A Dama das Camélias e as relações extramatrimoniais no Direito brasileiro e no mundo
É interessante apontar o processo de evolução logrado pela união estável na sociedade, especialmente, na brasileira, onde se deflagraram progressos após seu reconhecimento constitucional, como sendo entidade familiar idônea que goza de plena proteção do Estado. Cumpre, igualmente, observar a jurisprudência pátria que é capaz até de reconhecer uniões estáveis simultâneas bem como seus efeitos jurídicos. Mesmo apesar da decretação pelo STF de inconstitucionalidade do artigo 1.790 do C.C. de 2002, motivada pela vedação ao retrocesso e por julgar tal dispositivo como sendo violador de princípios constitucionais.
“A
Dama das Camélias” é uma obra de autoria de Alexandre Dumas Filho[1] que narra a história do
amor entre Armand Duval e Marguerite Guatier que se tornou um clássico da
literatura francesa. O enredo já começa pelo fim, quando o narrador entrou por
curiosidade em um leilão na casa de Marguerite Gautier, uma famosa cortesão
francesa de Paris, que havia falecido há pouco tempo.
Depois,
o jovem Armand que fora amante de Marguerite passa a contar sobre o romance. A
paixão de Armand por Marguerite e se declarou a ela, apesar de saber de seu
modo de viver e todo o falatório que ocorreria.
A
cortesã aceitou tê-lo como amante, e pouco a pouco correspondendo seu amor. Marguerite
tem pouco tempo de vida, já que uma doença nos pulmões lhe enfraquece a cada
dia, e decidiu que viverá aquele amor há muito tempo negado às mulheres de sua
condição social. E, são muitas as reviravoltas, alegrias e tristezas até chegarmos
ao ponto de partida, isto é, a morte da jovem.
O autor
propôs questionamentos até mesmo contemporaneamente válidos, e refletiu sobre o
julgamento que se faz sobre as mulheres que se dedicam a prostituição como meio
de subsistência.
Abordou
também o sentimento de posse do homem sobre a mulher, a sua inferiorização na
sociedade, a honra ligada ao dinheiro e ao nome de família estão também muito
presentes.
Nota-se
que a obra teve cunho autobiográfico e até chegamos a ter raiva de Armand e
admirar a força e a inteligência de Marguerite. Armand é o retrato fiel de
homem possessivo e trata a mulher como objeto, e por vezes, até mesmo animal
selvagem a ser domesticado e adaptado a um novo modo de viver, àquele de seu
senhor. Embora os detalhes tenham mudado muito, porém o padrão de comportamento
permanece o mesmo e até certos conceitos dentro de relacionamentos amorosos.
Por
esse enredo, nos dedicaremos ao Direito Família, a regulamentação da união
estável, sua diferença quanto ao concubinato e, demais reflexos jurídicos.
A
moderna doutrina orienta-se no sentido de que as uniões extramatrimoniais podem
também ser denominadas de concubinato, união livre ou união de fato,
correspondendo a uma vida em comum entre homem e mulher, com o fito de
constituir uma família[2].
Pretende-se
prover análise comparativa dos diversos institutos jurídicos que tratam do tema
das uniões livres em diversos países, e há em suma, três formas distintas.
Existem
países que tem legislação própria e autônoma que disciplina a família
legalmente constituída, naquilo que for compatível. E, a terceira possibilidade
é combinar a legislação pertinente com outras fontes do Direito.
Importante
frisar que as uniões sem matrimônio já coexistiam com o matrimônio legalmente
instituído na península ibérica de longa data e mesmo durante o domínio do
Império Romano, prevalecia a legalidade do concubinato escudado na lícita
consuetudo non causa matrimonio, não obstante não ser uma união de direito,
era uma forma de união legal, porém inferior ao matrimônio.
Da
mesma forma, após aqueda do Império Romano, ainda continuou o Direito Espanhol
a se permitirá união sem casamento, na Lei das Sete Partidas, conhecida como a
figura da barregania, em que a mulher, geralmente conviveu com a forma de vida em
comum entre o homem, geralmente era pessoa de classe inferior.
Direito
hispano-americano, temos que a influência da Igreja Católica sempre levou o
legislador a impor quase um rigorismo absoluto na defesa das uniões
matrimonializadas, sob o manto do casamento católico.
Tanto
é assim, que somente no início do século XX, é que de forma muito tímida
algumas legislações ordinárias passaram a tratar desta temática. “O antigo
direito espanhol admitiu a instituição da barragania, união de caráter inferior
similar ao concubinato romano. As partidas lhe dedicam todo um título (Partida
4ª, título XIV)”.
É
importante ressaltar que a legislação mais antiga em termos de proteção da
união de fato, foi inserida no art. 1.635 do Código Civil Federal mexicano de
1928, para o Distrito e Territórios Federais, no qual assegurou o direito de
herança à companheira que manteve vida em comum por 5 (cinco) anos com o autor
da herança, com exclusividade.
Da
mesma forma, também protege as uniões extramatrimoniais: o Código Civil do
Estado de Morelos, do Estado de Tlaxcala, e o Código de Família do Estado de
Hidalgo dos Estados Unidos do México.
O
direito constitucional de Cuba (carta Magna de 1976), da Guatemala (Carta Magna
de 1957), de Honduras (Carta Magna de 1957), do Peru (Carta Magna de 1945) e da
Bolívia (Carta Magna, art. 194 §2º), reconhecem a união de fato, e ipso facto
lhes é aplicada a legislação ordinária.
O
Código de família de Cuba. O art. 18 diz: “A existência de uma união
matrimonial entre um homem e uma mulher, com condição legal para contraí-la e
que reúna os requisitos de singularidade e estabilidade, surtirá todos os
efeitos próprios do matrimônio formalizado legalmente quando for reconhecido
por tribunal competente”
Diversos
países da América Central e alguns da América do Sul já optaram pelo
fracionamento de suas codificações civis, culminando com a exclusão do Direito
de Família, do ordenamento civil, e dentre eles pode-se citar a república de
Cuba, com o seu Código de Família (Lei n. 1.289 de fevereiro de 1975); onde em
seu Capítulo I, Seção terceira, trata do matrimônio não formalizado. Da mesma
forma, a república de El Salvador optou pelo Código de Família, que admite a
família extramatrimonial, regulando-a do art. 118 usque 126.
O Código
de Família de El Salvador. Este conceitua, no Capítulo IV, onde regula “A união
não matrimonial”, no seu art. 118, como: “Serão denominados “conviventes” os
companheiros de vida e gozarão dos direitos que se lhes confere neste
capítulo”.
Assim
também “gozarão desses direitos as pessoas que sendo púberes e reunindo os
demais requisitos, em razão da convivência, houverem procriado um filho e
alguma delas não tiveram tido a idade requerida para contrair matrimônio, ou
falecera antes de completar o período de convivência”.
Igualmente
na República do Panamá editou seu Código de família nos termos da Lei 3, de 17
de maio de 1994, que entrou em vigência em 3 de janeiro de 1995, em que uniões
não matrimonializadas são chamadas de matrimônio de fato.
A
república da Bolívia, que editou o colocou em vigência o seu Código de Família,
no ano de 1977, onde também regula as uniões conjugais livres, fundada nos seus
usos e costumes estabelecendo uma regulamentação de seu concubinato,
denominando-o sempre de união conjugal de fato.
O
Código de Família da República da Bolívia. O art. 159 afirma textualmente: “As
uniões livres ou de fato que sejam estáveis e singulares produzem efeitos
similares ao matrimônio, tanto nas relações pessoais como patrimoniais dos
concubinos podem aplicar-se as ditas uniões as normas que regulam os efeitos do matrimônio, na média que seja
compatível com a sua natureza, sem prejuízo das regras particulares que se dão
a continuação”.
O
Direito ocidental Europeu a variação de posicionamento em relação à família
constituída à margem da legislação própria recebe tratamentos distintos
conforme o país.
Em
Portugal, a união livre ou concubinato, na lição de Cunha Gonçalves foi
introduzida na legislação portuguesa, pelo art. 34, INC. V, do Decreto nº 2, de
25.12.1910, sob o rótulo de convivência notória como marido e mulher,
conferindo o art. 47 do mesmo decreto, direito a alimentos a mesma.
Direito
esse mantido à companheira do de cujas, caso fique comprovada vida em comum
more uxório, por mais de dois anos, contra a herança. Porque ela decai desse
direito se não for exercido no prazo de dois anos, a partir do falecimento do
autor da herança, nos termos do art. 2.020 do atual Código Civil Português.
Em
França, o concubinato ou união livre, são duas expressões que designam o mesmo
fenômeno, a saber uma união fora do casamento apresentando uma certa
estabilidade; o termo concubinato mais livre põe ênfase sobre o elemento
material (cum cubare: deitar-se com), já a união livre, mais
intelectual, prepondera sobre o elemento intencional (união livre, sem formalismo
e sobretudo sem vínculo, suscetível de ser livremente rompida).
O
doutrinador Alain Bénabent, da Universidade de Paris X – Nanterre, “podem
existir diversos graus nas relações extraconjugais: aventura passageira,
vínculo mais estável, mas sem coabitação, enfim vida marital.
Todos
não merecem o nome de concubinato, à luz do art. 340 do Código Civil Francês.
Mas, em verdade, a situação de fato pela qual se põe a questão de um embrião de
ordenação jurídica supõe mais que isto: não é o vínculo, mesmo seguido, que necessitará
dessa organização, mas a comunhão de vida que conduzirá de fato a uma mistura
de interesses e a uma aparência de vida de casados, a do ‘falso casal’.
Concluiu
esse jurista: “É nesta medida somente que o concubinato é apresentado às vezes
como uma alternativa ao casamento, e produzirá certos efeitos semelhantes.
O
Direito Francês não conhece nenhuma legislação conjunta sobre união livre,
apesar das evidências de aumento desse fenômeno: passou-se de 445.000 casais
que não contraíram legalmente núpcias em 1975 para quase 1.000.000 em 1985.
Existem somente ‘poemas de textos’ sobre o direito de moradia e direitos
sociais que usam de eufemismo”.
As
pessoas vinculadas ao concubinato procuram fazer valer o seu direito, obtendo
junto a certas municipalidades locais “certificados de concubinato”, ou
“atestado de união livre”, ou ainda, “declarações de honestidade”, visando
obter reduções sobre o custo dos transportes ou suprimento do direito de ajuda
e, também, buscando benefícios de seguridade social, ou finalmente, para
garantir que os contratos de locações para moradia celebrados com o concubino
lhes sejam transferidos. Isso, no fundo, representa um alinhamento das soluções
do Direito civil para com aquelas do Direito Social, anteriormente mencionadas.
Ponderou
Boulanger, a jurisprudência francesa colocou a ruptura da união livre e suas
consequências, equivalentes ao rompimento de noivado de tal sorte que não
existindo culpado pelo fato, ipso facto, não se cogitará em direito
indenizatório, conforme se dá na ruptura matrimonial através do divórcio sem
culpa.
Por
outro viés, se houver culpa por parte de um dos companheiros exsurge o direito
à indenização e. numa prima hipótese tem-se a obrigação natural que se
transformou em obrigação civil; Numa segunda hipótese, tem-se a configuração de
uma sociedade de fato, na qual ambos os companheiros contribuíam em pé de
igualdade para sua contribuição e manutenção.
Em
ambos os casos, o que se tem verificado é a dificuldade de se provar aquelas
situações, de tal modo, que não se configura enriquecimento ilícito como também
a sociedade de fato, o que leva à improcedência da pretensão indenizatória.
Até
mesmo em caso de morte, nada receberá o companheiro supérstite da união livre,
pois o Direito francês não prevê o benefício de ordem para a referida pessoa,
principalmente, após a decisão da Câmara Mista de cassação prolatada no Acórdão
Grandas em 27.02.1970.
Já
para o direito alemão, segundo H.W. Straetz o concubinato se reveste de
importância grande e a qualidade de casamentos reduziu-se constantemente nos
derradeiros anos.
Reciprocamente,
os concubinados válidos abertamente se multiplicam numa medida fácil de notar,
não somente estas uniões não criam objetivo de reprovação como também são
plenamente reconhecidas pela sociedade.
E, o
direito positivo alemão, fez sua única referência ao concubinado quando do §
122º do BSHG (Lei Federal de Auxílio Social) de 1961. In litteris: As pessoas que vivem em
uma comunhão no casamento não devem ser melhor tratados que os esposos, no que
concerne as condições ou extensão do auxílio”.
Cabe à
jurisprudência nortear as decisões acerca dos conflitos surgidos nos casos de
concubinato, e esta não fez nenhuma distinção significativa entre as uniões
concubinárias simples e as adulterinas, e inadmitiam o testamento entre
amantes, sob o prisma de atentar aos bons costumes à disposição. No entanto,
essa situação não é mais presumida, devendo a mesma, ser provada de forma
fundamentada pela parte interessada.
Em se
tratando de ruptura de concubinato, a jurisprudência alemã tem optado na
hipótese de objetivos comprados em comum, pela partilha igualitária escudada na
“sociedade interna” e, no que tange as contribuições aos enganos familiares de forma
recíproca, é o quantum satis para inviabilizar a pretensão
indenizatória, fundada no enriquecimento sem causa.
Se as
contribuições, porém, foram disformes, por exemplo, ocorrer trabalho não
remunerado de um favor do outro parceiro, poderá haver então decisão favorável
de indenização escudada no § 812º al. 1, do BGB.
Também,
é assegurado pela jurisprudência, o direito locatício a um dos concubinos, no
sentido de manter o contrato de locação celebrado pelo se companheiro até o seu
término, tendo em vista a morte deste ou a ruptura do concubinato, onde este
último deixa o imóvel locado.
É
incrível que o direito alemão já regulamentasse a instituição da união estável
homossexual, porém, ainda não regulamentou a união estável heterossexual, ao
contrário do Direito francês.
O
direito suíço afirma que na união pública, como também para o legislador e para
o juiz, o casamento é a única forma legítima da união de um homem e uma mulher.
Uma pesquisa recente mostrou que o casamento surge cada vez menos como
instituição, cada vez mais como contrato análogo, exceto idêntico aos outros
contratos. Outro traço revelador de evolução é o regime jurídico da união
livre.
Progressivamente,
passou-se neste domínio da hostilidade à tolerância. E, certamente, inúmeras
legislações cantonais reprimem ainda penalmente o concubinato, seja como tal,
seja como escândalo público, mas estas disposições não são mais quase nada
aplicadas. Não se saberia ainda, em alternativa ao casamento, mesmo que a
atitude do direito suíço não seja unívoca.
Em
matéria de segurança social, por exemplo, os consortes são favorecidos para
proveito dos concubinos, mas tal não é geralmente a caso em direito fiscal (os
consortes, taxados juntos, são mais afetados pela taxa em direito fiscal (os
consortes, taxados juntos, são mais afetados pela taxa progressiva de imposto
que os concubinos que são taxados separadamente).
A
jurisprudência da Suíça permitiu legado feito por homem separado de sua esposa,
em favor da companheira que tinha cuidado dele durante sua doença para
compensar sua devoção, vide Acórdão de Beindesgericht de 5 de novembro de
1959.
O
ordenamento jurídico italiano no que se refere às uniões livres, optou pela
aplicação do regime analógico, o que significa, estende-se à família
extramatrimonial de forma total ou parcial, o conjunto de normas destinadas à
família legítima.
A famiglia
di fatto tem o respaldo do artigo 29 da Constituição italiana nominada de
sociedade natural. E, a Lei de Igualdade, de 19 de maio de 1975, praticamente
acabou por consolidar a proteção jurídica aos membros da famiglia di fatto,
quando eliminou qualquer diferença entre os filhos legítimos e os naturais, em
termos de direitos sucessórios.
Importante
citar que a Suprema Corte Italiana em decisão de 1977, reconheceu a famiglia
di fatto como comunidade na qual se realiza uma função de gratificação
efetiva e de solidariedade social, que se corresponde como função de família e,
na qual se dá a vida a um processo de desenvolvimento da pessoa, derivando-se
daí, determinados efeitos jurídicos.
O
doutrinador Massimo Bianca[3] da Universidade de Roma
que a constituição reconhece o direito da família cuja sociedade se funda sobre
o casamento, marcando um seguro limite em relação a família de fato, isto é, a
respeito da família surgida de uma simples convivência. O significado deste
limite não pode, todavia ser aquele da total irrelevância, ou pior da
reprovação do ordenamento jurídico ao fenômeno da convivência não formalizada
do casamento.
Conclui
ainda, aquele jurista “ela, todavia, não comporta que a família natural seja
juridicamente comparada à família legítima, mas, mesmo assim, significa que o
ordenamento deve tutelar o interesse essencial da pessoa a se realizar na
família, que é a primeira forma de convivência humana, quer dizer, a sociedade
natural”.
O
Direito Italiano, em termos de Europa Ocidental, foi o que mais avançou na
proteção das famílias naturais ou extramatrimoniais, quando o próprio texto
constitucional se preocupou a lhes garantir segurança jurídica.
Nos
países de língua inglesa, onde vige o common law marriage praticados em
diversos Estados dos EUA e, também na Escócia. Nos EUA, a sobrevivência do
casamento de direito comum persiste ainda que a Associação Americana de
Advogados tenha preconizado a sua supressão e ele desempenhe um papel não
desprezível em certos estados do Centro e Sul (Iowa, Ibaho, Colorado, Carolina
do Norte, Alabama) onde ele é definido como mútuo entendimento para se entrar
na relação matrimonial.
Na
Grã-Bretanha, uma lei de 1975, mesmo na hipótese onde o defunto tomou precaução
testamentária, dava o direito de sucessão à esposa de fato mantida total ou
parcialmente.
Todavia,
a lei fiscal de 1976‘suplementare/Benefits Act’ (modificada em 1980) se
esforçou para não favorecer os concubinatos e sim as pessoas casadas. Por outro
lado, verifica-se que os antigos países do ‘Commonwealth’ se mostram
particularmente receptivos em proteger a união livre.
Na
Austrália do Sul, existe lei específica, ‘Family Relatioriship Act’,
desde 1975, disciplinando as relações familiares e instituindo figura dos
‘esposos putativos’, os quais, embora não casados, mas que mantiveram vida em
comum por cinco anos, tem direito a partilha dos bens.
No
Canadá, a maioria das provinciais de língua inglesa (Ontário, Colômbia
Britânica, Terra Nova e Ilha do Príncipe Eduardo) tomou-se medidas sucessórias
em favor dos concubinos, regulamentando os contratos de concubinagem.
Houve
casos de ruptura de vida concubinária, que ganhou a mídia norte-americana em
1979, foi a decisão proferida pelo Juiz Arthur K. Marshall, que após apreciar a
ação de divisão de bens, no valor de U$3.600.000, movida pela cantora Michelle
Triola contra o ator de cinema Lee Marvin, negou aquele direito, porém, sob fundamento de que ela passava por momentos
difíceis, estando desempregada e que precisava voltar a trabalhar após 6 (seis)
anos de vida em comum, e que o valor de
U$ 104.000 “para fim de reabilitação… para ela reeducar-se e aprender uma nova
profissão”. Tal benefício, na época tornou-se um precedente, no Direito
norte-americano,
pois o juiz admitiu um presente de despedida (a going-away present), no
entanto, na época, os especialistas em Direito de Família, admitiram que o
magistrado havia concedido na realidade alimentos disfarçados. Tal fato for a
publicado no “TIME”, edição do dia 30.4.1979
O
precedente judicial passou a ser utilizado como parâmetro para se conceder
benefícios também a mulheres de vida em comum, em caso de rompimento da união,
por diversas cortes norte-americanas. Afirma Julián Fuentevilla “… se menciona
o caso de Lee Marvin, que se desenvolveu nos juizados familiares da Califórnia,
chegando até a Suprema Corte do Estado.
Deste
caso, têm derivado princípios tradicionais, que sustentam que se os contratos
celebrados entre concubinos seguem as regras do contrato do matrimônio valem,
com exceção de quando os mesmos estejam fundados sobre fato de manter relações
sexuais banais, o que vale dizer, de serviços sexuais de meretrizes, porque se
viola a ordem pública”.
Já o Canadá apresenta uma situação totalmente peculiar, levando-se em conta que possui dois sistemas jurídicos, um dirigido para o Canadá-francês, em que impera o Direito romano-germânico, ou seja, o direito codificado e outro, o não codificado, ou seja, o Canadá-inglês, no qual prevalece o direito comum ou, mais preciosamente, o common law de tal sorte que os sistemas trazem diferentes, no que diz respeito aos efeitos e enfoques ao direito não matrimonializado.
A
realidade é que tanto nas províncias francesas como nas inglesas, cada vez
aumenta mais a quantidade de uniões familiares não matrimonializadas, no
entanto, nas primeiras, o catolicismo exerce uma forte dose de influência, e
não obstante serem admitidas como uma instituição próxima do matrimônio, não
tem guarida do direito às uniões não matrimonializadas, sendo certo de que nos
tribunais se invoca a ausência da intenção de contratar e a de consideração
entre os conviventes.
Tanto
no sistema de direito romano-germânico, como na common law, o que se
verifica é que a família vem passando também por grandes transformações, dentro
dos padrões normais da mutabilidade familiar ocorrida no final do séc. XX e que
a dinâmica social ainda mantém neste início de Séc. XXI.
A realidade é que as constituições dos países
europeus, de um modo geral, não tratam do tema, sendo certo de que uma das
exceções constado art. 29 da Constituição Italiana, e a legislação europeia ordinária
procura ignorar a vida concubinária, apenas conferindo direitos somente em
certas relações entre as pessoas.
Em
termos de Direito anglo-saxônico, o texto mais avançado, em proteção da família
extramatrimonial, encontra-se na Family Relatioriship Act, da Austrália
do Sul, onde permite que a companheira partilhe o patrimônio com a mulher
legítima, em certas hipóteses.
É
mister render homenagens ao Direito Mexicano, que teve a primazia e de forma
prospectiva legislar para o futuro, no continente americano, quando o seu
Código Civil do direito Federal de 1928, e que entrou em vigência em 1932, de
forma inovadora, legislou para o futuro, garantindo direitos hereditários para
a concubina, fato que somente muitas décadas depois foi assimilado por outros
países do continente americano, inclusive no Brasil.
O
Brasil foi um país que somente na Constituição de 1934, se preocupou em termos
de legislação constitucional, incorporar à sua Carta Magna, o direito familiar,
assim mesmo, totalmente, voltado para a defesa do direito familiar
matrimonializado.
Porque
tal situação, somente veio a se modificar com a vigência da Constituição de
1988, quando o concubinato puro, caracterizado por uma união estável, foi
elevado à condição de entidade familiar.
No
entanto, a união estável entre o homem e a mulher, deixou de ser apenas uma
relação de fato para se situar no campo da relação jurídica, gerando efeitos
entre as partes conviventes e seus descendentes.
Em
termos de Direito, entendeu-se que não se deve regulamentar o instituto da
união livre como entidade familiar, pois os seus verdadeiros contornos
definitivos deverão ficar a cargo da doutrina e da jurisprudência, e as grandes
transformações que vêm ocorrendo no mundo globalizado, envolvendo os países de
todos continentes, certamente, ainda vão delinear a forma de família ideal para
o Século XXI, o que certamente levará a constituição de posições sólidas tanto
para o instituto da família matrimonializada como a não matrimonializadas.
A
classificação clara e sintética de Maria HelenaDiniz1 cerca do concubinato, que
o divide em:
a)
concubinato puro: união duradoura entre homem e mulher desimpedidos;
b)
concubinato impuro: um ou ambos os concubinos é/são comprometido(s) ou sofre(m)
algum impedimento para o casamento. O concubinato impuro pode ser: adulterino: o
caso, por exemplo, de um homem casado manter relação concubinária ao
lado/concomitantemente com a manutenção de uma família legítima; incestuoso: quando há parentesco próximo entre os concubinos.
Sendo
muito interessante a colocação do Professor Francisco José Cahali, ao
distinguir concubinos de companheiros, entendendo que concubinos são pessoas
que mantém relações ilegítimas, proibidas, e companheiros aqueles que
voluntariamente mantêm um relacionamento
sólido, mas sem formalidades legais.
Sustentando,
todavia, que a distinção é mais: "[...] uma questão de terminologia, e não
de essência ", pois a legislação, a jurisprudência e a doutrina usam os
termos indistintamente, motivo pelo qual se deve, primeiramente identificar os
seus requisitos e não o seu nome.
Sem
existiu a união entre homem e mulher independentemente de qualquer tipo de formalidade.
Essa união era chamada de concubinato ou união estável conforme foi
reiteradamente registrado na História do Direito. Mas, na maioria das vezes, tais
relacionamentos receberam severas críticas e preconceitos, ligando se o nome da
concubina à de prostituta[4], mulher devassa, e outros
adjetivos pejorativos.
Na Grécia Antiga o concubinato não era visto
com estranheza, ao estudarmos a vida dos filósofos gregos nos deparamos com
vários concubinatos. Em Roma, também era frequente, e foi a partir dos
imperadores cristãos que se tornou reconhecido juridicamente, quando se passou
a permitir que os filhos advindos de relações concubinárias fossem
reconhecidos; como observa Ebert Chamoun: "Favorece-se, assim, a
transformação do concubinato em matrimônio através da legitimação dos
filhos".
Na
Idade Média, apesar de combatido pela Igreja, não deixou de existir. Na Idade
Moderna, coma criação do casamento civil no século XVI, passou a despertar
preocupações, o que não ocorria antes da institucionalização do matrimônio,
quando o concubinato era tão somente visto como um casamento inferior que
acabava por gerar alguns direitos em favor da mulher.
No
século XIX, na Idade Contemporânea, ocorreram os maiores avanços. Os tribunais franceses
foram os primeiros a julgar pretensões de concubinas, com a relação
concubinária passando a ser encarada como obrigação natural com caráter
nitidamente econômico e, acarretando assim, ao final do relacionamento, uma
série de vantagens à ex-companheira. A partir de então, a jurisprudência
francesa passou a tomar decisões que equiparavam o concubinato a uma sociedade
de fato.
A
inovação da Idade Contemporânea reside no fato da proteção à concubina
apoiar-se no reconhecimento de uma relação comercial entre o homem e a mulher
ao lado de um relacionamento afetivo. Nessa época, consagrou-se uma nova concepção
jurídica para o instituto do concubinato, que passou a ser visto como uma
sociedade resultante unicamente da vida em comum, não se exigindo prova
contratual para tanto.
Assim,
a jurisprudência passou a considerar os direitos advindos do concubinato como decorrentes de obrigações
naturais. A primeira lei sobre o tema é francesa, data de 1912 e estabelecia
que o concubinato notório era fato gerador de reconhecimento de paternidade
ilegítima.
A
partir dessa lei surgiram muitas outras e, assim, o direito francês foi muito
importante para a regulamentação do concubinato em outros países.
Por
muito tempo o concubinato não foi previsto na legislação brasileira, mas, mesmo
não sendo previsto também não era proibido.
Até
mesmo a proibição de doações feitas à concubina, prevista no Código Civil de
1916, é vista, pela maioria dos doutrinadores, e pela jurisprudência como uma
defesa do patrimônio da família, ao invés de ser encarada como uma forma de
proibição do concubinato.
O
concubinato apesar de na prática existir já há muito tempo e em número
considerável de casos, só recentemente encontrou amparo na legislação nacional.
Silvio
Rodrigues (2002) citou como causa geradora da multiplicação do concubinato a
inexistência até 1977, do divórcio a vínculo em nosso país, o que fazia com que
as pessoas separadas contraíssem uma nova relação amorosa que se prolongava no
tempo sem qualquer tipo de formalidade.
O
Código Civil de 1916 não faz menção à família ilegítima, e as poucas
referências que fez ao concubinato têm o intuito de proteger e valorizar a
família legalmente constituída. Durante muito tempo, a doutrina entendeu que
para a caracterização do concubinato havia a necessidade de comprovação de vida
more uxório.
Só
posteriormente, chegou-se ao entendimento, mais moderno, de que não constituía
elementar etiológica do concubinato a convivência sob o mesmo teto e a dependência
econômica da mulher, a ponto da Súmula 382, do STF determinar: "A vida em
comum sob o mesmo teto, more uxório, não é indispensável à caracterização do
concubinato".
Todavia,
passaram a ser exigidos outros requisitos para a caracterização do concubinato,
tais como: a continuidade, a constância das relações, a fidelidade etc.
Por um
longo período o instituto foi tratado somente dentro da seara do direito civil,
até que a Constituição federal brasileira de 1988 trouxe avanços significativos
para o concubinato, estabelecendo em seu artigo 226, §3º: "[...] para
efeito de proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a
mulher, como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em
casamento".
Com
tal previsão o concubinato deixou de ser discutido no ramo do Direito
Obrigacional e passou a ser tratado dentro do Direito de Família, pois a Magna
Carta o enquadrou como uma das formas entidade familiar.
Como
ensina Caio Mário da Silva Pereira, in verbis: "Num primeiro plano,
o Constituinte de 1988 passou a considerar as uniões extraconjugais como
realidade jurídica, e não apenas como um fato social. Retirou-lhes todo o
aspecto estigmatizante, no momento em que as colocou sob a proteção do Estado.
Não se pode eliminá-la do âmbito do Direito Civil. Eis que a Constituição as insere no artigo
226, no capítulo destinado à Família".
O
concubinato ou a união estável passara a integrar o que o Constituinte brasileiro
denominou de entidade familiar, ampliando-se desta forma, a ideia tradicional
de família.
O
legislador ordinário brasileiro criou, em 1994, a Lei 8.971, que tratou do
direito dos companheiros a alimentos e a sucessões. E, em 1996, a Lei 9.278,
que procurou regulamentar o §3º. do artigo 226 da Constituição Federal.
A
existência de um título próprio no Código Civil de 2002 acerca do
concubinato/união estável acabou por solidificar o instituto em nosso
ordenamento. Todavia, mesmo antes de tais leis, alguns problemas decorrentes
das uniões estáveis foram tratados pelos legisladores e pela jurisprudência.
Como,
por exemplo, a questão dos filhos havidos fora do casamento formal. A Lei
8.560, de 29 de dezembro de 1992, que trata da investigação de paternidade veda
qualquer tipo de indicação, quando do registro de nascimento, acerca do estado
civil dos genitores, da natureza da filiação, ordem em relação a irmãos do
mesmo prenome, sempre visando preservar a pessoa do reconhecido.
No
campo da previdência social o reconhecimento das uniões estáveis já vem de
algum tempo. O Plano de Benefícios da Previdência Social (Lei n. 8.213, de
24.07. 1991) em seu artigo 16, I, com redação dada pela Lei n. 9.032, de
28.04.1995) assim como o Regulamento (Dec. n. 2.172, de 05.03.1997, artigo 13,
I) permitem a inclusão da companheira ou companheiro na categoria de beneficiários
do Regime Geral da Previdência Social, recebendo, assim, tratamento semelhante
ao dispensado aos legalmente casados, desde que a união estável seja devidamente
comprovada.
Cumpre-nos,
entretanto, esclarecer que, apesar dos grandes avanços que a proteção jurídica
da união estável alcançou, não devemos confundi-la, nem equipará-la ao casamento.
O
próprio texto constitucional dispõe que a lei "facilitará a sua conversão
em casamento", ora, como muito bem observa Caio Mário: "Uma vez que a ‘lei facilitará a sua
conversão em casamento’ deixou bem claro que não igualou a entidade familiar ao
casamento. Não se cogitaria de conversão, se se tratasse do mesmo conceito".
A
união estável constitui uma espécie do gênero família, uma família que existe primeiramente
na prática, para depois encontrar a proteção jurídica; já a família derivada do
casamento primeiro encontra o amparo legal, com o ato formal do casamento civil,
para depois existir na vida prática.
A
palavra concubinato deriva do latim: cum (com) e cubare (dormir): concubinatus,
assim o seu significado etimológico é comunhão de leito. De acordo com Plácido
e Silva o concubinato significa "mancebia, companhia de cama sem aprovação
legal"; esse é o conceito primário de concubinato.
Durante
muito tempo, ligou-se tal tipo de união a relacionamentos adulterinos, ou onde
incidia algum tipo de impedimento matrimonial (concubinato impuro). Assim, a
palavra concubinato acabou cercada por uma áurea de pecado, associando-se o
termo a palavras pejorativas (mancebia, amigação etc.).
Entretanto,
não eram em todas as uniões que existiam impedimentos matrimoniais, casos havia
em que o casal simplesmente optava por viver sem nenhum tipo de formalidade
legal, sem um casamento tradicional (casos de concubinato puro).
Com o
tempo esse tipo de união foi tornando-se cada vez mais comum e, nossos
legisladores acompanhando a evolução social resolveram adotar outra terminologia
para os casos de concubinato puro, e assim surgiu o termo união estável.
A
união estável consiste, basicamente, na convivência duradoura, contínua, entre
um homem e uma mulher, cuja relação não seja incestuosa ou adulterina, que
acabe por formar uma espécie de família, onde não ocorre a formalidade do
casamento civil.
A
jurisprudência muito contribuiu para a consagração e reconhecimento da união
estável ao determinar quais são os elementos necessários para a sua
caracterização.
Atualmente
pode-se elencar como elementos caracterizadores: a durabilidade da relação, a
existência de filhos, a construção de patrimônio comum, a affectio societatis,
a coabitação, a fidelidade, a notoriedade, a comunhão de vida, ou seja, tudo
que faça a relação parecer um casamento.
Durante
muito tempo se sustentou que para a caracterização da união estável era
necessária a convivência sob o mesmo teto, entretanto, atualmente, dispensa-se
tal requisito para a sua configuração, bastando que o relacionamento seja
contínuo, habitual e público.
A
Súmula 382 do Supremo Tribunal Federal corroborou tal entendimento ao
estabelecer que a vida em comum sob o mesmo teto, more uxório, não é
indispensável à caracterização do concubinato.
Quanto
à notoriedade do relacionamento, Cunha Gonçalves esclarece que a relação deve ser
notória, porém pode ser discreta. O
requisito da notoriedade era muito importante quando não se diferenciava a
união estável do concubinato, atualmente, com a clara distinção existente entre
eles, tal requisito perdeu a importância, pois a união estável pressupõe uma
relação monogâmica, ao contrário do concubinato adulterino onde o
relacionamento é clandestino.
Outro
elemento necessário, é a fidelidade, que deve existir tanto por parte do homem
como da mulher, assim como no casamento. Discordamos do entendimento que
sobrepõe a necessidade de fidelidade da mulher, alegando que a infidelidade
desta poderia ocasionar "turbatio sanguinis", ou seja, um
filho não proveniente da união estável; entendemos que tal argumento não pode
prosperar na atualidade, quando homens e mulheres devem desempenhar os mesmos
deveres na vida conjugal, sobretudo no que diz respeito à fidelidade que é um
pré-requisito para a caracterização de um relacionamento sério, pois se não há fidelidade,
respeito mútuo dificilmente tal relação irá se consolidar e logo, não restará
consolidada a união estável.
A
existência de filhos facilita a comprovação da união estável, todavia, não pode
ser encarada como um requisito essencial, afinal, existem casamentos sólidos,
longos onde não existem filhos, e tal ausência não implica na descaracterização
das famílias formadas por tais relacionamentos. Um requisito muito importante
para a caracterização da união estável consiste na continuidade, durabilidade
do relacionamento.
Em
alguns países estabelece-se o prazo de dez anos, em outros de dois, até mesmo
no Brasil já foi estabelecido um prazo. Em nosso país, por muito tempo
convencionou-se que o prazo era de cinco anos, provavelmente em razão da Lei do
Divórcio (antes das inovações da Constituição atual) determinar que para a
concessão da separação judicial era necessária a prévia separação de fato por cinco
anos.
Assim,
por muito tempo predominou o entendimento de que era necessário um prazo de cinco
anos para a caracterização da união estável. Apesar da Constituição brasileira
de 1988 ser bem mais flexível quanto ao prazo para configurar uma união
estável, a Lei 8.971, de 29/12/1994 determinou que o prazo seria de cinco anos
(ou na ocorrência de prole seria menor).
Tal
requisito não vingou, por não acompanhar os nuances da vida prática, onde um relacionamento
de dois anos pode ser mais estável que um relacionamento esporádico de oito.
Assim, a Lei 9.278, de 15/05/1996 estabeleceu que não há um prazo fixo para a
configuração do concubinato, revogando, dessa forma, a disposição da lei
anterior.
Apesar
de tal revogação, o prazo de cinco anos continuou a servir como referencial, juntamente
com outros requisitos para que fique caracterizada uma união estável. Ou seja,
todos os requisitos devem se completar, é preciso analisá-los em conjunto,
pois, se considerarmos a falta de um elemento como descaracterizador da união
estável, ou a ocorrência de um deles isoladamente como indicador da relação,
corremos o risco de reconhecer namoros como uniões estáveis e vice-versa.
Enfim, devemos conjugar os elementos mais comuns na caracterização de uma
família para reconhecermos ou não uma união estável.
A
maior contribuição das leis 8.971/1994 e 9.278/1996 foi a inclusão das uniões
estáveis dentro do Direito de Família, o que acabou com as divergências a
respeito da competência para apreciação dos pedidos a ela relacionados.
Todavia, a regulamentação legal da união estável foi vista por muitos como um
paradoxo.
A evolução
histórica do instituto do concubinato/união estável demonstra que ele foi
gradativamente encontrando proteção na jurisprudência, a qual foi contornando
seus limites e alcances. O principal objetivo visado pela sua regulamentação
relaciona-se ao seu tratamento dentro da seara do Direito de Família, o que
antigamente não ocorria e dificultava a mensuração, principalmente, de seus aspectos
patrimoniais.
Foi
com a previsão constitucional do instituto e com as leis de 1994 e 1996 que a
união estável/concubinato deixou o Direito Obrigacional e migrou para o Direito
de Família. Orlando Gomes, já preconizava mesmo antes da Constituição Federal
de 1998.
A Lei
n. 8.974 de 29.12.94 regula o direito dos companheiros a alimentos e à
sucessão. Ao ser publicada causou espanto e ocasionou muita discussão. Cogitou-se
até que a nova lei desprestigiava o casamento, e dava mais privilégios para a
concubina que para a esposa.
Mas,
como afirma Rodrigo da Cunha Pereira, o casamento não foi colocado em plano
inferior, pois o fato de se proteger e reconhecer outras formas de família não
implica em desprestígio deste. A lei exclui do rol das pessoas que podem ser
consideradas “companheiras” as pessoas casadas, provavelmente para n‹o
incentivar o concubinato impuro/adulterino, e porque a Constituição Federal
brasileira vigente prevê a conversão da união estável em casamento, o que não
seria possível nas uniões adulterinas.
Adotou
o requisito do prazo mínimo de cinco anos de duração ou da existência de filhos
para caracterização da união estável, ao estabelecer o direito a alimentos,
todavia, com a Lei 9.278/1996 tal requisito foi abolido
Tratou
dos direitos sucessórios entre companheiros (artigo 2º.), os quais continuaram
a valer mesmo depois da Lei 9.278/1996, pois está última não disciplinou a
matéria de maneira diversa, apenas prevendo o direito real de habitação ao
companheiro sobrevivente.
Há
quem entenda que o artigo 2º. conferiu certa vantagem aos companheiros em
relação aos casados. João Baptista Villela esclarece a questão afirmando
tratar-se de uma aplicação da chamada "meistbegünsklausel" ou
cláusula de maior favorecimento, usual no comércio internacional.
Dada a
circunstância de o casamento ter na Constituição precedência sobre a união
estável, todas as vantagens deferidas a esta, por lei ordinária, supõem-se
extensivas àqueles, caso não as tenham obtido por outro título.
A Lei
9.278/1996 surgiu com o propósito de regulamentar o §3º. do artigo 226 da
Constituição Federal de 1988 e revogou a Lei anterior (8.971/1994) apenas nos
pontos em que lhe foi contrária. O seu artigo 1º dispôs: "É reconhecida
como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem
e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família".
O
artigo ao fornecer as características da união estável, não estipulou um prazo
mínimo de convivência, nem fez referência à necessidade de prole para a sua
caracterização. Apenas exigiu a intenção de constituir uma família,
independentemente do estado civil das pessoas, que podem, devido à omissão
legal, estarem apenas separadas de fato.
O
artigo 2º elencou os direitos e deveres dos conviventes (respeito e
consideração mútuos; assistência moral e material recíproca; - guarda, sustento
e educação dos filhos comuns), aproximando a união estável do casamento.
O
artigo 8º. trata da possibilidade de conversão da união estável em casamento,
refletindo um apego do legislador ao casamento convencional, todavia, trata-se
de uma faculdade dos conviventes e não de um direito que possa vir a ser
requerido judicialmente contra um dos companheiros.
A Lei
deixou claro em seu artigo 9º. a competência das Varas especializadas de
Família para as pretensões relativas às entidades familiares não oriundas do
casamento. Reafirmando, assim, o entendimento doutrinário e jurisprudencial de
que as uniões estáveis integram o Direito de Família
O
Código Civil de 2002 tratou expressamente do concubinato/união estável.
Todavia, as mudanças trazidas pelo vigente Código Civil brasileiro não foram
significativas no que se refere à união estável, apenas acompanhando as
tendências doutrinária e jurisprudencial, seguindo, basicamente, as Leis 8.971/1994
e 9.278/1996. Resumidamente, comentamos as disposições do Código Civil
brasileiro de 2002:
a) Definição
de união estável: O artigo 1.723 seguiu o artigo 1º. da Lei 9.278/96, adotando
uma definição ampla de união estável, não estabelecendo um prazo mínimo para a
sua caracterização, mas fixando como elementos mínimos para sua configuração e
comprovação: a convivência pública, contínua e duradoura, entre um homem e uma
mulher, com o objetivo de constituir uma família.
Inovou
o Código Civil de 2002 ao definir que a união estável não poderá ser
constituída se presente um dos impedimentos matrimoniais previstos no artigo 1.521,
exceto a proibição contida no seu inciso VI — "pessoas casadas" —
possibilitando na ocorrência e comprovação de separação de fato, a configuração
da união estável.
b)
Deveres dos conviventes: o artigo 1.724 estabeleceu para a união estável os
mesmos deveres do casamento, com exceção do dever de coabitação. Os deveres
são: lealdade, respeito, assistência; e guarda, sustento e educação dos filhos.
c)
Distinção entre união estável e concubinato: grande inovação do CC/2002 em
matéria concubinária foi a distinção expressa entre união estável e
concubinato, ou seja, entre o concubinato adulterino e o não-adulterino.
Definindo como concubinato "as relações não eventuais entre o homem e a
mulher, impedidos de casar-se”.
Rodrigo
da Cunha Pereira entende que a expressão ‘impedidos de casar’ está
inadequadamente empregada no artigo 1.727, poisos separados judicialmente são
impedidos de casar-se, mas, podem constituir uma união estável.
d)
Consequências patrimoniais: basicamente manteve as disposições das Leis 8.971/1994
e 9.278/1996; inovando apenas ao afirmar expressamente que o regime da comunhão
parcial de bens será o aplicado às uniões estáveis, aproximando ainda mais a
união estável do casamento.
e)
Alimentos: não ocorreram mudanças, o artigo 1.694 prevê que os conviventes
podem pleitear alimentos assim como os parentes e os cônjuges.
f)
Sucessão hereditária: entre os direitos decorrentes da união estável, os
relativos à herança sofreram grandes alterações.
Ocorreu
uma significativa mudança na ordem de vocação hereditária geral, incluindo os
cônjuges entre os herdeiros necessários (Art. 1.845, CC/2002), colocando-os ao
lado dos descendentes e ascendentes.
Todavia,
no tocante à união estável, de acordo com a Professora Maria Helena Diniz, em
razão do disposto no artigo 1.790[5], o (a)companheiro (a) não
é herdeiro (a) necessário (a). Assim, o (a) convivente terá direto de
participar da sucessão causa mortis do outro, apenas quanto aos bens adquiridos
onerosamente nas seguintes condições estabelecidas no artigo 1790.
O art.
1.790 do mencionado Código Civil brasileiro vigente é inconstitucional, porque
viola os princípios constitucionais da igualdade, da dignidade da pessoa
humana, da proporcionalidade na modalidade de proibição à proteção deficiente e
da vedação ao retrocesso.
O
direito à alimentos entre companheiros gerou muitas discussões, e até o advento
da Lei 8.971/1994, os conviventes apenas obtinham o direito a alimentos por
meios indiretos, como por exemplo, através de ações pleiteando indenização por
serviços prestados.
O doutrinador
notável Yussef Cahali resume a situação anterior a Constituição de 1988 da
seguinte maneira: “Antes da Constituição de 1988, exauria-se o direito da
companheira no simples direito à meação dos bens da sociedade de fato (Súmula
380)”.
A seu
turno, a jurisprudência vinha decidindo sistematicamente pela inexistência de obrigação
legal de alimentos em favor da companheira: simples concubinato não confere à
mulher o direito de pleitear alimentos do amásio; a obrigação alimentar é
condicionada por leis às relações de parentesco ou à existência de vínculo
conjugal
Com a
Constituição brasileira de 1988 criando a figura da entidade familiar, que
engloba as uniões estáveis, a polêmica acirrou-se ainda mais. Decisão do
Tribunal de Justiça de São Paulo, em julgado de1990, entendeu que:
A vigente
Carta Constitucional brasileira evitou a equiparação do concubinato ao
casamento, pela proeminência que deu a este instituto.
Assim,
a obrigação alimentar entre os concubinos escapa ao âmbito da norma do artigo
226, §3º da CFRB/1988. O dispositivo cria função de assistência para o estado,
não para o companheiro frente à companheira e vice-versa. (8ª. CCTJSP, Ap. nº.
119.798-1, v. un. em 7/3/1990, Rel. Des. Fonseca Tavares, RT 653/105)
Outra
corrente caminhava em sentido contrário e acreditava que os companheiros deveriam
receber alimentos, um grande defensor dessa corrente foi o jurista gaúcho Sérgio
Gischkow Pereira (2004) que argumentava ter a Constituição enquadrado o
concubinato entre as formas de entidade familiar, sendo assim uma espécie de
família à qual o estado devia proteção e, se a existência de uma relação concubinária
provocava a perda de alimentos percebidos em decorrência de anterior casamento,
podia-se presumir um dever alimentar entre os concubinos.
Da
análise dos variados posicionamentos sobre o assunto, podemos constatar que o
maior empecilho para a aceitação do direito a alimentos entre companheiros
residia na dificuldade de se compreender a ampliação das formas de família, com
a instituição da entidade familiar.
Gradativamente
os tribunais passaram a reconhecer a proteção jurídica ao concubinato, inicialmente
os julgados referiam-se às questões previdenciárias e, com o passar do tempo
foram sendo concedidos alimentos em ações de dissolução de união estável, com a
edição da Lei 8.971/1994 acabou a polêmica em torno da concessão ou não de
alimentos aos companheiros.
E, a
Lei 9.278/1996 reforçou o disposto na lei anterior ao estabelecer entre os
direitos e deveres dos companheiros a "assistência moral e material
recíproca".
O vigente
Código Civil brasileiro consagrou o disposto nas Leis 8.971/94 e 9.278/96,
mantendo os requisitos de necessidade do alimentado e possibilidade do
alimentante. E, quanto à questão da culpa dispôs no §2º do artigo 1.694 do
Código Civil brasileiro vigente.
Importante
contribuição jurisprudencial brasileira é percebida quando analisando o
julgamento do Recurso Extraordinário 1.045.273/SE pelo Supremo Tribunal Federal
(STF) cuja tema de Repercussão Geral 529 versou sobre o reconhecimento jurídico
de duas uniões estáveis concomitantes, com a atribuição de efeitos
previdenciários nas duas relações e o respectivo rateio.
Diante
da redação do tema 529 de Repercussão Geral, ocorreram acalorados debates durante
a primeira sessão de julgamento do RE 1.045.273/SE, ocorrida em 25 de setembro
de 2019, na qual foram proferidos três votos pelo improvimento recursal, pelo
Ministro
Alexandre de Moraes, que assumiu a relatoria do recurso, pelo Ministro Ricardo
Lewandowski e pelo Ministro Gilmar Mendes, fundamentados na impossibilidade
constitucional e infraconstitucional de reconhecimento de duas uniões estáveis
concomitantes, e, portanto, na inexistência de direitos previdenciários em
relações paralelas.
O
Relator, Ministro Alexandre de Moraes, proferiu seu voto8 com o esclarecimento
enfático e inicial de que não estava em debate a produção de efeitos de uma
união entre pessoas do mesmo gênero, porque, fosse homo ou heterossexual, a
relação em tela sempre seria adulterina, esta, sim, a matéria a ser analisada.
Fundamentado
na equiparação da união estável ao casamento e, consequentemente, na
impossibilidade de reconhecer direitos em relação paralela a uma união estável,
o Ministro Relator bem argumentou que se fosse possível o reconhecimento de
duas uniões estáveis, seria também possível o reconhecimento da validade de
dois casamentos, com aceitação da bigamia.
A
união estável foi equiparada ao casamento para que tenha os mesmos efeitos do
casamento, adquirindo os seus ônus e bônus, ou seja, o dever de fidelidade e os
benefícios previdenciários, os direitos de família e sucessórios, como
salientou o Ministro Relator.
Assim,
no voto em tela, o Ministro Alexandre de Moraes acentuou que a atribuição de
efeitos previdenciários à relação adulterina levaria à atribuição de outros
efeitos à mancebia, como os direitos de família e sucessórios.
O
Ministro Ricardo Lewandowski acompanhou o Relator: Citou o v. acórdão proferido
no RE 397.762/BA, de relatoria do Ministro Marco Aurélio, como paradigma do
recurso que estava em pauta. Acentuou a impossibilidade de revolver fatos e
provas em recurso extraordinário, de modo que não seria ortodoxo reconhecer que
houve uma união estável na relação em tela, visto que a relação da viúva foi
reconhecida judicialmente. Citou o disposto no art. 226, § 3º, que incentiva a
conversão da união estável em casamento, sendo aquela um embrião deste.
E, bem
observou que a publicidade é elemento essencial do reconhecimento de uma união
estável, na conformidade do ordenamento legal, e que a clandestinidade, que é
inerente a uma relação paralela, impede o reconhecimento de uma entidade
familiar.
O
Ministro Gilmar Mendes, em seu voto, enfatizou que a regra constante do Código
Civil (art. 1.723, § 1º), especificamente no que se refere ao requisito da
inexistência de comunhão de vidas de uma pessoa que mantenha o estado civil de
casado para que constitua uma outra entidade familiar, aplica-se à união
estável, o que impede a concomitância de duas relações de fato com efeitos
jurídicos. E destacou a insegurança jurídica que se instalaria pelo
reconhecimento de duas uniões familiares concomitantes.
No
entanto, foi aberta a divergência pelo Ministro Edson Fachin que, acompanhado
pelos Ministros Luis Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia e Marco Aurélio,
votaram pela possibilidade de reconhecimento jurídico e atribuição de direitos
previdenciários à relação concorrente com a união estável.
O
Ministro Edson Fachin, em seu voto, ao dar provimento recursal, utilizou-se da
aplicação analógica do artigo 1.561 do Código Civil, que oferece efeitos ao
casamento nulo e anulável, quando a relação de bigamia é putativa, ou seja,
naquela em que existe a boa-fé do partícipe da segunda relação.
Segundo
o Ministro, aplica-se a boa-fé objetiva e que nos autos não haveria prova de
que o concubino conhecia a união estável que o falecido mantinha há uma década.
Ademais, nas palavras deste Ministro, o tema de repercussão geral versaria
somente sobre matéria de direito previdenciário post mortem, e,
portanto, em suas palavras, alargar o assunto para mais do que isto seria uma
hipertrofia.
O
Ministro Luis Roberto Barroso também adentrou em análise de fatos e provas, ao
afirmar que não existiria nos autos a demonstração sobre qual relação teria se
iniciado primeiramente, devendo ser consideradas como simultâneas, razão pela
qual deveriam ser atribuídos direitos previdenciários, em rateio, ao concubino
e à viúva.
Argumentou,
ainda, que ao caso em tela não deveria ser aplicado o precedente já firmado
pela 1ª Turma da Suprema Corte no RE 397.762/BA, de relatoria do Ministro Marco
Aurélio, uma vez que, naquele caso, haveria óbice ao reconhecimento de união
estável em concomitância a casamento previamente constituído e que tal
proibição consta expressamente do § 1º do artigo 1.723 do Código Civil, ao
passo que no RE em discussão, por tratar da possibilidade de reconhecimento de
duas uniões estáveis simultâneas, tal vedação não se aplicaria.
O
Ministro destacou que a discussão versaria tão somente acerca de matéria
previdenciária post mortem, não resvalando em conceitos de Direito de Família,
com a proposição da seguinte tese: “é constitucional a divisão da pensão por
morte entre duas pessoas que mantiveram, paralela e concomitantemente, relações
equiparáveis à união estável com o mesmo indivíduo já falecido.”
A
Ministra Rosa Weber, igualmente, afirmou que a jurisprudência[6] já firmada pela Suprema
Corte diz respeito a situações de casamento e que este deve ser privilegiado,
concluindo que não cabe a sua equiparação à união estável.
Ademais,
a Ministra usou a teoria do fato nas relações trabalhistas na construção de seu
voto, defendendo a possibilidade de aplicação do princípio da realidade,
emprestado do direito do trabalho, nas relações familiares. Disse, a Ministra,
ser viável “o reconhecimento de efeitos jurídicos a situações fáticas que não
encontram óbice na legislação posta”.
A
Ministra Cármen Lúcia citou acórdão anterior de sua relatoria, afirmando que no
MS 33.555/DF foi negado o rateio dos benefícios previdenciários porque não fora
concluída a separação de fato no casamento, sendo situação diferente daquela
versada no presente recurso em que o paralelismo dizia respeito a uma união
estável. Citou, outrossim, acórdão preferido no RE 1.175.551, no qual o rateio
da pensão foi negado em virtude da inconclusão da condição de convivência
simultânea ao casamento, afirmando que o mesmo raciocínio não se aplicaria no
caso em tela, em que foram comprovadas duas uniões concomitantes, cujo início não
se poderia precisar. Concluiu seu voto considerando possível a atribuição de
efeitos previdenciários póstumos a “uniões eventualmente equiparáveis”.
O
Ministro Marco Aurélio enfatizou ser diferente o caso em análise de outro que
se tornou paradigma, aquele constante do RE 397.762/BA, em que foi relator e
não concedeu benefícios previdenciários porque ali a relação era paralela a um
casamento e não a uma união estável. Além disso, segundo o Ministro, teria o v.
acórdão sergipano a premissa de que a relação homossexual não poderia ser
equiparável à relação heterossexual.
O
julgamento não foi concluído na primeira sessão em razão de pedido de vista
formulado pelo Ministro Dias Toffoli, tendo sido retomado entre os dias 11 e 18
de dezembro de 2020, de maneira virtual, conforme Regimento Interno do Supremo
Tribunal Federal disposto no artigo 21-B e seus parágrafos. Depois dos votos
dos Ministros Luiz Fux, Dias Toffoli e Nunes Marques, o Recurso Extraordinário
foi julgado improcedente, por maioria.
Já foi
mencionado que a união estável foi elevada ao status de família a partir da
promulgação da Constituição de 1988, mediante a verificação dos requisitos
dispostos no caput do artigo 1.723 do Código Civil, sendo a durabilidade
do relacionamento apenas um deles.
Além,
portanto, da durabilidade, deve-se comprovar a convivência pública, contínua e
com animus de constituição de família para que se possa reconhecer o
relacionamento como legítima entidade familiar constituída por meio do
instituto jurídico da união estável. São estes requisitos que distinguem a
união estável da relação de mancebia à qual o Direito não oferece proteção.
O
ponto fulcral da distinção reside no conceito de família, que é levado em
consideração pelo ordenamento jurídico a partir do princípio da monogamia.
Em
síntese, o Direito, em consonância com a sociedade brasileira, reconhece como
entidade familiar o relacionamento estabelecido entre duas pessoas, que
pressupõe, por óbvio, o dever de fidelidade conjugal. Este encontra-se,
inclusive, englobado no dever de lealdade disposto no rol de deveres da união
estável (Código Civil de 2002, art. 1.724).
A
lealdade ou fidelidade é a base da confiança para as mais diversas
inter-relações humanas e, consequentemente, axioma fundamental para delinear a
sua dignidade. A fidelidade, lato sensu, é um dos alicerces da ordem
jurídica estabelecida, permeando e sustentando as relações jurídicas.
No
entanto, a divergência, nos votos do Ministro Roberto Barroso, da Ministra Rosa
Weber, da Ministra Cármen Lúcia e do Ministro Marco Aurélio pretendeu
diferenciar a união estável do casamento em impedimentos e no acatamento à
monogamia.
O
argumento de que somente se houvesse casamento do de cujus não caberia
atribuição de efeitos em relação concubinária, em razão da previsão expressa do
art. 1.727 do Código Civil vigente, com exceção somente do previsto no art.
1.723, § 1º, do mesmo diploma legal, sobre a separação de fato do companheiro
casado, se acolhido pela maioria, importaria em grave incongruência.
Segundo
a apontada divergência, já que a relação do de cujus havia sido de união
estável, poderiam ser atribuídos efeitos jurídicos a uma relação paralela.
A
distinção em impedimentos seria inconcebível diante da possibilidade
constitucional de conversão da união estável em casamento (CFRB/1988, art. 226,
§ 3º, e CC/2002, art. 1.726).
O STF
declarou a inconstitucionalidade do artigo 1.790 do Código Civil[7], com a equiparação dos
companheiros aos cônjuges na ordem de vocação hereditária do art. 1.829 desse
Diploma Legal.
Esta
equiparação, conforme bem frisado pelo Ministro Alexandre de Moraes em seu voto
no RE 1.045.273/SE, ocorre “em ônus e bônus”, ou seja, equiparação não só em
direitos e efeitos, mas, também, em deveres e impedimentos.
No
caso da união estável quando houver a escritura é registrada em um cartório de
notas e não altera o estado civil, ou seja, os dois continuam solteiros. Já o
casamento, registrado no cartório de registros públicos, altera o estado civil
e faz do cônjuge um “herdeiro necessário”, que não pode ficar sem ao menos
parte da herança.
Existe
questionamento se o namoro prolongado, por muitos anos, poderá configurar união
estável? Sim, se o casal possuir convívio público e duradouro e tenha
finalidade de constituir família, e então, o relacionamento pode ser
reconhecido como união estável. Conforme prevê o artigo 1.723 do Código Civil
brasileiro vigente.
Mas o
principal requisito para o reconhecimento do instituto é a intenção, comum e
atual, de participar de uma vida familiar. O artigo 1.173 do Código Civil
vigente enumera como requisitos para a união estável a convivência publica,
continua e com o objetivo de construir uma família.
Assim,
o relacionamento ou período do mesmo, em que não há vontade de formar uma
família, ou, que a intenção seja para o futuro, não é considerado como união
estável, mas, conforme expressão utilizada
pela doutrina e também por uma decisão colegiada do STJ, pode ser
chamado de “namoro qualificado”.
A obra é profunda e dolorosa e, mesmo uma pessoa com pouca sensibilidade irá se comover. Do Armand confesso de quem, aliás, não sinto pena, pois feria a quem dizia amar, muito menos, quando ferem de propósito, valendo-se do poder que possui sobre os que ama. E, foi Marguerite quem ficou destroçada por culpa dele. Seu fim foi triste e toda sua vida pautada de tristeza e traduziu o verbo amar como um castigo. O castigo de amar demais.
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Notas:
[1]
Alexandre Dumas Filho Nasceu em Paris, em 29 de junho de 1824, filho do
escritor Alexandre Dumas (autor de O conde de Monte Cristo, Os três
mosqueteiros, entre outros), que começava a se tornar famoso, e de uma
lavadeira dez anos mais velha, Catherine Labay. Enquanto criança, Alexandre
Dumas filho foi educado pela mãe nos arredores de Paris. À distância, prestava
culto ao pai, que se tornara tão renomado quanto Victor Hugo. Pai e filho só se
conheceriam em 1931. Alexandre Dumas afastou o jovem Alexandre da mãe, que ele
julgava ineficaz para a educação do menino, e inscreveu-o em um colégio
interno, onde o jovem acostumou-se com a palavra “bastardo”, proferida pelos
colegas. A despeito do turbilhão que era a sua vida, Dumas pai fez uma
contribuição fundamental para a carreira do filho: introduziu-o à elegante
sociedade parisiense da época, aos teatros, aos cafés literários e aos
saraus. Já moço, Alexandre Dumas filho
era um dândi e um observador da alta sociedade francesa do século XIX, à qual
não pertencia de berço, mas que frequentava e com a qual até se identificava,
por vezes. Alexandre começou a se tornar independente do famoso pai, iniciando
em um emprego burocrático e publicando poemas em jornais. Em meio a esses
ambientes ricos e elegantes conheceu, em 1842, aos dezoito anos, uma jovem de
vinte anos, vestida de branco. Era uma famosa cortesã, Marie Duplessis, que
tinha clientes como o compositor Franz Liszt e de quem Alexandre tornou-se
amante. Ele e Marie romperam em 1845, e parte da justificativa pode ser buscada
no seguinte trecho de uma carta de Alexandre: “Minha cara Marie, não sou rico o
suficiente para amá-la como eu gostaria, nem pobre o suficiente para ser amado
como você gostaria que eu fosse”. Por vezes sofria de crises nervosas. Em 1864,
casou-se com a princesa Naryschkine, com quem já havia tido uma filha. Sua fama
de escritor rivalizou internacionalmente com a de Alexandre Dumas pai, e, em
1875, o autor de A dama das camélias foi recebido por notáveis como Victor
Hugo, que acabara de retornar do exílio, como membro da Academia Francesa de
Letras – honraria que fora negada ao seu pai, pois os acadêmicos julgavam sua
obra por demais frívola.
[2]
Primeira e principal forma de agrupamento humano, a família preexiste à própria
organização jurídica da vida em sociedade, por isso que lhe dá origem, sendo
considerada a célula mater de uma nação. Sua formação decorre,
primordialmente, das regras do direito natural, até mesmo pelo fenômeno
instintivo da preservação e perpetuação da espécie humana. Por assim entender e
proclamar, a Constituição da República situa a família como “base da
sociedade”, digna de especial proteção do Estado, conforme os principios
básicos que anuncia.
[3]
C. Massimo Bianca, tendo em conta o sistema jurídico italiano, ressalta o princípio
da liberdade, pois a “necessidade da família como interesse essencial da pessoa
se especializa na liberdade e na solidariedade do núcleo familiar”. A liberdade
do núcleo familiar deve ser entendia como “liberdade do sujeito de constituir a
família segundo a própria escolha e como liberdade de nela desenvolver a
própria personalidade” .
[4]
No Brasil, a prostituição não é crime, mas quando é feita alguma prisão, quase
sempre é pelos delitos de Ato Obsceno (art. 233 do Código Penal), ou
Importunação Ofensiva ao Pudor (art. 61 da Lei de Contravenções Penais). Nossa
lei nunca puniu a prostituta ou o seu cliente, mas criou regras que
dificultavam a atividade. No entanto, a Lei nº 12.015/2009 corrigiu distorções
decorrentes de tabus e preconceitos do começo do século passado, punindo a casa
de prostituição somente "quando e se" dentro dela ocorrer
"exploração sexual".
[5]
Aquela redação para o artigo 1.790 do Código Civil, não se sustentava seja sob
o âmbito literal ou ainda teleológico, uma vez que criava, em afronta ao
princípio da igualdade, no âmbito da realidade social (direito é fato, norma e
valor) um absurdo tratamento à união estável. Na publicação do acórdão foi
mantida a modulação dos efeitos reconhecida em 2016, sem qualquer ressalva,
apesar de debates no julgamento final. Conforme o voto do Ministro Barroso,
"é importante observar que o tema possui enorme repercussão na sociedade,
em virtude da multiplicidade de sucessões de companheiros ocorridas desde o
advento do CC/2002. Assim, levando-se em consideração o fato de que as
partilhas judiciais e extrajudiciais que versam sobre as referidas sucessões
encontram-se em diferentes estágios de desenvolvimento (muitas já finalizadas
sob as regras antigas), entendo ser recomendável modular os efeitos da aplicação
do entendimento ora afirmado. Assim, com o intuito de reduzir a insegurança
jurídica, entendo que a solução ora alcançada deve ser aplicada apenas aos
processos judiciais em que ainda não tenha havido trânsito em julgado da
sentença de partilha, assim como às partilhas extrajudiciais em que ainda não
tenha sido lavrada escritura pública" (STF, recurso extraordinário
878.694/MG, relator ministro Luís Roberto Barroso).
[6]
Analisando a modulação de efeitos do Tema 809 da Repercussão Geral, a Terceira
Turma STJ, estabeleceu que a tese fixada pelo STF se aplica às ações de
inventário em que ainda não fora proferida sentença de partilha, mesmo que
tenha havido, no curso do processo, decisão que excluiu o companheiro da
sucessão. No precedente do STF, foi declarada a inconstitucionalidade da
distinção de regimes sucessórios entre cônjuges e companheiros, prevista no
artigo 1.790 do Código Civil de 2002. Entretanto, o STF modulou os efeitos da
decisão para aplicá-la "aos processos judiciais em que ainda não tenha
havido trânsito em julgado da sentença de partilha, assim como às partilhas
extrajudiciais em que ainda não tenha sido lavrada escritura pública".
Herdeiros questionaram no STJ a decisão do juízo do inventário que incluiu a
companheira de seu falecido pai na partilha de um imóvel comprado por ele antes
da união estável, pois ela já havia sido excluída da divisão desse bem, com
base no artigo 1.790 do CC/2002, em decisão anterior ao julgamento do STF. A
decisão do juízo do inventário foi mantida pelo Tribunal de Justiça do Distrito
Federal e dos Territórios, segundo o qual, com a declaração de
inconstitucionalidade do artigo 1.790 pelo STF, deveria ser aplicado ao caso o
artigo 1.829, inciso I, do Código Civil, admitindo-se a companheira como
herdeira concorrente na sucessão, inclusive em relação ao imóvel submetido à
partilha. Para os herdeiros, as decisões que, antes do precedente do STF,
aplicaram o artigo 1.790 do CC/2002 e excluíram o imóvel da concorrência
hereditária, estariam acobertadas pela imutabilidade decorrente da preclusão e
da coisa julgada formal, motivo pelo qual não poderiam ser alcançadas pela
superveniente declaração de inconstitucionalidade.
[7]
Em 10 de maio de 2017, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu julgamento que
discute a equiparação entre cônjuge e companheiro para fins de sucessão,
inclusive em uniões homoafetivas. A decisão foi proferida no julgamento dos
Recursos Extraordinários (REs) 646721 e 878694, ambos com repercussão geral
reconhecida. No julgamento realizado os ministros declararam inconstitucional o
artigo 1.790 do Código Civil, que estabelece diferenças entre a participação do
companheiro e do cônjuge na sucessão dos bens. O RE 878694 trata de união de
casal heteroafetivo e o RE 646721 aborda sucessão em uma relação homoafetiva. A
conclusão do Tribunal foi de que não existe elemento de discriminação que
justifique o tratamento diferenciado entre cônjuge e companheiro estabelecido
pelo Código Civil, estendendo esses efeitos independentemente de orientação
sexual.