A guerra da secessão. Aspectos Jurídicos e Jurisprudenciais

Considerada a primeira guerra moderna da história, a Guerra da Secessão (1861-1865) foi uma luta sangrenta que opôs o Sul escravista e o Norte industrializado dos Estados Unidos. Com a marca de 620 (seiscentos e vinte) mil americanos mortos, esse conflito cruel e desgastante teve início com a eleição do republicano Abraham Lincoln, em 1860, e culminou com o seu assassinato, em 1865. Nunca um confronto bélico ganhara tão ampla cobertura fotográfica, o que ajudou a mobilizar a opinião pública e, mais do que a guerra de independência e, ainda ajudou a conscientizar o povo norte-americano de que um país unido era o primeiro passo para construir uma superpotência

Fonte: Gisele Leite

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Diante da década de 1850, os EUA eram literalmente uma nação dividida, entre os Estados do Norte e os Estados do Sul. A despeito de haver algumas coincidências e similaridades entre os lados dentro da política imperialista dos EUA, havia enorme divergência sobre o modelo de sociedade nos territórios povoados.

O Norte dos EUA era caracterizado pelo forte desenvolvimento da indústria, sendo principal defensor do trabalho livre e assalariado, havia a composição expressiva da classe média urbana. Já o Sul, por outro lado, possuía uma economia basicamente agrícola que era voltada para a produção de algodão, no sistema conhecido como plantation, com uso de trabalho escravo.

A principal divergência girava em torno da questão política a ser adotada nos novos territórios que tinham sido conquistados. Pois o Sul defendia a extensão do plantation com o modelo escravista enquanto o Norte defendia que esses territórios deveriam ser constituídos com a proibição da escravidão.

Tal disputa entre o Norte e o Sul era relacionada com o uso da mão de obra escrava e intensificou-se a partir da ocupação de Nebraska e Kansas. E, o Presidente norte-americano da época Franklin Pierce mostrou-se favorável à extensão da escravidão para o Kansas, o que acarretou expressiva insatisfação na ala abolicionista. E, a disputa no Kansas, acarretou pequenos conflitos armados entre as milícias de abolicionistas e os escravocratas no fim da década de 1850.

A rivalidade entre os abolicionistas e os escravocratas galgou o debate presidencial nas eleições do 1860 e, o principal representante dos democratas era Stephen Douglas e, os republicanos estavam representados por Abraham Lincoln. A vitória de Lincoln nas eleições de 1860 gerou grande insatisfação no Sul.

Em verdade, Lincoln adotava uma ambígua postura sobre a escravidão, pois era defensor da abolição da escravatura, porém, acreditava piamente que a raça branca era naturalmente superior as demais.

A fora isso, Lincoln afirmava que não aboliria a escravidão nos locais onde já existisse, e defendia a sua manutenção exclusivamente no Sul, isto é, era contrário à sua expansão para os novos territórios como o Kansas.

Apesar da postura presidencial, na época, receber fortes críticas dos dois  lados: o Norte considerava-o muito conservador, ao passo que o Sul o considerava como um abolicionista radical, apesar de Lincoln tenha adotado medidas conciliatórias.

"A insatisfação dos Estados sulistas com a presidência de Abraham Lincoln  relacionava-se à questão da escravidão e motivou-os a rebelarem-se contra  o governo americano”. Os sulistas passaram a defender um discurso separatista, e, como consequência, o Sul acabou declarando sua desvinculação da União e  formação de uma nova nação, conhecida como Estados Confederados da América.

A eleição de Lincoln e a separação dos Estados sulistas foram, portanto, os estopins para o início da Secessão em 1861." O primeiro Estado do Sul dos EUA a se separar da União foi a Carolina do Sul, em seguida foi Alabama, Flórida, Mississipi, Geórgia, Texas e Luisiana.

E, o ataque mais marcante do princípio da guerra civil foi realizado pelos sulistas contra um Forte da União (o Forte Sumter) que era instalado em Charleston, na Carolina do Sul. Na ocasião, Lincoln afirmava que não aceitaria nenhum tipo de separatismo, e convocou os exércitos para lutar contra os separatistas e reintegrá-los à nação.

A convocação dos exércitos da União por Lincoln fez com que outros Estados do Sul declarassem sua secessão e se vinculassem com os confederados, a saber: a Virgínia, Arkansas, Carolina do Norte e o Tenesse. A resposta de Lincoln ao ataque ao Forte Sumter, em Charleston, veio com o envio de oitenta mil soldados. E, assim, a Guerra Civil norte-americana se espalhou por todo país.

"No início do conflito, o Norte possuía uma larga vantagem em relação ao Sul: os nortistas  possuíam maior contingente militar, uma economia muito mais desenvolvida e melhor infraestrutura.  Apesar disso, os sulistas alimentavam um forte otimismo em suas capacidades. Além disso, os sulistas  contavam com a liderança de importantes estrategistas militares, como o general Robert E. Lee.

A Guerra Civil Americana foi o pior conflito da história dos Estados Unidos. As batalhas realizadas  em campo aberto transformaram-se em verdadeiros massacres, com milhares de soldados morrendo, por exemplo,  na Batalha de Gettysburg, na qual cerca de trinta mil sulistas morreram em poucos dias de confronto."

A derrota sulista pelo Norte ocorreu à medida que sua economia foi sendo  sufocada pelas ações impostas por Lincoln. E, a falta de apoio estrangeiro e o embargo marítimo que, impediu a entrada de mercadorias no Sul, acabaram destruindo a economia sulista. E, a crescente precariedade dos Confederados fez com que cerca de um terço do exército desertasse, desistindo de lutar na guerra.

"A partir da “Lei do Confisco”, os nortistas foram reavendo o controle sobre  territórios anteriormente controlado pelos sulistas. Isso fez com que  propriedades de sulistas fossem confiscadas por nortistas, o que favoreceu  a fuga de escravos (que eram libertados caso fossem resgatados pelos nortistas).  A fuga dos escravos intensificou o desmoronamento do sistema escravista e da economia sulista."

Inicialmente, a guerra começara em prol da integridade territorial da União e acabou galgando outro significado na luta pela extinção da escravidão. E, então nova postura de Lincoln, foi motivado por fins políticos, ao observar que a defesa da abolição poderia majorar sua popularidade tanto nos EUA como na Europa.

"A abolição da escravidão nos Estados Unidos foi decretada em 1º de janeiro de 1863 com a Lei de Emancipação dos Escravos e foi reafirmada com a promulgação da 13ª Emenda Constitucional em 1865, após o fim da guerra. A Secessão oficialmente terminou em maio de 1865, com a derrota dos sulistas, sua reintegração à União e com a abolição definitiva da escravidão no país.

A Guerra de Secessão custou aos Estados Unidos mais de 600 (seiscentos) mil vidas – mais do que qualquer outra guerra na história americana – e gerou grande destruição no Sul do país.

A respeito dessa guerra, também se pode afirmar que:

        "O conflito também serviu para criar o mito de Lincoln como grande estadista defensor da liberdade, forjar certo sentimento de identidade nacional baseada na superioridade do “mundo” do Norte, abrir caminho para o surgimento de determinadas leis comuns e definir a trilha histórica de um país unificado a partir das armas”.

A Guerra Civil Americana, também chamada de Guerra de Secessão, aconteceu entre 12 de abril de 1861 e 9 de abril de 1865. Foi um conflito armado de disputa entre os Estados do Sul e do Norte dos EUA — um escravista, adotante do modelo de plantation e agrícola; o outro industrial, com uma classe média urbana e a favor do trabalho assalariado. Quando Abraham Lincoln foi eleito, nenhum dos dois lados ficou satisfeito, devido a sua postura ambígua.

Havia também uma disputa sobre qual modelo seria aplicado nas terras a oeste, recém-conquistadas. A Guerra Civil Americana foi bastante sangrenta. Em uma das batalhas, cerca de 30 (trinta) mil sulistas morreram.

Eles perderam a guerra, também por causa de medidas econômicas aplicadas pelo governo. Porém, não aceitaram e começaram a formar sociedades secretas de segregação racial, dando origem à Ku Klux Klan[1], por exemplo, e enorme racismo nos EUA.

As causas da Guerra Civil Americana foram as disputas entre os Estados do Norte e do Sul dos EUA, sendo que um era industrializado, com classe média urbana e defensor do trabalho livre, e o outro era agrícola e escravagista. Com as novas terras sendo conquistadas na Marcha para o Oeste, entraram em conflito para aplicação de um ou outro modelo de sociedade nelas.

Também contribuiu para o confronto a eleição de Abraham Lincoln, que demonstrava ambiguidade em suas posições quanto à escravidão, defendendo seu fim porém acreditando na superioridade da branquitude. Com os dois lados insatisfeitos, tem início a guerra.

A Guerra Civil Americana ocorreu assim: a Carolina do Sul apartou-se primeiro da União. Depois vieram na sequência: Alabama, Flórida, Mississipi, Geórgia, Texas e Luisiana.

O início da guerra foi marcado pelo ataque ao Forte Sumter, da União, em Charleston, Carolina do Sul. Após esse ataque dos sulistas, Abraham Lincoln convocou o Exército (cerca de 80 mil soldados), na tentativa de impedir o separatismo. O Sul, então, se unifica mais ainda e declara sua secessão (separação). Assim, Virgínia, Arkansas, Carolina do Norte e Tennessee se juntam aos demais Estados Confederados.

A guerra, então, toma proporções nacionais. O Norte tinha maior desenvolvimento econômico, infraestrutura e mais força militar, o que lhe garantiu vantagem inicial. O Sul tinha grandes estrategistas militares, como o general Robert E. Lee. As batalhas da Guerra Civil Americana eram em campo aberto.

Frise-se que essa guerra foi a mais sangrenta dos EUA, com várias mortes e massacres. Em uma delas, a Batalha de Gettysburg, o Sul teve baixa de 30 (trinta) mil pessoas. Ao todo, 600 (seiscentos) mil pessoas morreram.

Ao final da Guerra Civil Americana, os sulistas perderam. Não só belicamente, mas também porque o governo aplicou uma série de medidas, inclusive econômicas. Além disso, houve um embargo marítimo, devido ao não apoio de outros países às ideias sulistas. Com isso, as mercadorias não chegavam até lá, dificultando mais ainda a economia nos Estados do Sul.

Dessa maneira, um terço dos soldados do Exército sulista desertou, devido à precariedade dos Confederados. Uma das principais medidas adotadas foi a Lei do Confisco, que reavia terras do Sul à medida que o Norte ia reconquistando-as. Além das consequências diretas na guerra, muitos escravizados passaram a fugir a partir dela.

A Guerra Civil Americana foi justificada por Abraham Lincoln com o objetivo de “manter a integridade territorial da União”, porém seu sentido foi muito mais uma luta sobre escravatura, sobretudo porque o presidente foi percebendo que uma postura abolicionista lhe garantiria maior prestígio, não só nacional como internacional.

O decreto de fim da escravidão norte-americana data de 1º de janeiro de 1863, ainda durante a guerra, pela Lei de Emancipação dos Escravos, e depois pela 13ª Emenda Constitucional, em 1865, depois da conclusão do conflito. Nesse mesmo ano, o Sul foi reintegrado à União.

As consequências da Guerra Civil Americana foram: fim da escravidão norte americana; recessão econômica de todo o país, especialmente no Sul; posterior revolta dos sulistas, com o extremo racismo.

Outra consequência apontada por historiadores foi a criação do mito em torno da figura de Abraham Lincoln como grande estadista. O contexto histórico da Guerra Civil Americana foi a conquista de novas terras a oeste dos EUA, os modelos diferentes do Sul e do Norte dos EUA (um escravagista e agrícola, o outro industrial e a favor do trabalho, principalmente), com estopim na eleição de Lincoln.

As causas da Guerra Civil Americana foram a insatisfação dos sulistas com a eleição de Lincoln e a fundação dos Estados Confederados da América. A Guerra Civil Americana ocorreu entre 12 de abril de 1861 e 9 de abril de 1865 com conflitos entre milícias civis dos Estados do Norte e do Sul.

Os principais fatos da Guerra Civil Americana foram o ataque ao Forte Sumter, que deu início à guerra, e a Batalha de Gettysburg[2], com a morte de cerca de 30 (trinta) mil sulistas.

O fim da Guerra Civil Americana se deu com a derrota do Sul a partir de medidas adotadas pelo presidente, que foi dominando a economia desses Estados.

As principais consequências da Guerra Civil Americana foram uma forte recessão político-econômica em todos os EUA e a segregação racial nos Estados do Sul.

O plantation é um sistema de produção agrícola que foi adotado pelas nações europeias em suas colônias. Os historiadores entendem o plantation como uma prática que fazia parte do mercantilismo. O plantation baseava-se no latifúndio, na monocultura, no trabalho escravo e era voltado para atender o mercado exterior.

Já o Norte era industrializado, possuía uma população urbana grande e de classe média, e advogava por um modelo de trabalho que fosse assalariado porém livre, sem escravismo.

Nesse cenário, os dois lados discordavam quanto a qual modelo seria aplicado nos novos territórios, principalmente depois de Kansas e Nebraska. Naquele momento ainda (década de 1850), o então presidente, Franklin Pierce, interveio, demonstrando-se a favor da escravidão, indo contra muitos abolicionistas e gerando confrontos armados.

Assim, nas eleições de 1860, a escravidão foi tema central na disputa entre Abraham Lincoln, dos Republicanos, e Stephen Douglas, Democratas. Ao final, Lincoln foi eleito, o que gerou revolta dos sulistas, já que ele era defensor da abolição. No entanto, Abraham Lincoln afiançava que não acabaria com a escravatura onde já houvesse, ou seja, mantendo-a nos Estados do Sul.

Desse modo, os dois lados ficaram insatisfeitos com o presidente. Os sulistas, mais radicais, adotaram o separatismo como ideologia e prática. Em 1861, inicia-se, portanto, a Guerra Civil Americana, ou Guerra de Secessão, quando o Sul se desvincula da União para formar uma nova nação: os Estados Confederados da América.

A Guerra Civil norte-americana (1861-1865) representou uma confissão de que o sistema político falhou, esgotou os seus recursos sem encontrar uma solução (para os conflitos políticos mais importantes entre as grandes regiões norte-americanas, o Norte e o Sul). Foi uma prova de que, mesmo numa das democracias mais antigas, houve uma época em que somente a guerra poderia superar os antagonismos políticos”.

Nessa mesma atividade, deixe ainda registrada, logo em seguida, a declaração do Presidente Abraham Lincoln, que comandava a federação quando a guerra começou.

Segundo ele:

         “Uma casa dividida contra si mesma não subsistirá. Acredito que esse governo, meio escravista e meio livre, não poderá durar para sempre. Não espero que a União se dissolva; não espero que a casa caia. Mas espero que deixe de ser dividida. Ela se transformará só numa coisa ou só na outra.”

Ao expor essas duas opiniões em foco, o professor pode questionar em sala, ou durante atividade, se a independência serviu para anular os conflitos que impediriam o desenvolvimento político e econômico dos Estados Unidos. Além disso, pode ainda salientar de que maneira os dois depoentes do exercício interpretavam as diferentes visões econômicas e políticas dos Estados do Norte e do Sul.

Podemos compreender que a independência não veio simplesmente para garantir o posterior sucesso econômico norte-americano nos séculos XIX e XX. Além disso, põe em questão que o regime democrático implementado pelas Treze Colônias[3] não ofereciam “condições naturais” para resolver as contendas políticas da nação.

Outros fatores interessantes sobre a vida de Abraham Lincoln:

1 – Origem

Abraham Lincoln nasceu no dia 12 de fevereiro de 1809 em um quarto de uma cabana na Fazenda Sinking Spring, no Condado de Hardin, Kentucky. Ele era o segundo filho de Thomas Lincoln e Nancy Lincoln. Ele perdeu sua mãe quando tinha nove anos. Sua mãe morreu bebendo o leite de uma vaca que havia comido uma erva venenosa.

2 – Carreira

Em 1834, Lincoln foi eleito para o Legislativo do estado de Illinois e ficou lá até 1943. Em 1837, ele se tornou advogado e foi eleito para a Câmara Representativa dos Estados Unidos, em 1846. Ele cumpriu seu mandato e depois voltou para Springfield para poder trabalhar como advogado. Ele participou como orador de vários debates sobre a escravidão, onde se discutia se deveria ou não ser legalizada nos lugares que tinham se tornado estado.

3 – Casamento

Em dezembro de 1839, Lincoln conheceu Mary Todd, em Springfield, e um ano depois, eles noivaram. Eles romperam o noivado, mas se casaram dia quatro de novembro de 1842. O casal teve quatro filhos, mas apenas um viveu até a fase adulta.

Em 1843, nasceu Robert Todd Lincoln e em 1846, Baker Lincoln. No dia 1 de fevereiro de 1850, Edward morreu. ‘Willie’ Lincoln nasceu em 21 de dezembro de 1850 e morreu no dia 20 de fevereiro de 1862.

O quarto filho do casal foi Thomas Lincoln, que nasceu em quatro de abril de 1853 e morreu, aos 18 anos, em 16 de julho de 1871. E o único filho que sobreviveu foi Robert, que viveu e conseguiu ter filhos. O descendente de Lincoln teve seu o neto, Robert Todd Lincoln Beckwith, que morreu em 1835.

4 – Eleição

Lincoln tinha uma oratória muito boa e foi visto nos debates com Stephen Douglas. Por sua fama, o Partido Republicano recém-formado o escolheu para concorrer contra Douglas nas eleições para o Senado americano, em 1858. Ele perdeu, mas em 1860, os republicanos o quiseram para ser candidato à presidência, ocasião na qual ele foi eleito.

5 – União

Em 1861, no dia 4 de fevereiro, depois que Lincoln assumiu a presidência, onze Estados sulistas se separaram da União e formaram os Estados Confederados da América.

Eram estes: Alabama, Arkansas, Flórida, Geórgia, Louisiana, Carolina do Norte, Mississipi, Carolina do Sul, Texas, Tennessee e Virgínia. Mas o Presidente quis ir para a guerra para tentar restaurar a União. Isso foi o início da Guerra Civil Americana ou Guerra de Secessão.

6 – Conquistas

Abraham Lincoln conseguiu que os Estados Unidos não se dividisse, o que certamente resultaria na falência do sistema democrático norte-americano. Além disso, no dia 1º de janeiro de 1863, Lincoln emitiu a Proclamação da Emancipação, que libertava os escravos.

7 – Assassinato

No dia 14 de abril de 1865, ele foi assassinato no Teatro Ford em Washington por John Wilkes Booth. O homem era um ator que apoiava à causa dos Estados Confederados. E, logo depois de sua morte, Abraham Lincoln já era reconhecido como um dos presidentes mais importantes dos EUA.

Frases importantes de Lincoln:

"Pecar pelo silêncio, quando se deveria protestar transforma homens em covardes".

"Deus deve amar os homens medíocres. Fez vários deles".

"Pode-se enganar a todos por algum tempo; pode-se enganar alguns por todo o tempo; mas não se pode enganar a todos todo o tempo".

"Só tem o direito de criticar aquele que pretende ajudar".

"Quase todos os homens são capazes de suportar adversidades, mas se quiser pôr à prova o caráter de um homem, dê-lhe poder".

"Ando devagar, mas nunca ando para trás".

Após a guerra os EUA tiveram um crescimento extraordinário. Entre 1860 e 1914, a população passa de 31,3 para 91,9 milhões de habitantes, sendo 21 milhões de imigrantes. Em 1915 os EUA são os maiores produtores mundiais de ferro, carvão, petróleo, cobre e prata. Isso credenciou os EUA a ingressar na política mundial.

O encerramento das hostilidades, contudo, não significou pacificação. Lincoln, reeleito em 1864, acabou assassinado por John Wilkes Booth dias após a capitulação do Sul. Seu vice, Andrew Johnson, um unionista do Tennessee sem grandes afetos pela causa antiescravista, tentou suavizar os termos da reintegração da Confederação à União, no que foi oposto pelos republicanos radicais, para quem seus planos de uma anistia geral aos confederados, e a subsequente entrega dos governos sulistas a eles, era ato equivalente a uma traição.

O desenlace seria o impeachment do Presidente, em 1868 e, a tomada do controle da Reconstrução pelos republicanos radicais, que imporiam condições muito mais severas à reincorporação dos secessionistas aos Estados Unidos.

O resultado foi promissor, embora fugaz: durante alguns anos, apesar da violenta oposição aos seus esforços (simbolizada pela aparição dos terroristas da primeira Ku Klux Klan), uma democracia mínima existiu no Sul, com a participação ativa dos libertos (que constituíram maiorias eleitorais em diversos distritos) e a reorganização da vida política na região.

No entanto, a ausência de uma reforma agrária efetiva e a reorganização de outras formas de usurpação de mão-de-obra, disfarçada de “trabalho livre”, combinadas com a progressiva desmoralização da Reconstrução por uma opinião pública interessada numa reconciliação nacional sem justiça social, levaram, no entendimento de W. E B. DuBois, à “Redenção” do Sul em 1877 e o retorno da escravocracia em novas vestes.

No entendimento do notório intelectual e ativista, o “salário psicológico” advindo da branquitude impediu uma coalização entre brancos pobres e libertos e acabou por permitir a volta dos ex-confederados ao poder, com consequências devastadoras para as comunidades negras (segregação racial brutal, precarização da vida, retirada de direitos políticos, etc.).  Afinal, o esperado “novo nascimento em liberdade” preconizado por Lincoln em 1863 teria que esperar.

Há diversos precedentes judiciais que merecem atenção, a começar pelo caso Dred Scott versus Sandford (1857). e, antes deste, a legislação dos EUA permitia a instituição da escravidão, a começar por Massachusetts, já em 1641.

A questão basilar do precedente possuía relação direta com a  Guerra de Secessão, quando alguns escravos passaram a obter a liberdade, a partir de normas jurídicas que contemplavam situações específicas.

Simultaneamente, em paralelo, o julgamento do caso, apesar de consistir em evidente marco negativo na história norte-americana, destacou-se por representar a reafirmação do judicial review. E, que consistiu em um segundo precedente de controle de  constitucionalidade, após a célebre (e também lamentável) decisão proferida  no caso Marbury versus Madison (1803).

Segundo João Carlos Souto, a respeito do marco, in litteris:

           “Dred Scott” seguramente representa o maior equívoco da Suprema Corte dos Estados Unidos,  senão em toda a sua história, ao menos nos seus primeiros 100 (cem) anos de funcionamento.

Esta tem caráter absolutamente discriminatório e imprime interpretação enviesada do art. IV da Constituição Federal que, em oposição ao afirmado pelo Tribunal, efetivamente  autoriza o governo a criar territórios e estabelecer todas as normas e regulamentos respectivos. o caso versava sobre a aprovação do Missouri Compromise Act pelo Congresso Nacional americano em 1850, que baniu a escravidão em  novos territórios, em uma época de franca expansão territorial,  por meio de compras, guerra, conquista ou anexação.

Dred Scott  era escravo do cirurgião militar John Emerson, residente no  Estado de Missouri, que ainda admitia a escravidão. O militar  foi então designado para atuar no Estado de Illinois e  posteriormente em Wisconsin, locais onde a escravidão não era  mais permitida.

Ao retornar ao Missouri, Dred Scott pleiteou  então sua liberdade, fundamentando-a no fato de que, ao ingressar  e permanecer em território onde a prática escravista havia sido  proibida, agora seria um homem livre. Tal forma de pensar não era algo estranho à época, consistindo na doutrina do once free,  always free, aceita pela jurisprudência do Missouri.

Não obtendo sucesso em seu pedido, Dred Scott recorre à Suprema  Corte americana em 1846, tendo sido analisada sua ação apenas depois  de decorridos 11 (onze) anos, em 1857.

Na ocasião, entendeu a  Corte que o Missouri Compromise Act seria inconstitucional, afirmando que o Congresso Nacional não teria poderes para banir a escravidão.  Registrou, ainda, que Dred Scott não poderia ser considerado cidadão,  por não fazer parte do povo dos Estados Unidos, razão pela qual lhe  faltaria o requisito processual da legitimidade para o ajuizamento da ação.

A decisão da Corte, presidida pelo Chief Justice Roger Taney, invocou  uma hermenêutica originalista (original intent) do (suposto) pensamento  dos founding fathers, para afirmar que, à época da promulgação do texto  constitucional no século XVII, os negros não eram considerados cidadãos  e não deveriam gozar dos mesmos direitos reconhecidos aos brancos.

Segundo Taney, autor do voto vencedor, a legislação, a história e a linguagem utilizadas na Declaração da Independência revelam que nem os negros trazidos  à América como escravos nem os seus descendentes, livres ou não, poderiam  ser reconhecidos como parte do povo americano. Seriam, em realidade,  “seres de uma ordem inferior”, “incapazes de se associar com a raça branca,  seja em relações políticas ou sociais”

Sublinhe-se, porém, que não somente a Declaração da Independência deixava de fazer comentário relativo à cor da pele, como também alguns Estados, à época, já reconheciam os direitos da população negra, permitindo-lhes, até, o exercício do direito ao voto.

Contudo, que não apenas a Declaração da Independência deixa de fazer qualquer comentário relativo à cor da pele, como também alguns Estados, à época, já reconheciam direitos à população negra, permitindo-lhes, por exemplo, o exercício do voto.

Poucos anos depois a emblemática decisão, foi aprovada a Emenda Constitucional n. XIII, no ano de 1865, que aboliu a escravatura nos Estados Unidos como um todo.

A posição extremada da Corte Taney certamente contribuiu para isso, além de acirrar os ânimos entre os Estados do norte e do sul, o que culminaria com a Guerra de Secessão.

Apesar disso, os negros continuariam, por um século, recebendo o tratamento de cidadãos de segunda classe, em razão sobretudo das Jim Crow Laws (1876-1965), legislações estaduais e locais que institucionalizaram a segregação racial, sob o mantra Separate but equal.

Surgiram outros relevantes precedentes no tema racial que foram denominados Civil Rights Cases que também foram apreciados pela Suprema Corte dos EUA em 1883.

Consigne-se que no século XIX, os Estados Unidos experimentaram diversos acontecimentos: abolição da escravatura, a Guerra de Secessão e a reconstruction era, iniciada após o fim do conflito entre Estados do sul e do norte.

Em tal momento, mais precisamente em 1875, foi aprovado pelo Congresso Nacional o Civil Rights Act, também conhecido como Enforcement Act, com o objetivo de assegurar a todas, independentemente da sua cor, a igualdade de tratamento em acomodações públicas, transportes públicos e a proibição de exclusão do serviço do júri.

Cuidou-se, evidentemente, de uma reação à dura segregação racial pós-Guerra Civil, bem como uma decorrência direta da XIII Emenda Constitucional, que dispôs:

Emenda XIII. Seção 1

Não haverá, nos Estados Unidos ou em qualquer lugar sujeito a sua jurisdição, nem escravidão, nem trabalhos forçados, salvo como punição de um crime pelo qual o réu tenha sido devidamente condenado.

Seção 2

O Congresso terá competência para fazer executar este artigo por meio das leis necessárias.

Através de diversos recursos, a Suprema Corte dos EUA teve oportunidade de apreciar a constitucionalidade do Civil Rights Acts. E, foi em 1883 que o relator Justice Bradley J., em voto vencedor, entendeu que a fundamentação usada pelo Legislativo Federal era inidônea, ao ter como base a Emenda XIII.

Para o Justice Bradley J., referida Emenda somente se limitava à proscrição da escravidão e seus incidentes (has only to do with slavery and its incidents),  não sendo contrário à norma a recusa de um proprietário de um hotel ou local de  diversão em atender um negro. É dizer, “a Décima Terceira emenda não diz  respeito a distinções de raça, classe ou cor, mas a escravidão”.

O problema de tal sentido de pensamento residia no fato de a XIV Emenda prever  expressamente que “Todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados Unidos, e sujeitas a sua jurisdição, são cidadãos dos Estados Unidos e do Estado onde  tiverem residência”.

Como forma de superá-la, em complementação à sua fundamentação,  entendeu o Relator que referida Emenda alcança apenas ações do Estado-membro, não  alcançando ações discriminatórias individuais, que decorreriam do exercício da autonomia privada.

Consequentemente, foi considerado inconstitucional o Civil Rights Act of 1875, seja pela  incompatibilidade com as XIII e XIV Emendas, seja porque teria havido uma indevida intromissão  do Legislativo Federal sobre a competência dos Estados-membros, cabendo-lhes exclusivamente a  decisão política a respeito do comportamento de seus cidadãos.

Diante da suposta violação à competência estadual, a Corte reconheceu a inconstitucionalidade formal do ato. Restou isolado o voto do Justice John Marshall Harlan, para quem “o espírito e a substância  das recentes emendas constitucionais haviam sido sacrificados por um engenhoso e malicioso criticismo verbal”.

Pontuou ainda, a necessidade de respeito ao princípio da presunção de constitucionalidade das leis, pelo que uma lei não poderia ser declarada nula com base em mero conflito de interpretação entre o Legislativo e o Judiciário.

Com base na decisão da Suprema Corte nos Civil Rights Cases, abriu-se um caminho livre para que os Estados do sul  pudessem adotar diversas medidas de ordem legislativa e executiva, que acabariam por reforçar ainda mais a segregação racial, transformando os afrodescendentes em verdadeiros “cidadãos de segunda classe”.

O caso Plessy versus Ferguson (1896) representa mais um episódio de manutenção da segregação racial nos Estados Unidos,  consolidando a doutrina do Separate but equal (“separados, mas iguais”)[4].

Tal doutrina do final do século XIX foi responsável  pela aprovação de diversas leis estaduais, com o aval da Suprema Corte, estabelecendo uma série de medidas de segregação  entre negros e brancos nos Estados Unidos, em especial nos Estados da região sul e de fronteira.

Tais leis contemplavam,  dentre outras coisas, a restrição de acesso a restaurantes, banheiros, assentos em transportes públicos, acesso a escolas,  teatros etc. A ideia central era a de que negros e brancos seriam iguais, devendo ser destinatários dos mesmos serviços,  porém de forma separada.

Evidentemente, na prática, o tratamento dispensado aos negros era bem diverso daquele a que estavam  sujeitos os brancos, cujos serviços possuíam qualidade evidentemente superior.

O contexto histórico de tais medidas possui direta relação com a Emenda XIII – que aboliu a escravidão em todo o país em 1865  – e a Emenda XVI, de 1868, que universalizou a condição de cidadão: “Todas as pessoas nascidas ou naturalizadas nos Estados  Unidos, e sujeitas a sua jurisdição, são cidadãos dos Estados Unidos e do Estado onde tiverem residência”.

Como reação às  duas reformas, o pensamento de supremacia racial encontrou espaço na teoria do Separate but equal, mantendo a segregação.  

As leis segregacionistas compunham as chamadas Jim Crow Laws[5] em alusão ao personagem negro do humorista Thomas Rice –  instituídas no final do século XIX até os anos sessenta do século XX.

O caso Plessy versus Ferguson tem espaço em tal momento histórico, mais precisamente em Louisiana, 1892. Naquele ano, Homer  Plessy tentou embarcar em um vagão de trem exclusivo para pessoas de cor branca, em New Orleans. Segundo o relatório da  Suprema Corte, Plessy possuía 1/8 (um oitavo) de sangue negro, mas sua cor de pele não seria suficientemente clara para  permitir o embarque.

Diante disso, embora já tivesse embarcado no vagão, Plessy foi removido à força e encaminhado à cadeia, em razão da  desobediência. Em consequência, foi considerado culpado pela prática de crime, em sentença de novembro de 1892, por violação  à Jim Crow Law do Estado.

O juiz do caso, John H. Ferguson, invocou como precedente o acórdão da Suprema Corte nos Civil  Rights Cases. Os advogados de Plessy recorreram à Suprema Corte, que manteve a sentença proferida pelo juiz Ferguson.

De acordo com o entendimento do relator do caso, o Justice Henry Billings Brown, a Lei de Luisiana não teria promovido  discriminação entre negros e brancos. Registrou que a Emenda XIII, em realidade, “teve por objetivo reconhecer a igualdade absoluta entre as duas raças perante o Direito, mas, diante da natureza das coisas, não poderia abolir distinções baseadas na cor”.

A segregação, assim entendeu, não significaria a inferioridade de uma raça em relação à outra, nem poderia a legislação erradicar  instintos raciais ou distinções físicas. Ao final, registrou que “se uma raça é inferior à outra socialmente, a Constituição dos  Estados Unidos não pode colocá-las no mesmo plano”.

Na ocasião do julgamento, houve apenas um voto dissidente, do Justice John Marshall Harlan, mesmo voto vencido nos Civil Rights Cases, para quem a Constituição seria cega em relação à cor (our constitution is color-blind).

Com base em tal precedente, a doutrina do Separate but equal sobreviveu por mais de meio século. Passadas mais de cinco décadas de  humilhações segregacionistas, foi apenas no ano de 1954, já na segunda metade do século XX, que as Jim Crow Laws foram consideradas  inconstitucionais, no emblemático caso Brown versus Board of Education.

Dessa vez, a Suprema Corte invocou a Emenda XIV com o objetivo de  limitar a autonomia do Estado-membro, permitindo que Linda Brown estudasse em uma escola voltada exclusivamente à educação de pessoas  brancas.

Coube à Corte Warren decidir que a segregação promovida induzia ao retardamento educacional das crianças negras, privando-lhes  dos benefícios de um sistema escolar integrado.

É importante observar, pois, que somente após um século de aprovação, a Emenda XVI foi efetivamente aplicada nos Estados Unidos como  parâmetro de controle de constitucionalidade das leis de segregação racial. Na mesma década de 1960, ocorreu a primeira eleição de  um parlamentar negro ao Senado.

Conclui-se que o direito constitucional norte-americano se ocupa com o controle de constitucionalidade (judicial review), com interpretação constitucional, com relação entre o governo central e Estados (federalismo vertical) e com os direitos individuais, a exemplo da chamada discriminação reversa decorrente dos modelos de ações afirmativas.

E, assim, é no estudo das decisões da Suprema Corte americana que podemos encontrar os chamados watershed cases, a propósito das discussões em Marbury versus Madison, Roe versus Wade, Mac Cullogh versus Maryland, Plessy versus Ferguson, Brown versus Board of Education, Bakker versus University of California.

A força do precedente formatará o entendimento constitucional. Assim, a Suprema Corte ditará os cânones do American Way of Life. O Direito e política assumiram influências recíprocas sem maiores constrangimentos epistemológicos.

Do nome das partes a identificação do caso: Marbury vs. Madison. James Madison  não contestou a ação. O executivo simplesmente não tomou conhecimento de que havia  matéria pendente no judiciário.

O Presidente da Suprema Corte (chief justice) John Marshall  (que fora secretário de estado de John Adams) viu-se em situação difícil. Se ordenasse que  Jefferson empossasse Marbury, não teria como implementar o comando; a Suprema Corte seria desmoralizada.

Se desse razão a Jefferson, sem que ele sequer tivesse se defendido, pareceria temeroso e fraco; a Suprema  Corte sairia da contenda desmoralizada também. Porém Marshall, o grande chief justice, notabilizou-se  como mestre em tergiversar em momento de perigo.

Marshall redigiu sua decisão (opinion) confirmando que  Marbury estava correto, que estava intitulado a tomar posse e a entrar em exercício como juiz de paz em Columbia.

Aproveitou para criticar Jefferson e a política do partido que estava no poder. Porém, observou que o artigo de  lei que Marbury utilizara para instruir seu pedido (com base num ato judiciário de 1799) era inconstitucional, nulo (void).  

Segundo Marshall a Suprema Corte não tinha jurisdição originária para apreciar o pedido como formulado por Marbury.  Embora substancialmente correto, Marbury teria buscado remédio jurisdicional com base em regra inconstitucional.  

Marshall não enfrentou Jefferson, não deixou de dar razão a Marbury, salvou a Suprema Corte do descrédito e, estabeleceu  precedente que dá início ao controle de constitucionalidade nos EUA. Jefferson sentiu-se  vitorioso e não criticou a decisão, que passou a valer desde então.

O judicial review ganhou mais espaço no constitucionalismo norte-americano a partir de 1865 com o término da Guerra Civil,  em decorrência das questões que emergiram do sangrento conflito. Marbury vs. Madison encetara uma decisão seminal,  que qualificou a Suprema Corte como efetiva guardiã da legalidade, detentora do poder de dizer o que é lei.  

A prerrogativa foi ao longo do tempo apropriada por todo o judiciário, embora se reservando a última palavra à corte suprema . O controle de constitucionalidade de leis e de atos governamentais nos Estados Unidos é difuso, todo juiz pode exercê-lo. Marshall é qualificado como um juiz ativista (activist), impondo prudência pessoal na solução de problemas a ele encaminhados.

Essa perspectiva conduz-nos a outro tema, sutilmente implícito e decorrente no controle de constitucionalidade, a saber, os contornos da interpretação constitucional nos EUA.

O plano interpretativo do direito constitucional norte-americano desdobra-se nos debates entre os juízes da Suprema Corte. Aquelas reuniões são precedidas por simbólico aperto de mão (the symbolic handshake) na imagem de Phillip J. Cooper, que nos lembra  o juiz Melville Fuller, para quem (ainda em 1880) diferenças de opinião não devem macular a harmonia geral entre os magistrados.

Há intensa comunicação e barganha de votos entre os juízes da Suprema Corte norte-americana. As decisões refletem opinião colegiada,  não obstante o vedetismo dos grandes nomes do judiciário daquele país, como Oliver Wendell Holmes Jr., Felix Frankfurter,  Louis Brandeis, Benjamin Cardozo, entre tantos outros.

Sentido histórico informa mecanismos de interpretação. O texto constitucional passa de dois séculos e expressões como liberty,  due process, entre outras, suscitam conotações sociológicas e denotações políticas que se alteram com o tempo e com a realidade fática do país.

Chama-se o mecanismo de atualização da linguagem constitucional (updating the constitution). Tudo se faz sob manto ideológico que força a  crença de que a lei é a suprema vontade do povo, de modo que seus intérpretes revelariam a alma do país.

Alexis de Tocqueville, dentro do ceticismo típico da aristocracia francesa que representava, fora mais direto e percebera uma certa onipotência da maioria.

A flexibilidade interpretativa seria a referência exegética recorrente, por causa da eterna reserva de sentido que a Constituição perfila,  dado sua inegável característica sintética.

Destacam-se dois grupos hermenêuticos cujos contornos são muito bem distintos. Os ativistas  (political activists) ampliam a linguagem original para contemplar direitos e valores que se revelaram e que se alteraram no tempo, principalmente  em âmbito de direitos coletivos.

Nesse caso, a chamada Corte de Warren, de 1953 a 1969 é o mais perfeito paradigma, promovendo cânones de integração racial e de igualdade civil.

Os constituintes de 1787, os framers, teriam os olhos no futuro; o intérprete da Constituição deveria revelar esse horizonte. O que justifica  a severa volatibilidade que a leitura da Constituição produz. É difícil identificar os modelos hermenêuticos neutros, pois em verdade, a neutralidade é mera aparência  de posição adrede tomada e carente de justificação.

De um lado, há os ativistas são geralmente relacionados com o pensamento do partido democrata.  Os juízes construtivistas teriam sido indicados por presidentes daquela agremiação. Ainda exemplificando,  o presidente Woodrow Wilson nomeou Louis Brandeis. Franklyn Roosevelt indicou Hugo Black, William Douglas e Felix Frankfurter. John F. Kennedy apontou Arthur Goldberg. Porém essa observação não é regra.

O mais liberal e ativista de todos, Earl Warren, fora indicado pelo presidente Dwight David Eisenhower,  do partido republicano. Eisenhower, ou Ike, considerava a nomeação de Warren como o mais estúpido erro que cometera.

No outro lado, encontram-se os textualistas, originalistas, adeptos de interpretação literal da constituição  (strict interpretativists). Essa a tendência contemporânea na Suprema Corte, dada maioria de juízes indicados  por presidentes do partido republicano.

William Rehnquist, que já foi presidente daquela casa, fora indicado pelo   então Presidente Richard Nixon. Cogitava-se de um ativismo judicial à direita, metáfora que melhor qualificava o conservadorismo  de uma Suprema Corte majoritariamente republicana, posteriormente, os episódios da eleição de George W. Bush em face de Al Gore  ilustram e confirmam essa posição.

O resultado é que se diminuíram os direitos de presos, desprezou-se  as liberdades e expectativas de homossexuais, mitigaram-se as posições ambientalistas e se aceitou a franca hipertrofia do Executivo, acreditou-se e que a jurisprudência atinente ao aborto[6] foi brevemente alterada (overruled).

Enfim, triunfa um conservadorismo cujo referencial que se centra nas posições de Scalia, que se afirma como atrelado ao texto e sentido originais da Constituição.

Frise-se que a Suprema Corte dos EUA não se perde em meras discussões teóricas. Atua, firmemente, em casos concretos, reais e controversos, exercendo absoluta discricionariedade ao escolher os processos em que deseja opinar, somente, depois de provocada por meio do writ of certiorari.[7]

A hermenêutica constitucional presta-se a atender e disciplinar a vida real.  Para tal, pontos a serem esclarecidos carecem de implementar três exigências.  Devem subsumir prejuízo concreto (standing) causado pela ré.

Entre outros, é por isso que problemas provocados por receios abstratos obstruem o  livre acesso à Suprema Corte de temas ambientais, quando a comprovação de danos concretos, reais, efetivos, é muito difícil.

O dano não pode ser  percebido em teoria, deve ser real, o que qualifica o princípio da ripeness,  da maturidade do fato. A matéria não pode perder o objeto ao longo da discussão, o que indica o princípio da mootness, que sugere ideia de ficção .

A discussão é fictícia (moot) quando ultrapassada pelo tempo, esse devorador  de coisas, quando se dizem esgotados os limites cliométricos do processo (time frame).

Já, o caso Roe versus Wade, julgado em 1973, cuja decisão deferiu pedido referente a  possibilidade de prática de aborto por decisão da mãe[ ilustra os contornos inversos  do princípio da mootness. Trata-se de uma exceção a tal conceito.

Um caso dessa natureza  não pode ser julgado em menos de nove meses, tempo normal de uma gestação. Os advogados do Estado do Texas,  que defendiam a constitucionalidade de lei local que proibia o aborto, invocaram o princípio da mootness.

Como a autora da ação não estava mais grávida (a criança nascera ), não havia matéria concreta, real , fática,  a ser apreciada pela corte suprema. Ponderou-se que a decisão era referente a específica lei do Texas,  e que os efeitos da decisão seriam futuros.

Não se tratava, evidentemente, do clássico caso do aluno que tem matrícula indeferida em faculdade,  que obtém ordem judicial para estudar na aludida escola, e cuja decisão do feito dá-se no momento da colação de grau.

Nesse derradeiro exemplo não há (em tese) o que se decidir, dado o implemento de condição, que não poderia ser contrariada por decisão do judiciário.

Já quanto o  caso Roe versus. Wade. Norma McCorvey, de pseudônimo de Jane Roe, tinha vinte e um anos, era divorciada e cuidava de uma filha de cinco anos. Vivia com grandes dificuldades financeiras, estava desempregada e engravidou do namorado. Preocupada com a situação nova,  procurou abortar, no que se viu proibida pelas leis do Texas, onde vivia. Essas leis datavam de 1859.

O aborto[8] era ilegal naquele Estado,  exceto quando necessário para salvar a vida da mãe. Duas advogadas muito jovens, Linda Coffee e Sarah Weddington, interessaram-se pelo caso e, decidiram levá-lo às últimas consequências. Apesar de saber que a matéria não seria decidida antes do nascimento do bebê, Morma McCorvey concordou em ajuizar a ação, que seria usada como um  teste, com o objetivo de alterar tendência jurisprudencial.

Atacou-se a constitucionalidade da lei antiaborto do Texas[9], porque a norma violentava cláusulas da emendas nove e quatorze à Constituição norte-americana. Argumentou-se, ainda, em prol da defesa do aborto que direitos não especificamente listados na constituição são retidos pelo povo (retained by the people). Entre eles, o direito à privacidade (right to privacy).

Contemporaneamente, em minoria, os três magistrados da ala progressista da Suprema Corte tiveram a adesão do chefe do tribunal, o juiz John Roberts, que chamou a aplicação da lei do Texas[10] de “não apenas incomum, mas sem precedentes”. O atual Presidente Joe Biden, outro aliado dos defensores dos direitos das mulheres, questionou a sua constitucionalidade.

Esse direito à privacidade protegeria o direito da mulher decidir pela continuidade da gravidez, circunstância natural inserida na sua esfera mais íntima de escolha.

O acórdão foi proferido em 22 de janeiro de 1973.  Criava-se uma fórmula a ser, a partir de então, seguida. Até o terceiro mês da gravidez a decisão quanto ao aborto é da mulher com apoio de seu médico.

Em relação ao segundo trimestre da gravidez, os estados podem produzir normas, com o objetivo de assegurar-se a saúde da mulher, regulamentando-se o  procedimento de aborto.  Quando ao último trimestre, leis estaduais poderão autorizar aborto quando necessário para a salvaguarda da saúde da mãe.  A discussão desafiou o anunciado princípio do mootness[11].

Alterou substancialmente os contornos do direito de família. Considera-se Roe versus. Wade o mais controverso caso apreciado pela Suprema Corte,  provocando a abertura de uma caixa de Pandora na observação de Peter Irons, historiador do constitucionalismo norte-americano.

Em face da maioria  republicana que controla contemporaneamente o poder nos Estados Unidos, observa-se uma certa guinada à direita, que resulta na limitação concreta  do direito ao abordo, como definido na célebre decisão do caso Roe versus Wade, prolatada em 1973.

As legislaturas estaduais podem confeccionar regras  referentes à utilização e destino de recurso públicos em matéria de saúde pública. Observa-se que as legislaturas estaduais têm proibido o uso de  tais valores na cobertura de práticas abortivas.

Essa atitude limita concretamente o alcance de Roe versus Wade, indicando que a autorização  jurisprudencial para a prática do aborto tem alcance limitado, na medida exata da intervenção normativa local.

Um outro tema de direito constitucional norte-americano vincula-se a relação entre governo central e Estados, o chamado federalismo vertical[12].  Essa relação é historicamente o resultado de conflitos políticos, de compromissos e de consenso.

O pacto federalista limita o poder entre  as unidades da federação mesmo quando o governo central regula relações entre Estados, a exemplo do comércio interestadual.

Convém elucidar a respeito das três cláusulas que orientam o pacto federativo norte-americano, a saber : a) os Estados foram preservados como fontes de poder, com autoridade e natureza de órgãos da administração, b) aos Estados foram reservados importantes poderes quanto à composição do governo federal e, c) os poderes governamentais  foram distribuídos entre o governo central e os governos estaduais.

O federalismo norte-americano despreza a ideia de município. O federalismo concebe imunidade tributária recíproca no modelo dos Estados Unidos, como resultado de interpretação constitucional extensiva.

No caso McCulloch versus. Maryland, julgou-se inconstitucional tributo que o Estado de  Maryland lançara em face de banco federal, com base na doutrina dos poderes implícitos (implied powers), que outorga ao governo federal  mecanismos e meios para a consecução de seus fins.

O movimento para desegregação racial nos Estados Unidos, a exemplo da integração nas escolas públicas, fora o grande teste para a relação entre  Estados e poder central. Sublinhe-se que com o término da Guerra Civil (em 1865) formatou-se um modelo legislativo segregacionista no sul dos Estados Unidos,  chamado de Jim Crow.

As leis de segregação racial chamam-se de Jim Crow, nome de personagem popular de circos, geralmente um branco que pintava  a face de preto, para ridicularizar os afro-americanos.

Em 1896, no caso Plessy versus. Fergusson consolidou-se a segregação racial mediante o triunfo da doutrina do iguais, porém separados (separated but equal),  que prevê modelo de apartheid, no qual deve-se garantir igualdade de tratamento, porém em estabelecimentos e locais diferentes.

A cláusula jamais se  implementou faticamente, dadas as notórias condições inferiores impostas aos negros, em restaurantes, hotéis, escolas, banheiros públicos.

Identifica-se também o caso Plessy versus Fergusson,  quando em sete de junho de 1892, Homer Plessy sentou-se em setor reservado para brancos em trem do estado da Lousianna. Plessy era “um oitavo negro”; sua ascendência em relação a negros era pequena. Porém, as leis do Estado da Lousianna o consideravam como negro.

Instado pelo supervisor do trem a dirigir-se ao setor reservado às pessoas de cor, Plessy recusou-se a cumprir a ordem. Foi preso, julgado e condenado em  todas as instâncias locais. Plessy apelou para a Suprema Corte requerendo providências contra Ferguson, juiz da Suprema Corte da Louisianna.

A Suprema Corte em Washington manteve as decisões inferiores, valendo-se da seguinte linguagem: Uma lei que meramente implique distinções legais entre as raças branca e negra, uma distinção que é baseada na cor dessas raças, e que deve existir tanto quanto homens brancos são distintos de outros em razão de cor, não tem a tendência de destruir a igualdade jurídica entre essas raças.

A doutrina do separated but equal será derrubada pelo movimento pelos direitos civis, que ganhou corpo nas décadas de cinquenta e de sessenta.

A estratégia consistia em se denunciar a desigualdade, em momento em que a Suprema Corte se mostrava tendente a consagrar igualdade real, fulminando a segregação, em ambiente propício, anunciador de uma década agitada.

O caso Brown versus Board of Education, julgado em 1954, propiciará novos parâmetros de relação entre governo central e estados. Esses últimos  deverão cumprir ordens daquele, que viam como nefasta interferência em negócios internos. Os fatos foram particularmente difíceis no Estado do Alabama.

O governador George Wallace opôs-se a medidas de desegregação nas escolas, no que foi contestado pela administração Kennedy que federalizou a  guarda estadual, deixando-o sem muitas opções de resistência.

Alguns pais de alunos de escolas públicas da cidade de Topeka, Estado do Kansas, liderados por Oliver Brown, insurgiram-se com o fato de que crianças  negras eram impedidas de estudar nas melhores escolas públicas, que eram reservadas apenas aos brancos.

Por força da doutrina do separated but equal,  crianças negras deveriam estudar em escolas muito distantes de suas casas, frequentavam instalações escolares de qualidade inferior e, também eram educadas  por professores que recebiam salários mais baixos.

Com apoio da NAACP - National Association for the Advancement of Colored People, a questão foi levada a Suprema Corte que em histórica decisão  determinou o fim da segregação racial nas escolas.

O governo federal norte-americano encontrou inúmeras dificuldades em implementar o acórdão, dada resistência dos  Estados do sul, em confronto direto repleto de lances de heroísmo, de violência, de mártires.  

Só à guisa de curiosidade, o famoso músico de jazz, Louis Armstrong, antes das medidas de fim de segregação, estava proibido de dormir nos hotéis em que tocava.

O fim da segregação engendrou uma segunda guerra civil entre sul  e norte, focalizando o fim da resistência dos Estados mais reacionários, dimensionando o federalismo vertical em bases mais contemporâneas.

O tema sobre a proteção de direitos individuais representa mais outra característica do direito constitucional norte-americano de atuais dias, explicita individualismo que plasma  a sociedade dos Estados Unidos da América. A Constituição dos EUA assegura direitos individuais contra atos do governo, federal e estadual, concepção que identifica a doutrina do state action.

As entidades privadas no exercício de funções prioritariamente públicas (como educação e saúde) podem ser equipoladas à condição de pessoas jurídicas de direito público.

E, os direitos individuais são defendidos com base nas Emendas cinco e quatorze à Constituição norte-americana e, decorrente autorização dada ao Congresso para implemento da cláusula da equal protection of the laws.

Um bom exemplo de aplicação da cláusula deu-se em 1886 em São Francisco, Califórnia, quando do caso Yick versus Hopkins. A cidade de São Francisco dificultava outorga de autorização para que chineses operassem máquinas de lavar roupa (laundries), indiretamente vedando aos asiáticos a prática de lucrativo comércio.

Como não podia prejudicar os chineses com critérios baseados em raça, a prefeitura daquela cidade da costa oeste norte-americana começou a proibir os laundries em estabelecimentos de madeira. Ocorre que todas as lavanderias chinesas eram operadas em barracões que não eram de alvenaria.

A questão chegou à Suprema Corte que invalidou a norma que indiretamente excluía chineses do mercado de lavanderias, dada a notória discriminação contida na lei de São Francisco. Hipótese semelhante deu-se quando no sul dos Estados Unidos exigiu-se que eleitores fossem alfabetizados.

A norma excluía os descendentes de escravos do processo eleitoral, dada o notório baixo índice de escolaridade entre aquelas pessoas. Contemporaneamente, os direitos individuais são debatidos em âmbito das chamadas ações afirmativas (affirmative action).

A expressão supostamente surgira com o ex-presidente John Kennedy em ordem executiva de 1961, proibindo discriminação no regime de contratação de pessoal de manutenção.

A locução também foi utilizada pelo ex-Presidente Lyndon Johnson em ordem executiva de 1965. Tentava-se eliminar resquícios do passado, fazendo-se historicamente justiça devida às minorias, mediante a reserva de vagas em escolas e empregos para membros dessas comunidades e grupos étnicos.

Os barulhentos críticos das ações afirmativas consideram tais procedimentos como discriminações reversas (reverse discrimination). O caso Bakke versus. University of California, julgado em 1978, indica os precedentes. Allan Bakke, branco, requereu vaga em faculdade de medicina em um dos campi da Universidade da Califórnia.

Embora detentor de boas notas (good score), Bakke foi preterido porque a aludida universidade reservava dezesseis por cento de suas vagas para grupos minoritários. Bakke ajuizou ação contra a universidade, alegando que o programa de proteção de minorias o discriminava.

A Suprema Corte dos EUA decidiu que o modelo de ação afirmativa da Universidade da Califórnia era inconstitucional, usando-se inclusive a expressão reverse discrimination.

No entanto, como a decisão não foi unânime havia um voto vencido (dissent) o juiz Powell observara que em não havendo prejuízo para o interessado, as políticas afirmativas eram perfeitas.

Bakke teve êxito a ação e, então obteve a vaga na faculdade de medicina. Talvez pela primeira vez norma atinente a direitos civis (civil rights) fora utilizada na proteção de brancos. E, com base no voto vencido do juiz Powell muitas escolas mantém políticas de ações afirmativas.

A Suprema Corte norte-americana decidiu em meados de 2003 caso de affirmative action que envolve a Universidade de Michigan. Voto relevante, em favor de tais políticas poderá vem da juíza Sandra O’Connor.  É que essa juíza fora apontada para a Corte Suprema por Ronald Reagan, que cumpria promessa de nomear a primeira mulher para o importante cargo. Sua nomeação é evidente medida de affirmative action, em que pese suas inegáveis qualidades.

Ao votar contrário a tais modelos a citada juíza estaria votando contra sua própria indicação, no entender de setores da imprensa norte-americana.  Porém, a retórica da indecisão marcou a recente decisão.

O apontado acórdão foi liderado pela juíza Sandra Day O’Connor que capitaneou apertada maioria de 5 a 4, como previsto pela imprensa norte-americana.

Decidiu-se que a prática da Universidade de Michigan no sentido de admitir minorias não violou a XIV Emenda da Constituição norte-americana e, que portanto não houve discriminação racial ao reverso, como pretende a ala mais conservadora.

Mas, a Suprema Corte determinou que o uso de cotas para admissão de minorias é inconstitucional e que práticas neutras devem ser adotadas o mais rápido possível.

Em apertada síntese, e como visto, os principais temas que informam o direito constitucional norte-americano contemporâneo: judicial review, interpretação constitucional, federalismo vertical e affirmative action.

No ano de 2022 a Suprema Corte dos EUA adotaram decisões que seja individualmente ou em conjunto têm suscitados diversos questionamentos entre estudiosos, historiadores e doutrinadores. O que revela uma guinada para o extremo conservadorismo[13] e, certa politização de uma das mais respeitadas instituições dos EUA.

Novamente, os veredictos lançaram atenção para a independência do tribunal bem como sua proximidade com determinadas posições políticas. Em mais de uma década publicado no início deste mês na PNAS, a prestigiosa  revista da Academia de Ciências dos Estados Unidos, indicou que a corte nos últimos dois anos "tornou-se muito mais conservadora do que o público americano".

Donald Trump fez questão de nomear juízes com visões conservadoras e religiosas,  a maioria deles da Sociedade Federalista, uma organização que defende uma leitura literal da Constituição. Assim, solidificou-se uma "supermaioria" de seis juízes conservadores contra três de posições mais liberais.

Um estudo da Universidade de Chicago, em Illinois (EUA), mostrou que as decisões judiciais desde então  também se tornaram mais propensas a favorecer conceitos e temas religiosos sobre o que antes se consideravam liberdades individuais.

Embora Trump tenha modificado a composição do tribunal, juristas apontam que o movimento da Suprema Corte  em direção ao conservadorismo foi um processo que se consolidou ao longo dos anos: dos dezoito juízes confirmados  de 1969 até hoje, quatorze foram indicados por presidentes republicanos e apenas quatro por democratas.

No entanto, estudiosos apontam que os juízes conservadores de hoje não são nada parecidos com os de décadas passadas:  na verdade, foram cinco juízes republicanos que se juntaram a dois democratas na legalização do aborto em 1973 Roe versus Wade, o  precedente que reconheceu o aborto como um direito constitucional.

Segundo o estudo da PNAS, o tribunal "agora está mais parecido com o Partido Republicano em sua posição ideológica sobre questões-chave".

E, embora durante 2021 a Suprema Corte não tenha tomado decisões muito controversas, os inúmeros casos sobre os quais se pronunciou nesta  semana chamaram a atenção para uma aparente velocidade para mudar algumas leis que já faziam parte da sociedade americana.

"A coisa mais surpreendente sobre essas decisões é a rapidez com que os conservadores da Suprema Corte estão se movendo para promover  mudanças amplas e controversas", afirmou a professora de Direito Constitucional Maya Sen no site da Universidade de Harvard, em Massachusetts (EUA).

O porte de arma em público. Até agora, portar uma arma de fogo em público exigia uma licença especial e para obtê-la era necessário apresentar uma causa justificada (semelhante ao que acontece em outros Estados, como Califórnia, Havaí, Maryland, Massachusetts, Nova Jersey e Rhode Island).

Representando a maioria que apoiou a decisão da Suprema Corte, o juiz Clarence Thomas argumentou que a Constituição protege "o direito de um indivíduo de portar uma arma de fogo para autodefesa fora de casa".

Assim, considerou que exigir que os cidadãos demonstrem uma causa justificada para exercê-lo em Nova York viola a Segunda Emenda da Carta Magna. A referida Emenda, redigida em 1791 e cuja interpretação é atualmente objeto de debate, inclui "o direito do povo de possuir e portar armas", embora diga que é feito para que façam parte de uma "milícia bem regulamentada".

Espera-se que a decisão da Suprema Corte seja usada para derrubar outras leis restritivas de posse de armas em todo o país, o que afetaria um quarto dos estimados 330 (trezentos e trinta) milhões de americanos. Destaque-se que nos Estados Unidos, existem mais de 390 milhões de armas registradas em nomes civis.

Outra questão: a Suprema Corte decidiu que o Estado do Maine, no leste dos EUA, não poderia impedir que fundos públicos fossem usados por escolas que promovam ensino religioso.

A votação, novamente, foi de seis votos a favor e três contra. Segundo a opinião da maioria dos juízes, o Maine discriminava as escolas religiosas por seu ensino da fé.

"A exigência do Maine (…) viola a cláusula de livre exercício da Primeira Emenda (que reconhece a liberdade religiosa)", escreveu o juiz John Roberts.

Embora tenha argumentado que a decisão desta terça-feira está em consonância com outras medidas recentes da Corte para ampliar a liberdade religiosa, a juíza progressista Sonia Sotomayor acusou a maioria conservadora de derrubar "o muro de separação entre a Igreja e o Estado que os artífices da Constituição lutaram para construir".

"Como resultado, em apenas alguns anos, o tribunal mudou a doutrina constitucional, passando de uma regra que permite que os Estados se recusem a financiar organizações religiosas para uma que exige que, em muitas circunstâncias, subsidiem a doutrinação religiosa com dinheiro dos contribuintes", assinalou.

A nação ianque acompanhava essas discussões com curiosidade superlativa, aferindo movimentação que ainda atesta a vitalidade da Constituição dos Estados Unidos.

Os refratários às abstrações teóricas de duvidosa aplicabilidade na vida concreta e negocial, fizeram que os norte-americanos formatassem constitucionalismo pragmático, que é volátil e mutante, modulando uma constituição sintética na arena marcada pela luta, típica de uma civilização pujante, destemida, individualista, tradicionalmente dada aos embates jurídicos em meio das artimanhas políticas.

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SOUTO, João Carlos. Suprema Corte dos Estados Unidos. 2ª. ed. São Paulo: Atlas, 2015.

Notas:

[1] Foi uma organização supremacista e terrorista que surgiu nos EUA, no século XIX. Atuou na perseguição de negros, agredindo e assassinando-os. Fundada em uma pequena cidade do Tennessee, Estados Unidos, entre os anos de 1865 e 1866. Essa organização, que se pauta pelo supremacismo branco, promovia  e promove atos terroristas contra pessoas negras e simpatizantes dos direitos dos negros. A Ku Klux Klan passou por três fases em sua história e hoje se encontra enfraquecida. A Ku Klux Klan (KKK, na sigla) ou simplesmente Klan surgiu nos Estados Unidos, na segunda metade do século XIX. A expressão Ku Klux faz menção à palavra grega “kyklos”, que significa “círculo” e que transmite a ideia de  uma sociedade secreta. O termo “Klan” deriva de “clan”, palavra em inglês que corresponde a “clã” no idioma português. Seu surgimento da Klan tem relação com o desfecho da Guerra Civil nos Estados Unidos. A organização foi fundada entre os anos de 1865 e 1866,  na pequena cidade de Pulaski, no interior do Tennessee, Estado do sul dos Estados Unidos. Os fundadores da Klan eram antigos soldados que  pertenciam ao Exército Confederado (que lutou pelo sul na Guerra Civil).

[2] A Batalha de Gettysburg, ocorrida nos arredores e dentro da cidade de Gettysburg, Pensilvânia, foi o embate com o maior número das vítimas na Guerra de Secessão e ponto culminante da segunda invasão do norte pelo exército confederado do general Robert E. Lee. No final, o Exército do Potomac, comandado pelo major general George Meade, derrotou os ataques do Exército da Virgínia do Norte, comandado pelo general Lee, suspendendo a invasão confederada no Norte. A invasão confederada começou em 3 de junho de 1863, cruzando o Vale do Shenandoah e passando por Maryland. Um mês depois, as forças de Lee invadiram a Pensilvânia, com a cavalaria na vanguarda. Em 1 de julho, unidades avançadas dos exércitos do norte e do sul colidiram inesperadamente próximo a cidade de Gettysburg. Reconhecendo o valor estratégico daquela região, Lee ordenou que suas forças se concentrassem naquela pequena cidade e destruíssem as forças federais por lá, mas George Meade agiu mais rápido do que o antecipado e mandou reforços. Assim, em questão de horas, a luta em Gettysburg evoluiu para uma conflagração generalizada entre o Exército do Potomac e o Exército da Virgínia do Norte. No segundo dia, todas as tropas de ambos os lados estavam finalmente reunidas e assumiram suas posições. Os confederados tomaram a iniciativa, convergindo sobre os flancos das forças da União de forma feroz, mas sem sucesso. A luta foi particularmente violenta em Culp's Hill e Cemetery Hill. Apesar da pressão, as linhas federais mantiveram-se firmes e ambos os lados sofreram pesadas baixas.

[3] As 13 colônias eram um grupo de colônias britânicas localizadas na costa leste da América do Norte, fundadas no século XVII. As colônias foram estabelecidas principalmente para fins econômicos, incluindo o comércio de bens como tabaco, açúcar e madeira, entre outros produtos. As Treze Colônias tinham sistemas políticos, constitucionais e legais muito semelhantes e a maior parte de população falava a língua inglesa e faziam parte da igreja protestante. Elas faziam parte das América Britânica possessões britânicas "Novo Mundo", que também incluía colônias no Canadá, Flórida e Caribe. As Treze Colônias foram fundadas entre 1607 (Virgínia) e 1733 (Georgia). Documentos contemporâneos geralmente listam as 13 Colônias Norte-Americanas do Reino da Grã-Bretanha em ordem geográfica, do Norte para o Sul: Mapa das Treze Colônias em 1775; Província de New Hampshire, mais tarde o estado de New Hampshire; Província da Baía de Massachusetts, mais tarde os estados de Massachusetts e Maine; Colônia de Rhode Island e Plantações de Providence, mais tarde o estado de Rhode Island; Colônia de Connecticut, mais tarde o estado de Connecticut; Província de Nova Iorque, mais tarde os estados de Nova Iorque e Vermont;

Província de Nova Jérsei, mais tarde o estado de Nova Jérsei; Província da Pensilvânia, mais tarde o Estado de Pensilvânia; Colônia de Delaware, mais tarde o estado de Delaware; Província de Maryland, mais tarde o estado de Maryland; Colônia e Domínio da Virgínia, mais tarde os estados de Virgínia, Kentucky e Virgínia do Oeste; Província da Carolina, uma colônia proprietária criada em 1663 e dividida em Norte e Sul em 1712, cada uma tornou-se Colônia Real em 1729: Província da Carolina do Norte, mais tarde os estados da Carolina do Norte e Tennessee;  Província da Carolina do Sul, mais tarde o Estado da Carolina do Sul; Província da Geórgia, mais tarde o estado da Geórgia

[4] No final do século XIX, surgiu a ideia do "Separate but equal" ("Separados mas iguais").  Esta doutrina foi sedimentada ao longo do tempo, especialmente após um caso da Suprema Corte  em 1896 (Plessy v. Ferguson) quando foi afirmado que era legal a separação entre brancos e negros nas companhias de trem da Luisiana. Separate but equal (em português: "Separado mas igual") foi uma doutrina jurídica da lei  constitucional dos Estados Unidos que justificava e permitia segregação racial naquele país  como não sendo uma violação da décima-quarta emenda da constituição estadunidense que garantia proteção e direitos civis iguais a todos os cidadãos. Sob esta doutrina, o governo podia permitir que setores públicos ou privados como os de serviços, instalações, acomodações, moradia, cuidados  médicos, educação, emprego e transporte pudessem ser separados baseado em raça, desde que a qualidade  de cada um destes serviços fosse igual. Esta frase foi proferida notoriamente pela primeira vez na  Luisiana em 1890, embora o termo usado na verdade tenha sido "igual mas separado".

[5] O uso mais antigo conhecido da expressão "lei Jim Crow" pode ser datado de 1884 em um artigo de jornal resumindo o debate do Congresso.  O termo aparece em 1892 no título de um artigo do New York Times sobre a Louisiana exigindo vagões de trem segregados.  A origem da frase "Jim Crow" tem sido frequentemente atribuída a "Jump Jim Crow", uma caricatura de música e dança de pessoas negras  interpretada pelo ator branco Thomas D. Rice em blackface, realizada pela primeira vez em 1828. Como resultado da fama de Rice,  Jim Crow tornou-se em 1838 uma expressão pejorativa que significa "negro". Quando as legislaturas do sul aprovaram leis de segregação  racial dirigidas contra afro-americanos no final do século XIX, esses estatutos ficaram conhecidos como leis Jim Crow.

[6] Em 22 de setembro de 2023, a então Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Rosa Weber, votou a favor da descriminalização do aborto para gestações de até 12 (doze) semanas. Segundo a ministra, a criminalização fere direitos fundamentais das mulheres, como os da autodeterminação pessoal, da liberdade e da intimidade.

[7] No direito da common law, o termo certiorari significa um writ (ordem judicial) original, ao determinar que juízes de uma corte inferior ou oficiais certifiquem e transfiram o registro dos procedimentos da corte inferior no caso em exame para uma corte superior. O certiorari dá a Suprema Corte um controle quase que absoluto sobre os casos que serão julgados naquela instância. Sua introdução no sistema norte-americano deu-se por meio de uma Lei de 3 de março de 1891. Até então, em diversas matérias, as decisões das Cortes Distritais e de Circuito não podiam ser revistas pela Suprema Corte. E, com a referida lei, a Suprema Corte recebeu o poder de, através de um writ of certiorari, conhecer de determinado caso, ordinariamente não submetido à sua esfera de competência. O maior desafio que o certiorari enfrenta é o de conciliar a necessidade de uniformização do direito aplicado em todo o território dos EUA com as limitações de um tribunal composto por apenas nove juízes.  O certiorari, desta forma, é visto não como a solução ideal, mas como o mecanismo que torna viável a atuação da Suprema Corte em prol da uniformização do direito vigente norte-americano, por meio de apreciação de casos mais relevantes, de acordo com o seu próprio julgamento.

[8] As leis dos Estados norte-americanos sobre o aborto se dividem em três categorias, a saber: aqueles Estados onde, com a decisão da Suprema Corte, onde é proibido, de modo imediato ou nas próximas semanas ou meses, devido as leis pré-existentes que vão passar a valer ou a novos dispositivos legais que serão aprovados. E, há aqueles onde é incerto, se haverá restrições, e aqueles onde se espera que o aborto permaneça ser legal, e, alguns casos, onde o seu acesso muito provavelmente é ampliado.

[9] Cinco juízes conservadores, a saber: três deles nomeados pelo ex-presidente Donald Trump -- autorizaram que a lei sancionada pelo governador republicano Greg Abbott entrasse em vigor, violando o princípio básico do caso Roe x Wade: a interrupção da gravidez só poderá ser feita em até seis semanas após a menstruação, em contraposição ao prazo permitido atualmente, entre 22 e 24 semanas. A legislação exclui o direito ao aborto em casos de incesto ou estupro e ainda permite a qualquer cidadão do Texas processar médicos em 24 clínicas que praticam o aborto e ganhar até US$ 10 mil “Esta lei proibitiva do aborto do Texas viola descaradamente o direito constitucional estabelecido no caso Roe vs. Wade e mantido como precedente por quase meio século”, disse em um comunicado citando a decisão da Suprema Corte de 1973 que estabeleceu o direito ao aborto nos EUA.

[10] Infelizmente, há outros estados conservadores, como Kentucky, Alabama, Arkansas e Dakota do Norte, serão estimulados a replicar a política estadual do Texas. É ilusório, contudo, acreditar que as restrições, ou mesmo a proibição, reduzirão o número de abortos. Apenas levarão a prática para a clandestinidade, pondo em risco a saúde das mulheres e acirrando as desigualdades.

[11] Nos Estados Unidos, existe um princípio chamado “mootness doctrine”. Na prática, significa que decisões judiciais futuras, no âmbito de recursos,  não podem anular garantia ou aquisições de bens. O mootness e o ripeness são relacionados ao tempo e ao risco. Este ao aspecto da não judicialização prematura da questão, e aquele a sua não apreciação tardia. Assim, quanto ao tempo porque a provocação da jurisdição deve acontecer de modo a permitir uma intervenção eficaz. Em razão do risco porque, conforme visto em Roe v. Wade, embora o fato primário trazido a juízo tenha se consumado, o risco subjacente à case and controversy capaz de se manifestar novamente, constituindo uma situação de proteção permanente, impõe a realização do controle normativo para se declarar a validade ou a invalidade da norma questionada. Disto resulta que uma leitura mais acurada da decisão Roe v. Wade revela-se indispensável a fim de se recuperar essas doutrinas do mootness e do ripeness como a emprestarem fortes argumentos a favor da não abstração do judicial review, e, portanto, da legitimidade dos afetados para pleitear a intervenção judicial no reconhecimento, preservação e responsabilização de direitos ou de sua violação. Para tanto, se justifica a recorrência às doutrinas do mootness e do ripeness que são, na prática do judicial review, exceções ao princípio do case and controversy e autorizam e determinam a atuação da jurisdição constitucional. São exceções que assumem a ameaça a direito, a ameaça de lesão a direito ou a situação de risco a direito como critérios definidores da legitimidade de agir e do interesse em um provimento judicial ou administrativo.

[12] A repartição vertical de competências acontece quando existe possibilidade de diferentes entes políticos legislarem sobre uma mesma matéria, adotando-se a predominância da União que irá legislar sobre as normas gerais, e aos Estados estabelece-se a possibilidade, em face do poder suplementar, de legislar sobre assuntos referentes aos seus interesses locais, onde suplementar tem alcance semântico de pormenorização, detalhamento. Os Estados norte-americanos que compunham o modelo federalista reservaram  de forma sólida o poder em suas mãos, somente permitindo ao governo central  agir dentro das atribuições já delimitadas na Constituição por eles redigidas.

[13] O conservadorismo é forte nos Estados Unidos na região sul, nas Grandes Planícies, no Alasca e nos Estados Montanhosos. As principais mudanças de posição desde 2020 “O aumento na autoidentificação conservadora em assuntos sociais ao longo dos últimos dois anos é visto entre quase todos os subgrupos políticos e demográficos”, complementa Jones. O número de eleitores do Partido Republicano e de eleitores sem partido cresceu: em 2021, 60% se identificavam com o partido republicano, em 2023 o número subiu para 74%; no mesmo período, os eleitores independentes, sem partido, subiu de 24% para 29%.


Gisele Leite

Gisele Leite

Professora Universitária. Pedagoga e advogada. Mestre em Direito. Mestre em Filosofia. Doutora em Direito. Conselheira do INPJ. Instituto Nacional de Pesquisas Jurídicas. Consultora Jurídica.


Palavras-chave: História EUA Guerra da Secessão Escravatura Norte e Sul Suprema Corte

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