A necessidade de consolidação da cidadania brasileira
A cidadania contemporânea é resultante da especificação dos sujeitos de direito, o que serve de bússola para as políticas públicas e para atuação dos poderes constituídos. Mas, ainda cabe ao Estado reconhecer e saciar a necessidade de consolidação efetiva da cidadania brasileira.
Cogita-se
sobre a responsabilidade do Estado sobre a consolidação da cidadania. Trata-se
de um processo histórico, lento e dialético. Conveniente delinear o exato
perfil do Estado Constitucional, principalmente, em razão da atual Constituição
Federal brasileira de 1988, a Redentora. A Constituição cidadã.
Há o
Estado Democrático de Direito, também sendo conveniente cogitar sobre a
concepção da cidadania, principalmente, em face da concepção contemporânea dos
direitos humanos. A relação existente entre o Estado e a cidadania, onde há a
responsabilização do Estado está na observância dos direitos fundamentais.
A
ordem constitucional brasileira de 1988 apresenta duplo calor simbólico,
representando a transição democrática com a institucionalização dos direitos
humanos. Enfim, a Constituição Cidadã concretizou a ruptura com o regime
militar autoritário que existiu de 1964 até 1985.
Nessas
diversas investigações, há discrepância nos números de mortos e desaparecidos
computados. A CNV[1]
(Comissão Nacional da Verdade), em seu relatório final, reconheceu 434 mortes e
desaparecimentos políticos entre 1964 e 1988, dos quais a maioria ocorreu no
período do regime.
Entre
1964 e 1968, foram torturados e mortos 34 opositores do regime. Sabe-se até
quem foi o primeiro torturado: o líder comunista pernambucano Gregório Bezerra,
que no dia 2 de abril foi preso, arrastado pelas ruas de Recife, amarrado em um
jipe e depois espancado por um oficial do Exército com uma barra de ferro.
Em
2014, um relatório final foi divulgado listando o nome de pessoas que foram
mortas ou desaparecidas durante o regime. 191 assassinadas e 243 desaparecidas,
ou seja, 434 pessoas no total. Segundo a organização internacional não
governamental de direitos humanos, a Human Rights Watch, aproximadamente
20 mil pessoas foram torturadas no período brasileiro.
Já no
preâmbulo do texto constitucional vigente vige a redefinição do Estado
brasileiro e, também, dos direitos fundamentais. Apontou os princípios
fundamentais como se depreende do artigo 1º ao 3º da CFRB/1988.
O
Estado é destinado a assegurar o exercício de direitos sociais e individuais,
demarcando os fundamentos para promover o desenvolvimento, a igualdade e a
justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem
preconceitos.
Ao
construir uma sociedade livre, justa e solidária a fim de garantir o
desenvolvimento nacional, erradicar a pobreza e a marginalização, reduzir as
desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos, sem preconceitos
de origem, raça, etnia, sexo, cor, idade e qualquer outras formas de
discriminação que constituem obstáculo de objetivos fundamentais do Estado
consagrados no artigo 3º da Carta Magna de 1988.
Em
2019, o STF enquadrou a homofobia e a transfobia como crimes de racismo ao
reconhecer a omissão legislativa. Foi o Plenário do STF que conclui em
13.06.2019 o julgamento de ações que tratam da matéria e decidiu que, até o
Congresso Nacional edite lei específica, as condutas homofóbicas e transfóbicas
se enquadram na tipificação da Lei do Racismo.
O
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade por Omissão (ADO)26, de
relatoria do Ministro Celso Mello e do Mandado de Injunção (MI) 4733, relatado
pelo Ministro Edson Fachin. Por maioria, a Suprema Corte reconheceu a mora do
Congresso Nacional para incriminar atos atentatórios aos direitos fundamentais
dos integrantes da comunidade LGBT.
Os
ministros Celso de Mello, Edson Fachin, Alexandre de Moraes, Luís Roberto
Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux, Carmén Lúcia e Gilmar Mendes votaram pelo
enquadramento da homofobia e da transfobia como tipo penal definido da Lei do
Racismo, Lei 7.716/1989, até que o Congresso Nacional edite lei sobre a
matéria.
Restaram
vencidos os ministros Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, por entenderem a
conduta só pode ser punida mediante le aprovada pelo Legislativo. O Ministro
Marco Aurélio não reconhecia a mora.
Por
maioria, o Plenário aprovou a tese proposta pelo relator da ADO, ministro Celso
de Mello, formulada em três pontos. O primeiro prevê que, até que o Congresso
Nacional edite lei específica, as condutas homofóbicas e transfóbicas, reais ou
supostas, se enquadram nos crimes previstos na Lei 7.716/2018 e, no caso de
homicídio doloso, constitui circunstância que o qualifica, por configurar
motivo torpe.
No
segundo ponto, a tese prevê que a repressão penal à prática da homotransfobia
não alcança nem restringe o exercício da liberdade religiosa, desde que tais
manifestações não configurem discurso de ódio.
Finalmente,
a tese estabelece que o conceito de racismo ultrapassa aspectos estritamente
biológicos ou fenotípicos e alcança a negação da dignidade e da humanidade de
grupos vulneráveis. Ficou vencido o Ministro Marco Aurélio.
Infere-se
a preocupação em assegurar a dignidade humana sendo um imperativo da justiça
social. O texto resguardou o direito à preservação da dignidade humana que
redimensionou e privilegiou a temática dos direitos fundamentais.
Com a
topografia nacional e constitucional promoveu os direitos e garantias,
elevando-os à categoria de cláusula pétrea. As chamadas "cláusulas
pétreas" da Constituição de 1988 dizem respeito ao que determina o
parágrafo 4º de seu artigo 60: não se pode eliminar, nem mesmo por emenda
constitucional, a forma federativa do Estado; o voto direto, secreto, universal
e periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e as garantias.
Tais
cláusulas não são uma exclusividade da Constituição brasileira. Estas tiveram
sua origem no século XVIII, com a Constituição norte-americana de 1787 que
previu a impossibilidade de alteração na representação paritária dos
Estados-membros no Senado Federal. A cláusula pétrea não pode ser alterada nem
mesmo por Proposta de Emenda à Constituição (PEC).
As
cláusulas pétreas inseridas na Constituição do Brasil de 1988 estão dispostas
em seu artigo 60, § 4º. São elas: a forma federativa de Estado; o voto direto,
secreto, universal e periódico; a separação dos Poderes; e os direitos e
garantias individuais.
Frise-se
que o artigo 60, §4º do texto constitucional vigente apresenta as cláusulas
pétreas que integram esse núcleo: I. a forma federativa de Estado; II.O voto
direito, secreto, universal e periódico; III. A separação de poderes; IV. Os
direitos e garantias individuais.
O
texto de 1988 inovou ao ampliar a dimensão dos direitos e garantias, não se restringindo
ao assegurar os direitos individuais. Vindo a incorporar a tutela dos direitos
coletivos e difusos, aqueles pertinentes à classe ou categoria social,
caracterizados pela indefinição objetiva e indivisibilidade de seu objeto.
O
conceito de direito ou interesse difuso está positivado no artigo 81 do CDC,
inciso I. São interesses transindividuais, ou metaindividuais,
supraindividuais, isto é, extrapolam o sujeito isoladamente considerado
para
abranger questões que envolvam número indeterminado de pessoas. Há quem critique essa terminologia
transindividuais, porque pelo conceito determinado pela lei, o direito possui
titular, preferindo denominá-lo de plurindividuais.
Controvérsias
à parte, é certo que o interesse difuso características que o diferenciam dos
demais interesses ligados à tutela coletiva, são estes: indivisibilidade do seu
objeto, situação de fato em comum e indeterminabilidade dos titulares.
É o
caso de danos ao meio ambiente. Não há como contabilizar o prejuízo que cada
pessoa sofreu ou poderá sofrer. E, por esta indivisibilidade os efeitos da
coisa julgada são erga omnes, alcança a todos.
O
direito ou interesse coletivo stricto sensu está disposto no artigo 81,
parágrafo único do CDC, inciso II. A principal diferença entre os interesses
difusos e os coletivos é que nos difusos há uma situação de fato em comum,
enquanto nos coletivos há uma relação jurídica base, o que torna possível
determinar os titulares.
Os
direitos individuais homogêneos nada mais são do que simples direitos individuais.
Assim, nada impede que seus titulares, caso prefiram, busquem individualmente
sua tutela judicial.
O
saudoso Teori Albino Zavascki diferenciou a tutela de direito coletivos da
tutela coletiva de direitos individuais. Aquela se referiria à tutela dos direitos
difusos e coletivos, e esta, à dos individuais homogêneos. O jurista não admitia
que os direitos individuais homogêneos sejam espécie de direito coletivo lato
sensu, gênero que, em sua opinião, só engloba os direitos difusos e os direitos
coletivos em sentido estrito.
Outros
doutrinadores consideram que os individuais homogêneos também são espécies de
direitos coletivos lato sensu já que podem ser defendidos de modo coletivo. E, de outro lado, nem o CDC no conceito que
foi acima apresentado coloca os direitos individuais homogêneos como direitos
transindividuais, apenas os difusos[2] e coletivos stricto
sensu são.
Parte
da doutrina, orientando-se por esse entendimento, trata os difusos e coletivos stricto
sensu como sendo essencialmente coletivos e os individuais homogêneos como
acidentalmente coletivos. O que caracteriza um direito em difuso, coletivo
stricto sensu ou individual homogêneo é o tipo de tutela pretendida.
Determinada
empresa anuncia produtos na internet, mas para os clientes terem acesso devem
renunciar ao direito previsto no art. 49 (direito à devolução no prazo de sete
dias):
Em uma
ação coletiva, caso a pretensão seja: – A declaração de nulidade da cláusula
abusiva nos contratos já celebrados – estamos diante de um interesse coletivo
stricto sensu (pois existe uma relação base já firmada, o contrato); – A
condenação da empresa na obrigação de não inserção da mesma cláusula em
contratos futuros – estamos diante de um interesse difuso, já que existe apenas
um fato que une os titulares, havendo uma indeterminabilidade dos titulares
(todos são potenciais consumidores que poderão acessar aquela publicidade); – A
condenação da empresa na obrigação de aceitar as manifestações de desistência
efetuadas dentro do lapso legal de sete dias, bem como de restituir os valores
porventura já pagos pelos clientes desistentes – estamos diante de direitos
individuais homogêneos, pois são aferíveis (quantificáveis individualmente). O
sujeito poderia ingressar individualmente com a demanda judicial.
Na
doutrina de Claudia Lima Marques observa-se três principais características dos
direitos coletivos, a saber: transindividuais, indivisíveis e pertencentes ao
grupo determinável de pessoas. Tanto como entidade associativa quanto aquelas
que possuem uma relação jurídica base estabelecida com a parte contrária.
A
razão de ser da instituição de direitos individuais é que este concede a
possibilidade de demandas possuírem pretensões indenizatórias. Enquanto os
outros dois permitem que a determinada prática seja suspensa ou até anulada, os
individuais homogêneos garantem as indenizações àquelas que delas fazem jus.
Assim, é a única das três categorias que possui caráter patrimonial.
Ademais,
a Redentora no fim de reforçar a imperatividade das normas que traduzem
direitos e garantias fundamentais, institui o princípio da aplicabilidade,
imediata das normas definidoras de direitos e garantias fundamentais nos termos
do artigo 5º, §1º.
Inadmissível,
ipso facto, a inércia do Estado quanto à concretização de direitos
fundamentais[3],
posto que a omissão estatal viola a ordem constitucional, tendo em vista a
exigência de ação, o dever de agir no sentido de garantir o direito
fundamental. Enfim, instituiu-se em constitucionalismo que é concretizador dos
direitos fundamentais.
Consolidou-se
a extensão de titularidade de direitos, acenando à existência de novos sujeitos
de direito, aumento de bens de merecedores de tutela jurisdicional, mediante a
ampliação de direitos sociais, econômicos e culturais.
Ao
longo da história das constituições brasileiras, as Cartas de 1824 e 1891 foram
liberais, já a Constituição de 1934 e 1946 foram consideradas Constituições
sociais.
Aliás,
a Constituição brasileira de 1934 influenciada pela Constituição de Weimar[4] que de forma inédita
alargou a dimensão de direitos fundamentais, no sentido de incluir os direitos
sociais.
Enfim,
com a tutela dos direitos sociais. Enfim, com a tutela dos direitos sociais
visou disciplinar a categoria de direitos que acenou o primado da sociedade
sobre o Estado, afastando o absenteísmo estatal do século XIX para consolidar a
reabilitação do papel do Estado com referência à democracia, à liberdade e a à
igualdade.
O
texto constitucional de 1988 expandiu, consideravelmente, o universo de
direitos sociais, integrando-os na Declaração dos Direitos Fundamentais. Além
de afirmar que no artigo 6º que são direitos sociais à educação, saúde, o
trabalho, o lazer, a moradia, a segurança, a previdência social, a proteção da
maternidade, infância, a assistência aos desamparados e desvalidos,
apresentando uma ordem social.
A
ordem social dotada de vasto universo de normas jurídicas que enunciam
programas, tarefas, diretrizes e fins a serem perseguidos pelo Estado e pela
sociedade.
A
ordem social conjuga-se com uma ordem econômica que é fundada na valorização do
trabalho humano e na livre iniciativa e tem por objetivo assegurar a existência
digna, conforme os ditames da justiça social, conforme preleciona o artigo 170
da CFRB/1988.
Assinale-se
que é uma ordem social complexa, porque há a preocupação da incidência de
princípios e normas que retratam a realidade.
A
ordem econômica brasileira busca harmonizar a livre iniciativa com a
concorrência com a atuação do Estado seja como agente normativo e regulador da
atividade econômica, seja como agente econômico que desenvolve atividade
estratégicas para a defesa nacional (ou imprescindíveis) ao desenvolvimento do
país.
Trata-se de modelo aberto que é capaz de instrumentalizar as mudanças da realidade social e a promoção do bem-estar social. Reforçou-se a participação estatal no campo social e, ao tratar do Estado Social[5] como provedor do dinamismo social.
O
sistema constitucional brasileiro de 1988 trouxe o Estado intervencionista
voltado para o bem-estar social, assim o Estado-inimigo cede lugar ao
Estado-amigo e, o Estado-hostilidade ao Estado-segurança.
Enfim,
as Constituições tendem a se transformar num pacto de garantia social.
Portanto, o Estado democrático de Direito não se identifica com o Estado de
Direito formal, mas, visa legitimar-se como Estado de Justiça Social,
concretamente realizável.
O
desafio do constitucionalismo de 1988 é implementar uma ordem jurídica própria
dos Estados intervencionistas numa globalização econômica.
A globalização como processo tem se orientado pelas regras do chamado Consenso de Washington[6] que foi resultante do seminário realizado em 1990 e, passou a ser sinônimo de medidas econômicas neoliberais voltadas para estabilização de economias emergentes, notadamente, as latino-americanas.
A
plataforma dos neoliberais visa redução das despesas públicas, flexibilização
das relações de trabalho, a disciplina fiscal para eliminar o déficit público,
a reforma tributária e abertura do mercado ao comércio exterior.
O
referido Consenso procurou estimulou a transnacionalização dos mercados e a
privatização do Estado, condenando os tributos progressivos e os gastos sociais
em prol da austeridade monetária.
A
globalização econômica agravou o dualismo econômico e estrutural da realidade
latino-americana com aumento das desigualdades sociais e de desemprego
reforçando a pobreza absoluta e a exclusão social.
Emerge
do texto constitucional brasileiro vigente uma ordem jurídica própria do Estado
intervencionista, cuja dinâmica metabólica resta condicionada à eficiência e
competência na obtenção de resultados que se subordinam à concretização de
políticas públicas.
Enfim,
o desafio do constitucionalismo brasileiro e foi marcado pela globalização
econômica e pela ideologia neoliberal[7].
O
Estado enquanto agente interventor e passando para agente regulador da ordem
econômica, em face de sucessivos processos de privatização.
Cabe
lembrar de Emendas à Constituição de 1988, especialmente promulgadas a partir
de 1995. Por conta do código neoliberal que tem inspirado as reformas que
promoveram corrosiva descaracterização da Carta Constitucional de 1988.
O
ímpeto reformista tem esvaziado e mitigado a força normativa da Constituição
Cidadã principalmente no que se refere aos direitos sociais, pulverizando o
Estado do Bem-Estar Social que sofreu o impacto poderoso da globalização
econômica.
Acentuou-se
a abertura da economia brasileira ao mercado mundial, com intensa privatização
que segundo Aloysio Biondi tem implicado o desmonte do Estado, com a entrega do
patrimônio público do poder das forças do mercado o que resulto em notório
empobrecimento do Estado. (In: BIONDI, Aloysio[8]. O Brasil privatizado.
Fundação Perseu Abramo, 1999).
Sublinhe-se que os próprios formuladores do Consenso de Washington, dentre os quais Joseph Stiglitz, então vice-presidente do Banco Mundial, hoje assumem a necessidade de haver o Pós-Consenso de Washington onde a preocupação com temas relativos ao desenvolvimento humano, à educação, à tecnologia e ao meio ambiente e, ainda, aponta que entre as funções do Estado está assumir e assegurar um desenvolvimento sustentável[9] e democrático.
A
pobreza é a ameaça sistêmica fundamental à estabilidade de um mundo que se
globaliza cada dia mais. (In: Camdessus. Crítica ao desmonte do Estado.
Folha de São Paulo, 14.02.2000).
Os
preciosos contornos jurídicos da cidadania se preocupam com o perfil
constitucional do Estado. Numa perspectiva histórica observa-se que a definição
da cidadania sempre enfrentou a dicotomia entre os valores de liberdade e da
igualdade.
Ao
final do século XVIII quando ocorreram as Declarações de Direitos que refletiam
o discurso liberal da cidadania. Tanto a Declaração francesa de 1789 como a
norte-americana de 1776 consideravam a versão contratualista liberal, pela qual
os direitos humanos se reduziam aos direitos à liberdade, segurança e a
propriedade, complementadas pela resistência à opressão.
Explica-se
assim o primado do valor da liberdade, com a supremacia dos direitos civis e
políticos e a ausência de previsão de qualquer direito social, econômico e
cultural que dependesse da intervenção do Estado.
Após a
Primeira Grande Guerra Mundial ao lado do discurso liberal da cidadania,
fortaleceu-se o discurso social da cidadania e, sob as influências da concepção
marxista-leninista, e pela Declaração dos Direitos do Povo e do Trabalhador
Explorado da República Soviética Russa em 1918.
O
discurso da cidadania, dentro da teoria jurídica contemporânea brasileira,
emana do Direito Constitucional e da Teoria Geral do Estado, aparecendo
inserido basicamente nesse locus privilegiado. Nas obras de Direito
Constitucional está na temática referente à nacionalidade e aos direitos políticos.
E, na Teoria Geral do Estado, trata dos elementos constitutivos do Estado.
Realmente se trata de um discurso fragmentado e residual, que adquire ares de
epifenômeno, encontrando-se no centro de sua (in) definição a nacionalidade, os
direitos políticos e o povo.
Pinto
Ferreira mantém implícita a identificação existente entre nacionalidade e
cidadania. E leciona que a noção mais específica da cidadania ativa advém dos
direitos políticos são prerrogativas, os atributos, faculdade ou poder de
intervenção dos cidadãos ativos de seu país. Intervenção direta ou só indireta,
mais ou menos ampla, segundo a intensidade do gozo desses direitos. De modo
geral, os direitos políticos são os que asseguram a participação do indivíduo
no governo de seu país, seja votando, seja sendo votado.
Dalmo
de Abreu Dallari aborda a temática e traça análise sobre o conceito de povo
como elemento constitutivo do Estado, bem ao lado do território e da soberania
e desta ainda tratando em sua obra intitulada "O que são direitos da
pessoa".
Adverte-se
ainda sobre o uso indiscriminado das noções de cidadania e nacionalidade,
habitualmente empregadas como sinônimas.
Tentando
estabelecer a especificidade de cada uma destas, concebe a nacionalidade como status
imutável, que, uma vez adquirido, não se modifica: A nacionalidade é definida
pelas condições em que a pessoa nasceu, e por isso nunca pode ser modificado.
Assim,
qualquer processo de naturalização não tem o condão de alterar a nacionalidade,
mas tão somente a cidadania. Já que a mudança trata apenas de condição
jurídica. Outra distinção conceitual relevante é baseada na possibilidade de
exercício dos direitos políticos e, incide na distinção entre cidadão simples e
cidadão ativo.
Cidadão
simples é aquele que tem a cidadania, mas que não preenche os requisitos legais
para exercer os direitos políticos. Portanto, o cidadão ativo é aquele que pode
exercer os direitos políticos. No sistema jurídico brasileiro é condição básica
para adquirir a cidadania ativa é de ter a idade de dezoito anos.
Paulo
Bonavides ao analisar os elementos constitutivos do Estado, apesar de
estabelecer os conceitos de povo do ponto de vista político e sociológico,
enfatiza o prisma jurídico por onde aborda a noção de cidadania: "Só o
direito pode explicar plenamente o conceito de povo.
Se há
um traço que o caracteriza esse traço é sobretudo jurídico (...) Com vinculadas
de forma institucional e estável a um determinado ordenamento jurídico, ou
segundo Raneletti, o conjunto de indivíduos que pertencem ao Estado, isto é, o
conjunto de cidadãos.
Afirma
Ospilati que povo é o conjunto de pessoas que pertencem ao Estado pela relação
de cidadania, ou na dicção de Virga, o conjunto de indivíduos vinculados pela
cidadania a um determinado ordenamento jurídico, é semelhante vínculo de
cidadania que prende os indivíduos ao Estado e os constitui como povo. (...)
Urge,
portanto, dar ênfase ao laço de cidadania, ao vínculo particular ou específico
que tanto une o indivíduo a um certo sistema de leis, a um determinado
ordenamento estatal.
De
qualquer maneira é um status que define o vínculo nacional da pessoa, os seus
direitos e deveres em presença do Estado e que, normalmente, acompanha o
indivíduo por toda a vida. Três sistemas determinam a cidadania, a saber: o jus
sanguinis (determinação pelo vínculo pessoal), jus soli (determina
pelo vínculo territorial) e o sistema misto (que admite ambos os vínculos).
Na
terminologia corrente do direito constitucional pátrio, ao invés da palavra
cidadania tem-se uma acepção mais restrita e, emprega-se, com o mesmo sentido,
o vocábulo "nacionalidade". A regulação consta no artigo 145 do atual
texto constitucional brasileiro que define quem é brasileiro e, por
conseguinte, quem constitui nosso povo.
Manoel
Gonçalves Ferreira Filho sustenta que a identificação entre a nacionalidade e
cidadania encontra fundamento na ausência de diferenciação em muitos
ordenamentos jurídicos. Onde o nacional e o cidadão são expressões que designam
pessoas com o mesmo status.
A
distinção surge e, se desenvolve, na medida em que admitido o indivíduo a
participar no governo, essa participação não foi aberta a todos, mas, somente à
parcela dos nacionais.
Dessa
distinção resulta o emprego do termo "cidadão" para designar quem
conta com direito a intervir no processo governamental, seja num regime
democrático, seja num regime oligárquico. Todavia, é alargamento difundido, no
Brasil, o uso da expressão "cidadão" para a designar todo e qualquer
nacional. Em realidade, se deve caracterizar a nacionalidade como um status cujo
conteúdo só se esclarece por contraposição ao de estrangeiro.
Assim,
a cidadania em sentido estrito é o status de nacional acrescido dos direitos
políticos (stricto sensu), isto é, o poder de participar do processo
governamental, sobretudo, pelo voto. Portanto, a nacionalidade no Direito
brasileiro é condição necessária, mas não a suficiente da cidadania.
Pode-se
cogitar em escalonamento da cidadania no direito pátrio em três gruas, a saber:
mínimo, médio e máximo. O primeiro, o grau mínimo, compreende a participação no
processo político, o acesso aos cargos públicos em geral e a elegibilidade
apenas para mandatos municipais. Gozam dessa mínima cidadania os brasileiros
natos entre 18 a 21 anos de idade que forem eleitores. A situação do brasileiro
naturalizado se inclui nesse grau mínimo.
O
segundo, o grau médio compreende mais a elegibilidade salvo para Câmara alta,
para a Presidência da República e, o acesso a certos cargos públicos. Gozam
desse status apenas os brasileiros natos, eleitores entre 21 a 35 anos, havendo
para os naturalizados as exceções previstas no artigo 145, parágrafo único do
CFRB/1988.
O
terceiro grau, o máximo, compreende a plena elegibilidade e pleno acesso aos
cargos públicos. Gozam desse status os brasileiros natos, eleitores,
maiores de 35 anos.
Celso Ribeiro
Bastos adverte que o nacional não deve ser confundido com o cidadão pois a
condição de nacional é pressuposto para a condição de cidadão, de tal forma
que, se todo cidadão é um nacional, nem todo nacional é necessariamente um
cidadão. O que confere esta última qualificação é o gozo de direitos políticos,
entendidos como aqueles que almejam assegurar ao cidadão ativo a participação
na vida política. Cidadão, pois, segue o doutrinador, é todo nacional na
fruição de seus direitos cívicos.
Se por
qualquer motivo não os tiver adquirido (por exemplo, em razão da idade), ou
ainda, já os tendo adquiridos venha a perdê-los, o nacional não é cidadão, na
acepção técnico-jurídica do termo.
Percebe-se
que a nacionalidade e a cidadania são construções do direito e, pela primeira,
este procura circunscrever no gênero humano os indivíduos que considera
integrantes do Estado por este regido.
E,
pela segunda, objetiva delimitar dentre estes últimos o número daqueles que
podem eficazmente fazer valer a sua vontade no processo político decisório do
Estado. Da mesma forma como são diversos os critérios pelos quais se pode
conferir a nacionalidade, também a cidadania poderá encontrar os mais
diferentes fundamentos para sua aquisição.
Mas,
os casos de perda de nacionalidade também se constituem em causas de perda da
cidadania, é que esta não pode subsistir sem aquela. Se por qualquer motivo não
os tiver adquirido (por exemplo, em razão da idade), ou ainda, já os tendo
adquiridos e, venha a perdê-los, o nacional não é cidadão, na acepção
técnico-jurídica do termo.
Percebe-se
que a nacionalidade e a cidadania são construções do direito e, pela primeira,
este procura circunscrever no gênero humano os indivíduos que considera
integrantes do Estado por este regido.
E,
pela segunda, objetiva delimitar dentre estes últimos o número daqueles que
podem eficazmente fazer valer a sua vontade no processo político decisório do
Estado. Da mesma forma como são diversos os critérios pelos quais se pode
conferir a nacionalidade, também a cidadania poderá encontrar os mais
diferentes fundamentos para sua aquisição.
Mas,
os casos de perda de nacionalidade também se constituem em causas de perda da
cidadania, é que esta não pode subsistir sem aquela.
Paulino
Jacques estabeleceu distinção entre nacionalidade, naturalidade e cidadania. In
litteris:
"
A nacionalidade é fenômeno políticos exprime a vinculação do indivíduo para com
a nação de que é súdito. A naturalidade, fenômeno sociológico, traduz o liame
do indivíduo à terra em que nasceu e adotou. A cidadania, fenômeno jurídica,
revela o status do indivíduo no Estado em que vive.
Todavia,
todos esses fenômenos têm seu conteúdo político, sua origem sociológica e sua
expressão jurídica, como manifestações que são da vida dos indivíduos em
sociedade. Constituem os vínculos que prendem irrevogavelmente ao Estado. Por
isso, afirma-se que o cidadão é o nacional titular de direitos políticos
(eleger e ser eleito), exercício de função ou múnus público, etc.); nacional, o
vinculado politicamente à nação, o qual pode não ser cidadão (os menores, os
loucos, os clérigos isentos do serviço público, os condenados durante os
efeitos da condenação e, etc.). O conceito de nacionalidade é mais amplo que o
de cidadania, da mesma forma que o conceito de naturalidade o é mais do que
nacionalidade".
O
saudoso Arthur Machado Paupério mantém a identificação entre cidadania e os
direitos políticos, ao afirmar que é "costume subdividir-se os direitos
públicos subjetivos em direitos políticos ou de cidadania e em Direitos civis.
Os primeiros conferem ao homem a faculdade de participar do governo do país.
Entre eles, estão o direito de voto e o de elegibilidade. Dão ao homem a
qualidade de cidadão.
Os
segundos, garantem-lhe certas concessões positivas por parte do Estado,
mesclando-se, muitas vezes, com os direitos privados. Via de regra, os direitos
políticos são os concedidos apenas aos nacionais.
Em
resumo, a distinção entre nacionalidade e cidadania, apesar de existente e
necessária, tal como é efetuada pela cultura jurídica dominante, carece de
significação, pois é intrassistêmica, na medida em que o status da
nacionalidade ou cidadania em sentido amplo é o mesmo.
Trata-se,
portanto, de uma disputa meramente conceitual que fornece o substrato para a
titularidade de direitos políticos. Nessa mesma perspectiva podem ser encaradas
as demais distinções e nomenclaturas propostas, tais como cidadania simples,
passiva, originária, naturalizada, adotiva e, etc., pois desenvolveu-se dentro
da mesma matriz analítica, não propõem enfoque diverso, mas conceitos
elucidativos ou instrumentais.
A
partir do primado da liberdade transita-se para o primado do valor da
igualdade, objetivando-se eliminar o frenético ritmo da exploração econômica.
O
Estado passa a ser encarado como agente de processos transformadores e o
direito à abstenção do Estado nesse sentido, converte-se em direito à atuação
estatal com a emergência dos direitos a prestações sociais.
A
Declaração dos Direitos do Povo Trabalhador e Explorado de 1918, bem como as Constituições
sociais do início do século XX. Como a Constituição de Weimar de 1919,
Constituição do México de 1917 e, etc., que primaram por conter discurso social
da cidadania, em que a igualdade era o direito basilar, contendo extenso rol de
direitos econômicos, sociais e culturais.
Ainda
esse contexto, a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948 produziu
inovação ao conter uma linguagem de direitos até então inédita. E, combinou o
discurso liberal da cidadania com o discurso social, e passou a elencar tantos
direitos civis e políticos, como direitos sociais, econômicos e culturais.
Não há
como cogitar da liberdade divorciada da justiça social, sendo infrutífero
pensar na justiça social divorciada da liberdade. Em síntese, todos os direitos
humanos constituem em complexo integral, único e indivisível, em que os
diferentes direitos estarão necessariamente interrelacionados e
interdependentes.
A
Resolução 32/130 da Assembleia-Geral das Nações Unidas estabeleceu
literalmente: “todos os direitos humanos, qualquer que seja o tipo a que
pertencem, se interrelacionam necessariamente, e são indivisíveis e
interdependentes”.
O que
foi reiterado pela Declaração de Viena de 1993. Portanto, os direitos humanos
são universais, inerentes à dignidade humana e não relativos às peculiaridades
sociais e culturais de determinada sociedade, seja por incluir não só os
direitos civis e políticos, mas também os direitos sociais, econômicos e
culturais.
A
concepção contemporânea de cidadania foi endossada pela Declaração de Direitos
Humanos de Viena de 1993. Um novo componente veio a integrar a concepção
contemporânea de cidadania, é o chamado de processo de especificação do sujeito
de direito.
E, que deixou de ser visto em sua abstração e generalidade e, passa a ser concebido em sua concretude, em suas peculiaridades. Por isso, cogita-se na tutela jurídica dos direitos das mulheres, crianças, minorias raciais, refugiados e, etc. Assim o indivíduo mais especificado em categorias tais como gênero, faixa etária, etnia, raça[10], religião, religião e, etc...
Observamos
a especificação do sujeito de direito conjugada com a indivisibilidade e
universalidade dos direitos humanos, o que dá contorno da cidadania
contemporânea.
E,
fazem proliferar os microssistemas jurídicos, como estatutos: ECA, do Idoso, do
Torcedor, da Pessoa com Deficiência e, etc.
A
Carta de 1988 empresta aos direitos e garantias a ênfase extraordinária, sendo
documento legal mais aperfeiçoado e detalhista sobre a matéria. Sendo o valor
da dignidade humana que se impõe como núcleo basilar e informador do
ordenamento jurídico brasileiro, tido como parâmetro de valoração capaz de
orientar a interpretação de todo o sistema constitucional brasileiro.
A
dignidade humana e os direitos fundamentais vêm constituir os princípios
constitucionais que incorporam a exigência da justiça e dos valores éticos,
conferindo suporte axiológico a todo sistema jurídico brasileiro. Os valores
ganham força expansiva, projetando-se por todo universo constitucional e
servindo de critério interpretativo de todo o ordenamento jurídico nacional.
Já
delineado o perfil do Estado, a responsabilização do Estado quanto à
indivisibilidade dos direitos humanos, com a aplicabilidade dos direitos e
garantias fundamentais, o que deve orientar os poderes públicos. Cabem a estes,
conferir a eficácia máxima e imediata a todo e qualquer preceito constitucional
definidor de direitos e garantias fundamentais.
Assim,
compete ao Legislativo, como destinatário das normas consagradoras de direitos
e garantias fundamentais: a) proceder em tempo razoável útil à sua
concretização, sempre que este seja necessária, para assegurar a exequibilidade
de normas, sob pena de inconstitucionalidade por omissão; b) concretização de
direitos por via legal, opera uma redução da força normativa imediata dessas
normas, trocando-a pela força normativa da lei; c) não emanar preceitos formal
e materialmente incompatíveis com essas normas.
Ao
Judiciário compete: a) interpretar os preceitos constitucionais consagradores
de direitos fundamentais, na sua aplicação em casos concretos, de acordo com o
princípio da efetividade ótima; b) densificar os preceitos constitucionais
consagradores de direitos fundamentais de forma a possibilitar a sua imediata
aplicação, nos casos de ausência de leis concretizadoras.
Quanto
à administração, incumbe-lhe relevante função de materialização dos direitos
fundamentais, no exercício de sua competência pacificadora, regulamentar,
fornecedora de prestações.
O
princípio da aplicabilidade imediata dos direitos e garantias constitucionais
intenta assegurar a força vinculante e, investe os Poderes Públicos da
atribuição de promover as condições para que sejam reais e efetivos.
No
tocante à universalidade dos direitos humanos a responsabilidade do Estado concentra-se
no desafio da extensão universal da cidadania sem qualquer discriminação.
Também assume a obrigação internacional assumida relativa aos direitos humanos
decorrentes de tratados e convenções internacionais ratificados pelo Brasil.
Há a responsabilidade do Estado na consolidação da cidadania, com vistas aos três essenciais elementos da cidadania plena, a saber: a indivisibilidade e a universalidade dos direitos humanos e o processo de especificação dos sujeitos de direito. Quanto ao derradeiro elemento destacam-se os programas[11] direcionados às crianças, adolescentes, idosos, deficientes físicos, sociedades indígenas, para a proteção do meio ambiente, à população adolescente, dentre outas categorias que são considerados socialmente vulneráveis.
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[1] A Comissão Nacional da Verdade (CNV), órgão temporário criado pela Lei 12.528, de 18 de novembro de 2011, encerrou suas atividades em 10 de dezembro de 2014, com a entrega de seu Relatório Final. Esta cópia do portal da CNV é mantida pelo Centro de Referência Memórias Reveladas, do Arquivo Nacional. Em suas conclusões, a comissão recomenda ao Estado brasileiro que as pessoas apontadas sejam responsabilizadas juridicamente – do ponto de vista civil, criminal e administrativo. O texto afirma que elas não podem ser beneficiadas pela Lei n.º 6683, de 1979, mais conhecida como Lei da Anistia.
[2]
O Fundo de Defesa de Direitos Difusos - FDD, criado pela Lei nº 7.347, de 24 de
julho de 1985, tem por finalidade a reparação dos danos causados ao meio
ambiente, ao consumidor, a bens e direitos de valor artístico, estético,
histórico, turístico, paisagístico, por infração à ordem econômica e a outros
interesses difusos e coletivos. O Conselho Federal Gestor do Fundo de Defesa
dos Direitos Difusos - CFDD, que analisa e aprova os projetos apresentados em
processos seletivos, é constituído por:
1. um representante da Secretaria Nacional do Consumidor - Senacon, do
Ministério da Justiça e Segurança Pública, que o presidirá; 2. um representante
do Ministério do Meio Ambiente; 3. um representante do Ministério da Cultura
(atual Ministério do Turismo); 4. um representante do Ministério da Saúde,
vinculado à área de vigilância sanitária; 5. um representante do Ministério da
Fazenda (atual Ministério da Economia); 6. um representante do Conselho
Administrativo de Defesa Econômica - CADE; 7. um representante do Ministério
Público Federal; e 8. três representantes de entidades civis.
[3]
Já se percebe que os direitos fundamentais na condição de direitos
constitucionalmente assegurados possuem uma abrangência em parte distinta dos
direitos humanos, seja qual for o critério justificador de tal noção, por mais
que exista uma maior ou menor convergência entre o catálogo constitucional dos
direitos fundamentais e o elenco de direitos humanos, convergência que será
maior quanto maior a sinergia com os níveis de positivação dos direitos humanos
na seara internacional. Para a compreensão adequada do que são, afinal de
contas, direitos fundamentais, não basta saber que se cuida de direitos assegurados
pela ordem constitucional de determinado Estado, pois tal circunstância, embora
essencial, por si só não é suficiente, ao menos de acordo com a evolução que
marcou o constitucionalismo do Segundo Pós-Guerra e da qual o modelo adotado
pelo nosso próprio constituinte de 1988 é tributário.
[4]
O disposto no artigo 19, II, da Lei Fundamental a lei poderá restringir os
direitos fundamentais desde que preserve o seu respectivo núcleo essencial, ou
seja, a restrição, embora legítima do ponto de vista constitucional, não
representa uma “carta em branco” para as instâncias legislativas. Mas também a
exigência de respeitar os requisitos das reservas legais e os critérios da
proporcionalidade, bem como a inclusão (ainda que não necessariamente integral,
na Alemanha) dos direitos fundamentais na esfera das assim chamadas “cláusulas
pétreas” da Constituição constituem mecanismos cujo escopo é reforçar a
proteção dos direitos fundamentais, seja mediante inclusão de tais garantias na
constituição escrita (formal), seja mediante construção jurisprudencial. A
“fórmula” germânica de fato, tudo somado, representou, um marco na trajetória
constitucional e levou à própria reconstrução e mesmo formatação do atual
conceito de direitos fundamentais, pois vincula a circunstância de se tratar de
um direito reconhecido (atribuído) pela ordem constitucional à existência de um
particular e sempre diferenciado regime jurídico que, ao fim e ao cabo,
simultaneamente assegura, de modo reforçado (qualificado) a normatividade e
proteção de tais direitos (precisamente por serem fundamentais do ponto de
vista material) mediante um conjunto de garantias constitucionais, expressas ou
mesmo implícitas, garantias que passam a integrar a própria noção de direitos
fundamentais.
[5] O Estado de bem-estar social, ou Estado-providência, ou Estado social, é um tipo de organização política, económica e sociocultural que coloca o Estado como agente da promoção social e organizador da economia. Nesta orientação, o Estado é o agente regulamentador de toda a vida e saúde social, política e económica do país, em parceria com empresas privadas e sindicatos, em níveis diferentes de acordo com o país em questão. Cabe, ao Estado de bem-estar social, garantir serviços públicos e proteção à população, provendo dignidade aos naturais da nação. O Estado de bem-estar social moderno nasceu na década de 1880, na Alemanha, com Otto von Bismarck, como alternativa ao liberalismo económico e ao socialismo. Pelos princípios do Estado de bem-estar social, todo indivíduo tem direito, desde seu nascimento até sua morte, a um conjunto de bens e serviços, que deveriam ter seu fornecimento garantido seja diretamente através do Estado ou indiretamente mediante seu poder de regulamentação sobre a sociedade civil. São as chamadas prestações positivas ou direitos de segunda geração, em que se inclui gratuidade e universalidade do acesso à educação, à assistência médica, ao auxílio ao desempregado, à aposentadoria, bem como à proteção maternal, à infantil e à senil.
[6]
O Consenso de Washington é o conjunto de dez políticas econômicas liberais que
passaram a ser sugeridas e aplicadas para acelerar o desenvolvimento de vários
países. Só na América Latina e Caribe 13 países seguiam as medidas, isso nos
anos 90. Entretanto, dependendo do local, algumas medidas eram mais favorecidas
que outras. O Consenso de Washington foi uma recomendação internacional
elaborada em 1989, que visava a propalar a conduta econômica neoliberal com a
intenção de combater as crises e misérias dos países subdesenvolvidos,
sobretudo os da América Latina. Sua elaboração ficou a cargo
do economista norte-americano John Williamson.
As ideias defendidas por Williamson ficaram conhecidas por terem se tornado a
base do neoliberalismo nos países subdesenvolvidos, uma vez que depois do
Consenso de Washington, os EUA e, posteriormente, o FMI adotaram as medidas
recomendadas como obrigatórias para fornecer ajuda aos países em crises e
negociar as dívidas externas.
[7] "O Neoliberalismo é uma doutrina socioeconômica que retoma os antigos ideais do liberalismo clássico ao preconizar a mínima intervenção do Estado na economia, através de sua retirada do mercado, que, em tese, autorregular-se-ia e regularia também a ordem econômica. Sua implantação pelos governos de vários países iniciou-se na década de 1970, como principal resposta à Crise do Petróleo. Os neoliberais combatem, principalmente, a política do Estado de Bem-Estar social, um dos preceitos básicos da social-democracia e um dos instrumentos utilizados pelo Keynesianismo para combater a crise econômica iniciada em 1929. Nessa política, apregoava-se a máxima intervenção do Estado na economia, fortalecendo as leis trabalhistas a fim de aumentar a potencialidade do mercado consumidor, o que contribuía para o escoamento das produções fabris."
[8]
(1936-2000) Foi jornalista econômico brasileiro. Atuou por quarenta e quatro
anos nas principais redações da imprensa brasileira. Trabalhou também na Gazeta
Mercantil, Jornal do Commercio (RJ), Diário do Comércio e Indústria (DCI-SP),
Correio da Manhã (RJ), Diário da Manhã (GO) e revistas Veja e Visão. No Diário
da Manhã, em Goiânia, trabalhou junto a Washington Novaes em um dos mais
interessantes e inovadores projetos do jornalismo brasileiro, ainda
desconhecido. Foi vencedor de dois Prêmio Esso. Em 1967, pela revista Visão, e
em 1970, pela Veja. Conforme escreveu o também jornalista Jânio de Freitas, em
artigo por ocasião da morte do colega "Biondi não frequentava ministérios,
bancos, gabinetes estatais, rodas de grandes empresários. E, no entanto, jamais
um jornalista soube de modo tão completo quanto ele, e duvido que algum dia
outro venha a saber, o sentido real, os pormenores e as consequências das
decisões econômicas e monetárias".
[9] É o desenvolvimento capaz de suprir as necessidades da geração atual, sem comprometer a capacidade de atender as necessidades das futuras gerações. É o desenvolvimento que não esgota os recursos para o futuro. Essa definição surgiu na Comissão Mundial sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, criada pelas Nações Unidas para discutir e propor meios de harmonizar dois objetivos: o desenvolvimento econômico e a conservação ambiental. "Desenvolvimento sustentável se refere a um modelo de desenvolvimento econômico, social e político que esteja em harmonia com o meio ambiente. Isso significa que é preciso fazer a utilização racional dos recursos naturais de forma que seja possível suprir as necessidades da sociedade atual, mas sem que haja o comprometimento da disponibilidade desses mesmos recursos para as gerações futuras. "
[10] Enquanto raça engloba características fenotípicas, como a cor da pele, a etnia também compreende fatores culturais, como a nacionalidade, afiliação tribal, religião, língua e as tradições de um determinado grupo. "Etnia" determina as características de um grupo por seus aspectos socioculturais, principalmente ligado a um território (um lugar). Já a “raça” é um conceito mais complexo. Definido inicialmente por critérios físicos ou biológicos para diferenciar os indivíduos, foi ressignificado por movimentos sociais para explicitar as desigualdades (raciais) existentes na sociedade. O conceito de raça surgiu para explicar as características físicas de uma pessoa, como estrutura óssea, cor da pele, do cabelo ou dos olhos e sua relação com características psicológicas, intelectuais e morais. Com o avanço das ciências, essa definição foi abandonada por falta de evidências que sustentassem essa categorização.