Pesquisa busca entender como o Sistema Penal lida com a violência contra a mulher

Diante da taxa recorde de feminicídios no Brasil, projeto da FGV analisa como a justiça lida com esses casos, desde a denúncia até o encerramento.

Fonte: Enviado por Vania Santos

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Reprodução: Pixabay.com

Mesmo após 16 anos da criação da Lei Maria da Penha, ainda assim, em média, quatro mulheres são assassinadas, por dia, no Brasil. Os dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública sobre feminicídios, apontaram 699 casos no primeiro semestre de 2022, configurando o maior número já registrado em um semestre. A partir dessas estatísticas, um estudo do Centro de Justiça e Sociedade (CJUS), da Fundação Getúlio Vargas (FGV), analisa como o sistema penal lida com todo o processo judicial desse tipo de violência, desde a denúncia até uma possível condenação.


“Buscamos melhorar o tratamento relacionado à mulher ao longo do processo de denúncia da violência de gênero”, declarou a pesquisadora Fernanda Prates. Os dados alarmantes se complementam a fala da pesquisadora quando ela afirma que há uma necessidade de entender quais são os filtros e as dificuldades do fluxo de informação encontrados no sistema de justiça, no que diz respeito à violência contra a mulher. O que é justamente o objetivo deste trabalho, coordenado pelo professor e pesquisador da FGV, Thiago Bottino.


“Importantes estudos vêm analisando a experiência de vitimização vivenciada nesse tipo de violência, mas nossa pesquisa busca entender os fluxos que tal violência gera no sistema penal. Qual o tratamento direcionado às vítimas e as possíveis consequências desse tratamento? Queremos entender o caminho percorrido desde o momento de abertura de um boletim de ocorrência até a sentença, e para isso, estamos dialogando com os atores que participam deste processo. Pois, se não há o acolhimento devido, isso pode criar uma nova vitimização”, explicou Fernanda.


Diante deste fator, a pesquisadora comenta que serão realizadas entrevistas e coleta de dados com o Ministério Público, Polícia Militar, Polícia Civil, Instituto Médico Legal (IML), além de redes formais e informais de atendimento à mulher, Defensoria Pública e diversos profissionais que atuam nesse contexto. Paralelo a este trabalho, serão realizadas coletas de dados quantitativas, a fim de se obter uma noção, em números, de quantas denúncias desse tipo são recebidas, quantas recebem o devido seguimento, quantas são encerradas, entre outros aspectos.


Da investigação à criação de políticas públicas


Para Fernanda, é de extrema importância saber qual é a percepção desses atores envolvidos no processo de combater a violência contra a mulher e qual é o tipo de tratamento que é oferecido ao público feminino. “Vivemos em uma sociedade machista em que todo mundo acaba embebido nesses valores e isso pode impactar, inclusive, as pessoas que estão de fronte ao sistema penal. Por isso, estamos analisando de que forma esses atores entendem o próprio trabalho e como entendem a própria violência contra a mulher”.


Apesar de o projeto ser direcionado para uma análise estadual no Rio de Janeiro, segundo Fernanda, a intenção é que a pesquisa possa ser replicada em outros estados. Principalmente após a pandemia, que ocasionou em grande aumento da violência doméstica. “Precisamos saber as impressões e opiniões das pessoas que atuam na linha de frente, a fim de compreender quais são os gargalos e os principais desafios que realmente podem impactar na luta jurídica da violência contra a mulher”.


Atualmente o projeto está na etapa de coleta de dados com os órgãos e redes, e é esperado que os resultados sejam apresentados no segundo semestre de 2023. A expectativa é que as informações obtidas possam embasar políticas públicas, que venham não só para melhorar a forma como o Sistema Penal lida com esses casos, como também para ajudar a diminuir os índices da própria violência contra a mulher.


Dados alarmantes


Índices recentes como o Atlas da Violência 2019, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada indicam que em 2018, 1,6 milhão de mulheres foram espancadas no Brasil. O relatório destaca ainda que houve um crescimento dos homicídios femininos no país em 2017, com cerca de 13 assassinatos por dia. Ao todo, 4.936 mulheres foram mortas, o maior número registrado desde 2007.


Para combater esta realidade, Fernanda declara que quando estiverem com os resultados da pesquisa em mãos, os pesquisadores irão apresentá-los a todas as instituições que participaram da própria pesquisa em si e que são os atores que estão na linha de frente do combate à violência doméstica, feminicídios, etc. Segundo ela, não faz sentido que essas informações se retenham somente ao espaço acadêmico, sem atingir o próprio sistema do qual está sendo analisado.


“Este ator, seja do MP, da Polícia Civil, ou de inúmeros outros, às vezes não consegue ter uma a visão geral para entender o fluxo de como a denúncia irá prosseguir. O que dificulta averiguar quais são os possíveis gargalos nesse processo. Por isso, após a realização das pesquisas, voltaremos com essas informações em mãos, para demonstrar como funciona todo este cenário”.


Luta social e pesquisa científica


Um outro caminho que está intrínseco dentro deste projeto e pode sinalizar uma possibilidade de melhoria deste cenário, é a capacitação de estudantes desde o início da formação. Algo que vem não só para sensibilizá-los sobre o tema, mas também para capacitá-los na prática de pesquisa científica de excelência capaz de propor soluções para problemas da sociedade.


“O engajamento dos nossos alunos, sejam eles bolsistas ou voluntários, é algo a se destacar, visto que eles estão aprendendo a fazer pesquisa desde os primeiros semestres do curso. A FGV oferta a possibilidade para que esses jovens pesquisadores possam realizar e experimentar o exercício da pesquisa científica aplicada em diversos parâmetros, principalmente quando abordada em um tema tão importante como este”, finalizou a professora e pesquisadora Fernanda Prates.


Apoio e Financiamento


Esta pesquisa contou com o financiamento do Fundo de Pesquisa Aplicada da FGV (FPA FGV), que desde 2014 apoiou mais de 251 projetos, selecionados pela Comissão de Pesquisa e Inovação.


Pesquisa Científica Aplicada


A pesquisa científica aplicada é o principal foco da Rede de Pesquisa e Conhecimento aplicado da FGV, criada em 2016, com o objetivo de incentivar o desenvolvimento de pesquisas com excelência, alto impacto em diferentes âmbitos da sociedade e elevado grau de inovação. Ao propor diferentes processos e soluções para os desafios enfrentados pela população brasileira, as pesquisas vão de acordo com a missão da Fundação de promover o crescimento socioeconômico do Brasil.

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