A difícil vida do estagiário de Direito
Por Paulo Schwartzman.
Olá leitores, tudo bem? Quero,
nessa volta da minha coluna mensal aqui no Jornal Jurid, trazer a atenção de
vocês para uma figura que muitas vezes é esquecida em nossa cultura jurídica: o
estagiário.
Ora, todas as profissões
contam com estagiários, podendo esses receberem a definição de aprendizes da
profissão, pessoas que estão tentando entender melhor como funcionam as
carreiras que no futuro exercerão. Então resta a pergunta, mas e o estagiário
de Direito? O que ele teria de especial?
Quero nessa coluna apontar
algumas das muitas agruras que já me foram relatadas, e algumas também
experienciadas por mim nesses mais de 12 anos envolto na cultura jurídica. Sim,
eu entreguei um pouco a minha idade, bem como o fato de que eu estagiei desde o
começo da graduação.
O estagiário jurídico é uma
personagem que sofre atualmente, no geral ele é parcamente remunerado,
recebendo, quando possui sorte, algo acima de R$1.500,00. Todavia, essa não é a
realidade da maior parte dos estagiários e estagiárias de Direito, esses que,
na infeliz maioria, não conseguem um salário que supere a casa dos R$1.000,00,
mesmo em seu trabalho sendo fundamental para o movimento da máquina jurídica.
Reza a lenda, inclusive, que a
culpa por todos os erros “é sempre do estagiário”! Ora, que infeliz posição
essa na qual seu ocupante é mal remunerado e, além disso, recebe a culpa por
todos os erros cometidos dentro da equipe de trabalho.
Se fosse só isso estava bom,
me disse um amigo estagiário, colega meu na época em que eu ainda estagiava.
Ele estava certo.
Reduzir o sofrimento do
estagiário jurídico a esses dois fatores (ser mal remunerado e receber sempre a
culpa pelos erros dos outros) seria mesmo um reducionismo indevido. Com efeito,
a realidade é mais tenebrosa.
No mundo dos egos, acima do
qual o próprio mundo jurídico é construído, o estagiário está no fundo da
cadeia alimentar. Não é raro que todos os que com ele interajam descarreguem
sobre os pequenos ombros de um mal remunerado estudante diversos problemas e
cobranças que, sinceramente, não são dele.
Quantas vezes não vi ou ouvi
relatos de assédio moral e sexual contra estagiários e, no último caso, mais
especificamente contra estagiárias/ Quantas vezes não vi que, mesmo trabalhando
muitas horas além do permitido pela lei do estágio (6 horas/dia), o estagiário
era culpado por não conseguir dar cabo às suas tarefas?
Aliás, uma das razões para os
estagiários não darem conta de terminar as tarefas em tempo não é a falta de
competência desses, mas tão somente o fato de serem utilizados como mão de obra
barata, inclusive como “substitutos” de advogados (já aproveitando pra mandar
aquele abraço para os estagiários do quinto ano – que sabem exatamente do que
estou falando). Dentro dessa cultura extremamente tóxica criada, o estagiário
que não “performa” para ficar no vocabulário clássico dos coaches e
mentores atuais é mandando para a rua com uma mão na frente e a outra atrás,
uma vez que a Lei do Estágio não o protege de dispensa sem justa causa.
Fica aí uma lembrança: o
estágio é feito para ser uma experiência de aprendizado para o estudante! Este
estudante que não deveria ser apenas mais um precarizado na já imensa horda de
precarizados do nosso Brasil.
Além de toda a carga de
trabalho estafante, o estagiário tem, por óbvio, que fazer malabarismo para
equilibrar todas as demandas do escritório com as demandas da faculdade. Isso
pode ser, como veremos abaixo, ainda mais difícil, uma vez que a Lei do Estágio
é reiteradamente descumprida na parte referente à jornada de trabalho e aos
direitos do estudante em época de prova.
Com efeito, a mesma legislação
usada como base para prejudicar os estagiários, uma vez que protege os
estagiários contra demissão injusta, é ignorada convenientemente pelos
empregadores na parte que beneficia os estagiários. Digo isso porque não é
incomum o relato de que o “chefe” não liberou para fazer prova, ou que não
respeitou o horário reduzido (que está na lei) no dia anterior, violando o
trabalho à razão de 50% estipulado pela Lei nº 11.788/08.
O que se vê, atualmente, é
apenas a ponta do iceberg de toda uma estrutura sistêmica calcada em premissas
e princípios errados. O resultado só poderia ser desastroso.
Acredito que nos comentários e
discussões do presente artigo poderemos entender e descobrir ainda mais
violações que as pequenas linhas escritas aqui. Aos supervisores, exorto a ter
mais coração e a minimamente cumprir a lei. Aos estagiários: força.