A Dimensão Trágica da Justiça
Seja a justiça divina[1] ou humana. Seja virtuosa ou apenas legalista. As lutas pelo poder trazem o questionamento sobre a legitimidade do detentor do poder, que se manifesta normalmente hoje diante da imagem do governante justo. Não há poder legítimo sem haver justiça e, também não existe justiça sem a dimensão do poder. O conteúdo político e filosófico contido na literatura nos resgata e nos faz perceber no jogo de linguagem o quão difícil é harmonizar o poder com a justiça.
De
fato, a literatura é uma defesa contra as injustiças da vida. É a famosa frase
de Cesare Pavese, um grande escritor e poeta italiano. Sendo um combatente
antifascista pelo o que obteve três anos de prisão no Sul da Itália.
Reconheçamos
que há uma tragédia potencial na relação complexa existente entre poder e
justiça[2]. A tragédia é mais que
mero gênero dramático-literário, pois nos faz pensar, sentir e refletir sobre a
relação do ser humano com o mundo onde está inserido. Envolto nas laboriosas
teias da genética, da história e da geografia.
O
trágico é mesmo uma concepção antropológica e filosófica que nos seduz de
diversas formas pois nos faz enxergar as múltiplas esferas da existência
humana.
William
Shakespeare não produziu somente tragédias, também foi hábil na comédia. E,
tradicionalmente, os dramas históricos não ingleses que são inseridas nas obras
do Bardo, há realmente cerca de dez peças mui especiais, a saber: de acordo com
a ordem de composição são Tito Andrônico, Romeu e Julieta, Júlio César, Hamlet,
Othello, Rei Lear, Macbeth, Antônio e Cleópatra, Coriolano e Timão de Atenas[3].
Shakespeare
escreveu 154 sonetos, 4 poemas - sendo 2 narrativos - e 37 peças (ou 38, se
considerarmos The Two Noble Kinsmen, recentemente incorporada ao
cânone), que lhe renderam um lugar de destaque entre os "clássicos"
da literatura[4]
ocidental.
É
certo que o poder[5]
resta dissociado da justiça na perspectiva de Maquiavel, ou o poder estaria
determinado pela concepção do justo, na perspectiva de Shakespeare.
Para
Maquiavel[6], há a eterna possibilidade
de haver um poder sem justiça, um poder baseado na força e na astúcia, um poder
que nem precisa, forçosamente, ter qualquer compromisso com o ideal de justiça.
Poder que não reconhece o conceito de legitimidade de modo como a entendemos
contemporaneamente[7].
Shakespeare
aponta para uma concepção em que não se pode dissociar o poder da justiça. No
fundo, seriam os dois lados da mesma moeda, existiria então uma relação de
implicação entre os dois conceitos de Shakespeare teria percebido e expresso de
forma artística. Para o Bardo existia a justiça, uma que era divina e outra a
dos homens que depende sinceramente de uma relação de poder.
Na
justiça divina, dá-se uma adequação ou não aos desígnios do cosmos e a vontade
de Deus. Já na justiça humana, a questão é saber quem poderá legitimamente
executar a justiça. Só há justiça se cogitarmos em relações de mando[8] e obediência[9].
Mas, o
poder, sua concepção e funcionamento estão condicionados à questão de justiça.
Só existirá um poder legítimo onde houver a justiça manifesta. Sempre há o
questionamento sobre o caráter legítimo do detentor do poder, que se expressa,
na maioria das vezes, por meio da imagem consagrada do governante justo.
O combustível
das tragédias é composto de justiça e poder. O poder, sem justiça, é via de
arbitrariedades e autoritarismo. E, justiça sem poder é inócua e vazia. Além de
não concretizar os valores que almeja implementar na sociedade humana.
Justiça
é um conceito abstrato que se refere a um estado de interação social ideal onde
há um equilíbrio, por si só, razoável e imparcial, entre os interesses,
riquezas e oportunidades das pessoas envolvidas em determinado grupo social.
O
memorável Oscar Wilde afirmou: Só há uma coisa pior que a Injustiça, que é a
Justiça sem a espada na mão. Sem força, o Direito age a favor do Mal. (In:
WILDE, Oscar. Aforismos ou mensagens eternas. São Paulo: Landy, 2006, p. 45).
O
direito, sem a balança para pesá-lo, é força bruta e irracional. O direito, sem
a espada para obrigar sua aplicação, é fraco. Da mesma forma, a ausência da
venda nos olhos lhe retira a imparcialidade. Cada elemento deve completar o
outro para que a justiça seja a mais justa possível[10].
Tercio
Sampaio Ferraz Jr. (2014) já nos alertou sobre a relação intrínseca entre
razão, comunicação e poder. A maior parte dos discursos humanos não se revela
racional. Pois, a racionalidade é apenas forma possível entre tantas outras, de
enfrentar a situação comunicativa, de enfrenta o jogo entre emissor e receptor,
entre orador e ouvinte. No fundo, é um jogo de poder. O mestre em tom
provocativo aponta para as relações entre filosofia política, literatura e
filosofia do Direito.
Maquiavel
como era pragmático sustentou que o poder é um fim a ser perseguido pelos
homens de virtù[11].
E, para tal pensamento, o exercício do poder não precisa, necessariamente, de
justificação. Poder e justiça restam plenamente apartados. E, tudo se passa
como se o poder, por si só, tivesse validade na medida em que tenha efetividade[12].
A
importância de Sócrates[13] para o estudo do conceito
de justiça desde o momento em que o mesmo rompe da virtude (areté),
transferindo-a de bens materiais para o comportamento humano, ou seja, a
justiça se concretiza através de um comportamento reto, ela é aplicável
independente de bens materiais, posição social do indivíduo, não se nasce justo[14].
Porém,
ainda não se encontrava a preocupação com a justiça distributiva na filosofia
socrática, mas sim, questionamentos e postulados éticos fundamentais para o
desenvolvimento jusfilosófico ocidental.
Já
para Platão, um socrático maior, foi atribuído o mérito de ter escrito a
primeira obra dedicada à filosofia da justiça no Ocidente, a República. Para
Platão, a justiça é um fenômeno secular, apesar de não a definir ocasionalmente
de divina, o mesmo não se refere a uma obrigatoriedade de natureza religiosa.
No lugar da origem divina aparece um elemento metafísico: último fundamento de
legitimação é a ideia do Bem.
Já o
mais genuíno discípulo de Platão[15], segundo Diógenes
Laércio, o Estagirita, filho do médico Nicômaco, Aristóteles seguiu para Atenas
aos dezoito anos para que ali consolidasse sua vocação filosófica. O local pra
se efetivar tal intento é a Academia de Platão, onde ficou durante vinte anos.
Aristóteles superou seu mestre, não o repetindo e, sim, o repensando.
Apesar
de Aristóteles considerar a doutrina da virtude-ciência, resolvendo o problema
da aquisição da virtude pelo sábio, como o surgimento da história da Ética como
ciência do ethos, virtude não existe pelo seu simples conhecimento, ela somente
se concretiza através da prática, como é exemplo a justiça.
Aristóteles
tratando a justiça como virtude assemelhada às outras tratadas em sua obra
(coragem, benevolência), atribuiu à mesma o fim de se evitar a pleonexia,
isto é, evitar que se tire alguma vantagem em benefício próprio tomando o que
pertence a outrem, sua propriedade, sua recompensa, seu cargo, e coisas
semelhantes, ou recusando a alguém o que lhe é devido. Sendo a justiça uma
virtude, é um justo meio (mesótes)[16].
Portanto,
a justiça é o elemento que vincula os homens no Estado. Pois o Estado deve
almejar o bem nas maiores proporções e excelência possíveis. Antes do Estado,
há, primeiramente, a associação da família, qual tem por objetivo suprir as
necessidades diárias dos homens.
Como
continuador do pensamento platônico, Aristóteles prosseguiu a secularização da
justiça, conseguindo separar a justiça, além do conteúdo religioso ou
teológico, do conteúdo metafísico. E, assim, de acordo com o Estagirita,
observa-se que todos os homens, quando falam da justiça, creem que é um modo de
ser pelo qual estão dispostos a praticar o que é justo, a obrar justamente e
querer o justo, do mesmo modo, o seu contrário, a injustiça, acreditam ser um
modo de ser através do qual obram injustamente e querem o injusto.
Já
Shakespeare apontou que o poder precisa ser justificado, ou seja, tem algo a
ver com a justiça. E, campo de atuação do poder é delimitado pelo justo. Na
obra do Bardo, a injustiça exercida pelos humanos que detêm o poder nos agride
e aponta para a dimensão trágica em que a verdadeira ordem das coisas deve ser
restabelecida, mesmo que isso signifique, como sempre, o sacrifício do
personagem trágico principal.
A
revelação da dimensão trágica do poder e da justiça[17] traz uma reflexão
filosófica e, a arte do bardo é tão política quanto a escrita de Maquiavel. O
que vem a ser filosofia para Deleuze e Guattari é a arte de formar, de
inventar, de fabricar conceitos.[18]
Dessa
forma, aproxima-se perigosamente a arte de filosofia, na formulação de
conceitos, o que está em jogo, sendo a mais pura produção de estruturas do
pensamento que são responsáveis por nossas formas de viver, sentir e pensar[19].
Ben
Jonson escreveu um poema em homenagem ao Bardo, onde encontramos o seguinte verso:
“Ele não era de uma época, mas de todos os tempos”. (In: WELLS, Stanley.
Oxford Dictionary of Shakespeare. Oxford: Oxford University Press, 1998,
p.88).
Também
Maquiavel galgou notoriedade por suas ideias, por suas ideias políticas não tão
convencionais. E, logo lembramos da associação as palavras como falsidade,
astúcia, cálculo, perfídia.
E,
assim tais palavras parecem realmente apontar para o pensamento de Maquiavel.
E, suas ideias causaram relevante impacto no pensamento político ocidental tanto
que a maioria da Europa incorporou um adjetivo em seus léxicos e dicionários
para caracterizar certas condutas humanas, ao denominá-las de maquiavélicas.
Shakespeare
e Maquiavel são clássicos, pois, apesar de ter sido produzidos para certo
momento histórico, se revelou particularmente relevante para melhor compreensão
de nosso próprio tempo. Segundo Joseph Koller: "O Direito deve mais ao
Mercador de Veneza[20] do que a todos os
compêndios jurídicos escritos até o século XIX”. (Citado por Teófilo Silva. A
paixão segundo Shakespeare, W. Edições, 2010, p. 233).
“O
mundo inteiro é um palco, e todos os homens e mulheres meros atores; que têm
suas entradas e saídas; E um homem representa, em seu tempo, diversos papéis”
(...) Jacques em “Como Gostais”[21] de W. Shakespeare[22].
Realmente,
é possível tecer a relação entre política e o direito e encarar sua dimensão
trágica. O poder sendo núcleo estruturante da política, e a justiça sendo o
eixo estruturante do Direito. Nessa visão de universo, detectamos o início da
modernidade.
O drama do Bardo transcende as convenções
medievais e ainda apresenta em sua forma as contradições do período que
retrata. E, Maquiavel numa ruptura com a noção clássica de bom governo ou bom
governante[23]
e, portanto, de uma política que se estabelece a partir de Deus, da razão ou da
natureza.
Assim,
a justiça era um elemento constituinte de uma política fundada nestas figuras,
não afirma mais nada ao poder enquanto exercício de homens que pautam suas
ações pelos critérios práticos da conquista e manutenção deste poder.
Foi na
transição entre uma concepção de mundo moderno e mundo pós-moderno[24], já vislumbramos uma
dimensão trágica na relação entre poder e justiça[25].
O
pensamento pós-moderno trouxe para o Direito uma nova maneira de pensar acerca
das questões da justiça. Depois da corrente positivista e das teorias
idealistas, percebeu-se que urgia uma
forma de pensar o Direito de maneira a abranger toda a complexidade epistemológica que o conhecimento humano já
pode conhecer até então.
O
pensamento pós-modernista pôde colocar as questões relativas à justiça de
maneira mais realista, livre de ideais transcendentais do que seria uma
sociedade justa.
As
teorias jurídicas mais recentes[26] foram fortemente
influenciadas pela onda pós-modernista[27] e pode-se dizer que a
pós-modernismo inaugurou uma nova forma de pensar o Direito, uma forma mais
comprometida com a realidade e pluralista, capaz de fazer dialogar com diversas
teorias e culturas para a formação da noção de justiça no caso concreto, contextualizado
historicamente e estruturalmente.
E, o
lapso entre o discurso, a teoria e a prática traz a justificação e o
descompasso entre o justo e poderoso. São insuficientes as dimensões éticas e
jurídicas para a sobrevivência no jogo de poder. Assim, a verdade real das
coisas e dos fatos não está nas abstrações bastardas sobre política que podem
ser diletantes, porém, carecem de utilidade prática.
Seu
texto pode ser estendido como espécie de teoria[28] da ação política, negando
toda a tradição filosófica teórica anterior ao seu tempo. Maquiavel nos aterroriza ao revelar os
princípios políticos de realismo autenticamente assustador.
A
educação no sentido da justiça, além da sabedoria prática, necessita ser
analisada, a partir da sabedoria moral[29] que objetiva apontar que
o mundo humano não é apenas constituído apenas das exigências de cálculo ou da
prudência, isto é, de direitos, deveres e responsabilidades.
Existe
algo além do direito e do dever, há o mistério da gratuidade, de onde brota o
mundo de obrigações que não podem exigir-se, porém, compartilhar-se
graciosamente, o mundo do dom e do presente, do consolo em tempos de tristeza,
do apoio em tempos de desgraça, da esperança quando o horizonte parece
desfigurar-se, do sentido diante da experiência do absurdo. (Cortina, 2007).
Nas pioneiras formulações científicas[30] sobre a política presentes tanto em Maquiavel como em Shakespeare, a dissociação entre poder e justiça que torna possível a existência de imagem do governante injusto tido como um representante viável, plausível e, real. O poder poderá ser teoricamente justo[31], mas poderá ser na prática injusto. As aparências e a literatura jurídica torneiam o conceito de justo e de justiça o tempo todo.
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Notas:
[1]
A justiça para Agostinho era dividida em duas: a justiça humana e a divina. A
primeira seria estabelecida pelas leis humanas, feitas pelo homem, e, portanto,
é falha. É considerada ainda, temporal e mutável. Quanto à finalidade, a paz
social é o que objetiva a justiça humana. A falha vista na justiça humana se
deve ao fato do homem ser pecador, pois possui o livre arbítrio, o poder de
escolher, um “dom extraordinário que o Criador concedeu à criatura racional”,
de acordo com o teólogo. Esta liberdade é transformada em boa ou má no momento
em que o indivíduo faz uma escolha, e, para se tornar um ser pecaminoso, deve
fazer uma escolha ruim.
[2]
A justiça tida como a virtude das virtudes serve para orquestrar e ordenar as
demais virtudes, conduzindo-as à ideia do Bem.
[3]
Muitas dessas peças estão ligadas ao conceito aristotélico sobre os fundamentos
da tragédia: o protagonista deve ter um caráter admirável, mas imperfeito, e o
público precisa compreendê-lo e simpatizar com ele. Provavelmente todos os
protagonistas trágicos de Shakespeare são capazes tanto do bem como do mal. Ele
sempre insiste no funcionamento da livre vontade. Romeu e Julieta, Antônio e
Cleópatra e Otelo são peças consideradas como romances trágicos. Elas se
diferem das outras no sentido de que os amantes dessas não são condenados por
si, mas pelo mundo de fora. Nestas tragédias, a morte é quase uma espécie de
consumação do amor -- como se o amor não pudesse ter sucesso em ambientes
trágicos!
[4]
As principais características que podem ser observadas nas obras de William
Shakespeare são as seguintes: presença da natureza humana, seus defeitos e
qualidades; humanismo e subjetivismo; personagens de diversas regiões e classes
sociais; diálogos fluidos; foco no conteúdo das ações, não nos gestos teatrais
“exagerados”; caráter nacionalista, pois foca na Inglaterra e sua história;
representação de costumes sociais.
[5]
O poder dos que dominam é que decide sobre a constituição do direito e da
justiça na Pólis. Justiça é o resultado de um acordo entre os homens e este acordo
estabelece o meio termo entre fazer injustiça sem ser penalizado, que seria a
tendência fundamental do egoísmo humano, e sofrer injustiça sem poder se
defender ou se vingar.
[6]
Uma grande fonte de inspiração de Nicolau Maquiavel foi o grande orador romano
Marco Túlio Cícero. Nessa linha de raciocínio, para Cícero, a virtude (virtus)
é algo indissociável da vida pública. Ou seja, o homem que almeja a virtude não
pode perder de vista a noção de dever para com os outros. “De fato, parcela
alguma da vida, quer nos negócios públicos, quer-nos da esfera estritamente
pessoal pode prescindir do dever”. E o que seria exatamente esse dever na visão
de Cícero? Ele mesmo nos responde: “Toda investigação a respeito do dever é de
dois tipos. Um envolve o limite dos bens, o outro os preceitos pelos quais o
seu uso para a vida passa ser confirmado em todas as partes”. Recapitulando, o
homem honesto deve praticar o dever, em seu sentido mais amplo, para que possa
ser considerado virtuoso.
[7]
John Rawls fundou uma concepção de justiça própria: a justiça como
imparcialidade e um marco neocontratualistas geral, a partir do qual as
diferentes concepções de justiça podem ser comparadas: a posição originária,
que possibilita, que sejam investigados, com muita nitidez, os pressupostos e
implicações de cada concepção particular de justiça. A posição originária é uma
situação hipotética, a partir da qual qualquer pessoa colocada em uma situação
de ignorância a respeito da posição que ocupa ou que virá a ocupar na
sociedade, escolhe quais princípios de justiça devem reger as futuras
instituições. Rawls estabeleceu ainda
outra distinção de grande importância para a discussão sobre a justiça nas
sociedades complexas e plurais contemporâneas: a distinção entre as teorias
éticas gerais que se ocupam com os ideais de bem viver, com as diversas
dimensões da vida, tanto material, como social ou cultural, e as teorias mais
modestas e específicas que se limitam a expor determinada visão sobre as
instituições justas. A justiça como imparcialidade se propõe a ser uma teoria
deste segundo tipo, que busque um consenso mínimo possível com outras
cosmovisões, sejam filosóficas ou religiosas que coexistem nas sociedades
contemporâneas pluralistas.
[8]
A desobediência civil, em outras palavras, é o direito de defender-se da ordem
posta quando esta ordem nega ao cidadão um direito que, pelos critérios de
justiça, pode ser considerado mais importante do que o que está estabelecido na
lei.
[9]
A justiça para Tomás de Aquino, de acordo com Bittar (2001, p. 197), é: [...]
um hábito, portanto, uma prática, que atribui a cada um o seu, à medida que
cada um possui uma medida, e que nem todos são materialmente iguais. A justiça tem a ver com uma atividade da
razão prática, de discernir o meu do seu, e o seu do meu. Mais que isso, a
justiça não tem a ver com as paixões interiores, que são objeto das outras
virtudes; a justiça é fundamentalmente um hábito à medida que pressupõe a
exterioridade do comportamento, ou seja, de um comportamento que sabe atribuir
a cada qual o seu.
[10]
São símbolos usuais da justiça: a espada, a balança e a deusa de olhos
vendados. Espada - simboliza a força, coragem, ordem, regra e aquilo que a
razão dita; e a coerção para alcançar tais determinações; Balança - simboliza a
equidade, o equilíbrio, a ponderação e a igualdade das decisões aplicadas pela
lei; Deusa de olhos vendados - usualmente uma imagem da deusa romana Iustitia,
que corresponde à grega Dice, que significa o desejo de nivelar o tratamento
jurídico de todos por igual, sem nenhuma distinção. Tem o propósito da
imparcialidade e da objetividade. É a afirmação de que todos são iguais perante
a lei; portanto, uma vez que seus olhos estão vendados, elucidam o disposto
clara e evidentemente. Há que se dizer que a imagem original não comportava tal
venda. No entanto, com a evolução da humanidade, por obra dos alemães, eis que
se faça presente até hoje; Deusa de olhos abertos e sem venda - pode ser
interpretada como a necessidade de não deixar que nenhum pormenor, relevante
para a aplicação da lei, seja desconsiderado e avaliar o julgamento de todos os
ângulos.
[11]
A Virtù é a capacidade do príncipe para ser flexível às circunstâncias,
mudando com elas para agarrar e dominar a Fortuna. Isto é, um príncipe que agir
sempre da mesma maneira e de acordo com os mesmos princípios em todas as
circunstâncias fracassará e não terá Virtù alguma. Em sua obra, Maquiavel
descreve quais as qualidades que um príncipe deve possuir e como deve usá-las.
O príncipe deve ser ponderado, humanitário, prudente, agir de forma
equilibrada.
[12]
A justiça como equidade expõe a tensão existente entre os direitos à igualdade
e à diferença, argumentando que ser justo é tratar o igual de maneira igual e o
diferente de maneira diferente. O legalmente justo é ser justo, é ser ético e
ser ético é preservar a igualdade dentro da diversidade. Para Aristóteles o
princípio da igualdade não é suficiente para garantir a justiça plenamente,
posto que as demandas e as necessidades não são sempre iguais para todos.
[13]
Sócrates percebe nas leis um somado de preceitos cuja obediência é
indiscutível, sendo elas justas ou não. Diz que o direito surge como um
instrumento do homem para manter a coesão social, visando a efetivação do bem
comum, que ocorreria quando a humanidade alcançasse todas as suas
potencialidades por meio do cultivo de virtudes. Cita também o juiz, que deve
julgar de acordo com o direito (leis) e a sua consciência (ética e moral). E
por mais que as leis sejam injustas devese segui-las para alcançar um bem
comum, entendido como a possibilidade de os homens atingirem todas as suas
potencialidades.
[14]
A Equidade é definida como a liberdade instrumental igual e independente de
diferentes justiciáveis (dos indivíduos, por exemplo) era. um espaço de escolha
definido, ou como uma situação equivalente. E o conceito básico e mais simples
da análise da liberdade igual, e o instrumento básico da análise de situações
mais complexas. (A palavra 'eqüidade’ provém do termo latino que significa
igual, e liberdade igual é a igualdade ética geral; semioticamente, a palavra
Equidade corresponde, aqui a 'liberdade instrumental igual e
independente’)." (SergeChristophe Kolm, Teorias modernas da justiça, p.
191).
[15]
A tragédia e a comédia estão muito imbricadas na vida e na obra de Platão. É
famosa anedota de Diógenes Laércio em sua Vida e Doutrinas dos Filósofos
Ilustres, em que narra que Platão: [...] enquanto se preparava para participar
de um concurso de tragédias, ouviu Sócrates em frente ao teatro de Dionísio, e
então jogou os poemas, dizendo: “Efesto! avança assim, Platão precisa de ti!”
Dizem que a partir de então, aos 20 anos, tornou-se discípulo de Sócrates.
(D.L. 3.5-6).
[16]
A justiça para Aristóteles é uma virtude (areté) prática ou moral, da mesma
forma, por exemplo, que a coragem e a temperança. As virtudes éticas são
hábitos que, como tais, se adquirem pela experiência.
[17]
Rawls ao identificar quais eram os seus princípios da justiça e defender que os
homens encobertos pelo véu da ignorância os escolheriam, a imprecisão de
Dworkin foi defender todas as decisões jurídicas orientadas pelo ideal político
da integridade seriam justas.
[18]
Diante das inúmeras dificuldades que o conceito de Justiça levanta, as duas
soluções mais recorrentes foram a do Positivismo Jurídico e a do Realismo
Jurídico. A primeira, procura anular o valor da justiça como uma questão
exterior ao direito. A segunda, encabeçada não apenas por Oliver Holmes Jr,
como também por Jerome Frank, alimenta um ceticismo ríspido contra as normas,
as regras e os fatos, abrindo mão de qualquer possibilidade de produzir
justiça. Mas estas tentativas claramente não esgotaram o problema.
[19]
O filósofo é o amigo do conceito, ele é conceito em potência. Quer dizer que a
filosofia não é uma simples arte de formar, de inventar ou de fabricar
conceitos, pois os conceitos não são necessariamente
formas, achados ou
produtos. A filosofia, mais rigorosamente, é a disciplina que consiste em criar
conceitos. O amigo seria o amigo de suas próprias criações? Ou então é o ato do
conceito que remete à potência do amigo, na unidade do criador e de seu duplo?
Criar conceitos sempre novos é o objeto da filosofia. É porque o conceito deve
ser criado que ele remete ao filósofo como àquele que o tem em potência, ou que
tem sua potência e sua competência. Não se pode objetar que a criação se diz
antes do sensível e das artes, já que a arte faz existir entidades espirituais,
e já que os conceitos filosóficos são também sensibiliza. Para falar a verdade,
as ciências, as artes, as filosofias são igualmente criadoras, mesmo se compete
apenas à filosofia criar conceitos no sentido estrito. Os conceitos não nos
esperam inteiramente feitos, como corpos celestes. Não há céu para os
conceitos.
[20]
A peça " Mercador de Veneza “foi escrita há mais de quatro séculos, mas
ainda coloca em cena temas que permanecem relevantes, como discriminação
racial, intolerância e violência. A trama é repleta de passagens que evocam uma
reflexão sobre identidade e igualdade, como o famoso discurso do personagem
Shylock.
[21]
Em "Como gostais" nona das dezoito comédias do autor, escrita em
1599, é contada a história de Rosalinda, uma jovem que, em meio a uma disputa
sucessória em um ducado na França, precisa fugir da vida na corte. Para chegar
ao seu final feliz, ela terá de passar por mil provações, inclusive se
disfarçar de homem.
[22]
Os três primeiros Seminários de Lacan põem em evidência uma primazia: do
significante (I), do sujeito efeito do significante (II), do significante
Nome-do-Pai (III), substituição metafórica do desejo primordial materno. Uma
explicitação da mediação da linguagem se imporia para uma abordagem mais adequada
da temática do objeto (IV), se destacando sobre o pano de fundo da falta, lugar
do desejo. E assim, uma vez assinalada a primazia do significante, surgem os
quatro Seminários seguintes sobre o desejo: desejo do Outro (para Hamlet, ser
ou não ser o falo da mãe) (VI), desejo de morte articulado à falta do Bem
Supremo, a propósito da Ética da psicanálise (VII), e, neste Seminário VIII,
cuja última parte vai agora reter nossa atenção, desejo do analista, pondo verdadeiramente em questão o amor-ódio
da transferência.
[23]
Para Platão, a maioria das pessoas, principalmente, os sofistas colocam a
justiça como pertencente a ideia de bem. Importante na fundação da cidade, por
entender que a justiça é um Bem que se quer pelo que ela é e pelas
consequências que produz na vida dos cidadãos. A finalidade da justiça é
conseguir o máximo de bem-estar para o súdito, velando pelo bem de quem é
cuidado pelo governante. A finalidade de governar está no coletivo dos
cidadãos, ou seja, da proteção do bem alheiro, e não nos interesses individuais
do governante.
[24] Julgar com justiça apresenta-se como o
desafio constante do juiz moderno, uma vez que ele deve se valer dos princípios
jurídicos, como o da razoabilidade e da proporcionalidade, num balanceamento
dos interesses em conflito, observando sempre, os fins sociais da lei e as
exigências do bem comum, na fundamentação de suas decisões. Também, é
necessário que o magistrado tenha prudência, pois ao aplicar a lei em cada
caso, ele interpreta o fenômeno jurídico. A interpretação e aplicação possuem
um conteúdo eminentemente prático da experiência humana, vez que se espera uma
decisão não apenas jurídica, mas, também, de conteúdo social.
[25]
Para Alf Ross, há uma conexão entre o direito vigente e a ideia de justiça.
Dentro deste pensamento pode-se distinguir dois pontos: primeiro, a exigência
de que haja uma norma como fundamento de uma decisão; segundo a exigência de
que a decisão seja uma aplicação correta de uma norma. E, por isso, o problema
pode ser formulado de duas maneiras, a saber:
a) Podemos nos indagar
sobre o papel desempenhado pela ideia de justiça na formação do direito
positivo, na medida em que é entendida com uma exigência de racionalidade, isto
é, uma exigência de que as normas jurídicas sejam formuladas com a ajuda de
critérios objetivos, de tal maneira que a decisão concreta tenha a máxima
independência possível diante das reações subjetivas do juiz e seja, por isso,
previsível.
b) Pode-se perguntar,
então, que papel desempenha a ideia de justiça na administração da Justiça, na
medida em que essa ideia é entendida como uma exigência de que a decisão do
caso individual aplique corretamente o direito vigente. (ROSS, 2000, p.
326-330).
[26]
Dworkin, ao contrário de Hart, não entendia que um sistema jurídico válido
deixaria de guardar correspondência com a moral e a justiça. Como desdobramento
dessa ideia, entende que os homens e mulheres possuem direitos morais que não
são necessariamente sancionados pela ordem política vigente. Defende o autor
que determinados direitos do homem existem independente de prescrição legal e,
assim, nega a noção positivista de que o Direito apenas existe nos temos da
lei.
[27]
Levar os direitos a sério, afastando-se do que preconizou Ronald Dworkin que
cunhou a frase, para muitos autores pós-modernos, não significa mais
estabelecer uma dita “ciência do direito” eliminando todas as variáveis que
atrapalhem a metodologia do trabalho. O que se observa agora é que o
comprometimento do cientista jurídico se dá em termos de considerar todos os
fatores importantes para determinada questão, levando em conta seu contexto,
seu momento histórico, o aparato jurídico disponível e teorias que venham a
auxiliar no enfrentamento dos problemas, de maneira que os termos verdade e
justiça estejam contextualizados segundo a realidade momentânea que estão
inseridos.
[28]
As principais teorias modernas sobre justiça revelam-se em duas grandes
categorias: para uma primeira corrente, a ideia de justiça relaciona-se
diretamente com a ideia de equidade (ou ainda, fairness, utilizando-se
da expressão inglesa). Para uma segunda corrente, a ideia de justiça está mais
ligada ao conceito de bem-estar (welfare). Cada uma dessas correntes comporta
uma série de teorias diferentes, que se utilizam de distintas perspectivas para
tratar do tema.
[29]
Outro aspecto importante da obra de Hart é a relação estabelecida entre justiça
e moral e a distinção entre estes conceitos. Hart separa a ideia de justiça que
está relacionada ao campo do Direito e as características que distinguem os
princípios morais das regras jurídicas ou de qualquer outro conjunto de regras. O autor identifica o
conceito de justiça com o de eqüidade -justice as fairness- e faz sua
análise no campo da segunda para chegar à outra. O justo então seria tratar
igualmente os iguais e desigualmente os desiguais. Esta premissa somente se
justifica enquanto tem por finalidade o bem comum, ou seja, o bem da sociedade,
que não for considerada apenas pelas necessidades de uma determinada classe ou parcela mais forte.
[30]
Importante é lição de Cavalieri Jr., ao apontar que a criação do Direito não é
obra exclusiva do legislador, mas, principalmente do jurista, do magistrado, do
advogado, enfim de todos os operadores do direito. O que o legislador faz é a
lei, mas o Direito é muito mais amplo que a lei. A Lei não esgota o Direito
tanto como a partitura não esgota a música. Ao interpretar a lei, constrói-se
uma concordância aceitável entre o caso concreto e a justiça.