Domicílio eleitoral e inelegibilidade

Celso Spitzcovsky, Advogado e Professor no Complexo Jurídico Damásio de Jesus (CJDJ), na Faculdade de Direito Prof. Damásio de Jesus (FDDJ), na Universidade Paulista (UNIP) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

Fonte: Celso Spitzcovsky

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Celso Spitzcovsky ( * )

O Tribunal Superior Eleitoral (TSE) publicou, recentemente, o calendário visando às eleições do próximo ano, no qual se destaca, para este momento, a data de 5 de outubro de 2007, em que os futuros candidatos deverão tomar certas providências, sob pena de inviabilização de suas candidaturas.

Com efeito, a referida data surge como prazo fatal para a tomada das seguintes medidas:

a) os partidos políticos que pretendam participar das eleições de 2008 devem ter obtido registro de seus estatutos no TSE;

b) os candidatos a cargo eletivo nas eleições de 2008 devem ter domicílio eleitoral na circunscrição na qual pretendem concorrer;

c) os candidatos a cargo eletivo nas eleições de 2008 devem estar com a filiação deferida no âmbito partidário.

Outrossim, a data de 5 de outubro assume importância, ainda maior, na medida em que surge como prazo fatal para a aprovação de modificações na legislação eleitoral, por força da redação estabelecida no art. 16 da Constituição Federal (CF). Confira-se:

"Art. 16. A lei que alterar o processo eleitoral entrará em vigor na data de sua publicação, não se aplicando à eleição que ocorra até um ano da data de sua vigência."

Assim, os candidatos devem estar atentos para as modificações em tramitação no Congresso Nacional, dentre as quais a possibilidade de veiculação de propaganda eleitoral por outdoors, o que estava proibido desde maio de 2006.

Por outro lado, em relação à necessidade de comprovação dos requisitos de domicílio eleitoral e filiação partidária, cumpre observar que o assunto apresenta algumas nuances que demandam uma atenção especial por parte dos futuros candidatos.

A exigência de comprovação do domicílio eleitoral na circunscrição do cargo eletivo que se pleiteia justifica-se pela necessidade de maior afinidade do candidato com o eleitorado.

Essa afinidade, por sua vez, leva a um comprometimento maior do candidato em relação às suas plataformas de campanha, facilitando, ao menos em tese, o acompanhamento e, conseqüentemente, a cobrança de tais promessas durante o transcorrer do mandato.

Em outras palavras, o que se busca evitar, com a formulação dessa exigência, é a caracterização de candidaturas sem um mínimo de legitimidade, já que postuladas por pessoas estranhas ao eleitorado daquela circunscrição.

Em relação à necessidade de comprovação de domicílio eleitoral, acrescente-se que essa exigência retroage para um ano antes das eleições, conforme previsão estabelecida na Lei n. 9.504/97. Confira-se:

"Art. 9.º Para concorrer às eleições, o candidato deverá possuir domicílio eleitoral na respectiva circunscrição pelo prazo de, pelo menos, um ano antes do pleito e estar com a filiação deferida pelo partido no mesmo prazo." (grifo nosso).

De outra parte, cumpre salientar, em vista da diretriz adotada pela Constituição, que o conceito de domicílio eleitoral revela-se muito mais amplo do que aquele estipulado pelos dispositivos do Código Civil. Confira-se:

"Art. 70. O domicílio da pessoa natural é o lugar onde ela estabelece a sua residência com ânimo definitivo.

Art. 71. Se, porém, a pessoa natural tiver diversas residências, onde, alternadamente, viva, considerar-se-á domicílio seu qualquer delas.

Art. 72. É também domicílio da pessoa natural, quanto às relações concernentes à profissão, o lugar onde esta é exercida.

Parágrafo único. Se a pessoa exercitar profissão em lugares diversos, cada um deles constituirá domicílio para as relações que lhe corresponderem."

Nesse contexto, para alguns casos pode-se revelar insuficiente a demonstração, pelo candidato, para o cumprimento da exigência aqui formulada, de ser proprietário ou mesmo locatário de determinado imóvel, se permaneceu este desocupado durante largo período que antecedeu o pleito eleitoral.

Em outras palavras, esse maior rigor exigido pode impedir a candidatura dos chamados "pára-quedistas", principalmente para cargos eletivos em municípios nos quais jamais apareceram.

Por outro lado, em certos casos torna-se possível cogitar a comprovação do domicílio eleitoral por meio de outros requisitos que não se confundem com a propriedade ou mesmo a locação de um imóvel.

De resto, essa orientação está consolidada não só no TSE, como também nos Tribunais Regionais Eleitorais em todo o País. Confira-se:

"Cancelamento de inscrição eleitoral. Residência em um município e centro de atividades profissionais em outro. Art. 42, par. ún., CE. Recurso a que se dá provimento.

I - Recorrente que reside no município de José Bonifácio e comprovou o exercício de atividades profissionais no município de Uberaba.

II - Prevalência do entendimento no sentido de que, comprovando o eleitor presença de vínculos profissionais, patrimoniais, políticos e familiares em determinado município está habilitado a fazer sua inscrição eleitoral nesse local." (REC n. 24.969, Ubarana/SP, rel. Maria Salette Camargo Nascimento, j. em 28.7.2005, DOE de 4.8.2005, p. 244)

"Domicílio Eleitoral. Transferência. Distinção entre domicílio civil e eleitoral. Conceituação flexível deste último conforme reiteradas e pacíficas manifestações doutrinárias e jurisprudenciais. O domicílio eleitoral contenta-se com vínculos de relações de trabalho, patrimonial, político e até afetivo. Jurisprudência deste TRE/SP e do TSE. Prova suficiente feita pela recorrida, que, além da presumida residência decorrente de o marido ser funcionário público municipal, ainda juntou certidão de casamento realizado na cidade e conta de telefone instalado em residência do casal. Recurso improvido." (REC n. 19.098, Piquerobi/SP, rel. Fernando Antonio Maia da Cunha, DOE de 3.6.2004)

"Recurso. Documento. Apresentação. Inocorrência. Domicílio eleitoral. Definição. TSE. Jurisprudência firmada. Revisão do eleitorado. Comparecimento. Proibição. Alegações. Demonstração. Ausência. Desprovimento. Por não apresentado, pelo recorrente, qualquer documento a indicar o seu domicílio em Crixás do Tocantins, apesar do conceito de domicílio eleitoral envolver questões de cunho pessoal, comercial ou patrimonial (consoante posicionamento do TSE) e, ainda, por não demonstrado tenha sido impedido de se recadastrar, conforme alegado, é de se negar provimento ao recurso. Unânime." - grifo nosso (Crixás do Tocantins/TO, rel. Marcelo Eduardo Rossitto Bassetto, DJ de 5.4.2004, t. 1226, p. 32)

As decisões reproduzidas deixam entrever que a comprovação de outros requisitos, como vínculos profissionais, patrimoniais, políticos e familiares, assume importância para a configuração, em certos casos, do domicílio eleitoral, que surge, como se sabe, como requisito de elegibilidade, a teor do disposto no art. 14, § 3.º, IV, da CF.

De outra parte, cumpre observar que essas decisões acabaram por considerar, para a configuração do conceito de domicílio eleitoral, itens que não foram contemplados pela Lei n. 4.737/65 (Código Eleitoral - CE), consoante se verifica na redação do art. 42, par. ún.:

"Art. 42. O alistamento se faz mediante a qualificação e inscrição do eleitor.

Parágrafo único. Para o efeito da inscrição, é domicílio eleitoral o lugar de residência ou moradia do requerente, e, verificado ter o alistando mais de uma, considerar-se-á domicílio qualquer delas."

Essa discrepância entre a previsão contida no CE e a jurisprudência reproduzida pode contribuir para aumentar, ainda mais, as incertezas em relação a esse tema, até mesmo em vista da ausência de qualquer súmula a esse respeito.

Outrossim, importante ainda anotar que o não-cumprimento desse requisito, por eventual fraude nos documentos apresentados, representa crime por agressão ao disposto nos arts. 348 e 350 do CE.

Por fim, oportuna a lembrança de que a não-comprovação desse requisito até o dia 5 de outubro deste ano pode inviabilizar, desde já, as futuras candidaturas, por inelegibilidade, o que poderá ser argüido até o momento de impugnação do seu registro, previsto para 5 de julho de 2008.


Notas:

* Celso Spitzcovsky, Advogado e Professor no Complexo Jurídico Damásio de Jesus (CJDJ), na Faculdade de Direito Prof. Damásio de Jesus (FDDJ), na Universidade Paulista (UNIP) e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). [ Voltar ]

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3 Comentários

francisco carlos melo muniz servidor público federal26/02/2008 14:15 Responder

Gostaria de obter informação, se servidor público federal, que é candidato a vereador aonde reside, e trabalha em outro municipio(32km) distante do domicilio, é obrigado a se afastar de suas funções? obrigado desde já, Obs. não consegui abrir a pagina sobre o assunto.

Suporte Jurid Suporte26/02/2008 16:43 Responder

Prezado Senhor Francisco Carlos Melo Muniz Acusamos o recebimento do e-mail de Vossa Senhoria, e informamos que a empresa somente presta tal serviço a título de cortesia aos assinantes da Jurid Publicações Eletrônicas, e infelizmente não o localizamos como usuário em nosso banco de dados. No link abaixo poderá consultar outras ementas. http://www.tse.gov.br/sadJudSjur/index_jur.html Esperamos que o material lhe seja útil, subscrevemo-nos. Atenciosamente, JURID Publicações Eletrônicas

04/08/2008 17:00 Responder

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