Escuta telefônica - intimidade e imagem

Paulo Biskup de Aquino, Funcionário Público Federal; Bacharel em Direito pela Sociedade Unificada de Ensino Superior Augusto Motta, formado em 1987; cursou a Fundação Escola do Ministério Público - FEMPAR; Pós-Graduando em Direito Penal e Processo Penal pela FACULDADE DINÂMICA DAS CATARATAS - U.D.C. E-mail: pbaquino@ig.com.br

Fonte: Paulo Biskup de Aquino

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Paulo Biskup de Aquino ( * )

A Constituição Federal e sua supremacia, limitação da Lei 9.296/96, diferenças entre meio de prova e a prova, e a proteção da intimidade e imagem.

"A má elaboração de uma Lei leva a interpretações extensivas, a insegurança jurídica, prejuízos ao devido processo legal e ao Estado de Polícia". (Paulo Biskup de Aquino)

RESUMO

Apresentação de considerações acerca da escuta telefônica, sob o enfoque crítico, com o fito de dispor de alegações defensivas na práxis forense. Apóia-se, para tanto, na opinião de doutrinadores em matéria Constitucional, Penal e Processual Penal, na análise de ações penais, ressaltando a filiação à corrente que concebe que o moderno Direito não comporta a aplicação da lei dissociada da prova material, corrente esta adotada por diversos operadores do Direito, tendo por justificativa o excesso em operações policiais no país, sua extensão quanto à exposição da intimidade e a imagem, além do clamor público.

Palavras-chave: Escuta Telefônica; Intimidade; Imagem.

Sumário: Introdução. 1 A Constituição Federal e os Direitos e Garantias Fundamentais - 2 A escuta telefônica - 3 A Intimidade e imagem - Conclusão - Referências bibliográficas.

Introdução

A escuta telefônica, carece de adequação em nosso ordenamento Penal para se prestar como meio de prova, pois a filiação corrente concebe que o moderno Direito não comporta a aplicação da Lei n. 9.296/96, dissociada da prova material, corrente esta adotada por diversos operadores do Direito, como é o entendimento da doutrina e jurisprudência. Apresentam-se neste estudo, breves considerações a primordialidade da Constituição Federal perante as outras leis, no que tange à hierarquia, a interpretação restritiva da lei em análise, os pontos controversos com a Carta Magna e a linha tênue no que diz respeito à proteção da intimidade e da imagem tão banalizados e desrespeitados pelas autoridades públicas quando da concessão de medidas extremas como a escuta telefônica, dissociado de outras provas na formação de convicção para condenação em Processo Penal.

1 A Constituição Federal e os Direitos e Garantias Fundamentais

Todas as Constituições dos países considerados "democráticos", elencam já em primeiro plano, os direitos e garantias dos cidadãos. Ad exemplum, tal assertiva é facilmente observada na análise rápida da Lex Matter vigente, onde os Direitos Fundamentais encontram-se elencados já no artigo 5º.

Afirma Rui Barbosa(1) que os Direitos Fundamentais são "os enunciados constitucionais de cunho declaratório de uma prerrogativa fundamental do cidadão" e as Garantias Fundamentais são os "enunciados de conteúdo assecuratório ao fornecer mecanismos ou instrumentos para a proteção, reparação ou reingresso ao Direito Fundamental aviltado". Nesta linha de raciocínio, seriam Direitos, ad exemplum, a livre expressão, a intimidade e honra, a propriedade e a defesa do consumidor; enquanto que seriam Garantias o direito de resposta, o mandado de injunção, o Habeas Corpus e o Habeas Data, todos expressos no artigo 5º, incisos da Constituição Federal. O aviltamento ou a não-observância destes direitos ensejariam - à prerrogativa do cidadão - no uso dos mecanismos e instrumentos citados para garantia que o direito fosse observado.

Em análise da aplicação destes Direitos e Garantias Fundamentais - basilares num Estado Democrático de Direitos - na vida prática do cidadão, nem sempre há pacificidade, uma vez que em determinados casos um direito fundamental vai de encontro, obsta ou minimiza outro, obviamente quando o cidadão exerce um, pode atingir o direito de outrem.

Há Direitos Fundamentais em todas as horas da vida do cidadão brasileiro: à vida, à liberdade, ao andar livremente pelas ruas, ao falar e ser ouvido, ao ler o jornal... Num primeiro momento, o reconhecimento destes direitos são óbvios; porém a obviedade acaba quando analisa-se o histórico destes direitos ou a história da humanidade para eles estarem tão concretizados hoje na vida dos cidadãos, sendo cláusulas pétreas na Constituição conforme dispõe o artigo 60, § 4º, inciso IV. Não obstante, há àqueles que insistem em impor limites aos Direitos Fundamentais, sob a prerrogativa do interesse social e da justificativa de que o direito à privacidade e à intimidade não é absoluto na Constituição - é o caso da lei infraconstitucional da interceptação telefônica - que, na prática, tem se revelado desastrosa e até catastrófica.

As Garantias Fundamentais, conhecidos modernamente como os writs constitucionais, consistem em fornecer mecanismos ao cidadão para que este exerça um Direito Fundamental violado ou não observado, tendo por principal característica a celeridade. No caso específico de Habeas Corpus, Habeas Data e mandado de segurança, o impetrante deve demonstrar de pronto o direito aviltado, não comportando, como sabido, dilação probatória, fato este que corrobora para a celeridade. Não obstante o fator positivo da celeridade há que se ressaltar se tal garantia, materializada pelas citadas ações possuem, de pronto, a eficácia esperada pelo impetrante. Ressalta-se que tanto os Direitos como as Garantias só alcançarão a eficácia almejada se exercida numa sociedade livre, dissociada de interesses escusos, políticos e/ou unilaterais; caso contrário será letra morta, fachada democrática para alguém ver, porém, impraticável. Estes, os Direitos e as Garantias, são os pilares e o reconhecimento de uma sociedade livre deste que eficazmente exercido e o nível de eficácia exsurge quando o cidadão impetrante vê seu direito ser reconhecido por um juízo competente, imparcial e não influenciado por ingerências da política em questão.

Observam-se Direitos e Garantias Fundamentais na Constituição/88 em diversas searas do Direito, seja processual penal, seja cível, penal - partidos políticos art. 17, § 3º; acesso à Justiça e assistência jurídica integral e gratuita art. 5º, incisos XXXV e LXXIV; trabalho art. 6º; educação art. 205 c/c art. 6º; intimidade e privacidade art. 5º, inciso X, juiz natural art. 5º, XXXVII; defesa art. 5º, LV - que, como lei maior que é, deve traçar parâmetros para que o legislador infraconstitucional não saia da linha definida pela Carta.

A Imperatividade das normas Constitucionais traduz-se em sua aplicação imediata e tais normas impõem um dever, havendo conseqüências punitivas pela sua não-observância, podendo ser invocadas pelos cidadãos e pelos Poderes Públicos. Podem ser, em classificação própria deste autor quanto a primeira, imperativas ou impositivas ou ainda de imperatividade absoluta, segundo a doutrina; estas ordenam uma ação ou abstenção de conduta, não comportando alternativa ou opção, impondo a todos um comando. Há as de imperatividade relativa que podem ser permissivas, supletivas ou também impositivas por interpretação doutrinária ou jurisprudencial.

A Constituição Federal pátria não é imutável, porém há dificultadores no processo de reforma, sabido é que os preceitos constitucionais fundamentais só devem ser reformulados somente através de nova Carta Política, a qual representará os anseios de uma sociedade num determinado momento histórico. Para tais revisões e reformulações, devem ser observados os aspectos técnicos e políticos, lembrando que não é toda matéria que pode ser reformulada.

2 A escuta telefônica

Hodiernamente, há uma discussão acalorada entre os operadores do Direito ao confrontar os Direitos e Garantias Individuais esculpidos na Carta Magna em paralelo com a Lei n. 9.296/96, haja vista que no artigo 5º inciso XII, onde in verbis "é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal" (grifo nosso), levando juristas e doutrinadores a uma verdadeira batalha 'jurídico-analista' no que diz respeito à compreensão legal quanto à visão do legislador constitucional.

Pela ótica da interpretação restritiva, o legislador ao abrir mão do sigilo e conceder a regulamentação por lei quanto à quebra do sigilo das comunicações telefônicas, o fez no intuito de assegurar ao Estado o direito de, excepcionalmente, ferir o fundamental direito da inviolabilidade do sigilo das comunicações telefônicas, mas, manteve a regra, quanto ao direito fundamental do sigilo. A concessão por regra de exceção, se deu apenas para fins de investigação criminal e instrução processual penal, sendo tão-somente um meio de investigação criminal. Assim, parece claro que a intenção do legislador constituinte foi estabelecer como a regra o sigilo e como exceção a interceptação telefônica, porém somente no campo penal, não dando margem para sua utilização em outras searas do direito.

Ao analisar concretamente a expressão 'salvo, no último caso' em relação ao texto Constitucional, a luz da interpretação jurídico-gramático-textual, chega-se à conclusão de que o legislador referiu-se apenas aos casos de comunicações telefônicas, deixando preservados os sigilos quanto à correspondência, às comunicações telegráficas e os dados telemáticos. No campo do abstracionismo jurídico, a interpretação quanto ao tema suscitado levou grande parte de nossos doutrinadores e juristas a aceitarem a tese extensiva quanto à recepção da violação legal regulamentada, concernente ao sigilo das correspondências, das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas por ordem judicial para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, nas hipóteses e na forma que a lei a lei estabelecer. Com a regulamentação do inciso XII, parte final, do artigo 5º da Constituição Federal pela Lei n. 9.296 de 24 de julho de 1996, surgiram muitas dúvidas quanto à aplicação prática desta norma nova ao caso concreto.

A interpretação elástica ou extensiva de toda norma nova é perigosa, tanto que, no Direito, toda interpretação só é aceita quando traz benefícios a quem dela necessita para efeitos de defesa, em sede de segurança jurídica e em prol do devido processo legal, tão resguardados pela Constituição Federal, tratados e convenções por ela recepcionados. Ao Estado-Juiz cabe a interpretação razoável e proporcional da lei e seu enquadramento no caso concreto, não podendo dar margens à extensividade ou elucubrações jurídicas, a não ser em benefício de seus tutelados - entendendo como 'tutelados', aqueles que estão sofrendo ou possam a vir sofrer as demandas impostas pelo Estado.

A Constituição Federal em seu artigo 5º inciso XII, já determina em seu texto que "na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal", caracterizando desde já que a interceptação das ligações telefônicas servirá como meio de prova para que a investigação criminal chegue até a prova do fato investigado e, com esta, materialize a prática do delito. Percebe-se que a interceptação isolada de um contexto probatório, por si só, não pode ser admitida como prova da materialidade de um delito. Exemplificando, uma interceptação telefônica cujos diálogos versem sobre prática de ato ilícito penal, mas que, por razões diversas, não ocorreu. Mesmo que um diálogo interceptado tratasse de ato preparatório para a prática de crime, sequer poderia ser considerado como tentativa, porque esse ato não basta, diante da exigência legal de que o bem tutelado penalmente corra risco, em conseqüência da conduta do agente. Até no crime tentado, é necessário o início da sua execução no iter criminis, que pode não se consumar por circunstâncias alheias à vontade do agente. Portanto, para que uma conversação telefônica seja considerada prova de crime é necessário que esteja inserida no contexto probatório, corroborada pelo menos por uma prova concreta da materialidade, do início de uma ação ou omissão penalmente punível, considerada antijurídica e culpável.

Em livre interpretação, o legislador ao elaborar o artigo 1º da Lei n. 9.296/96, não notou que o referido artigo entrou em choque com a Carta Magna, quando em seu texto inseriu a expressão: "para prova em investigação criminal e em instrução processual penal", não foi isso que o legislador Constitucional disciplinou - como já exemplificado - e cabe ressaltar a hierarquia das leis, onde todas devem partir da Constituição Federal, valendo em regra o que expressa a mesma "para fins de investigação criminal e instrução processual penal" e não "para prova em investigação criminal e em instrução processual penal".

O legislador ao descrever os preceitos contidos na Lei n. 9.296/96, ainda em seu artigo 1º, aduz a necessidade da pré-existência de uma ação principal em curso, sob segredo de justiça, onde o juiz, titular da mesma, observará o disposto na lei em comento e poderá, dependendo do caso já pré-existência em sede criminal, quebrar a regra constitucional e por via de exceção, conceder o monitoramento. Para melhor entendimento, se faz necessária a leitura do Artigo 1° da Lei n. 9.296/96, que assim prescreve: "A interceptação de comunicações telefônicas, de qualquer natureza, para prova em investigação criminal e em instrução processual penal, observará o disposto nesta Lei e dependerá de ordem do juiz competente da ação principal, sob segredo de justiça" (grifo nosso).

Quando o legislador fez referência à ordem do juiz competente da ação principal, já o fez admitindo a existência de uma ação criminal principal em andamento, com denuncia feita pelo Ministério Público e com um crime previamente investigado pela polícia judiciária, ou ainda, um inquérito policial instaurado por flagrante delito ou portaria devidamente relatado ao juiz competente por distribuição, o qual devidamente encaminhado ao ministério público para a denuncia de praxe, onde este ultimo notando o exaurimento investigativo da policia judiciária e concluindo pela utilização da exceção a regra e excluindo as inadmissibilidades contidas nos incisos do artigo 2º da Lei n. 9.296/96, onde pela característica do crime em comento e pela sua extensão e gravidade, merece por via de exceção o rompimento da regra constitucional, faz requerimento ao juízo competente da ação principal, em conformidade com o parágrafo único do artigo 2º, solicitando tal medida, o requerimento também pode ser feito nos mesmos moldes pela policia judiciária, quando da entrega do inquérito relatado, onde o juiz ao analisar o pedido, poderá determinar tal medida de oficio ou a requerimento dos mesmos, conforme preceitua o artigo 3º da lei 9.296/96.

Note-se que o legislador não fez referência alguma quanto a inquérito policial ou procedimento administrativo-criminal feita pelo Ministério Público, tanto quanto as denúncias a serem apuradas pelas duas instituições. Fez sim referência a uma investigação mais aprofundada em sede de ação penal já em andamento, para se chegar a verdade real de fatos criminosos pré existentes inseridos no contexto da mesma. E é claro que em seu desdobramento, dentro do devido processo legal, aumentando assim o poder investigativo do Estado. Pois não pode o Estado se munir de tal artifício para investigar fatos ou crimes que ainda em tese vão se consumar, num plano futuro.

Quanto a determinação da medida de oficio pelo juiz, a inconstitucionalidade é latente, pois a interceptação telefônica "de ofício", vulnera o modelo acusatório de processo, processo de partes, instituído pela Constituição de 1988, quando considera os ofícios da acusação e da defesa como funções essenciais da jurisdição, atribuindo esta aos juízes, que têm competência para processar e julgar, mas não para investigar, principalmente no âmbito extraprocessual. O juiz ao tomar a iniciativa da prova, envolve-se psicologicamente com a mesma e compromete a sua imparcialidade, por analogia, corroborando a esta linha de raciocínio o Plenário do Supremo Tribunal Federal, por maioria, declarou a inconstitucionalidade do artigo 3º da Lei n. 9.034/95, Sob a alegação de violação do princípio do devido processo legal (CF, artigo 5º, inciso LIV), o ministro Maurício Corrêa observou que o artigo 3º da Lei n.9.034/95 cria um "procedimento excepcional, não contemplado na sistemática processual penal contemporânea, dado que permite ao juiz colher pessoalmente as provas que poderão servir, mais tarde, como fundamento fático-jurídico de sua própria decisão". A decisão foi dada pelos ministros ao julgarem parcialmente procedente a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI 1570).

O parágrafo único desta mesma lei amplia a exceção a regra à interceptação do fluxo de comunicações em sistemas de informática e telemática, fato este que a luz da nossa Constituição só poderia ser recepcionada mediante Emenda a Constituição de 1988, por se tratar de matéria de garantia Constitucional.

O legislador errou ao elaborar de forma inversa o artigo 2° onde, em vez de apresentar um rol de admissibilidade, resolveu apresentar um rol de inadmissibilidade quanto ao monitoramento telefônico, a saber:

Artigo 2º Não será admitida a interceptação de comunicações telefônicas quando ocorrer qualquer das seguintes hipóteses:

I - não houver indícios razoáveis da autoria ou participação em infração penal;

II - a prova puder ser feita por outros meios disponíveis;

III - o fato investigado constituir infração penal punida, no máximo, com pena de detenção.

Parágrafo único. Em qualquer hipótese deve ser descrita com clareza a situação objeto da investigação, inclusive com a indicação e qualificação dos investigados, salvo impossibilidade manifesta, devidamente justificada.

Mas, partindo do rol das inadmissibilidades legais, a discussão fica mais acalorada quando se tenta desvendar para melhor compreender o real significado da expressão "indícios razoáveis da autoria", onde razoável seria os indícios pré-existentes de autoria quanto a um crime onde a prova não puder ser angariada por outros meios disponíveis, ou melhor, quando já existem provas materiais de um crime ligado a uma pessoa e indícios pré-existentes de autoria em relação a outras pessoas ligados ao crime descoberto, onde se faz necessário, neste caso, o sacrifício da regra constitucional, para que, por meio de prova obtida pelo monitoramento legal da interceptação telefônica, sane todas as dúvidas em relação às provas obtidas pelos meios de investigação convencional. Já quanto à participação em infração penal, neste caso, a autoria já está previamente identificada em investigação penal, carecendo apenas de um meio de prova, como um elo, para que com a prova obtida por meios convencionais, chegue a elucidação e enquadramento do sujeito ao tipo penal dentro da complexibilidade criminal, para efeitos do devido processo penal.

Quando o legislador, no inciso II, invoca a inadmissibilidade em relação a concessão do monitoramento telefônico, nos casos em que a prova puder ser feita por outros meios disponíveis, o fez de forma que, quis resguardar mais uma vez o sigilo telefônico, e partindo do principio que o Estado personificado pelos seus agentes e com os meios já existentes de investigação e obtenção de meio de prova disponíveis no direito, como pessoal qualificado, fotografias e filmagens, declarações de vitimas e colaboradores, dentre outras, seria dispensável tal medida extrema, a não ser por exceção, quando esgotado todos os meios legais disponíveis em sede de investigação criminal.

O esgotamento de todos os meios disponíveis de investigação legal seria o termo adequado ao caso em concreto, para não se banalizar tal medida obtida por via de exceção e não se aviltar direitos tão caros, inseridos na carta magna.

Além de que, o monitoramento das ligações telefônicas por meio de interceptação legal, carece de confirmação objetiva dos fatos narrados na mesma, para se chegar a verdade real, ou melhor, a interceptação de uma ligação telefônica com conotação criminosa teria que ser confirmada/materializada, por meio de investigação para servir como prova e não tão somente a interceptação isolada de sua materialidade, pois poderíamos estar diante de um crime impossível ou inexistente.

Outra restrição a regra está delineada no artigo 4º da Lei n. 9.296/96 que de modo restritivo preconiza que "o pedido de interceptação de comunicação telefônica conterá a demonstração de que a sua realização é necessária à apuração de infração penal, com indicação dos meios a serem empregados". A necessidade da demonstração pela autoridade policial ou ministério público terá que ser bem fundamentada, demonstrando o exaurimento investigativo e a complexidade do fato criminoso em comento, descartando as inadmissibilidades dos incisos esculpidos no artigo 2º, e indicando os meios de operacionalização para a captação dos áudios telefônicos, quer dizer: redirecionamento de ligações para gravação de áudios, com auxilio de empresas públicas do ramo de telefonia, equipamento de captação e gravação de áudio telefônico pertencente ao órgão investigador, dentre outros pertencentes ao poder público.

Além da exceção a regra constitucional, o parágrafo 1º do artigo 4º da Lei n. 9.296/96 admite outra excepcionalidade, a saber: "§ 1° Excepcionalmente, o juiz poderá admitir que o pedido seja formulado verbalmente, desde que estejam presentes os pressupostos que autorizem a interceptação, caso em que a concessão será condicionada à sua redução a termo", o legislador prevê a exceção da exceção quando admite o pedido verbal pela autoridade policial ou o ministério público, tal medida excepcionalíssima deveria ser seguida de regras de admissibilidade ou de inadmissibilidade, mesmo que após a sua propositura seja reduzida a termo para concessão judicial.

Quanto ao prazo para a decisão sobre o pedido da concessão da exceção a regra, esculpido no § 2° do artigo 4º da Lei n. 9.296/96, leva o juiz, a toque de caixa, decidir no prazo máximo de 24 horas, se é cabível ou não tal medida, que dependendo da complexibilidade do caso, quantidade de números a serem interceptados, o tempo pode ser exíguo ou perfeitamente cabível, faltando entender se às 24 horas são corridas ou se contam as horas trabalhadas pelo magistrado no tocante ao expediente de trabalho forense.

O interessante é que, para a concessão, não há um limite para a quantidade de números a serem monitorados, ficando a cargo da autoridade policial, a seleção e controle dos números, bem como a quantidade a ser requerida, bastando para o caso a elaboração de um relatório ou auto circunstanciado dando conta da necessidade da medida. Neste contexto nota-se que a autoridade policial fica investida/dotada de super poderes, ficando a pergunta! Quem controlará o controlador?, a resposta poderia estar no artigo 6º da Lei n. 9.296/96, quando do deferimento do pedido, "a autoridade policial conduzirá os procedimentos de interceptação, dando ciência ao Ministério Público, que poderá acompanhar a sua realização". A quem fica a incumbência de dar ciência ao Ministério Público?, Pela análise restrita do artigo em comento, tal incumbência fica a cargo da autoridade policial e não do juiz competente da ação principal ao deferir o pedido. No caso em tela e pelas circunstancias tão delicadas a exceção de uma regra Constitucional, o Ministério Público teria que acompanhar a sua realização e não ser facultado como expressa o artigo 6º, evitando em muito os abusos e erros cometidos pela autoridade policial. (grifo nosso)

Quando da leitura do artigo 5º da Lei n. 9.296/96, "a decisão será fundamentada, sob pena de nulidade, indicando também a forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova". Mais uma vez o legislador pregou uma peça a juristas e doutrinadores, quanto a pena de nulidade atrelada tão somente a fundamentação pelo juiz, ou será que o mesmo quis dizer que "a decisão será fundamentada, indicando a forma de execução da diligência, que não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova, sob pena de a decisão ser nula?", mesmo com interpretação restritiva, a nulidade da decisão estaria relacionada a fundamentação da mesma, com a indicação da forma de execução da diligência, e com o prazo dentro dos 15 dias, sendo a sua renovação concedida por igual período uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova. Mas os problemas não acabam por aqui, pois fica a cargo do juiz indicar a forma de execução da diligência e não a autoridade policial fica também a cargo do mesmo comprovar a indispensabilidade do meio de prova e o controle do prazo de 15 dias bem como sua renovação por igual tempo que também necessitará de relatório policial ou auto circunstanciado policial para ser dada outra decisão para a prorrogação da medida.

Há de se refutar o prazo indeterminado das prorrogações do monitoramento telefônico nas investigações policiais invocando os Direitos e Garantias Fundamentais os quais estariam sendo abolidos/reduzidos e em contrapartida, aumentando/elastecendo o poder investigativo do Estado, comprometendo princípios e garantias basilares num Estado Democrático de Direitos.

Quanto à indicação da forma de execução da diligência feita pelo juiz, entende-se que a autoridade judiciária de forma fundamentada e sob pena de nulidade, deve informar ao requerente do pedido, autoridade policial ou o representante do ministério público, quais os meios e a forma a serem empregados para a captação das ligações telefônicas, como equipamentos, meios de gravação e armazenamento dos áudios capitados, e para auxilio destes meios de execução, o legislador elaborou o artigo 7º, inserindo apenas a autoridade policial e excluindo o representante do ministério público para a requisição de serviços e técnicos especializados às concessionárias públicas, excluindo também a iniciativa privada de telefonia e seus técnicos na operacionalização e auxilio a medida.

Art. 7° Para os procedimentos de interceptação de que trata esta Lei, a autoridade policial poderá requisitar serviços e técnicos especializados às concessionárias de serviço público.

Voltando a analisar o artigo 6º da Lei n. 9.296/96, em especial seus parágrafos, se nota que no § 1º o legislador aponta duas possibilidades, a interceptação da comunicação telefônica sem gravação de áudio e a interceptação da comunicação telefônica com gravação de áudio que neste caso em comento, será determinada a sua transcrição, entendendo como transcrição, a redução a termo de todo o áudio da comunicação interceptada. E no caso da interceptação da comunicação telefônica sem gravação de áudio, o legislador se omite quanto a forma de apresentação da mesma a autoridade judiciária, omitindo também quem ou qual autoridade que determinará a transcrição da interceptação da comunicação telefônica com gravação de áudio. No parágrafo segundo, após cumprida a diligencia determinada pelo juiz, o legislador atrela o resultado da interceptação a um auto circunstanciado que deverá conter o resumo das operações realizadas pela autoridade policial. O que pode se entender como resultado da interceptação?, e se não for possível gravar seu áudio? Fica claro neste ponto que a interceptação da comunicação telefônica é um meio de prova e não a prova, pois se tratarmos como prova, a autoridade não precisaria realizar operações e no caso de a mesma não possibilitar sua gravação, a autoridade policial ficaria sem a prova do crime cometido pelo telefone. Registramos mais uma vez, a exclusão do ministério publico no que se refere ao esculpido nos parágrafos 1º e 2º do artigo 6º. O legislador ao elaborar o parágrafo terceiro lembrou da existência do ministério público, quanto a ciência em relação às providências determinadas pelo juiz em relação ao artigo 8º da Lei n. 9.296/96, após recebidos os elementos colhidos pela autoridade policial nos § 1º e 2º do artigo 6º. Então além da autoridade policial o juiz também tem que dar ciência ao ministério público. (grifo nosso).

Artigo 6° Deferido o pedido, a autoridade policial conduzirá os procedimentos de interceptação, dando ciência ao Ministério Público, que poderá acompanhar a sua realização.

§ 1° No caso de a diligência possibilitar a gravação da comunicação interceptada, será determinada a sua transcrição.

§ 2° Cumprida a diligência, a autoridade policial encaminhará o resultado da interceptação ao juiz, acompanhado de auto circunstanciado, que deverá conter o resumo das operações realizadas.

§ 3° Recebidos esses elementos, o juiz determinará a providência do art. 8°, ciente o Ministério Público.

Outra confusão gerada pelo legislador fica a cargo da leitura do artigo 8º da Lei n. 9.296/96, a saber: A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas (grifo nosso). O mesmo acrescenta a aludida lei autos apartados, denominados por juristas como procedimentos criminais diversos, os quais deverão ser apensados ao inquérito policial ou processo criminal. Faltou a legislador definir o que seria autos apartados no mundo jurídico. (grifo nosso)

Então, pela analise restritiva do caso em comento, o legislador abre mão da exclusividade e existência da ação principal para a concessão da exceção a regra constitucional, recepcionando também o inquérito policial como um meio processual a ser utilizado como elemento jurídico de exercício a ampla defesa antes da denuncia feita pelo ministério público e antes também da ação penal principal. Ao concordarmos com este entendimento, estaríamos diante da insegurança jurídica, negando a existência do Estado Democrático de Direitos e recriando o Estado de Policia, a muito enterrado com a ditadura.

O inquérito policial tem caráter administrativo e inquisitivo, onde não é admitida a ampla defesa, porém nada obsta que a defesa tenha acesso ao mesmo, para futuras alegações defensivas ou impetrações de remédios jurídicos, o alegado segredo de justiça não pode ser confundido com segredo de Estado, é certo que o segredo de justiça também abarca a parte investigada e sua defesa, pois como defender alguém que se encontra preso preventivamente, temporariamente ou em flagrante se a defesa, pelo intitulado segredo de justiça, não tem acesso aos autos do inquérito? Está se vivendo num Estado democrático de Direitos ou num Estado não Democrático sem Direitos? Casos como este só acontecia em tempos do Ato Institucional nº 5, onde o cidadão era preso sem acusação formalizada e cercado pelo segredo de Estado.

O legislador ao elaborar o parágrafo único do artigo 8º da Lei n. 9.296/96, o fez no intuito de preservar as gravações e transcrições das ligações telefônicas em autos apartados, as quais só podem ser apensados ao Inquérito policial imediatamente antes do relatório da autoridade, no sentido de que o meio de prova obtido nas interceptações telefônicas corrobore com as provas colhidas e inseridas no inquérito policial e juntas, formem um contexto probatório no relatório da autoridade policial. Note-se que o inquérito policial corre em separado ao auto apartado de monitoramento telefônico justamente para se preservar o sigilo Constitucional que é a regra, o inquérito policial neste caso conterá apenas as diligencias e provas obtidas por meio das investigações feitas a partir da interceptação telefônica, ocorrendo o mesmo mecanismo quando da conclusão do processo ao juiz para os despachos de praxe.

Quanto ao artigo 9º da mesma lei, o legislador, apesar de não precisar, salientando mais uma vez que a regra é o sigilo e a exceção é a interceptação das ligações telefônicas, fez inserir no texto legal o incidente de inutilização onde "A gravação que não interessar à prova será inutilizada por decisão judicial, durante o inquérito, a instrução processual ou após esta, em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada", colocando mais uma vez as gravações e transcrições das ligações telefônicas em autos apartados como meio de prova a prova feita no inquérito ou na instrução processual, não dando margens a riscaduras ou outra modalidade, sendo um ato solene entre as partes, como preleciona o parágrafo único do aludido artigo e lei.

O legislador, no artigo 10º da Lei n. 9.296/96, asseverou como crime a realização de interceptação de comunicação telefônica de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei, apenando o crime com reclusão, de dois a quatro anos, e multa, entendendo-se como crime a realização de interceptação telefônica extra autos ou intra autos sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei, mais para garantir o sigilo que é a regra e para evitar a banalização de tal exceção a regra, como também coibir os excessos e evitar erros por parte da autoridade policial, ministério público e juiz, onde os mesmos devem primar pelos princípios basilares da administração pública, os quais faço questão de reproduzir: Os princípios da legalidade, moralidade, finalidade, publicidade e eficiência, com o fim de não gerar uma promiscuidade jurídica entre as pessoas elencadas nos incisos do artigo 3º da lei 9.296/96. (grifo nosso)

A banalização da interceptação telefônica gerou uma verdadeira paranóia social no que diz respeito à exposição da intimidade e imagem na mídia, além de tornar público um poderoso meio investigatório, que por sua divulgação exagerada e criminosa por certas autoridades muitas vezes atrás de holofotes e notoriedade com o único fito de se promoverem tanto funcional/profissional como socialmente, colocam em xeque todo um trabalho investigativo, prejudicando às vezes por completo a ação penal. Tal paranóia chegou as raias da justiça, como se depreende da notícia veiculada na mídia nacional.(grifo nosso)

Conversas a três: Divulgação de grampos telefônicos provoca paranóia(2).

A enxurrada de grampos telefônicos divulgados pelo Brasil afora tem mudado o comportamento dos profissionais do Direito ao telefone. E não é só da escuta ilegal, aquela encomendada pelo desafeto, concorrente ou cônjuge. "Os juízes estão autorizando a fazer investigação prospectiva. Amanhã não saberemos se o meu ou o seu telefone estará grampeado", disse o advogado José Gerardo Grossi, ministro substituto do Tribunal Superior Eleitoral, à revista Consultor Jurídico. E acrescentou: "Sempre acho que estou grampeado. Trato meus telefonemas como se grampeados estivessem".

O vice-presidente do Superior Tribunal de Justiça, ministro Edson Vidigal, evita atender telefonemas de números desconhecidos em seu celular. "Só atendo quando vejo que é da minha casa, da minha mulher e do meu gabinete", contou. A informação é confirmada durante a entrevista para a ConJur quando seu celular toca. Ele olha o número antes de atender, sorri e diz: "É do meu gabinete". Em seguida, atende sem receio. [.....].

Criou-se também uma verdadeira caça as bruxas, onde segmentos do judiciário assumindo o papel de paladinos da justiça interpretam ao bel prazer à lei de interceptação telefônica, concedendo monitoramentos mil sem nenhuma fiscalização e acompanhamento, invocando tão somente o interesse público, transformando o Estado Democrático de Direitos em um verdadeiro Estado de Polícia.(grifo nosso)

Juízes defendem escuta telefônica(3):

Categoria decidiu em Florianópolis

Juízes federais do Brasil inteiro se reuniram por três dias em Florianópolis e decidiram apoiar interceptações telefônicas nas apurações acerca de organizações criminosas, ainda que o grampo alcance a toga. Sugestão foi motivada pela Operação Anaconda, a grande investigação que apontou corrupção no Judiciário e na polícia.

Os magistrados criticam, enfaticamente, um projeto do ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, que restringe a escuta. Também reconhecem a importância da adoção de um código de ética da magistratura nacional e a criação da Ouvidoria da Justiça, para captar reclamações sobre o funcionamento de órgãos judiciários de qualquer instância.

Os juízes consideram que está na hora de dar "transparência ao Judiciário, com ampla publicidade das decisões de âmbito disciplinar". Apóiam o fim do sigilo que protege juízes sob investigação, privilégio assegurado pelo regime militar, quando foi produzida a Lei Orgânica da Magistratura.

As propostas fazem parte da "Carta de Florianópolis", documento aprovado por 500 juízes federais no encontro que se encerrou na última sexta-feira.

Os magistrados lançaram a campanha nacional "Sede de Justiça - prioridade aos Juizados Especiais Federais, ampliação imediata da Defensoria Pública da União e combate à impunidade." Eles não escondem a insatisfação diante do que chamam de "descaso" do governo para com as necessidades estruturais da Justiça e alertam para o "agravamento" da situação.

3 Intimidade e imagem

A Constituição Federal prevê a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem das pessoas. Os incisos X e XII do seu art. 5º integram o mesmo núcleo de normas (Direitos e Garantias Fundamentais), não se podendo falar, assim, em uma hierarquização entre eles, impõe-se compatibilizar os seus textos, interpretando, de modo sistêmico, as aludidas regras. Destarte, não se pode violar a intimidade e a vida privada, mas é possível adotar a escuta telefônica, para fins de investigação policial e de instrução criminal. É óbvio que as normas em tela não são necessariamente excludentes.

Não pode as escutas telefônicas ou ambientais, servirem para atacar à privacidade e/ou a intimidade dos indivíduos em comunicação. O controle tem que ser rigoroso por parte do Estado no que se refere à violação legal da intimidade e imagem, Logo, apenas interessa colher, pela via da escuta, os elementos imprescindíveis à descoberta do cometimento ou da iminência do cometimento de uma infração penal e de seus autores e/ou partícipes.

A despeito do fato de que existe o interesse público na investigação de possíveis infrações, deve ser respeitado o direito das pessoas à intimidade e à vida privada. O investigado, como os seus interlocutores, é um ser humano, mesmo sendo delinqüentes, a preservação dos basilares direitos individuais, devendo, ser reprimida qualquer tentativa de expor a sua imagem, divulgando, indevidamente, o teor de suas conversações, fotografias e filmagens.

Constituição Federal, artigo 5º

X - são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

XII - é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal.

Quanto à intimidade, Paulo José da Costa Júnior(4), tece o seguinte comentário:

Na expressão 'direito à intimidade' são tutelados dois interesses, que se somam: o interesse de que a intimidade não venha a sofrer agressões e o de que não venha a ser divulgada. O direito, porém, é o mesmo. [...] No âmbito do direito à intimidade, portanto, podem ser vislumbrados estes dois aspectos: a invasão e a divulgação não autorizada da intimidade legitimamente conquistada.

Desse modo, esse direito é protegido em dois momentos. No momento antecedente, a proteção consiste numa reação à interferência ilícita na intimidade, procurando evitar que ela seja devassada através de grampos telefônicos. No momento posterior, a reação vira-se contra a divulgação indevida da intimidade alcançada legitimamente. No primeiro momento, a proteção dirige-se a terceiros; no segundo, dirige-se ao destinatário do fato íntimo.

Com certeza a escuta telefônica, atinge o direito à intimidade e a imagem, mas a violação delas resultante de aceitação ou concessão judicial é suportada em prol de um bem maior que é a Sociedade, porém não pode ser aceito o menosprezo a Constituição e ao direito, no que diz respeito à falta de regulamentação, empurrando goela a baixo da mesma Sociedade e do Poder Judiciário, Leis extravagantes elaboradas e aprovadas a toque de caixa pelo Poder Legislativo, o qual, no intuito de dar uma resposta ao povo e resolver a demanda da criminalidade, passa por cima

do Estado Democrático de Direitos, atingindo não só a criminalidade mas também a Sociedade.

Cabe também aos nossos magistrados e ao ministério público a proteção e fiscalização quando da violação de tais direitos protegidos pela Constituição, não permitindo a veiculação na mídia a intimidade e a imagem não autorizada e protegida por Lei, mesmo se tratando de criminoso, pois a proteção constitucional também o ampara, além do que o mesmo possui família, a qual não pode ficar a mercê de uma mídia e sociedade preconceituosa, como também os casos de erro policial e judiciário onde os danos pelo rompimento de direitos e garantias causam seqüelas muitas das vezes irreversíveis.

Urge por parte do Estado personificado pelo Supremo Tribunal Federal e Ministério Público Federal ou Estadual, bem como todos os setores da justiça e da comunidade jurídica a rechaçar as ilegalidades, cobrando do Poder Legislativo e Executivo um trabalho sério em relação à regulamentação via Constituição destes ordenamentos jurídicos conflitantes, para as instituições envolvidas com a persecução penal terem uma ação mais célere, justa e legal.

Exemplos são muitos em relação ao desrespeito a intimidade e imagem, porém há de se destacar alguns casos que causaram comoção social:

O país dos Francenildos(5)

Milhares de sigilos bancários são quebrados impunemente

A reação à quebra ilegal do sigilo bancário do caseiro Francenildo Santos Costa abriu espaço para que advogados de outras vítimas da violação reclamem a mesma garantia. Os advogados pedem para que a Polícia Federal apure quem são os responsáveis pelo vazamento de informações financeiras sigilosas, legalmente manipuladas pelas autoridades financeiras, pelo Ministério Público e pelas CPIs, mas que acabaram ilegalmente divulgadas pela imprensa.

A responsabilidade da imprensa que divulga dados sigilosos ainda gera controversas no meio jurídico. No entanto, para os funcionários, seja dos bancos, do Ministério Público, da Polícia ou do Judiciário, que tiveram acesso aos dados, à regra é muito clara: eles têm obrigação estrita de preservar o sigilo. A divulgação, para estes funcionários, é proibida pela Constituição e caracteriza crime, com pena de reclusão de um a quatro anos.

Um importante advogado de uma instituição financeira que teve seu sigilo quebrado e posteriormente divulgado pela imprensa enviou ofício à Polícia Federal requerendo instauração de inquérito policial para apurar os responsáveis pelos "atos ilícitos".[...]

Dias depois de registrar oficialmente suas apreensões, constatou que a imprensa tinha conhecimento dos dados de milhares de contas bancárias. Matéria publicada em jornal de circulação nacional revelou "que houve acesso por pessoas não autorizadas ao sigilo bancário de inúmeros clientes", diz o advogado.

Para ele, "houve evidentemente invasão da privacidade de todos os clientes que tiveram seus nomes expostos". Referindo-se ao episódio da quebra ilegal do sigilo do caseiro Francenildo Costa Santos, a testemunha chave na queda do ministro da Fazenda Antonio Palocci, o advogado sustenta que "não se pode admitir discriminação às avessas, repelindo-se a violência praticada contra o modesto caseiro e admitindo-se a devassa nos dados de pessoas com depósitos superiores a R$ 100 mil".

Ao pedir à Polícia Federal a instauração de inquérito policial, o advogado destaca ser importante que "as investigações alcancem todos os níveis e todos os planos".

PF deve indiciar Palocci por violação de sigilo(6)

A Polícia Federal informou que deverá indiciar o ex-ministro da fazenda, Antônio Palocci, ainda nesta semana, por quebra do sigilo bancário do caseiro Francenildo dos Santos, além de abuso de poder e advocacia administrativa quando o funcionário age em seu benefício dentro do governo. Francenildo acusa Palocci de participar de reuniões de lobby e festas com garotas de programa em uma mansão no Distrito Federal.

A situação de Palocci se agravou após os depoimentos, ontem, do secretário de Direito Econômico do Ministério da Justiça, Daniel Goldberg, e do chefe de gabinete do ministro Márcio Thomaz Bastos, Cláudio Alencar. [...]

Ontem, o Ministério da Justiça declarou que iniciou as investigações sobre a violação do sigilo no primeiro dia útil após a divulgação do extrato. Até deixar o ministério, Palocci sempre sustentou que não teve envolvimento com a quebra, embora as investigações da PF indicassem ligação direta do Ministério da Fazenda e da cúpula da Caixa no caso.

Não à mordaça: Punir jornalista que divulga grampo é heresia jurídica(7)

Noticia-se nos meios de comunicação prenúncio de eventual proposta do governo, em fase de estudo, para reformular a legislação de escuta telefônica e, entre as mudanças, está à possibilidade de punição de jornalistas que divulgarem o conteúdo dos grampos, ainda que realizados com autorização judicial.

No entanto, ao se confirmar essa iniciativa, padecerá no nascedouro de inconstitucionalidade, provando que os meios, ao contrário do que alguns pensam, comprometem os fins, o que passamos a demonstrar. A Lei 9.296/96 já prescreve que a responsabilidade da guarda do segredo de Justiça está afeta ao magistrado, ao Ministério Público, às autoridades policiais, às partes, aos servidores que tiverem acesso aos autos e aos técnicos das operadoras dos serviços de telefonia, isto é, a todos aqueles que direta ou indiretamente atuarem ou participarem da investigação. Nada mais lógico e justo.

Assim, se há vazamento do conteúdo dos grampos, partiu de alguma das pessoas que a lei restringe os dados obtidos no procedimento. A partir daí, enquadrar por via infraconstitucional o jornalista como co-autor do crime, seja por saber, divulgar os dados ou omitir a fonte, se consubstancia em evidente heresia jurídica, data maxima vêniab.

É imperioso assinalar que a Constituição Federal relativizou quase todos os princípios, limitando aqueles antes denominados de "absolutos" no fundamento da supremacia do interesse público sobre o privado. Entre eles, o sigilo das comunicações telefônicas nas hipóteses de inquérito policial ou processo penal, sempre com prévia autorização judicial, até porque assegurado ao acusado à presunção de inocência (art. 5º, XII e LVII).[...]

Neste contexto, criminalizar a pessoa do jornalista pela prática de qualquer ato no exercício do mister não resulta em harmonizar os princípios constitucionais pertinentes à espécie, mas notoriamente amordaçar aqueles a quem as normas protegem o direito/dever de informar os fatos à sociedade e resguardar o sigilo da fonte, prerrogativas inerentes e essenciais à profissão e princípio basilar à própria manutenção do Estado Democrático de Direito. Qualquer aventura jurídica nesta seara, ainda que sem finalidade instilatória, será em vão, porquanto nitidamente inconstitucional. Por fim, aqui vale rememorar adágio do poeta alemão, Friedrich Hebbel: "Há casos em que cumprir o dever é pecar".

Cabe um alerta aos magistrados e aos operadores de direito no sentido de não coadunar com a política de governo de mídia, como exemplo destacamos o Boletim Informes da Liderança do PT na Câmara dos Deputados, onde fica evidente o uso da Polícia Federal como meio promocional de um partido político e do governo:

Ações da Polícia Federal crescem 815% no governo Lula(8)

Entre os anos de 2000 a 2005, as ações da Polícia Federal no combate ao crime cresceram 815%. Durante o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, a Polícia Federal realizou 183 operações e 2961 prisões - uma média de 987 presos por ano. Já nos dois últimos anos do governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, foram realizadas apenas 20 operações, com a prisão de 54 pessoas, ou seja, uma média de 27 capturas por ano. O balanço foi divulgado pelo Ministério da Justiça. [...]

Fortalecimento - Os dados das ações da Polícia Federal revelam que o governo Lula investiu no fortalecimento da instituição. O efetivo saltou de 9.289 pessoas, em 2002, para 11.749, em 2005 - um aumento de 26,5%. O objetivo do governo federal é de que, até 2007, 15 mil homens e mulheres estejam engajados no combate à criminalidade - um acréscimo de 61,5% em relação ao número de policiais existentes no início da atual gestão.

Nos últimos três anos, a Polícia Federal realizou 67 operações especiais de combate à corrupção. Foram presas 1,3 mil pessoas, dentre as quais 515 servidores públicos federais, estaduais e municipais e 130 policiais federais e rodoviários federais, acusados de crimes que vão do superfaturamento na compra de derivados de sangue à adulteração de leite em pó.

Em apenas 12 operações (Farol da Colina, Perseu, Vampiro, Ajuste Fiscal, Big Brother, Praga do Egito, Cavalo de Tróia, Pororoca, Mamoré II, Mascates, Matusalém e Curupira), a Polícia Federal identificou fraudes no valor de R$ 67,8 bilhões. A instituição conseguiu identificar ainda ligações entre a quadrilha acusada de fraudar por 12 anos as licitações no Ministério da Saúde e o suposto esquema de compras superfaturadas nos Correios.

Houve um aumento de 1.421% nos inquéritos abertos para investigar lavagem de dinheiro e de 1.955% nas ações penais. Na operação Farol da Colina, realizada em agosto de 2004, os investigadores descobriram fraudes em evasões de divisas ocorridas desde 1997, em valores próximos a US$ 24 bilhões. Foram abertos 3,5 mil inquéritos contra pessoas e empresas, suspeitas pelo envio ilegal de cerca de US$ 1 bilhão ao exterior, entre 1999 e 2002. [...]

Conclusão

A escuta telefônica, carece de elementos probatórios para servir como prova em Processo Penal, além de estar sempre em contraponto com a Constituição Federal no que se refere aos direitos e garantias individuais, intimidade e imagem onde de maneira licita ou ilícita sempre trás prejuízos as pessoas investigadas ou envolvidas em qualquer fato ilícito. Não é escusa para as autoridades judiciais e policiais estarem acobertados, uns pela lei, outros pela autorização judicial a ceifar os direitos e garantias individuais e coletivos conferidos pela Constituição Federal, muito pelo contrário, são estes que devem primar pela total garantia Constitucional e não se esconderem atrás de interpretações extensivas, colocando o interesse público como um totem inviolável e o interesse privado no limiar da marginalidade, atrás de interesses escuso/nefastos, no que tange a promoção pessoal, de instituições e de política de governo junto à mídia, esquecendo que a Constituição Federal é dotada de supremacia perante todos os ordenamentos jurídicos. O ministério público além de exercer o controle externo das polícias, tem o dever legal de zelar pelo cumprimento dos ditames constitucionais. O controle de constitucionalidade deve começar já nos juízos de primeiro grau, por mais que difícil seja, pois, mais vale dez bandidos soltos a manter preso um inocente, além do que, cabe ao Estado a proporcionar meios legais e operacionaliza-los e não se escudar atrás de leis inconstitucionais passando uma falsa segurança ao povo, colocando a opinião pública contra o Judiciário alegando inércia e benevolência por parte do mesmo. O uso da Polícia Política, para forçar uma resposta exemplar do judiciário é uma vergonha e abala a segurança jurídica, o atual Estado Policial em que se vive não é muito diferente daqueles em que viveram nossos pais quando da ditadura, onde a Constituição era apenas um instrumento simbólico de nação.

Aos magistrados cabe ponderar os exageros, analisar caso a caso e pautar as decisões com base em primeiro plano na Constituição Federal, buscar o equilíbrio entre princípios e regras constitucionais bem como em normas infraconstitucionais, buscar a razoabilidade e a proporcionalidade e diante da cedência recíproca, minimizar a colisão de princípios e conflitos de regras.

Referências Bibliográficas

CUSTÓDIO, Antonio Joaquim Ferreira. Constituição Federal Interpretada pelo STF. 3. ed. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998.

DELMANTO, Celso; DELMANTO, Roberto; DELMANTO JUNIOR, Roberto. Código Penal comentado. 4. ed. Rio de Janeiro: Renovar, 1998.

FREITAS, Theodósio Ferreira de. O Ministério Público e o controle externo das atividades policiais: uma abordagem jurídica. Jus Navigandi, Teresina, a. 9, n. 827, 8 out. 2005. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina . Acesso em: 19 abr.2006.

MENDES, Gilmar. Os direitos fundamentais e seus múltiplos significados na ordem constitucional. Revista Diálogo Jurídico, Salvador, CAJ - Centro de Atualização Jurídica, nº. 10, janeiro, 2002. Disponível na Internet: http://www.direitopublico.com.br . Acesso em: 18 de fevereiro de 2006.

SANTOS, Paulo Ivan da Silva. As provas obtidas com violação da intimidade e sua utilização no Processo Penal . Jus Navigandi, Teresina, a. 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina. Acesso em: 18 abr. 2006.

OLIVEIRA, Márcio Saturnino de. Controle de constitucionalidade: um breve ensaio. Jus Navigandi, Teresina, a. 4, n. 45, set. 2000. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina. Acesso em: 20 abr.2006.

SIQUEIRA FILHO, Élio Wanderley de. A escuta telefônica: comentários à Lei 9.296/96., São Paulo: Revista dos Tribunais, v. 86, n. 737, p. 471-480, mar. 1997. Disponível em: http://www.silviamota.com.br/direito. Acesso em 04 mai.2006.

PARETA, Ivan. A interceptação telefônica e a prova. Disponível em http://www.ivanpareta.com.br/ http://www.intelligentiajuridica.com.br/artigos. Acesso em 04 mai.2006.

RESUMEN

Presentación de consideraciones acerca de la escucha teléfonico, sob el punto de vista crítico, con la intención de disponer de las alegaciones de la defensa en práctica de las leyes. Apoyase, por lo tanto, en la opinión de los doctrinadores en el contenido Penal, Procesal Penal y Constitucional, en el análisis de las acciones penales, resaltando la filiación a la corriente que concibe que el moderno Derecho no comporta la aplicación de la ley separada de la prueba material, corriente ésta adoptada por distintos operadores del Derecho, teniendo cómo justificativa el exceso de operaciones de Policía en el país, su estira considera como la exposición de la intimidad y la imagen, más allá del clamor público.

PALABRAS-CLAVE: Escucha Teléfonica; Intimidad; Imahen.


Notas:

* Paulo Biskup de Aquino, Funcionário Público Federal; Bacharel em Direito pela Sociedade Unificada de Ensino Superior Augusto Motta, formado em 1987; cursou a Fundação Escola do Ministério Público - FEMPAR; Pós-Graduando em Direito Penal e Processo Penal pela FACULDADE DINÂMICA DAS CATARATAS - U.D.C. E-mail: pbaquino@ig.com.br [ Voltar ]

1 - BARBOSA, Rui. República: teoria e prática. Petrópolis:Vozes, 1978. 343 p. 124. [Voltar]

2 - PINHO, Débora, Conversas a três: Divulgação de grampos telefônicos provoca paranóia, Fonte: Revista Consultor Jurídico, 28 de novembro de 2003. [Voltar]

3 - Juízes defendem escuta telefônica, Fonte: Diário Catarinense 01/12/2003. [Voltar]

4 - Paulo José da Costa Júnior, O Direito de Estar Só: Tutela Penal da Intimidade, 1995, p. 34. [Voltar]

5 - PINHEIRO, Aline. O país dos Francenildos, Fonte: Revista Consultor Jurídico em 27/04/2006. [Voltar]

6 - PF deve indiciar Palocci por violação de sigilo, Fonte: Redação do Portal Terra em 03/04/2006. [Voltar]

7 - ALMEIDA, Jansen Fialho de: Revista Consultor Jurídico, 26 de janeiro de 2006. [Voltar]

8 - Boletim Informes da Liderança do PT na Câmara dos Deputados, Ações da Polícia Federal crescem 815% no governo Lula, disponível em http://www.informes.org.br, em 10/04/2006. [Voltar]

Palavras-chave: Escuta telefônica

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4 Comentários

claudia dias advogada22/12/2006 13:48 Responder

Excelente abordagem.

Paulo de Aquino Funcionario Público 14/10/2010 13:34

Obrigado!

Paulo de Aquino Mestrando e funcionário Público14/10/2010 13:54 Responder

Quatro anos se passaram e pouca coisa mudou, porém o STJ tem sinalizado em suas decisões que os abusos são muitos no que diz respeito à interpretação elástica da referida lei, e está corrigindo tais desvios interpretativos anulando e reformando diversas decisões de primeiro e segundo graus referentes a matéria! Em fim uma luz no túnel

MARCO RIBEIRO Funcionario Publico Federal14/10/2010 20:58 Responder

Tese de grande interesse para os operadores do direito e, sobretudo, para os vitimados pelo uso abusivo desse meio investigatório, que via de regra é deturpado e acaba por tornar-se um único e isolado fim persecutório, sem quaisquer outras provas que corroborem os resulatados obtidos.

Sidney Funcionário Público Federal14/10/2010 22:55 Responder

Belo artigo, meu camarada. Quisera alguns jurisconsultos o lessem, para embasar corretamente suas decisões e entendimentos. Grande abraço.

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