O Supremo sob pressão

Depois de conceder e derrubar a liminar que permite o aborto para grávidas de fetos sem cérebro, o Supremo Tribunal Federal (STF) está sob fogo cruzado.

Fonte: Jornal O Globo

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Depois de conceder e derrubar a liminar que permite o aborto para grávidas de fetos sem cérebro, o Supremo Tribunal Federal (STF) está sob fogo cruzado. Se de um lado a Igreja Católica usa sua força política para pedir o apoio dos ministros contra a interrupção da gravidez, de outro entidades de direitos humanos e o movimento feminista tentam convencer a Corte de que as mulheres têm direito a decidir se querem ou não levar a gestação adiante. De parte a parte, a campanha é acirrada.

Num julgamento que pode ocorrer no mês que vem, os ministros do STF deverão julgar se têm ou não competência para tratar do assunto ? já que o aborto de anencéfalos não está previsto em nenhuma lei brasileira.

As estratégias para tentar obter o voto dos ministros incluem mensagens eletrônicas e o velho lobby nos gabinetes ? comum no Congresso, não no STF. Os ministros também recebem cartas e livros. O clamor popular em torno da questão já supera julgamentos importantes da história recente do Supremo, como o da taxação dos inativos prevista na reforma da Previdência.

? Jamais tivemos um tema tão acompanhado pelos diversos segmentos da sociedade ? diz o ministro Marco Aurélio de Mello, autor da liminar que, até ser derrubada no final de outubro, chegou a permitir por 112 dias o aborto de fetos anencéfalos.

A Igreja Católica tem usado seu poder para fazer valer sua histórica posição, que condena o aborto em qualquer situação. Há algumas semanas, ex-ministros do STF ligados ao clero visitaram gabinetes dos atuais ocupantes da Casa para pedir voto contra. Além disso ? e das manifestações públicas da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) ? um grupo de cardeais enviou ofício aos ministros com a opinião da Igreja.

O ministro Carlos Velloso enfrenta o embate de opiniões até em família. De suas três filhas, uma é a favor do aborto em caso de anencefalia, outra é contra e a terceira ainda não tem opinião formada. As duas primeiras fazem defesas fervorosas de suas posições, tentando convencer o pai:

? Apesar de ficarem tentando me convencer, elas me respeitam e não sabem como vou votar ? diz ele.

Advogado da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Saúde (CNTS), que entrou com a ação pela legalização do aborto de fetos anencéfalos, Luís Roberto Barroso considera legítima a mobilização, mas manifesta preocupação quanto à fé.

? Em um estado democrático e laico, a interpretação da Constituição e das leis não pode estar subordinada aos dogmas da fé.

Livros, fotos e e-mails enviados

Centenas de e-mails têm chegado aos computadores dos ministros. As mensagens vêm de várias partes do mundo, com opiniões, relatos de casos e imagens de bebês nascidos sem cérebro, muitas delas chocantes.

Até o julgamento da liminar de Marco Aurélio, em outubro, a maioria dos e-mails vinha de religiosos contra o aborto. Agora, médicos e organizações não-governamentais favoráveis à interrupção da gestação adotaram a mesma tática. E, assim como existem católicos a favor do aborto, há médicos contra. É o caso de Antun Lisec, um médico da Croácia que escreveu ao presidente do STF, Nelson Jobim. ?Não permitam a matança de crianças não-nascidas?, defendeu Lisec.

A pressão inclui páginas na internet que revelam para o público os e-mails e telefones dos ministros. Foi o que fez, por exemplo, o padre de Anápolis (GO) Luiz Carlos Lodi, presidente do Grupo Pró-Vida, o mais radical na campanha contra o aborto:

? A estratégia é criar um clima contrário para tentar convencer.

A organização Católicas pelo Direito de Decidir, de mulheres católicas favoráveis ao direito ao aborto, faz o mesmo, pedindo a grupos feministas que bombardeiem o STF com cartas e e-mails.

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