativa de fugir da dor da vida. Reivindicamos que o romântico personagem Estêvão, ao sentir a “voluptuosidade da dor”, estabelece um horizonte próprio de discussão sobre o pessimismo oitocentista, com a pena da galhofa, numa simbiose entre o sério e o cômico.

[4] Lafayette Rodrigues Pereira, mais conhecido como Conselheiro Lafayette, foi um jurista, proprietário rural, advogado, jornalista, diplomata e político brasileiro. Foi primeiro-ministro do Brasil, de 24 de maio de 1883 a 6 de junho de 1884. Graduado em Filosofia pela Faculdade de São Paulo em 1857. Promotor Público em Ouro Preto; Senador pela Província de Minas Gerais (1879); Membro extraordinário do Conselho de Estado. Exerceu a Presidência do Ceará em 1868, Maranhão em 1869 e o cargo de Ministro da Justiça (1878-1880). Em 1883 acumulou a Presidência do Conselho e o cargo de Ministro da Fazenda. Seu programa baseou-se no combate ao déficit e à progressão dos empréstimos. Foi Ministro em Missão Especial (do Imperador); Árbitro nas relações europeias pela guerra do Pacífico, em 1885; Chefe da Delegação à Primeira Conferência Panamericana, em Washington, cargo que largou em 16 de novembro de 1889.

[5] A loucura é uma ilha perdida no oceano da razão. Machado de Assis. Trecho adaptado do conto O Alienista (1882)

[6] Ouça-me este conselho: em política, não se perdoa nem se esquece nada. Machado de Assis   Quincas Borba (1892).

[7] Na compreensão de Nietzsche, a origem dos conceitos morais aceitos na modernidade remonta à transvaloração ou transmutação dos valores. Inicialmente, determinou-se como “bom” aquilo que estava ligado ao nobre, aristocrático, espiritualmente bem-nascido, ao passo que o “ruim” designava a baixa estirpe dos plebeus . Com a transmutação conceitual posterior essa ordem foi invertida: através da revolta dos escravos judeus na moral, o “bom” passou a equivaler ao miserável, pobre, sofredor, necessitado. Desse modo ocorreu dentro da tradição judaica uma modificação de conceitos, pois houve uma inversão de valores com o início do cristianismo. Por conseguinte, esse grupo aboliu a moral dominante dos senhores e da nobreza, passando a exercer a moral escrava cristã e dos “homens do ressentimento”.

[8] Montaigne fez de sua vida o objeto específico dos Ensaios, estuda-se a si  mesmo. Revela seus sentimentos e idiossincrasias numa criação difícil de ser  classificada, pois, enquanto os filósofos hodiernos sentem pela falta de  sistematização e “certeza”, os críticos literários encontram uma orientação  demasiado filosófica .  Entretanto, além de ser considerado o criador  do gênero ensaio no Ocidente, gênero caracterizado pela “reflexão e beleza  estilística", Montaigne fez uso de outros procedimentos  considerados literários nos Ensaios, como a citação, a livre associação de  ideias, a narração de casos ou episódios e análise psicológica

[9] Afrânio Coutinho (1959) discute a formação filosófica de Machado de Assis,  apontando a filiação desse escritor a Pascal e a Montaigne. Sua reflexão sobre a constituição  de um espírito “clássico” em Machado é aproveitada neste trabalho para a realização de  algumas aproximações entre os Ensaios, de Michel de Montaigne, e as crônicas da série “Bons  dias!”, de Machado. Nesse intuito, são pensados os gêneros em que esses escritores  desenvolvem seus projetos de escrita: o ensaio e a crônica. Verificou-se que Montaigne se faz  presente de várias formas em “Bons dias!”, entre elas a confluência temática. Constatou-se,  também, que o papel de Montaigne na formação machadiana não se restringe à atitude  espiritual, passando necessariamente pela criação literária.

[10] A Operette morali é uma coletânea de vinte e quatro composições em prosa, divididas entre diálogos e contos de estilo médio e irônico, escritas entre 1824 e 1832 pelo poeta e estudioso Giacomo Leopardi. Eles foram finalmente publicados em Nápoles em 1835,[1] após duas edições intermediárias em 1827 e 1834. A Opereta é o local de pouso literário de quase todos os Zibaldone.  Os temas são os caros ao poeta: a relação do homem com a história, com seus pares e, em particular, com a Natureza, da qual Leopardi amadurece uma visão filosófica pessoal; a comparação entre os valores do passado e a situação estática e degenerada do presente; o poder das ilusões, da glória e do tédio. Esses temas são repropostos à luz da mudança radical ocorrida no coração do escritor: a razão não é mais um obstáculo à felicidade, mas a única ferramenta humana para escapar do desespero.

[11] Poeta e filósofo Leopardi escreveu artigos filosóficos, manifestos e poesias, como Pompeo in Egitto, L'appressamento della morte, Inno a Nettuno, e Le rimembranze. Uma de suas últimas obras foi a Operette morali, uma coleção de reflexões filosóficas escritas com ironia. Os principais temas das obras de Leopardi envolviam reflexões profundas sobre a existência humana, patriotismo e amor não correspondido, sendo ele um dos precursores do Existencialismo.

[12] Francesco De Sanctis foi um crítico literário, intelectual, escritor, historiador, filósofo e político italiano. É geralmente considerado como o mais importante especialista da língua italiana do século XIX. Foi ministro da instrução pública por várias ocasiões.

[13] Arthur Schopenhauer foi um filósofo alemão do século XIX. Ele é mais conhecido pela sua obra principal "O Mundo como Vontade e Representação", em que ele caracteriza o mundo fenomenal como o produto de uma cega, insaciável e maligna vontade metafísica.

[14] No Rio de Janeiro, lecionou filosofia no Colégio Pedro II entre 1881 e 1910. Estava entre os intelectuais que fundaram a Academia Brasileira de Letras (ABL), em 1897. Um ativo polemista, contribuiu de modo significativo para que a Escola do Recife — denominação que lhe deve ser atribuída — viesse a ser conhecida em todo o país. Em 1882 publicou a Introdução à História da Literatura Brasileira, atualmente em edição de cinco volumes. Com o livro Últimos Harpejos, em 1883, sua carreira de poeta se encerra. Como resultado de pesquisas sobre o folclore brasileiro escreveu O elemento popular na literatura do Brasil e Cantos populares do Brasil, tendo realizado para este, em 1883, uma viagem a Lisboa a fim de publicá-lo. Em 1888 foi publicada a História da Literatura Brasileira em 2 volumes. Em 1891 produziu artigos sobre ensino para o jornal carioca Diário de Notícias, dirigido por Rui Barbosa. No mesmo ano, foi nomeado membro do Conselho de Instrução Superior por Benjamim Constant.

[15] Madame Bovary conta a história de Emma, uma moça criada no campo mas com sonhos burgueses. Inspirada pelo que lê nos livros, Emma quer uma vida melhor, cheia de mimos e coisas que só os ricos podem comprar. Pensando que poderá alcançar o que tanto quer, Emma casa com Charles Bovary, um médico também do interior.

[16] Essa obra retrata a história do casal Jorge e Luísa, pertencentes à burguesia portuguesa do século XIX. A trama passa-se em Lisboa, na capital portuguesa. Jorge, marido de Luísa, vai viajar a trabalho e ela recebe a visita de seu primo Basílio. Nesse ínterim, eles que já tiveram uma relação anterior, acabam por consumar o desejo latente. Vale notar que a relação de Jorge e Luísa estava mais baseada no interesse, uma vez que, de fato, eles não viviam uma vida feliz juntos. Jorge era um excelente marido que sempre estava preocupado em agradar sua bela esposa. Lhe dava diversos presentes e sempre estava disposto a lhe oferecer conforto. No Primo Basílio, Eça de Queirós faz um panorama da sociedade portuguesa da época. Suas críticas sociais à burguesia e aos atos humanos são expostas, por exemplo, na análise psicológica de seus personagens, dos estereótipos e de seus comportamentos. A obra está dividida em 16 capítulos. Temas como o adultério, a hipocrisia, o caráter, a mediocridade e os valores morais são as principais características do romance realista-naturalista português.

[17] A razão não é suficiente a si mesma, ela tem limites, e Pascal reconhece esses limites. Estabelece que a ética, a vida social e a religião é que definem o mundo humano real e esse mundo real em grande parte foge das possibilidades da razão. O conhecimento científico é independente dos conhecimentos da fé que são imutáveis, a fé nos faz dizer creio, e a ciência, sei. O conhecimento científico para ter credibilidade tem que estar baseado em um método, mas nenhum método é capaz de nos dar uma verdade científica completa. Pascal acreditava que uma das prioridades do nosso pensamento é pensar a nós próprios e não somente as coisas exteriores a nós. A tarefa principal do homem é conhecer a si mesmo, mas para cumprir esse empreendimento a razão não nos pode ajudar muito, pois ela é fraca, desnecessária e imprecisa e cai constantemente na fantasia, no sentimentalismo e no hábito. Para conhecer-nos o melhor caminho é o do coração.

[18] Blaise Pascal (Clermont-Ferrand, 19 de junho de 1623 – Paris, 19 de agosto de 1662) foi um matemático, escritor, físico, inventor, filósofo e teólogo francês. Prodígio, Pascal foi educado por seu pai. Os primeiros trabalhos de Pascal dizem respeito às ciências naturais e ciências aplicadas. Contribuiu significativamente para o estudo dos fluidos. Ele esclareceu os conceitos de pressão atmosférica e vácuo, estendendo o trabalho de Evangelista Torricelli. Pascal escreveu textos importantes sobre o método científico. Na literatura, Pascal é considerado um dos autores mais importantes do período clássico francês e é lido hoje como um dos maiores mestres da prosa francesa. Seu uso da sátira e do humor influenciou polemistas posteriores. O conteúdo de sua obra literária é mais lembrado por sua forte oposição ao racionalismo de René Descartes e a afirmação simultânea que a principal filosofia de compensação, o empirismo, também era insuficiente para determinar verdades importantes. Na filosofia, a influência de Pascal foi ampla, influenciando grande parte dos filósofos franceses subsequentes. Para além dos franceses, destacamos autores como Friedrich Nietzsche e Søren Kierkegaard, filósofos influenciados por Pascal.

[19] “Há mais coisas no céu e na terra do que sonha nossa filosofia”, disse Hamlet para seu amigo Horácio. Intimamente, poderia ser o personagem Vilela avisando para Camilo seu destino, ao final deste  conto de Machado de Assis. A escolha pela complexa intertextualidade com Hamlet, pontos de convergência com a obra famosa de Shakespeare, não se valem necessariamente pelos paralelismos ou referências. Numa interpretação mais pessoal, sem apelar para uma crítica com fervores acadêmicos, a correlação das obras se vale pela inversão dramática, pelo tão aclamado realismo de Machado que com sua literatura torna a moral a religião de uma sociedade mais viva que nunca. A verdade de “A Cartomante” é a ironia fervilhante que Assis torna a frase de Hamlet para Horácio em uma ameaça, tornando a parte “coisas na terra” como algo ainda mais relevante. Porque o suspense e a vingança vão além da filosofia, mas no caso de Camilo, as coisas do céu se tornaram mais próximas de sua filosofia como alívio da sua moralidade confrontada. Entre cartas, três ou quatro anônimas, e as da cartomante, Camilo vai do realismo ilógico ao romance lógico do leitor, uma verdadeira febre que Assis abaixa para escorrer sangue frio. Por isso o inverso de Hamlet, em que o corpo frio traz a crença que revela, enquanto em “A Cartomante” o corpo frio é o esconderijo da imoralidade da crença que esconde.

[20] Entre o pensamento religioso e a prática capitalista, no mundo moderno, e a escrita irônica de Machado de Assis, no romance Dom Casmurro. Se Karl Marx, em Sobre a questão judaica, identificou  a propagação do pensamento reificado do judaísmo pelas relações político-econômicas do mundo capitalista, Machado de Assis mostrou como o pensamento burguês do protagonista do romance citado se manifesta nos momentos em que ele trata da imagem de Deus e das próprias práticas religiosas.

[21] A palavra ceticismo vem do grego “sképsis” que significa “exame, investigação”. Atualmente, a palavra designa aquelas pessoas que duvidam de tudo e não acreditam em nada. Podemos afirmar que o ceticismo: defende que a felicidade consiste em não julgar coisa alguma; mantém uma postura de neutral em todas as questões; questiona tudo o que lhe é apresentado; não admite a existência de dogmas, fenômenos religiosos ou metafísicos. Portanto, se estivermos dispostos a aceitá-lo, alcançaremos a afasia, que consiste em não emitir opiniões sobre qualquer tema. Em seguida, entramos no estado de ataraxia (despreocupação) e somente assim, poderemos viver a felicidade.

[22]  Matamos o tempo, o tempo nos enterra. Machado de Assis  Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881).

[23] Foram encontradas semelhanças entre a filosofia Schopenhauriana e o pensamento pessimista apresentado por Machado de Assis na figura da personagem Brás Cubas. Uma personagem pessimista como esta nada mais é do que a personificação da ideia proposta por Schopenhauer. Além disso, a obra também oferece outros conceitos do filósofo, como miséria, esperança, vontade e, sobretudo, a vida sem outra possibilidade além do sofrimento. A literatura machadiana constitui fonte de pesquisa para as mais profundas filosofias, uma vez que nela constatamos um trânsito da mitologia ao existencialismo e aspectos claros dos pensamentos acerca do Ser e sua vivência na circumundaneidade. Em Machado de Assis é possível corroborar esse entendimento de Schopenhauer acerca da moralidade ao se encontrar personagens egoístas, maldosos e alguns poucos compassivos. Dentre os egoístas, talvez o representante mais significativo seja Brás Cubas, de Memórias Póstumas de Brás Cubas, guiado constantemente por seu amor pela glória, sem se deixar afetar pelos sofrimentos morais.

[24] Em "Memorial de Aires" também é possível encontrar personagens cujo caráter virtuoso é ressaltado pelo narrador. D. Carmo é exemplo de pessoa amorosa, totalmente dedicada ao bem-estar de seus filhos postiços, Tristão e Fidélia. Ao mesmo tempo, os personagens de Memorial de Aires são caracterizados pela ausência das contradições morais, o que os distingue substancialmente dos personagens de Quincas Borba, nos quais é possível identificar uma visão crítica sobre o ser humano enquanto sujeito moral egoísta e auto-interessado. Lá, ao referir-se ao Palha, o narrador o descreve como uma “colcha de retalhos”, além de afirmar que “moralmente as colchas inteiriças são tão raras”.

[25] Curiosidades sobre Machado: Machado de Assis, considerado o maior escritor brasileiro, guarda algumas curiosidades. Acompanhe: morreu de depressão aos 69 anos; era epilético e gago; tinha baixa autoestima, na infância, em função de sua ascendência negra; sofreu preconceito racial; escreveu mais de 600 crônicas, que são um retrato do Rio de Janeiro no século XIX; ganhou terceiro lugar no primeiro campeonato brasileiro de xadrez; ficou 35 anos casado com Carolina Augusta Xavier de Novais, sua grande companheira.

[26] Tendo em vista as circunstâncias históricas peculiares de sua produção literária, isto é, o período de transição da Monarquia para a República, no Brasil, ao final do século XIX. Aliado a esse ponto, busca-se, concomitantemente, pensar de que modo a presença da religião, na obra, contribui para a sua eficácia estética e também para os questionamentos e reflexões levantados pelo autor em relação à história e à realidade brasileiras. Mesmo que não apresente os elementos tradicionais do romance histórico europeu, o romance de Machado de Assis permite uma profunda análise do movimento da história nacional, revelando as singularidades históricas a partir da revelação dos nexos entre acontecimentos públicos e a experiência individual da realidade nacional, sobretudo pelo entrelaçamento entre o elemento humano e a história, trespassados pelo fio da religião, aqui entendido como fator determinante para a configuração da narrativa e da experiência histórica que ela revela.

[27] Machado de Assis falava francês, inglês e latim fluentemente. O francês, dizem, ele aprendeu com um padeiro imigrante; já o latim teria sido ensinado a ele por um padre. Sendo assim, além de escrever, ele também traduzia muitos livros. Se, no leito de morte, Machado de Assis recusou a presença de um padre, alegando não professar religião alguma, foi, no entanto, a um padre Silveira Sarmento (que o iniciou nas letras e no latim), que dedicou alguns dos poemas de seu primeiro livro ("Crisálidas").

[28] Era epilético e apresentava sinais de gagueira, o que contribuiu para formação de sua personalidade insegura e reclusa. Além disso, Machado de Assis, por ser mulato, enfrentou muito preconceito para conseguir reconhecimento. Com a morte da esposa, Machado entrou em profunda depressão. Numa carta ao amigo Joaquim Nabuco, ele lamenta: “foi-se a melhor parte da minha vida, e aqui estou só no mundo”.

[29] Quem popularizou esse epíteto foi Carlos Drummond de Andrade com o poema “A um Bruxo, com Amor”. O trabalho faz parte de Machado, a Cidade e seus Pecados e marca uma reavaliação do posicionamento de Drummond em relação a Machado de Assis, reconhecendo-o como um dos nossos maiores mestres. O poema foi publicado originalmente no Correio da Manhã em 1958. Embora muitos tenham atribuído a criação de epíteto a Drummond, o próprio poeta esclareceu que não cabe a ele a autoria do termo, conforme escreveu em uma crônica publicada em 1964 no mesmo Correio da Manhã: “Devo reconhecer (…) que não me cabe a paternidade da apelação ‘bruxo do Cosme Velho’, dada a Machado de Assis”. Ele nem mesmo foi o primeiro escritor a utilizar o apelido, já que o poeta gaúcho Augusto Meyer já havia feito isso. Outro gaúcho, o crítico literário Moysés Vellinho também já o tinha chamado de bruxo.

[30] Religiosamente, casou-se na igreja católica, à qual, na infância, serviu como sacristão. No entanto, a reputação de cético, agnóstico ou mesmo materialista (que ele sempre negou) o acompanhou ao longo da vida.

[31] O medo é um preconceito dos nervos. E um preconceito, desfaz-se; basta a simples reflexão. Machado de Assis  Helena (1876).

[32] Epitácio Lindolfo da Silva Pessoa foi um magistrado, diplomata, professor universitário, jurista e político brasileiro, filiado ao Partido Republicano Mineiro. Foi Presidente da República entre os anos de 1919 a 1922.Levi Carneiro, no "Livro de um Advogado", assinala que Epitácio Pessoa nunca foi voto vencido nos processos em que foi relator. Em 1912, elege-se senador pela Paraíba. Depois foi para a Europa e lá viveu até 1914. Retornou ao Brasil nesse ano e, logo após a morte de Pinheiro Machado, destacou-se no Congresso ao assumir o cargo de relator da Comissão de Verificação de Poderes. Com o fim da Primeira Guerra Mundial, chefiou a delegação do Brasil na Conferência de Paz de Versalhes, em 1919. Rui Barbosa, indicado chefe da delegação, renunciou, sendo substituído por Epitácio. A delegação brasileira, apoiada pelos Estados Unidos, obteve bons resultados quanto aos problemas que mais de perto interessavam ao Brasil: a venda do café brasileiro armazenado em portos europeus e os 70 navios alemães apreendidos pelo Brasil durante a guerra. Em 15 de novembro de 1898, Epitácio Pessoa, então com 33 anos de idade, é nomeado Ministro da Justiça e dos Negócios Interiores pelo Presidente Campos Sales. Ficaria no cargo até 1901. Logo depois, seria indicado ministro do Supremo Tribunal Federal. A Justiça era, naquela altura, um superministério, cujas atribuições abarcavam, para além dos habituais temas jurídicos e legislativos, toda a área de saúde e educação nacionais. Ao chegar no Ministério da Indústria, Viação e Obras Públicas, Epitácio encontrou, como secretário ministerial, ninguém menos do que Joaquim Maria Machado de Assis. O Bruxo do Cosme Velho já era um intelectual sexagenário que trazia no currículo os êxitos literários de Memórias Póstumas de Brás Cubas (1881), Quincas Borba (1891) e Dom Casmurro (1899). A nova rotina era puxada: Epitácio costumava, pela manhã, dar expediente no Ministério da Justiça, onde dava conta de pautas como o projeto de novo código civil, a reforma do ensino e o combate à peste bubônica. À tarde, seguia para o Ministério da Indústria, onde o secretário Machado de Assis lhe fazia minuciosas exposições sobre cada tema da pasta, apresentando-lhe, em seguida, minutas literárias dos despachos. O hiperativo paraibano, veraneando em Petrópolis para fugir do infernal calor carioca, desde logo não se deu muito bem com o temperamento de Machado de Assis, demasiado meticuloso, reservado e cerimonioso. Enfadado, Epitácio queria sempre apressar e abreviar as exposições machadianas daquela interinidade, a fim de adiantar o serviço e não perder a barca que o levaria até a estação ferroviária de onde pegaria o comboio para Petrópolis. Algumas vezes perdeu a segunda barca, só tomando a terceira e chegando à residência pretropolitana já tarde da noite.

[33] Epitácio Lindolfo da Silva Pessoa(Umbuzeiro, 23 de maio de 1865 – Petrópolis, 13 de fevereiro de 1942) foi um magistrado, diplomata, professor universitário, jurista e político brasileiro, filiado ao Partido Republicano Mineiro. Foi Presidente da República entre os anos de 1919 aie3 1922. Seu governo foi marcado por revoltas militares que acabariam na Revolução de 1930, a qual levou Getúlio Vargas ao governo central. Anteriormente, foi deputado federal em duas oportunidades, ministro da Justiça, do Supremo Tribunal Federal, procurador-geral da República, senador três vezes, chefe da delegação brasileira junto à Conferência de Versalhes e juiz da então Corte Permanente de Justiça Internacional.

[34] Raymundo Magalhães Júnior Jornalista e biógrafo, nasceu no Ceará em 1907 e faleceu no Rio de Janeiro em 1981. Ingressou na Academia Brasileira de Letras em agosto de 1956, ocupando a Cadeira no 34, sucedendo a D. Aquino Correia

[35] Existem palavras racistas na língua portuguesa. O que só reforça o racismo também é refletido nos aspectos culturais e linguísticos, como expressões e palavras com base discriminatórias  que se difundiram com os anos. Eis exemplos são palavras que se utilizam do termo “negro” para referir-se a algo negativo ou que têm origem nos ideais escravagistas, como: Denegrir; Lista negra; Mercado negro; Criado-mudo: tem origem nas pessoas escravizadas, que eram obrigadas a segurar objetos por horas sem fazer barulhos; Mulato: sua origem, da língua espanhola, refere-se ao cruzamento entre um cavalo e uma mula; "Meia tigela": tem origem nos negros escravizados que não conseguiam alcançar objetivos de trabalho e só recebiam meia tigela de comida; Macumba: termo pejorativo para religiões de matriz africana,  "escurinho", neguinho e, etc. Nas pesquisas do Censo feitas pelo IBGE, é apresentada uma relação com as cinco nomenclaturas utilizadas e as pessoas precisam indicar a qual cor pertencem. Segundo Petruccelli, cada pessoa tem liberdade para dizer a sua classificação. Ele explica que pretos normalmente são as pessoas que se enxergam com a cor mais escura. Mas em relação aos pardos não há consenso. “Normalmente são as pessoas que se classificam como ‘morenas’ ou ‘mulatas’, mas isso depende na região”, afirma. O pesquisador diz ainda que nas regiões Sul e Sudeste, a população que se declara parda normalmente é de origem africana. Porém, no Norte, muitos pardos são, na verdade, descendentes de indígenas. Ele ainda conta uma história curiosa sobre a situação no Distrito Federal. “A população local, por mais branca que seja a sua pele, se classifica como parda porque vê os brancos como os funcionários públicos que vieram de fora”. De acordo com o pesquisador do IBGE, a presença de pretos é menor no Brasil, por isso existe a tendência em reunir pardos e pretos em um grupo de negros.

[36] A guisa de esclarecimento, a classificação do IBGE estabelece que, além dos pardos, há outros quatro grupos étnicos compõem a população brasileira. São eles: Negros, Brancos, Indígenas e Amarelos.


Gisele Leite

Gisele Leite

Professora Universitária. Pedagoga e advogada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Conselheira do INPJ. Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Consultora Jurídica.


Palavras-chave: Machado de Assis Direito Literatura Jurisprudência Sociologia[1] Filosofia

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