A Guerra da Ucrânia e os delitos internacionais
O ataque e invasão da Rússia ao seu vizinho, a Ucrânia e o redesenho de suas fronteiras é uma evidente violação da ordem internacional. E, o legado russo é aproximadamente quinze milhões de ucranianos que foram internamente deslocados ou vivem como refugiados[1]. A Rússia separou milhares de crianças de seus pais, saqueou e destruiu patrimônio cultural, infraestrutura, usinas de energia, cidades e agricultura na Ucrânia, devastando relevantes cadeias de suprimento de alimentos para a Europa. As consequências da agressão russa injustificada são devastadoras e causa aumento acentuado da insegurança alimentar, principalmente, aos mais vulneráveis do mundo.
O
atual Secretário-Geral da ONU afirmou; "Ninguém está a ganhar. Todos estão
a perder. E isso é absolutamente essencial para que eles (os envolvidos nos
conflitos) esqueçam as diferenças, as contradições de interesses, e possam
realmente pôr fim a essa trágica série de crises, violência e conflitos".
A
invasão da Ucrânia em meados de abril de 2022 ficou evidentes as implicações
que adviriam dos combates nas cidades resultando em óbitos, destruição,
potenciais desastres ambientais e que os civis sofreriam o forte impacto e as
piores consequências[2].
A guerra é entre dois Estados- Nações,
caracterizando, portanto, conflito armado internacional (CAI) independentemente
de haver uma declaração formal. Esse conceito também se aplica quando há a
ocupação militar de parte ou de todo um território por uma força estrangeira,
com ou sem resistência.
Duas
referências podem ser feitas com relação aos conflitos internacionais, a
primeira é a que os define como qualquer controvérsia que apareça entre dois
Estados e que leve à intervenção de Forças Armadas, mesmo que um dos envolvidos
negue a existencia do estado de guerra. Não importante qual seja o número total
de baixas ou feridos durante o conflito armado.
A
segunda referência que é a firmada pelo TPI, ou seja, Tribunal Penal
Internacional quando do julgamento de Dusko Tadic, da ex- Iugoslávia, que firmou,
in litteris: "(...) um conflito armado existe sempre que se fizer
presente o uso de forças armadas entre Estados (...)"Nessas últimas três
décadas como exemplos de CAI pode ser citados a Guerra do Golfo (1990-1991), do
Congo-Uganda, a Guerra da Etiópia-Eritreia (1998-2000), o conflito de Kosovo de
1999, a Guerra do Afeganistão, a Guerra do Iraque, o conflito Israel-Líbano de
2006, o conflito Etiópia-Somália (2006-2009) e o conflito Rússia-Geórgia de
2008.
Questiona-se
qual seria o direito regulador por meio de regras de um CAI e, quais seriam os
pontos cruciais a serem esclarecidos. Os
conflitos armados de acordo com o direito internacional público, são concebidos
através de duas diferentes visões, a saber: o jus ad bellum
(direito do uso da força) e o jus in bello (direito na guerra). E, os
dois termos ganharam destaque particularmente após a Segurança Guerra Mundial.
O jus
ad bellum regula os motivos legais para participação em conflitos armados;
descreve as circunstâncias no qual seria justificado ao Estado usar a força
contra o outro. É o famélico conceito de guerra justa[3], sendo regulado pela Carta
das Nações Unidas.
Já o jus
in bello, a seu turno, gera a condução das hostilidades e oferece proteção
ao longo de embates bélicos. Sendo norteado particularmente pelo Direito Internacional
Humanitário (DIH).
Em
resumo, o jus ad bellum refere-se às condições sob as quais alguém pode
recorrer à guerra ou ao uso da força em geral. O jus in bello administra
a conduta dos beligerantes durante a contenda, e, lato sensu, compreende
os direitos e as obrigações das partes na condução das hostilidades.
De
acordo com o discurso proferido pelo Presidente da Federação Russa, Vladimir
Putin, em 24.02.20233, quando comunicou ao mundo que havia ordenado a invasão
do território ucraniano, não deixa dúvidas de operação militar especial, como
ele chamou a intervenção, é, em verdade, uma declaração de guerra contra seu
vizinho.
Putin
tratou de justificar o ato nos artigos constantes da Carta da ONU de 1945 e, os
argumentos jus ad bellum da Rússia baseiam-se no direito à legítima
defesa de acordo o artigo 51 da referida Carta. In litteris:
ARTIGO 51 - Nada na presente Carta
prejudicará o direito inerente de legítima defesa individual ou coletiva no
caso de ocorrer um ataque armado contra um Membro das Nações Unidas, até que o Conselho
de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da paz e da
segurança internacionais. As medidas tomadas pelos Membros no exercício desse
direito de legítima defesa serão comunicadas imediatamente ao Conselho de
Segurança e não deverão, de modo algum, atingir a autoridade e a
responsabilidade que a presente Carta atribui ao Conselho para levar a efeito,
em qualquer tempo, a ação que julgar necessária à manutenção ou ao
restabelecimento da paz e da segurança internacionais.
A fim
de confirmá-la, Moscou enviou ao Conselho de Segurança da ONU as justificativas
com objetivo de cumprir o requisito, fundado no documento retromencionado. E,
sem embargo, a erronia da narrativa de Putin, é a chamada Defesa Coletiva,
segundo a qual as operações russas que visavam proteger as Repúblicas populares
de Luhansk e Donetsk, com as quais a Rússia possui um tratado de assistência
militar mútua[4].
E, a
questão colocada é, portanto, inquirir se Luhansk e Donetsk constituem, de
fato, Estados soberanos, porquanto acordo com a comunidade internacional, as
duas regiões integram o território ucraniano e, o status de Estados
independentes restou reconhecido, apenas pelos russos em suas alegações.
Ainda
que os referidos Estados fossem considerados soberanos, a ação russa foi
deflagrada sob o argumento da legítima defesa coletiva não satisfaz os dois critérios
universalmente aceitos, quais sejam: a necessidade e a proporcionalidade[5].
E,
assim, pressupõem que a resposta a um ataque armado deve refletir o alcance, a
natureza e a gravidade do próprio ataque, logo a proporcionalidade devendo ser
descartada, bem como o uso de medidas exageradas e desnecessárias em resposta a
um ataque armado.
Ademais,
a motivação de a Ucrânia pretender ingressar na OTAN, propiciando assim aliança
militar considerada hostil na fronteira russa, não procede, na medida em que,
na época da invasão, ela não se concretizara e, consequentemente, não se
materializara uma ameaça imediata, razão pela qual, sob a luz do jus ad bellum,
o uso da força extrema pela Federação Russa contra a Ucrânia[6] configura um flagrante
violação do direito internacional.
Paralelamente,
ao jus ad bellum, que torna a invasão em si legal, as imagens das
cidades destruídas e o genocídio crescente de civis inocentes que trouxe preocupações
relevantes com respeito ao jus in bello, a traduzir-se no ramo do direito
internacional que regula a forma como a guerra é conduzida.
Está-se
diante de um corpo de leis conhecido como Direito Internacional Humanitário
(DIH) ou Direito da Guerra que norteia a condução de conflitos armados,
protegendo assim a população civil, os feridos e os prisioneiros de guerra[7]. E, se aplica tanto na
Rússia como na Ucrânia.
O
Direito Internacional Humanitário tem por escopo controlar as relações entre os
Estados, as organizações internacionais, bem assim os demais assuntos
relacionados ao Direito Internacional.
É um ramo
do Direito Internacional Público que normatiza regras destinadas a resguardarem
as pessoas que não participam diretamente das hostilidades, restringindo os
meios e os métodos de guerra utilizados.
Pode-se
afirmar que o Direito Internacional Humanitário abarca os tratados
internacionais e as normas consuetudinárias que se destinam a solver questões
humanitárias oriundas de conflitos armados, sejam de caráter internacional ou
não.
Tais
normas limitam a ação dos beligerantes para que não inflijam danos desproporcionais
aos seus adversários e existem desde os tempos antigos, em quase todas as
civilizações.
São
leis concernentes à proteção de certas classes de pessoas durante as
hostilidades, como mulheres, crianças, idosos, combatentes desarmados e
prisioneiros de guerra; proteção estendida aos alvos sem importância bélica, a
exemplo dos templos religiosos, das escolas e dos hospitais, e que vedam,
outrossim, a utilização de armas biológicas.
Jean-Jacques
Rousseau sintetizou a necessidade da existência de um ramo do Direito
preocupado com o comportamento dos participantes dos conflitos.
Sendo
a guerra uma relação de Estado para Estado, na qual os particulares apenas
acidentalmente são inimigos, não na qualidade humana, nem mesmo como cidadãos,
mas sim, como soldados, não como membros da pátria, mas como seus defensores.
Assim,
cada Estado não pode ter como inimigo senão o outro Estado, nunca homens,
entendido que entre coisas de natureza diversas é impossível fixar uma verdadeira
relação.
O
objetivo principal não visa à destruição física do oponente, diferenciando
combatentes e cidadãos de um Estado inimigo, os civis não lutadores, sendo a
finalidade de guerra vencer as forças armadas inimigas e não a destruição da
nação oponente. Tal como colocado, o uso da força há de ser destinado apenas,
contra aqueles que oferecem resistência. O soldado que se rende ou é ferido não
pode ser considerado como inimigo pessoal, responsável pelo conflito.
Busca-se
civilizar a guerra, exsurge assim a relevância da diferenciação entre o
princípio da necessidade militar e o princípio da humanidade. A necessidade
militar autoriza, tão apenas, o grau e o tipo de força mandatórios para galgar
o propósito legítimo de um conflito, isto é, a submissão total ou parcial do
inimigo o mais cedo possível, com o mínimo de gasto de vidas e recursos.
E,
assim, o princípio da humanidade veda sofrimentos, lesão ou destruição
desnecessários para o alcance do legítimo propósito das hostilidades.
É
missão difícil e delicada a manutenção esse equilíbrio, particularmente,
considerando-se que os conflitos armados contemporâneos estão marcados por
significativa mudança das técnicas de guerras, que refogem as vetustas
definições tradicionais e das categorias sobre as quais a ordem normativa do
DIH foi construído e sob o qual sua funcionalidade depende na prática
operacional.
Frise-se
ainda, a ascensão de grupos organizados e armados que operam clandestinamente
operando a terceirização das funções militares tradicionais para contratantes
privados e inteligência civil pessoal, como também a tendência geral de aumento
do envolvimento de civis em operações militares e pessoas protegidas contra os
ataques diretos.
O
resultado é civil mais tendentes a serem vítimas de erros ou segmentação
arbitrária, enquanto as forças armadas são incapazes de identificar seus reais
adversários e se arriscam a serem atacadas por pessoas que não conseguem
diferenciar.
Sublinhe-se
que o objetivo primordial do Direito Internacional Humanitário é proteger as
vítimas e regular a conduta da luta com base no equilíbrio existente entre a
necessidade militar e a humanidade que esbarra em inéditas conjunturas que só
surgiram depois o segundo quartel do século passado.
O
Direito Internacional Humanitário é um conjunto de normas que procura limitar
os efeitos de conflitos armados. Protege as pessoas que não participam ou que
deixaram de participar nas hostilidades, e restringe os meios e métodos de
combate. O Direito Internacional Humanitário (“DIH”) é também designado por
“Direito da Guerra e por Direito dos Conflitos Armados”
Para
Nils Melzer, da Organização das Nações Unidas: “O DIH é um conjunto de normas
que procura limitar as consequências humanitárias dos conflitos armados. Às
vezes também é conhecido como o direito do conflito armado ou normas da guerra (jus
in bello).
O
principal objetivo do DIH é restringir os meios e métodos de guerra que as
partes em conflito podem usar e garantir a proteção e o tratamento humano das
pessoas que não participam ou que deixaram de participar diretamente das
hostilidades.
Em
poucas palavras, o DIH inclui as normas do direito internacional que
estabelecem normas mínimas de humanidade que devem ser respeitadas em qualquer
situação de conflito armado”.
O denominador
comum é compreender o DIH e as normas do Direito Internacional que estabelecem
o mínimo de humanidade que deve ser respeitada em situações de conflitos.
Destaque-se
ainda que as regras humanitárias aplicáveis às guerras podem ser rastreadas
desde a Antiguidade, contudo, somente no século XIX, o DIH teve seu marco
regulatório inicial estabelecido, nomeadamente, após a Batalha de Solferino[8] de 1859, travada entre os
austríacos e as forças franco-italianas, cujo resultado fora uma carnificina
totalizando cerca de seis mil soldados mortos e trinta e seis mil feridos de
ambos os lados, deixados sem a assistência e indo a óbito por ausência de
atendimento médico imediato, ao lado de corpos insepultos.
Dunant
descreveu suas experiências em um livro intitulado “Lembrança de Solferino”. A
obra, publicada em 1862, teve um impacto notável em toda a Europa, sobretudo,
no interior do círculo de pessoas que poderiam modificar significativamente a
situação existente.
Dunant
propugnava, em seus escritos, a adoção de medidas minimizadoras do sofrimento
dos combatentes, assim sintetizadas: criar em todos os países “sociedades
voluntárias de socorro com o propósito de garantir que os feridos em períodos
de guerra sejam assistidos” e, [...], formular um “princípio internacional,
sancionado por uma Convenção de caráter inviolável”, que serviria como base e apoio
para as sociedades de socorro.
Um
Comitê Particular, conhecido como Comitê dos Cinco, organizou uma conferência
em Genebra, para onde dezesseis países enviaram representantes. A conferência
recomendou o estabelecimento de sociedades nacionais de socorro, e solicitou
aos governos que lhes dessem proteção e apoio.
Para
além, a Conferência expressou o desejo de que, em períodos de guerra, as partes
beligerantes declarassem neutras as instalações hospitalares e ampliassem este
tipo de resguardo às equipes médicas militares, aos socorristas voluntários e
aos próprios feridos.
Em 1864,
protagonizou-se uma Conferência Diplomática em Genebra, com plenipotenciários
dos dezesseis países participantes, que esboçou a “Convenção de Genebra para a
Melhoria da Condição dos Feridos dos Exércitos em Campanha”, assinada em 22 de agosto
daquele ano, e ratificada por quase todos os Estados nos anos seguintes.
A Convenção
formalizou as recomendações da Conferência de 1863 e declarou o princípio de
que os soldados feridos e doentes devessem ser recolhidos e tratados sem
distinção de nacionalidade. O Documento ficou conhecido como a Primeira
Convenção de Genebra, tratado revisado, modificado e ampliado várias vezes, em
especial, nos anos de 1906, 1929, 1949 e 1977.
As
Convenções de Genebra de 1949 totalizam quatro tratados internacionais
ratificados por 196 estados, incluindo todos os membros das Nações Unidas.
Outrossim, dois protocolos adicionais (I e II) em 1977 e um protocolo adicional
em 2005 (III) foram aprazados. Tais diplomas advieram da Conferência de
diplomatas de todo o mundo em 1949, fundada em tratados de conflitos
anteriores, com o fito de regular pugnas bélicas, proteger os não combatentes e
minimizar a perda de vidas.
O
conjunto consolida o princípio fundamental do Direito Internacional Humanitário
(DIH) e, desde 2000, a ratificação adicional às Convenções de Genebra elevou-o
à categoria de leis internacionais de aplicação universal. Isso significa não
mais procederem as assertivas dos Estados de não se sujeitarem a elas, sabido
constituírem o âmago do direito consuetudinário internacional.
Convenção
I
A
Primeira Convenção de Genebra para a Melhoria da Condição dos Feridos nos
Exércitos no Campo, pactuada em 22 de agosto de 1864, é o primeiro dos quatro
tratados. Ela define “a base sobre a qual repousam as regras do direito internacional
para a proteção das vítimas de conflitos armados”. Depois da adoção do primeiro
tratado em 1864, ela foi significativamente revisada e substituída em 1906,
1929 e, finalmente, em 1949. Está
intrinsicamente vinculada ao Comitê Internacional da Cruz Vermelha, que é tanto
o instigador para o início quanto o aplicador dos artigos convencionais.
Convenção
II
A
Segunda Convenção de Genebra para a Melhoria da Condição de Membros Feridos,
Doentes e Náufragos das Forças Armadas no Mar foi adotada pela primeira vez em
1949 e substituiu a Convenção de Haia de 1907. Ela adapta o principal regime de
proteção da Primeira Convenção de Genebra para o combate no mar.
Convenção
III
A
Terceira Convenção de Genebra, relativa ao tratamento de prisioneiros de
guerra, foi ratificada em 1929, mas foi significativamente revisada na
Conferência de 1949. Tem por escopo definir a proteção humanitária para os
prisioneiros de guerra.
Convenção
IV
A
Convenção de Genebra relativa à Proteção de Pessoas Civis em Tempo de Guerra,
mais comumente referida como a Quarta Convenção e abreviada como GCIV, foi
adotada em agosto de 1950. Embora as três primeiras convenções tratassem de combatentes,
a Quarta foi a primeira a versar sobre a proteção humanitária de civis em zonas
de guerra. Atualmente, cento e noventa e seis países são signatários das
Convenções de Genebra de 1949 na sua totalidade.
Acordo
destacado, no ano de 1977 dois protocolos adicionais foram acrescidos à Quarta
Convenção relativos ao “Uso hostil de técnicas ambientais”, estendendo as
proteções de todas as convenções às guerras civis.
O
Protocolo I de Proteção das Vítimas de Conflitos Armados Internacionais
elastece as garantias às vítimas de guerras contra regimes racistas, guerras de
autodeterminação e contra opressão estrangeira, para além de estabelecer que os
métodos e meios de combate não são ilimitados, e proibir a utilização de armas,
projéteis ou qualquer outro dispositivo que causem sofrimentos supérfluos. O
Protocolo II versa sobre a Proteção de Vítimas de Conflitos Armados Não
Internacionais.
Lastimável,
porém, que a maioria das ações bélicas posteriores à Segunda Guerra Mundial
foram de caráter não internacional, donde se conclui que, hodiernamente, as
Convenções de Genebra de 1949 restam insuficientes para amparar as populações
envolvidas. Interessante notar que o Protocolo II não limita a ação dos Estados
na manutenção ou no restabelecimento da ordem pública sobre o seu território,
outrossim, não reconhece o estatuto dos rebeldes.
As
fontes do DIH tidas como a genealogia das Ciências Jurídicas que se subdivide
em material, onde o direito se cria, e a formal, a maneira pela qual é
aplicado.
Sintetizando,
o direito internacional humanitário – jus in bellum – aplica-se às situações de
conflitos armados com o fito de proteger e assistir as vítimas, a fim de
minorar os sofrimentos provocados pelas conflagrações bélicas. Objetiva
disciplinar a mais trágica e excepcional das circunstâncias: a guerra. Pretende
restringir os meios e métodos de combate e proteger os envolvidos no cenário de
hostilidade, salvaguardando civis e militares em poder do inimigo.
À evidência
houve um grande impulso na evolução dos Direitos Humanos e do Direito Internacional
Humanitário. O seu estabelecimento deveu-se a uma conjunção de recentes particularidades históricas, dentre as quais
se ressaltam o término da guerra fria que tornou menos rígidos os alinhamentos ideológicos que
bloqueavam a evolução do direito internacional nessa direção; a globalização e
a interdependência que acentuaram a necessidade de maior coordenação e normatividade em diversas áreas
das relações internacionais; as tendências de fragmentação dos Estados ocorridas no final do
séc. XX, que ocasionaram a irrupção de conflitos étnicos, raciais e religiosos
nos quais ocorreram catástrofes humanitárias que puseram em risco a paz e a segurança mundial, fatos estes que
reforçaram a opinião dos atores internacionais acerca da necessidade de reais sanções do Direito
Internacional nesta esfera. Nesse sentido, a tendência do DIH é avançar cada
vez mais, para tornar-se um referencial ético de proteção à pessoa humana.
No
caso do Direito Internacional obras diversas a elas se referem. Um exemplo que
condensa os conceitos está insculpido no art. 38 do Estatuto da Corte
Internacional de Justiça das Nações Unidas, o qual estabelece como fontes de
direito internacional os tratados, o costume internacional, os princípios
gerais de direito, as decisões judiciais e a doutrina de juristas renomados.
As
fontes do DIH são as mesmas de outros ramos do Direito Internacional Público,
embora alguns fenômenos sejam catalogados diferentemente. Os Tratados
Internacionais são os primeiros e os mais importantes mananciais do DIH. Nos
textos dos Tratados, Convenções ou Acordos Internacionais estão expressos de
modo claro o consentimento firmado pelos Estados como criadores das normas
jurídicas exógenas.
Conquanto
existam tratados bilaterais ou multilaterais, os de maior relevância são os
normativos, denominados de Convenção ou Convenções, sem olvidar os Protocolos
destinados a complementá-los e de eficácia idêntica à dos primeiros.
Já
quanto às fontes consuetudinárias, que possui proeminência significativa do
costume que aliás, é a origem comum de muitas normas do DIH.
A lei
consuetudinária é indispensável, por abarcar questões não regulamentadas pelos
tratados, nas relações entre os Estados partes com aqueles que não possuem tal
status. Ela deriva da “uma prática geral aceita como lei” na Comunidade das
Nações. Para a identificação de determinada norma ser ou não costumeira, impõe
estar ela refletida nas práticas dos Estados, segundo as quais a comunidade
internacional entende serem necessárias por questões jurídicas.
Registra-se
recentemente o renascimento surpreendente nos derradeiros anos. Na Genebra de
1993, a Conferência Internacional para a Proteção das Vítimas de Guerra
discutiu, entre outros temas, as formas e os meios para combater as violações
do DIH, sem, no entanto, sugerir a adoção de novos tratados.
Sem
embargo, em sua Declaração Final, adotada por consenso, a Conferência propôs a
convocação de um grupo de especialistas para elaborar regras disciplinadoras do
DIH. Tal estudo deveria ser apresentado na próxima sessão da Conferência
Internacional da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.
O CICV
encarregou dois membros de sua Divisão Jurídica de realizarem-no e, sob a
orientação de um Comitê Diretor composto por doze especialistas de renome, o
CICV desencadeou uma consulta em larga escala, envolvendo mais de cem
autoridades eminentes.
A
finalidade das análises foi identificar o direito costumeiro com vistas a
esclarecer a proteção jurídica concedida às vítimas da guerra. Cento e sessenta
e uma normas do DIH consuetudinário foram identificadas e constituem,
atualmente, o núcleo comum do direito humanitário vinculante nos conflitos
armados.
Elas fortalecem
o resguardo das vítimas das guerras em todo o mundo e restam publicadas em dois
volumes pelo Comitê Internacional da Cruz Vermelha, servindo de subsídio para a
elaboração de tratados e convenções.
Em
verdade, as normas consuetudinárias tornaram-se essenciais para a consolidação
do DIH e, assim há quatro fores confirmatórios, a saber: i) as lacunas
existentes devido à ausência dos tratados poderem ser supridas pelo direito
consuetudinário; ii) a vinculação das partes não signatárias que estejam
envolvidas no conflito; iii) em caso de reservas ao documento internacional, o
direito consuetudinário tem o poder de eliminar as objeções e, alfim, iv) os
tribunais penais internacionais quando julgam delitos preferem aplicar as
regras costumeiras.
A
utilização dos princípios gerais do direito também é reconhecida pelas nações
civilizadas como fonte do DHI. Na doutrina do Professor Paulo Bonavides, os
princípios nada mais são do que uma fonte primária do Direito.
O DIH
também encontra suporta na jurisprudência dos tribunais e na doutrina dos
juristas proeminentes.
A
jurisprudência internacional oficial é produzida pela Corte Internacional de
Justiça da ONU e fornecem subsídios relevantes sobre as normas externas
emergentes. Pontuem--se que os julgamentos não aceitos por um Estado por um
Estado em disputa, mas cuja decisão da Corte externa é reconhecida como
vinculativa, a exemplo do caso Nicarágua versus EUA.
Quanto
aos princípios do DIH constituem a fonte primária e fundamentam a conduta que
deverá ser adotada em todos os tipos de conflitos armados.
E,
tais postulados são conhecidos por diversas nomenclaturas e podem ser
sintetizados nos seguintes: princípio da
humanidade, princípio da necessidade militar, princípio da proporcionalidade,
princípio da limitação e princípio da distinção. Por partes.
O
princípio da humanidade é bem definido no artigo 27º da 4.ª Convenção de
Genebra, in verbis:
Artigo 27.º: As pessoas
protegidas têm direito, em todas as circunstâncias, ao respeito da sua pessoa,
da sua honra, dos seus direitos de família, das suas convicções e práticas
religiosas, dos seus hábitos e costumes. Serão tratadas, sempre, com humanidade
e protegidas especialmente contra todos os atos de violência ou de intimidação,
contra os insultos e a curiosidade pública.
As
mulheres serão especialmente protegidas contra qualquer ataque à sua honra, e
particularmente contra violação, prostituição forçada ou qualquer forma de
atentado ao seu pudor.
Sem
prejuízo das disposições relativas ao seu estado de saúde, idade e sexo, todas
as pessoas protegidas serão tratadas pela Parte no conflito em poder de quem se
encontrem com a mesma consideração, sem qualquer distinção desfavorável,
especialmente de raça, religião ou opiniões políticas.
Contudo,
as partes no conflito poderão tomar, a respeito das pessoas protegidas, as
medidas de fiscalização ou de segurança que sejam necessárias devido à guerra.
Como
foco principal proteger, na totalidade, os seres humanos envolvidos em
conflitos armados, resguardando a vida, a saúde e aliviando os inevitáveis
sofrimentos.
Um dos
preceitos do DIH que o reforçam é a chamada Cláusula de Martens, introduzida
pela primeira vez na Convenção de Haia de 1899, e em uso, incluída que foi pelo
artigo 1 (2) do Protocolo Adicional I:
Nos
casos não cobertos por este Protocolo ou por outros acordos internacionais,
civis e combatentes permanecem sob a proteção e autoridade dos princípios do
direito internacional derivados do costume estabelecido, dos princípios de
humanidade e dos ditames das consciências públicas.
Princípio
da Necessidade Militar também chamado apenas de princípio da necessidade, disciplina
a incursão militar a um alvo ou objetivo. Assim, um ataque de natureza
estritamente bélica não poderá ocorrer se causar a ocorrência de eventos
prejudiciais a qualquer ser humano não envolvido no embate.
Sua
previsão consta do art.º 57º do Protocolo I Adicional às Convenções de Genebra,
1977 (PA I).
Leia-se:
Artigo 57º: Precauções no ataque - 1 - As
operações militares devem ser conduzidas procurando constantemente poupar a população
civil, as pessoas civis e os bens de caráter civil.
Ainda,
o seu item 3: Quando for possível escolher entre vários objetivos militares para
obter uma vantagem militar equivalente, a escolha deverá recair sobre o
objetivo cujo ataque seja susceptível de apresentar o menor perigo para as
pessoas civis ou para os bens de caráter civil.
O
postulado articula com as discordâncias da dificuldade de reconhecimento do que
seja um alvo militar. César Krieger (2004) sobreleva os desacordos acerca da
fixação exata de alvo militar, já que podem apresentar natureza civil, como
estações de trem, portos, emissoras de televisão, etc.
O
princípio da proporcionalidade regra os limites para a aplicação da violência
pelos militares com objetivos de natureza bélica. Sua base funda-se no art.º
51.º (5b) do Protocolo I Adicional às Convenções de Genebra, 1977 (PA I)34, que
limita:
Os
ataques que se possa esperar venham a causar incidentalmente perda de vidas
humanas na população civil, ferimentos nas pessoas civis, danos nos bens de
caráter civil ou uma combinação destas perdas e danos, que seriam excessivos
relativamente à vantagem militar concreta e direta esperada.
Desde
de sua adoção, tal postulado provocou muitas divergências e discordâncias.
Na Conferência Diplomática que levou à adoção
dos Protocolos Adicionais, a França votou contra o artigo 51 porque considerou
que o parágrafo 5, por sua “própria complexidade, dificultaria seriamente a
condução de operações militares defensivas contra um invasor e prejudicaria o
direito inerente de legítima defesa”.
Após a
ratificação do Protocolo Adicional I, ela não colocou nenhuma reserva. Muitos
Estados Nacionais adotaram-no, uma vez que a legislação internacional,
criminaliza ataques violadores da proporcionalidade.
O
princípio da limitação pode ser considerado como um dos pilares da aplicação do
DIH por restringir os meios e métodos utilizados nos combates e conflitos
armados que, por óbvio, não podem e nem devem ser ilimitados.
A
limitação, por igual, obsta a destruição de alvos não militares, conforme
preconiza o art. 52, (proteção geral dos bens de caráter civil) nº 2 PA I, de
1949:
Os ataques devem ser estritamente
limitados aos objetivos militares. No que respeita aos bens, os objetivos
militares são limitados aos que, pela sua natureza, localização, destino ou utilização
contribuam efetivamente para a ação militar e cuja destruição total ou parcial,
captura ou neutralização ofereça, na ocorrência, uma vantagem militar precisa.
Das
treze Convenções da Haia (1907), restam, ainda hoje, normas restritivas da
liberdade de ação dos beligerantes, extremamente úteis no quadro dos conflitos
armados que desafiam o ideal pacifista das Nações Unidas.
Na
doutrina de Rezek, a elas se agregam em três nortes básicos: o ratione
personae, segundo o qual os não combatentes serão poupados de qualquer
ataque ou dano intencional; o ratione loci, que fixa serem os lugares de
ataque somente os configurados como militares e o ratione conditionis, que
veda a utilização de armamentos e métodos de guerra que causem sofrimento excessivo
aos combatentes inimigos.
O
princípio da distinção, no tocante a necessidade de estabelecimento da
diferenciação de quem pode ser atacado ou de quem necessita proteção. Todos
aqueles diretamente envolvidos no conflito armado podem ser alvos de ataques,
mas os civis que dele não participam devem ser preservados.
A fim
de garantir o respeito e a proteção da população civil e da população civil
objetos, as Partes no conflito devem sempre distinguir entre a população civil
e os combatentes e entre os objetos civis e os objetivos militares e, portanto,
devem dirigir suas operações apenas contra objetivos militares.
Evidente
está deixar a regra geral lacunas e não fornecer orientação precisa que
autorize diferençar os objetivos que podem ou não ser alvo de ataques.
Contudo,
as determinações do DIH resguardam dos ataques diretos várias categorias de
pessoas, a saber: civis, pessoal médico, religiosos, jornalistas, participantes
em missões de paz, prisioneiros de guerra, feridos e doentes.
Há
nítida relação entre o Direito Internacional dos Direitos Humanos (DIDH) e
Direito Internacional Humanitário (DIH) tenham sido desenvolvidos a partir de
diferentes fontes, indubitável ambos se complementarem.
O DIH
é a primeira fonte que rege os conflitos armados internacionais ou não
internacionais. Como nem todas as facetas de tais contendas são albergadas pelo
DIH e considerando-se que muitos, mas não todos, dos valores protegidos são
igualmente protegidos pelas Leis do Direito Internacional dos Direitos Humanos
(DIDH), é possível aplicá-los simultaneamente.
Atente-se
não ser a generalização restrita, pois, acorde o princípio da lex special is generali
us derroga, a precedência deve ser do DIH. Mas, o tema não guarda unanimidade.
Exemplificativamente:
ao lidar com situações envolvendo a conduta em hostilidades, a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos vale-se do conteúdo da lei de direitos
humanos por referência expressa às regras e princípios do DIH, enquanto o
Tribunal Europeu dos Direitos do Homem, decide, exclusivamente, com base no direito
dos direitos humanos.
Os
documentos internacionais do DIDH e do DIH é mostrada:
TRATADOS
Tratados
universais de direitos humanos.
Tratados
Regionais de Direitos Humanos.
Organismos
internacionais de supervisão.
Organismos
regionais de supervisão.
Órgãos judiciais internos.
Convenções
de Genebra e seus protocolos adicionais.
Convenção
das Nações Unidas de 1980.
Estatuto
do Tribunal Penal Internacional.
Tratado
de Roma.
Legislação penal interna.
Em
termos geográficos, o DIH aplica-se, tanto aos locais onde ocorrem os combates
ou as hostilidades armadas quanto em sítios nos quais, embora não tenha havido
um confronto bélico material, tenham ocorrido atos intimamente relacionados aos
embates.
A jurisprudência
internacional referenda que, para fins geográficos de aplicação do DIH, “não é
necessário provar que houve um conflito armado em cada centímetro quadrado da
área geral. O estado de conflito armado não se limita a áreas de combate
militar efetivo, mas em todo o território sob o controle das partes na guerra”.
Finalmente,
em termos materiais, a fim de que situação específica onde não combate armado
esteja coberta pelo DIH, mister tal evento restar intimamente relacionado ao
conflito.
E, ao
determiná-la, os tribunais internacionais devem considerar fatores como o
conflito armado não precisar ter sido causador do crime, mas a existência de
ele dever, no mínimo, ter desempenhado um papel substancial na capacidade do
perpetrador de cometê-lo, sua decisão, a forma como foi desfechado ou o
propósito para o qual foi perpetrado.
Os
desafios enfrentados pelo DIH na atual conjuntura, em particular nos conflitos
armados de natureza não internacional, terrorismo, prisões indevidas com
torturas, conduta de hostilidades, ocupação e sanções é e será sempre
resguardar civis, doentes, feridos, mulheres, crianças, dentre os demais vulneráveis.
Cumpre
abordar a Guerra da Rússia contra a Ucrânia[9] desde o início das
hostilidades, os diversos meios de comunicação denunciaram crimes de guerra
cometidos pelas forças russas.
A
principal acusação gira em torno do descumprimento do princípio da distinção.
Conforme o Protocolo I das Convenções de Genebra46, as partes em conflito devem
distinguir os combatentes da população desarmada, além dos objetivos militares
e os bens civis.
O art.
51 é claro ao estabelecer que: “Não serão objeto de ataque a população civil
como tal e nem as pessoas civis. São proibidos os atos ou ameaças de violência
cuja finalidade principal seja aterrorizar a população civil.”
No
tocante aos objetivos militares e os bens civis, o art. 52 (1) esclarece: “Os
bens de caráter civil não serão objeto de ataques nem de represália. São bens
de caráter civil todos os bens que não são objetivos militares como definido no
parágrafo”.
Adicione-se
ao princípio da distinção o princípio da proporcionalidade disposto no
Protocolo no art. 51(1)(b), ao vedar “os ataques quando se pode prever que
causarão incidentalmente mortos e ferimentos entre a população civil, ou danos
a bens de caráter civil, ou ambas as coisas, e que seriam excessivos em relação
a vantagem militar concreta e diretamente prevista.” Um adendo à
proporcionalidade é a determinação dirigida aos conflitantes para adotarem
medidas cautelares na escolha de seus alvos, conforme dispõe o art.57(2)(a)(ii)
Outra
vulneração que chama a atenção da opinião pública mundial foi a comunicação
oficial do Presidente Joe Biden dos Estados Unidos, de estarem os russos cometendo
crimes de guerra e de o Presidente Putin dever ser julgado em virtude de tais
delitos.
Convém
ressaltar que nem toda violação ao Direito Internacional Humanitário configura
crime de guerra, tão só os abusos mais graves darão origem à responsabilidade criminal
do perpetrador individual.
Os
crimes desta natureza encontram-se disciplinados no Estatuto de Roma, que criou
o Tribunal Penal Internacional (TPI), sendo que o art. 8º(b)47 pontua uma lista
abrangente dos atos que os configuram. Uma vez comprovados, o TPI oferecerá uma
denúncia para investigá-los e punir os responsáveis.
Verifica-se
não ser a Rússia signatária do Estatuto de Roma que é a base legal do Tribunal
Penal Internacional, tampouco a Ucrânia, mas mesmo assim, o governo ucraniano
apresentou duas declarações separadas com base no artigo 12, nº 3 do referido
Estatuto, reconhecendo a jurisdição ad hoc do TPI, a primeira em 2014 e a
segunda em 2015.
Adicione-se
ter o Tratado de Roma, adotado em 17 de julho de 1998, passado a vigorar
internacionalmente em 1º de julho de 2002, quando conseguiu o quórum de sessenta
países ratificadores da convenção. Daí, mesmo o Estado Russo não sendo membro
do TPI e, por decorrência, não possuir o dever de com ele cooperar, seus
criminosos podem sim ser levados à julgamento perante aquela Corte.
À
evidência uma eventual entrega do Presidente Putin configura uma questão à
parte, mas a possibilidade da imputação criminosa é real. Por esta razão,
trinta e nove Estados Partes solicitaram imediata investigação sobre o
conflito, prontamente atendidos pelo Procurador do TPI, Karim AA Khan Q. C.50
em apoio à Ucrânia.
Após
décadas, uma grande potência europeia, detentora de vasto arsenal nuclear,
atacou um vizinho com capacidade militar significativamente inferior, sem
provocação, ocasionando nefastas consequências políticas, sociais e econômicas
que repercutirão negativamente na Sociedade Mundial.
Como
exposto no presente artigo, o direito humanitário (jus in bello) aplica-se
às situações de conflito armado com o fito de proteger e assistir as vítimas, a
fim de minorar os sofrimentos provocados pela guerra. Por sua vez, os direitos
humanos protegem o indivíduo a todo o tempo e ambos se imiscuem na ordem
doméstica estatal.
Por que
motivo, afirmaria, Boutros Boutros-Ghali, então secretário da ONU: “Sou tentado
a dizer que, pela sua natureza, os direitos do homem aboliram a distinção
tradicional entre ordem interna e internacional. Eles resultam de uma
permeabilidade jurídica nova”. Não se pode considerá-los, nem sob o ângulo da
soberania absoluta, nem sob o da ingerência política.
De
fato, a doutrina internacionalista moderna tem abandonado o tradicional
conceito de soberania, dantes concebido como o poder absoluto, ilimitado e incontrastável
do Estado.
Contemporaneamente,
um dos maiores desafios jurídicos é discutir e pensar a questão sob os auspícios
do direito dos povos, a traduzir-se numa espécie de garantia universal fulcrada
na dignidade humana. Nesse contexto, a novel conceituação não contrapõe o
direito interno ao externo, por conformar os limites da majestosa estatal.
Ademais,
a maior parte dos documentos exógenos condiciona a atuação das Cortes
Internacionais a uma posterior interveniência, a exemplo da Convenção Interamericana
de Direitos Humanos e do próprio Tratado de Roma, o qual estabelece um sistema
híbrido de implementação baseado no princípio da complementaridade. Nesse
cenário, elas somente atuarão quando o Estado descumprir ou cumprir de maneira
ineficiente o dever de processar e julgar seus criminosos.
O
direito humanitário (jus in bello) aplica-se às situações de conflito
armado com o fito de proteger e assistir as vítimas, a fim de minorar os
sofrimentos provocados pela guerra. Por sua vez, os direitos humanos protegem o
indivíduo a todo o tempo e ambos se imiscuem na ordem doméstica estatal.
A
invasão da Ucrânia pela Rússia completou um ano em 24.02.2023 e tem
perspectivas de perdurar para além de 2023 e segundo a ONU[10] mais de oito milhões de
pessoas deixaram o país e se refugiaram em outras nações.
Atualmente,
o conflito vivencia um impasse em que os russos continuam a atacar para
conseguirem o controle sobre os territórios do leste da Ucrânia. Porém, os
ucranianos conseguem se defender das ofensivas, principalmente, por causa da
ajuda dada pelos EUA e de países europeus.
O
referido conflito armado é pautado em questões civilizacionais e ideológicas
ligadas às identidades nacionais e reacende discussões sobre relevantes
aspectos da política internacional tal como o uso de sanções que não tem se
mostrado eficaz e não tem reduzido os conflitos e, a posse de forças e
equipamentos militares que não garante aa dissuasão, os detentores de poder
militar tendem ao uso da força, mesmo que justificado em princípios e valores
que incentiva outros Estados a buscarem a hegemonia e usá-la em prol de seus
próprios interesses, a distribuição de podem em diferentes polos no sistema
internacional o que tem adicionado complexidade e tornado todo o sistema
instável, além de miserável.
A construção
da definição de crimes internacionais está calcada no Estatuto de Roma tais
como crimes de genocídio, crimes contra a humanidade, crimes de guerra e crimes
de agressão. Aliás, a definição de crime internacional se aperfeiçoou depois de
processo que se deu ao longo do século XX, pois de um lado surgiu a prática de
violações graves que se tornam conhecidas em face das novas tecnologias, e de
outro lado, em razão do desenvolvimento internacional.
De
fato, o direito penal conheceu movimento de internacionalização e seguiu por
meio do direito internacional convencional que disciplinou a responsabilização
penal, graças à identificação de graves ofensas que ultrapassaram todos os
limites da criminalidade tradicional.
Em
matéria de violação ao direito das gentes, como é o caso de crimes de massa, o
princípio da subsidiariedade do direito penal não é aplicável em decorrência do
desaparecimento da margem de apreciação pátria.
Há
duas concepções pelas quais podem os crimes internacionais. A primeira é de
natureza formal, segundo a qual os crimes internacionais são violações previstas
e descritas por uma convenção internacional. Já a segunda concepção, de
natureza material, considera que os crimes internacionais são infrações[11] que portam lesão aos
valores de toda a humanidade, valores, portanto, comuns a todas as sociedades.
Atualmente,
a expressão “crimes internacionais”
advém de transgressões penais que são
previstas no Estatuto de Roma , tais
como o crime de genocídio, o crime contra a humanidade, o crime de guerra e o crime de agressão, e que são, portanto, definidos por
um instrumento único de direito
internacional, tendo por objetivo, ao
menos em teoria, a proteção de valores
do conjunto das comunidades humanas,
considerando o fato de que se trata de
uma jurisdição internacional permanente com
vocação universal, essas definições foram construídas de maneira diferente ao longo da história.
A
primeira acepção de crime internacional refere-se ao conceito de crime de
guerra, devido em grande parte ao desenvolvimento do direito internacional
humanitário (DIH), cuja nascimento remonta à preocupação da comunidade
internacional em reduzir os danos acarretados pela guerra.
E, seu
principal instrumento jurídico é a construção da Liga das Nações consagrada
pelo Tratado de Versalhes de 1919, redigido no prolongamento das conclusões da Commission
sur la responsabilité des auteurs de la guerre et sur l’application des peines,
bem como pelas Convenções de Haia de 1899 e de 1907 e, sobretudo, pelas quatro
Convenções de Genebra.
As
Convenções de Haia são as fundadoras do denominado “direito de Haia”,
encarregado notadamente de estabelecer as regras concernentes aos conflitos
armados, tais como a proibição de utilização de certas armas ou métodos de
combate, enquanto as Convenções de Genebra, portando criação ao “direito de Genebra”,
fundam um regime jurídico de proteção de pessoas concernidas pelas
hostilidades.
Verifica-se,
portanto, que tanto do direito de Haia como o direito de Genebra serão as
principais fontes de inspiração da definição de crimes de guerra. A primeira
aparição de crime contra à humanidade no contexto internacional remonta às
convenções de Haia[12] de 1899, e de 1907,
através da definição da cláusula de Martens[13] que foi o primeiro texto
jurídico a evocar normas uniformes de proteção das pessoas e sob a proteção e
regulamentação dos princípios do direito internacional, vez que surgem dos
costumes estabelecidos entre os povos civilizados, dos princípios da humanidade
e dos ditames da consciência pública.
E,
após o massacre dos armênios na Turquia ocorrido em 1915 e, por ocasião da
Conferência de Paz de Paris em 191, uma comissão que foi nomeado para o fim de
examinar as responsabilidades decorrentes de atos cometidos durante a Primeira
Guerra mundial, incluindo-se o genocídio armênio. Apesar de tais atos fossem
qualificados como crimes contra a humanidade, nunca foram incluídos no Tratado
de Sèves[14],
posteriormente, substituído pelo Tratado de Lausanne[15], que nada previu sobre os
crimes contra a humanidade.
Apesar
de que o direito internacional tenha reconhecido que algumas referências às
ofensas às leis da humanidade, a primeira definição de crime contra humanidade
decorreu do Estatuto do Tribunal de Nuremberg, que fora criado pelo Acordo de
Londres em 1945.
À
diferença dos conceitos de crime de guerra, a noção de crime contra a
humanidade foi concebida de forma casuística com a finalidade de responder às
atrocidades perpetradas durante a Segunda Guerra Mundial. O Estatuto de Nuremberg[16] funda, portanto, a noção
jurídica de um crime extremamente grave e que não poderia ser qualificado como
sendo um crime de guerra segundo o direito internacional humanitário.
Ao
mesmo tempo em que o Estatuto de Nuremberg rompeu paradigmas tais como a desconstrução
do elo que ligava o indivíduo ao seu Estado de forma a impedir a sua responsabilização
internacional, a primeira definição de crime contra a humanidade foi igualmente
objeto de numerosas críticas, tais como a de ser qualificada como instrumento de
justiça dos vencedores e de violar os princípios da legalidade e da primazia do
direito penal.
Mesmo
sendo criticável, a primeira definição de crimes contra a humanidade tornou-se
possível o desenvolvimento de conceito de valores protegidos por meio do
desenvolvimento do conceito de valores protegidos através de convenções
internacionais que lhe sucederam.
Desde
Nuremberg, o direito internacional experimentou novo desenvolvimento coma
advento da Convenção pela prevenção e repressão do crime de genocídio, em que
este crime foi nomeado pela primeira vez em um instrumento jurídico.
A essa
convenção sobrevêm a Convenção sobre humanidade (1968), a Convenção para a
eliminação e a repressão do crime de apartheid (1973), a Convenção
contra a tortura e outras penas e tratamentos cruéis, desumanos e degradantes
(1984) e a Convenção internacional para a proteção de todas as pessoas contra os
desaparecimentos forçados (2006).
Mesmo que
essas convenções não tenham precisado os contornos do crime contra a humanidade[17], elas tornaram possível a
sua evolução no sentido de que os conceitos por elas construídos foram utilizados
no desenho da atual noção de crime contra a humanidade.
Foi
nas Nações Unidas que surgiu um Comitê encarregado de codificar o direito
relativo aos crimes internacionais, que experimentou uma desaceleração
sobretudo durante a guerra fria, apenas retornando seu desenvolvimento a partir
dos fatos que desencadearam a criação do Tribunal Penal Internacional.
Quanto
aos estatutos e à jurisprudência desses tribunais, os mesmos aportaram novos elementos
à definição do crime contra a humanidade, ligado inicialmente à necessidade de
um contexto de existência de um conflito armado (TPII) e à existência de uma intenção
discriminatória geral (TPIR).
Em uma
derradeira etapa, a evolução da definição do crime contra a humanidade chega ao
Estatuto de Roma, criador do Tribunal Penal Internacional, cujo artigo 7 não
exigirá mais a existência de um conflito armado, confirmando a noção de que
crimes contra a humanidade podem ser cometidos em tempo de guerra ou de paz.
No que
concerne à definição do crime de agressão, seu primeiro aparecimento advém da Conferência
de Versalhes de 1919, em que a ideia de qualificar os atos de agressão foi
concebida.
Em
seguida, esses atos foram qualificados como crimes contra a paz pelo Estatuto
de Nuremberg.
Vários
debates sobre a natureza da guerra enquanto meio lícito ou ilícito de solução
de conflitos internacionais e se bem que seja considerada um meio ilícito pelo artigo
2 da Carta das Nações Unidas, subsiste até os dias de hoje uma controvérsia
sobre o direito de ingerência de um Estado sobre outro por razões humanitárias.
Esta
ausência de consenso sobre o tema se reflete, finalmente, no Estatuto de Roma,
o qual, quando de sua criação, não se desincumbiu de definir o crime de agressão[18], retardando sua adoção
definitiva.
No Estatuto
de Roma se encontram as definições dos crimes internacionais ao mesmo tempo como
resultado de um longo processo de construção histórica e de uma forma mais
completa, se comparado a outros estatutos.
Nesse
sentido, seu artigo 6 prevê como crime
de genocídio a intenção de destruir, no todo
ou em parte, um grupo nacional, étnico, racial
ou religioso, cometendo atos tais como o homicídio de membros do grupo, ofensas graves à integridade física ou mental de membros do grupo, a submissão intencional do grupo a condições de existência que levem a sua destruição física total ou parcial, a prática
de medidas visando a impedir nascimentos
no seio do grupo ou a transferência
forçada de crianças do grupo a um outro
grupo.
Os
crimes contra a humanidade, conforme definidos
no artigo 7, são considerados como aqueles
cometidos no quadro de um ataque generalizado
ou sistemático contra população civil,
por meios como homicídio, exterminação, redução
à escravidão, deportação ou transferência forçada de população, aprisionamento ou outra forma de privação grave da liberdade física, tortura, estupro, escravidão sexual,
prostituição forçada, gravidez forçada,
esterilização forçada ou outra forma de
violência sexual de gravidade comparável,
perseguição do grupo por motivos de ordem
política, racial, nacional, étnica, cultural, religiosa ou sexista , desaparecimentos
forçados, apartheid e outros atos
desumanos de caráter análogo, causando
intencionalmente grande sofrimento ou
ofensas graves à integridade física ou
psíquica ou à saúde física ou mental.
Em
seguida, o artigo 8 define o crime de guerra como sendo, de um lado, as violações
das convenções de Genebra, compreendendo os conflitos armados
não-internacionais, e, de outro lado, outras violações graves às leis e costumes
aplicáveis aos conflitos armados internacionais conforme o que dispõe o direito
internacional,
Essa definição
preenche uma lacuna no Estatuto de Roma do ponto de vista formal, sem, no
entanto, incluir a possibilidade de exercício efetivo e imediato da competência do Tribunal Penal Internacional por
crimes de agressão, porquanto a competência somente poderá ser exercida a
partir de 2017, conforme definido pelo artigo 15 bis, e isto após a ratificação
da emenda por pelo menos trinta Estados.
Em
virtude da nova regra, o indivíduo protagonista
de um ataque armado, sem legítima defesa
ou sem autorização prévia do Conselho de
Segurança das Nações Unidas, poderá ser submetido
à Corte, o que acrescenta um caráter de
natureza política ao crime de agressão, sobretudo
porque o Conselho de Segurança é competente
tanto para dar seu acordo em relação à
abertura de uma investigação pelo cometimento
do crime quanto para conceder ao juiz
sua anuência sobre a admissibilidade da ação
em relação ao ato imputável.
A
existência de ordenamentos jurídicos nacionais que passam a conter normas de direito
internacional permite a análise comparada desses crimes, como é o caso do
direito brasileiro (A) e do direito francês (B) ao cumprimento dessa obrigação
positiva.
Nosso
país apesar de ter ratificado o Estatuto de Roma, através do Decreto
4.388/2002, seu direito penal interno não é acompanhado da adoção de processo
legislativo que preveja e caracterize os crimes contra a humanidade, os crimes
de genocídio, os crimes de guerra e tampouco os crimes de agressão.
A partir
da internalização do Estatuto da Corte Penal Internacional pelo direito
brasileiro, alguns esforços legislativos tiveram lugar a fim de adaptar e
harmonizar o respectivo sistema de justiça, porém, sem sucesso.
A esse
respeito, no domínio penal, as normas
contidas nos tratados internacionais assim
como a promulgação do tratado pelo decreto
presidencial não são suficientes para orientar
a elaboração do direito nacional, sabendo-se
que não se admite a aplicação direta das
previsões de um tratado internacional ao encontro dos princípios nullum crimen sine
lege praevia, nullum crimen sine lege stricta, nullum crimen sine
lege scripta nullum crimen sine lege, consagrados pela Constituição
brasileira no quadro do princípio da
legalidade, tão caro ao direito
brasileiro a que os penalistas possuem ainda
tanto apego, sem consideração a outros valores.
Por
consequência, segundo entendimento dominante, os crimes devem ser
caracterizados, em todas as suas circunstâncias, pela lei interna, promulgada
conforme o devido processo legislativo, não importando o teor do direito internacional
e do ius cogens.
De
outro lado, as normas internacionais possuem valor de fonte de interpretação,
conforme a decisão exarada no julgamento do Habeas Corpus n° 70389 pelo
Supremo Tribunal Federal no Brasil, que utilizou a Convenção das Nações Unidas
sobre a repressão do crime de tortura como uma norma de integração, porquanto
não existia à época uma lei brasileira específica para a repressão da tortura.
A
respeito do crime de genocídio, a Lei 2.889/1956 o define como sendo o fato de
matar membros de grupo nacional, étnico, racial ou religioso, provocando as
graves lesões à integridade física ou mental desses membros, ou ainda, de
submetê-los intencionalmente à condições de vida que os levem à destruição
física total ou parcial, bem como adotar medidas visando a impedir nascimentos
no seio do grupo ou a transferência forçada de crianças do grupo a outro grupo,
com o objetivo de destruí-lo total ou parcialmente[19].
Portanto,
genocídio é crime internacional previsto no direito pátrio que possui melhor
simetria com o Estatuto de Roma. E, a lei faz menção às penas previstas para o
crime de homicídio do Código Penal, pelo artigo 20 do Código Penal Militar
brasileiro[20],
para o crime cometido em tempos de paz, cuja pena é de quinze a trinta anos e,
ainda, pelos artigos 401 e 402 também do Código Penal Militar, os cometidos em
tempo de guerra, cuja previsão é de imposição da pena de morte.
Quanto
aos crimes contra a humanidade, o direito brasileiro ainda não o caracterizou
conforme os atos previstos pelo artigo 7 do Estatuto de Roma, apesar de que a
lei penal brasileira contenha várias descrições de crimes que em muito se
aproxima das já previstas pelo referido Estatuto.
O
sistema jurídico brasileiro possui disposições gerais incriminando os crimes
como o racismo, a escravidão, a violência sexual, a tortura e o tráfico de
pessoas. No entanto, o ataque generalizado contra a população civil não resta
disciplinado na descrição de cada um desses crimes.
O
crime de tortura, por exemplo, teve sua primeira definição na lei de Abuso de
Autoridade (Lei n° 4.898/1965), passando por uma disposição no Estatuto da
Criança e do Adolescente, chegando à previsão feita pela Lei n° 9.455/1997 que,
no entanto, não atribuiu a esse crime o caráter de crime internacional.
O
mesmo ocorre no que concerne à previsão do crime de racismo. Definido por meio
da Lei n° 7.716/1989, ela consagra figuras típicas simples que se resumem a
atos de degradação ou perturbação da livre entrada de pessoas em determinados
lugares, o que se encontra longe da abordagem feita pelo crime de apartheid.
Pode-se concluir nesse sentido que não existe no direito brasileiro uma definição de crime contra a humanidade.
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Acesso em 13.10.2023.
Notas:
[1]
Refugiado - toda pessoa que, devido ao temor de ser perseguida, à guerra ou a
acontecimentos que perturbem seriamente a ordem pública, se vê obrigada a
abandonar seu lar e buscar refúgio fora de seu país de origem. Após chegar ao
país de acolhimento, alguns refugiados têm direito a um estatuto especial. As
condições para pedir esse estatuto estão estabelecidas na Convenção de 1951
sobre o Estatuto dos Refugiados.
[2] "Por que a Rússia invadiu a Ucrânia em 2022? Trata-se de algo multifatorial. A Rússia invadiu a Ucrânia no dia 24 de fevereiro de 2022, após uma escalada nas tensões que haviam tido início poucos meses antes. Algumas das motivações que conduziram a esse cenário no Leste Europeu, como a maior aproximação da Ucrânia com organizações como a Otan e a União Europeia, são compreendidas mediante a análise das relações históricas entre ambos os países, remetendo principalmente à incorporação da Ucrânia à União Soviética, ao contexto da Guerra Fria e ao domínio sobre a península da Crimeia."
[3] A
doutrina da guerra justa (em latim Bellum iustum ou jus ad bellum)
é um modelo de pensamento e um conjunto de regras de conduta que define em
quais condições a guerra é uma ação moralmente aceitável. A doutrina se refere
mais particularmente à guerra preventiva e a noção de prova do casus belli tem
pouca relevância. Guerra de libertação nacional - conflito no qual um povo luta
contra uma potência colonial, uma ocupação estrangeira ou um regime racista.
Segundo o Direito Internacional Humanitário, uma guerra de libertação nacional
(reconhecida como tal pelas Nações Unidas) é um conflito armado internacional.
[4]
"Uma das principais razões apontadas para a invasão é a maior aproximação
da Ucrânia com a Otan, organização essa que representa, na visão russa, os
países do Ocidente e alguns de seus principais oponentes políticos no cenário
internacional, dentre eles os Estados Unidos. Outras nações do Leste Europeu e
que fazem fronteira com a Rússia, inclusive, são parte dessa aliança, como os
países bálticos (Letônia, Estônia e Lituânia) e a Polônia, restando somente a
Ucrânia e Belarus. Além de um provável ingresso na Otan indicar a maior força
do Ocidente na região e, por conseguinte, a redução da influência russa sobre a
Ucrânia, o território ucraniano passaria a adotar a política de segurança e
proteção militar da aliança, o que acarretaria em apoio direto de outros
países-membros em caso de instabilidades na região."
[5]
Proporcionalidade - princípio segundo o qual a perda de vidas civis e os danos
aos bens de caráter civil não devem ser excessivos em relação à vantagem
militar que se espera conseguir com um ataque a um objetivo militar.
[6]
A invasão da Crimeia e a instabilidade de Donbass foram focos de tensão
importantes que contribuíram diretamente para a ocorrência da guerra atual. A
Rússia invadiu a Ucrânia com o propósito de manter sua zona de influência na
porção oriental do território europeu. Um dos objetivos da ação russa é evitar
que a Ucrânia ingresse na Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). A
tensão entre Rússia e Ucrânia é histórica. Os países, que compunham a antiga
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), compartilham diversos laços
culturais, como língua e religião. A desfragmentação da União Soviética em
diversos países, entre eles Rússia e Ucrânia, um evento derivado do término da
Guerra Fria e da queda do Muro de Berlim, alterou a geopolítica da Europa.
Logo, os últimos 30 anos foram marcantes na relação entre Rússia e Ucrânia no
que toca a instabilidade regional.
[7]
Prisioneiro de guerra - combatente capturado num conflito armado internacional.
Só os combatentes que reúnam certas condições têm direito a este estatuto
(principalmente os membros das forças.
[8]
A Batalha de Solferino, ocorrida em 24 de junho de 1859, próximo ao comune
italiano de Solferino, foi um combate decisivo da Segunda Guerra de
Independência Italiana, resultante da invasão do Piemonte-Sardenha pelos
austríacos em 1859. Essa batalha resultou na vitória das tropas francesas de
Napoleão III e Sardo-Piemontesas de Vítor Emanuel II sobre o exército austríaco
comandado pelo imperador Francisco José I da Áustria (Franz Joseph). Mais de
200 000 soldados lutaram nesse importante batalha, a maior desde a Batalha de
Leipzig, em 1813. Nessa batalha lutaram aproximadamente 100 000 soldados da
Áustria contra 118 600 soldados franco-piemontesas. Esse confronto foi entre os
austríacos, que marcharam sobre o Norte da Península Itálica, e as forças
franco-piemontesas, que se opuseram ao avanço austríaco. A batalha foi
particularmente dura, durando mais de nove horas e resultou na destruição de
mais de 3 000 tropas austríacas, com 10 807 feridos e 8 638 desaparecidos ou
capturados. As tropas aliadas também sofreram muitas baixas, com 2492 mortes,
12 512 feridos e 2 922 capturados ou desaparecidos. Notícias de soldados
feridos de ambos os lados sendo baionetados ou baleados adicionou horror à
batalha. No final, as forças austríacas foram forçadas a entregar suas posições
e a aliança franco-piemontesa ganhou uma estratégica, mas custosa, vitória. A
batalha teve uma consequência de longo prazo no futuro da condução de ações
militares. Henri Dunant, que testemunhou a batalha em pessoa, foi motivado pelo
horroroso sofrimento de soldados feridos a abandonar os campos de batalha e
iniciar uma campanha que resultaria na Convenção de Genebra e na fundação da
Cruz Vermelha.
[9]
São eventos marcantes em relação à aproximação da Ucrânia com o Ocidente as
diversas tentativas dos ucranianos de ingressarem na União Europeia (UE) e na
Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan). No contexto de manutenção da
influência russa destaca-se a invasão pelas tropas da Rússia na Geórgia (2008)
e na Crimeia (2014). A invasão e posterior anexação da Crimeia, parte do
território da Ucrânia, realizada pela Rússia em 2014, marcou o ápice da tensão
entre os dois países.
[10]
A grande dificuldade da ONU em assegurar a paz entre as nações deve-se à sua
estrutura na qual os membros permanentes do Conselho de Segurança, a saber:
EUA, Rússia, Reino Unido, França e China têm poder de veto nas decisões e
utilizam tal poder para se proteger de possíveis consequências de suas
políticas externas. A Organização das Nações Unidas declarou ter identificado
"claras evidências" de que podem ter sido cometidos crimes de guerra
em Israel e na Faixa de Gaza no recente conflito entre Israel e o grupo
terrorista Hamas.
[11]
Infrações graves - trata-se das violações mais graves do Direito Internacional
Humanitário e que, segundo as Convenções de Genebra, abrangem: • o homicídio intencional; • a tortura ou os
tratamentos desumanos, incluídos os experimentos biológicos; • o fato de causar
deliberadamente grandes sofrimentos ou de atentar seriamente contra a
integridade física ou a saúde, a destruição ou a apropriação em grande escala
de bens, não justificada por necessidades militares e efetuadas ilícita e
arbitrariamente; • o fato de obrigar um prisioneiro de guerra a servir nas
forças armadas da Potência inimiga; • o fato de privá-lo de seu direito de ser
julgado legítima e imparcialmente segundo o que prescreve à presente Convenção;
• a deportação ou o traslado ilegal, a detenção ilegal, o fato de forçar uma
pessoa protegida a servir nas forças armadas da Potência inimiga; • a tomada de
reféns. O Protocolo adicional I ampliou esta lista acrescentando: • os ataques contra a população civil, as
pessoas civis ou os bens de caráter civil; • os ataques indiscriminados; • os
ataques contra as instalações que contêm forças perigosas; • os ataques contra
localidades não defendidas e as zonas desmilitarizadas; • o uso desleal
(pérfido) do emblema da cruz vermelha ou do crescente vermelho; • a demora na
repatriação dos prisioneiros de guerra; • as práticas de apartheid e demais
práticas humilhantes e degradantes; • os ataques dirigidos contra monumentos
históricos, artísticos ou religiosos.
[12]
A Primeira Conferência Internacional de Haia, de 1899, e assim também a
Segunda, de 1907, ficaram conhecidas, por inspiração da opinião pública, como
Conferências da Paz. Elas tiveram um caráter inovador no campo da diplomacia e
das relações internacionais. Em meados de fevereiro, foi oficializada a adesão
do Brasil à Convenção de Haia para o Registro Internacional de Desenhos
Industriais, após o governo depositar seu instrumento de adesão à Ata de
Genebra de 1999, em dezembro de 2022. A entrada no acordo vigorará a partir de 1º
de agosto deste ano. CONVENÇÃO SOBRE OS ASPECTOS CIVIS DO SEQÜESTRO
INTERNACIONAL DE CRIANÇAS Assinado em: Haia.
Data: 25 de outubro de 1980.
Entrada em vigor internacional: 1º de dezembro de 1983 Promulgação:
Decreto nº 3413, de 14 de abril de 2000 Entrada em vigor no Brasil: 1º de
janeiro de 2000
[13]
Cláusula de Martens - disposição incluída em muitos tratados de DIH desde 1899
e que brinda uma proteção geral tanto aos civis como aos combatentes. A
Cláusula de Martens afirma textualmente:
Nos casos não previstos nas disposições escritas do Direito
Internacional, as pessoas civis e os combatentes ficam sob a proteção e o
regime dos princípios do direito de gentes, derivados dos usos estabelecidos,
dos princípios de humanidade e dos ditames da consciência pública.
[14] Tratado
de Sèrves: Foi assinado em 1920 a fim de regular a situação com a Turquia,
estipulando que a Armênia seria independente e que a maior parte da Turquia
européia passaria à Grécia; a Síria seria controlada pelos franceses; a
Mesopotâmia e a Palestina pelos ingleses.
[15]
O tratado foi assinado em 24 de julho de 1923 em Lausanne entre a Turquia, de
um lado, e França, Itália, Reino Unido, Japão, Grécia, Romênia e Reino dos
Sérvios, Croatas e Eslovenos, de outro. O tratado reconheceu a legitimidade do
regime de Atatürk instalado em Ancara e definiu as fronteiras da Turquia
moderna.
[16]
O Código de Nuremberg estabelece um paciente falante e que tem autonomia para
decidir o que é melhor para ele e agir em consequência. Ele requer que o
pesquisador proteja os melhores interesses do seu paciente, mas também proclama
que Page 2 os sujeitos podem ativamente se protegerem a si mesmos. Entre uma
das teses principais, a teoria do Direito Natural explicou os fundamentos
usados durante o julgamento. Já a segunda tese abordou a respeito do
Positivismo Jurídico, que foi usado como
argumento de vários réus julgados no processo ocorrido depois da Segunda Grande
Guerra Mundial.
[17]
A definição dos crimes de lesa-humanidade, também chamados de crimes contra a
humanidade, pode ser encontrada no Estatuto de Roma, promulgado no Brasil por
força do Decreto nº 4.388/2002. No Brasil, no entanto, ainda não há lei que
tipifique os crimes contra a humanidade. Crime contra a humanidade, segundo a
definição vigente no direito internacional, são crimes cometidos como parte de
um ataque sistemático de uma pessoa ou de um grupo contra uma população civil
atentando contra a vida e a dignidade dessas pessoas, conferindo-lhes
sofrimento proposital.
[18]
A agressão é o uso da força armada por um Estado contra a soberania,
integridade territorial ou independência política de outro Estado, ou de
qualquer forma incompatível com a Carta das Nações Unidas, tal como decorre da
presente Definição. Para efeitos do presente Estatuto, uma pessoa comete “crime
de agressão” quando, estando em condições de controlar ou dirigir efetivamente
a ação política ou militar de um Estado, planeja, prepara, inicia ou realiza um
ato de agressão, que, por suas características, gravidade e escala, constitui
uma violação manifesta ...
[19]
Os tratados internacionais assinados pelo Brasil são incorporados pelo
ordenamento jurídico interno com o status de lei federal. É papel do Superior
Tribunal de Justiça (STJ) uniformizar a interpretação dessas normas, para que
sejam aplicadas, com segurança, por todos os tribunais do país. Com o objetivo
de atender aos compromissos firmados, o STJ mantém diálogo permanente com
organizações internacionais encarregadas de fazer cumprir os tratados a elas
relativos. É nesse contexto que se destacam o diálogo e o intercâmbio com a
Conferência da Haia de Direito Internacional Privado, organização mundial para
cooperação transfronteiriça em matéria civil e comercial, a qual possui 83
países membros e administra um total de 40 convenções multilaterais. O Brasil é
signatário de 7 (sete) acordos firmados no âmbito dessa Conferência, a saber:
Convenção relativa à Obtenção de Provas no Estrangeiro em Matéria Civil ou
Comercial (1970); Convenção sobre os Aspectos Civis do Sequestro Internacional
de Crianças (1980); Convenção sobre Acesso Internacional à Justiça (1980);
Convenção relativa à Proteção de Crianças e à Cooperação em Matéria de Adoção
Internacional (1993); Convenção sobre a Eliminação da Exigência de Legalização
dos Documentos Públicos Estrangeiros (1961); Convenção relativa à Citação,
Intimação e Notificação no Estrangeiro de Documentos Judiciais e Extrajudiciais
em Matéria Civil e Comercial (1965); Convenção sobre a Cobrança Internacional
de Alimentos para Crianças e Outros Membros da Família e o Protocolo sobre a
Lei Aplicável às Obrigações de Prestar Alimentos (2007).
[20]
A nova lei — que compatibiliza o CPM com as reformas no Código Penal
(Decreto-Lei 2.848, de 1940), com a Constituição Federal e com a Lei dos Crimes
Hediondos — endurece algumas penalidades, como no caso de tráfico de
drogas praticado por militares. A pena máxima agora será de 15 anos, enquanto
anteriormente era de 5 anos. Além disso, o militar que se apresentar para o
serviço sob o efeito de substância entorpecente poderá agora ser punido com
reclusão de até 4 anos. Ainda, torna-se qualificado o roubo de armas e
munições de uso restrito militar, ou pertencente a instituição militar, o que
significa um aumento de um terço até a metade sobre a pena (4 a 15 anos de
reclusão). Fonte: Agência Senado.