Aspectos fundamentais da propriedade produtiva

Juari José Regis Júnior, Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso, Advogado, trabalhou no Tribunal de Justiça de Mato Grosso no gabinete da Desa. Shelma Lombardi de Kato, atualmente é servidor público federal, cargo de analista em reforma e desenvolvimento agrário-INCRA.

Fonte: Juari José Regis Junior

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Juari José Regis Júnior ( * )

SUMÁRIO: I. DOS ASPECTOS CONCEITUAIS FUNDAMENTAIS. II. DOS CRITÉRIOS DE UTILIZAÇÃO RACIONAL DA TERRA. III. A EXPLORAÇÃO AGRÁRIA E OS REQUISITOS BÁSICOS PARA A CARACTERIZAÇÃO DA PROPRIEDADE PRODUTIVA. CONCLUSÃO. BIBLIOGRAFIA.

I. DOS ASPECTOS CONCEITUAIS FUNDAMENTAIS

Resumo: Em um breve estudo abordamos os aspectos fundamentais da propriedade produtiva, tendo como prisma os graus de utilização e de eficiência da terra e o fator função social da propriedade.

Palavras-chave: Propriedade - Produtiva - Grau - Utilização - Eficiência - Terra - Função - Social - Propriedade.

No estudo proposto identificamos que o seu ponto fulcral é a classificação da propriedade produtiva, para efeitos de exploração agrária do imóvel rural, da qual devemos fazer um breve intróito sobre a conceituação de propriedade produtiva e sobre o imóvel rural.

Desde os tempos mais remotos à propriedade é sinônimo de poder perpétuo e absoluto. Porém, com o avanço histórico e a proclamação dos direitos de primeira (liberdades individuais), segunda (direitos políticos ou de positivação) e terceira geração (direitos sociais), o Estado foi obrigado a acolher, no bojo de suas constituições, a garantia da propriedade produtiva. Não bastava deter apenas propriedade, cabendo ao proprietário o preenchimento de certos requisitos para a sua perpetuação, i.e, a propriedade deve cumprir com a sua função social e atender aos graus de utilização racional e de eficiência da terra.

Em decorrência disso, incumbe ao Estado o dever-poder de engendrar na exploração agrária como incentivador e fiscal da produtividade dos imóveis rurais, penalizando os infratores com multas ou até a expropriação do imóvel.

No mesmo turno, os representantes da Igreja Católica, a exemplo de São Tomás de Aquino, pontilharam com percuciência o significado de propriedade, senão vejamos:

Para São Tomás de Aquino o conceito de propriedade privada é visto em três planos distintos na ordem de valores. Em um primeiro lugar, o homem: em razão de sua natureza específica (animal racional), tem um direito natural ao apossamento dos bens materiais. Num segundo, contempla o problema da apropriação dos bens, qual resulta, em última instância, no direito de propriedade propriamente dito. Por fim, num terceiro plano, São Tomás de Aquino permite o condicionamento da propriedade ao momento histórico de cada povo, desde que não se chegue ao extremo de negá-la.

Todavia, partilhamos do entendimento de Jean Jacques Rousseau que, ao analisar a propriedade, lançou que o seu surgimento remonta à época em que o homem reconhece que o seu semelhante, que cercou um pedaço de terra, é legítimo senhor daquele espaço. A propriedade não nasce com as cercas de delimitação do espaço, mas sim com a autorização/referendum dos demais em relação aquela terra de titularidade do seu semelhante.

O reconhecimento gerou a propriedade. Sem ela haveriam apenas cercas e nada mais.

Com efeito, o Prof. Benedito Ferreira Marques explicita que o texto constitucional, em seu art. 185, II e o art. 6º da Lei reguladora da matéria (Lei 8629/93) impõe aos proprietários de terras o ônus de manter a propriedade produtiva, atendendo a fatores econômicos (grau de utilização e eficiência) e ainda o cumprimento da função social da propriedade.(1)

Além disso, devemos destacar que o imóvel rural "é um prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a localização, que se destine ou possa destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial" (art. 04º, inciso I, da Lei 8629/93).

Em síntese, a análise dos graus de exploração da terra (utilização e eficiência) atrelada ao cumprimento da função social do imóvel rural são indispensáveis para a perpetuação da propriedade no tempo, posto que, sem um mínimo de controle sobre a utilização racional da terra (desenvolvimento sustentável), estaremos fadados ao inchaço/pressão provocado pelos movimentos sociais com fito no acesso à terra (os quais crescem a cada dia em escala exponencial). E ainda lançados ao alvedrio da natureza pela falta de controle no processo de exploração da terra.

II. DOS CRITÉRIOS DE UTILIZAÇÃO RACIONAL DA TERRA

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 185, enuncia as propriedades rurais insuscetíveis de expropriação, são elas: a pequena e média propriedade rural, assim definida em lei, desde que seu proprietário não possua outra e a propriedade produtiva.

Já o art. 186 do mesmo diploma constitucional vaticina os meandros do que se deve entender por função social da propriedade, ou seja, a exploração da terra atender, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei (grau de utilização e eficiência de exploração da terra), aos seguintes requisitos: aproveitamento racional e adequado; utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente; observância das disposições que regulam as relações de trabalho e a exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

Já a Lei 8629/93 conceitua o que é o imóvel rural, a propriedade produtiva, grau de utilização e de eficiência na exploração da terra, como a seguir deduzido:

Art. 4º. Para os efeitos desta Lei, conceituam-se:

I - Imóvel Rural - o prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a sua localização, que se destine ou possa se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial;

omissis

Art. 6º. Considera-se propriedade produtiva aquela que, explorada econômica e racionalmente, atinge, simultaneamente, graus de utilização da terra e de eficiência na exploração, segundo índices fixados pelo órgão federal competente.

§ 1º. O grau de utilização da terra, para efeito do caput deste artigo, deverá ser igual ou superior a 80% (oitenta por cento), calculado pela relação percentual entre a área efetivamente utilizada e a área aproveitável total do imóvel.

§ 2º. O grau de eficiência na exploração da terra deverá ser igual ou superior a 100% (cem por cento), e será obtido de acordo com a seguinte sistemática:

I - para os produtos vegetais, divide-se a quantidade colhida de cada produto pelos respectivos índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;

II - para a exploração pecuária, divide-se o número total de Unidades Animais (UA) do rebanho, pelo índice de lotação estabelecido pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea;

III - a soma dos resultados obtidos na forma dos incisos I e II deste artigo, dividida pela área efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem), determina o grau de eficiência na exploração.(2)

Da mesma forma cotejamos do Estatuto da terra a célula-motriz sobre o exercício da função social da propriedade, verbis:

Art. 2º. É assegurada a todos a oportunidade de acesso à propriedade da terra, condicionada pela sua função social, na forma prevista nesta Lei.

§ 1º. A propriedade da terra desempenha integralmente a sua função social quando, simultaneamente:

a) favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores que nela labutam, assim como de suas famílias;

b) mantém níveis satisfatórios de produtividade;

c) assegura a conservação dos recursos naturais;

d) observa as disposições legais que regulam as justas relações de trabalho entre os que a possuem e a cultivam.

Em linhas gerais, essas são as legislações que trabalham com a fixação de critérios técnicos para a racional utilização da terra. Bem cujo acesso é garantido a todos pelo texto constitucional de 1988.

O reconhecimento da produtividade rural exige a presença da perspectiva econômica, representada, cumulativamente, pelo grau mínimo de 80% do grau de utilização da terra (GUT) e o patamar mínimo de 100% do grau de eficiência da exploração econômica (GEE). Todavia, este entendimento nitidamente matemático, não deve prevalecer sobre critérios de foro constitucional (função social da propriedade).

O cálculo do índice do GUT considera a área efetivamente utilizada do imóvel, em confronto a área potencialmente utilizável. Essa é representada pela área que comprovadamente for aproveitável, que não explore a mineração, que não seja ocupada com instalações e ainda que não seja de preservação permanente, reserva legal ou esteja gravada por outra forma de proteção ambiental. Melhor, devem ser excluídas do conceito de área aproveitável, segundo o art. 10 da Lei 8.629/93, as áreas ocupadas por construções e instalações, excetuadas aquelas destinadas a fins produtivos, como estufas, viveiros, sementeiros, tanques de reprodução e criação de peixes e outros semelhantes; as áreas comprovadamente imprestáveis para qualquer tipo de exploração agrícola, pecuária, florestal ou extrativa vegetal; as áreas sob efetiva exploração mineral; as áreas de efetiva preservação permanente e demais áreas protegidas por legislação relativa à conservação dos recursos naturais e à preservação do meio ambiente.

De outro lado o GEE é obtido por meio de cálculos, para tanto, procedemos à consideração da destinação econômica/financeira do imóvel rural em face de índices médios das propriedades produtivas da região em que está fincado, com fulcro no art. 6º, §2º, da Lei 8.629/93. Daí, a soma dos resultados obtidos é dividida pela área efetivamente utilizada e multiplicada por 100 (cem), determinando-se, por conseguinte, o grau de eficiência na exploração do imóvel rural. Dessa forma, um imóvel com níveis de exploração econômica mais eficientes que aqueles relativos à média exigida pelos órgãos oficiais poderá obter um percentual superior a 100% de GEE.

Com efeito, por razões de grande relevância fática e de direito, a Lei 8.629/93 considera como produtivas os imóveis rurais que, por razões de força maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida, devidamente autorizados a funcionar pelo órgão competente, deixar de apresentar anualmente os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie (art. 6º, §7º). Além dessas exceções a regra e, por razões de ordem pública, entendemos, com espeque no Pretório Excelso, que as áreas que tenham sofrido esbulho estão abarcadas pela permissiva legal, por estarem impossibilitada de atender os graus exigidos.

Não obstante o alcance dos graus econômicos de efetividade da terra, vislumbramos que a terra produtiva não pode restar limitada a critérios meramente financeiros. Longe disso, a utilização racional da terra, como preconizado no art. 185 e 186 da CRFB/88, passa pelo régio cumprimento da função social da propriedade atrelado ao seu grau econômico de utilização e eficiência. Vamos ainda mais longe ao considerarmos que a função social da propriedade é mais importante que o grau econômico, sem ela a propriedade jamais poderá ser considerada produtiva.

Nesse ponto merecem registro as passagens do mestre Benedito Ferreira Marques:

Com efeito, tome-se o requisito do aproveitamento racional e adequado, que, no Estatuto da Terra, corresponde ao requisito níveis satisfatórios de produtividade, que é mensurado pelos graus de utilização e de eficiência na exploração, [...] São os mesmos índices exigidos para a configuração da "Propriedade Produtiva" [...] instituto jurídico novo criado pela Constituição Federal vigente, que a inclui como objeto insuscetível de desapropriação. Isso explica o raciocínio do interprete da nova lei, segundo o qual todo imóvel rural, mesmo a pequena ou a média propriedade, deve alcançar esses parâmetros [...] estão imunes à desapropriação, quando o seu proprietário não possua outra. [...] A adequada utilização dos recursos naturais e a preservação do meio ambiente, exige o respeito à vocação natural da terra, com vistas à manutenção tanto do potencial produtivo do imóvel como das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, para o equilíbrio biológico da propriedade. [...] a observância das disposições que regulam as relações de trabalho [...] o bem-estar dos proprietários e trabalhadores rurais. [...] Impõe-se assinalar, neste passo, que os requisitos alinhados nos preceitos legais examinados devem ser observados simultaneamente, vale dizer, todos ao mesmo tempo. Não se cumpre a função social, observando-se apenas um ou dois requisitos (3). (grifo nosso)

Com maior acuidade anotamos a doutrina Argentina sobre função social da propriedade:

(in "Las Transformaciones generales del Derecho Privado desde el Condigo de Napoleón", trad. Castelhana, Edit, Francisco Beltrán, Buenos Aires).

"...a função social da terra comporta duas concepções opostas sob a invocação do mesm objetivo: a concepção democrática que defende a reforma agrária pelos meios pacíficos; e a concepção marxista ou marxista-leninista que, em nome do mesmo princípio, propugna pela expropriação pura e simples. Sob tal ponto de vista, vale registrar que as diversas concepções ditam igual número de soluções para a posse da terra: a solução democrática, ou a mais acolhida para os países ocidentais, que considera a função social da propriedade privada, conquanto sujeita à limitações que estabelece com o objetivo de preservar o direito de propriedade, em oposição às concepções socialistas; a solução marxista que considera a terra propriedade do Estado, e que inspirou a reforma russa e a do Código Agrário da China, em 1950, chamada marxista-liberal, porque assegura a propriedade da terra pelos camponeses. Parece ser esta também a solução adotada pela Iugoslávia. A reforma egípcia é um meio termo entre as duas concepções, predominando nesta, certas concessões ao direito individual."

E ainda com percuciência verbera Marcos Colares(4):

O entendimento de que a propriedade privada merece proteção se sobrepôs ao princípio do efetivo cumprimento da função social da propriedade. Entretanto, o mesmo não aconteceu com as glebas utilizadas para plantio de psicotrópicos, que serão expropriadas e destinas à colonização (art. 243, da Constituição Federal). De certa forma, talvez a falta de perspicácia do legislador ordinário o tenha conduzido a esse fim, que poderia ter sido outro, se o mesmo tivesse substituído "confisco" por expropriação e destinada à Reforma Agrária.

Considero que o descumprimento da função social da propriedade não deve ser encarado apenas como um instrumento de tributação, mas acima de tudo como um referencial para desapropriação por interesse social para fins de Reforma Agrária.

Urge que os movimentos sociais recolham a jurisprudência acerca do tema e estimulem a produção de decisões que configurem a atenção do Estado juiz ao cumprimento do espírito da Lei Maior.

A produtividade da terra não pode ser sobrepor ao cumprimento dos demais itens norteadores da função social da propriedade, que acima de tudo deve qualificar-se como em sintonia com a vida e não com a instituição propriedade, fonte de poder, controle e, por vezes meio de alienação.

Com essas colações, entendemos que o prisma da função social da propriedade deve ser visto lado a lado com a necessidade de implementação da Reforma Agrária. O descumprimento do primeiro deve gerar a intervenção do segundo.

Sobre reforma agrária merece registro a doutrina de Nelson Duarte(5) e Coutinho Cavalcante(6) a seguir transcritas:

Reforma agrária é a revisão, por diversos processos de execução, das relações jurídicas e econômicas dos que detêm e trabalham a propriedade rural, com o objetivo de modificar determinada situação atual do domínio e posse da terra e a distribuição da renda agrícola.

Reforma agrária é a revisão e o reajustamento das normas jurídico-sociais e econômico-financeiras que regem a estrutura agrária do País, visando à valorização do trabalhador do campo e ao incremento da produção, mediante a distribuição, utilização, exploração sociais e racionais da propriedade agrícola e ao melhoramento das condições de vida da população rural.

Dentro do que manifestamos por função social da propriedade deve-se ter em mente a proteção ambiental como fator primordial para as futuras gerações, como direito de todos e transgeracional. Sem isso, não como se conceber a função social da propriedade como limitador da propriedade e protetor do meio ambiente.

A função social trata-se de uma imposição de uso da propriedade, não por mera limitação do Estado, mas sim por determinação da comunidade.

A comunidade/sociedade, pelo Estatuto da Terra (art. 2º), é assegurada a oportunidade de acesso à propriedade da terra, que na maioria das vezes não é efetivada; razão pela qual, deve-se, no mínimo, exigir que as propriedades cumpram com sua função social, sob pena restar expropriada pelo Estado por força da exigência social.

Desta feita, há de se pontuar sobre a mesa os aspectos do aproveitamento racional e adequado do imóvel rural (ótica econômica) com os da função social da propriedade.

III. A EXPLORAÇÃO AGRÁRIA E OS REQUISITOS BÁSICOS PARA A CARACTERIZAÇÃO DA PROPRIEDADE PRODUTIVA.

Como visto, o imóvel rural é um prédio rústico de área contínua, qualquer que seja a localização, que se destine ou possa destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal, florestal ou agroindustrial (art. 04º, I, da Lei 8629/93). No mesmo turno, o art. 06º da Lei 5868/72 considera propriedade ou imóvel a área de terras que se destinar à exploração agrícola, pecuária, extrativa vegetal ou agro-industrial e que, independentemente de sua localização, tiver área superior a 01 (um) ha.

No caso sub examinen, a exploração agrária que não alcance os graus mínimos de utilização e eficiência, via de regra, serão consideradas improdutivas, sem destinação efetiva.

Todavia, a própria legislação que impõe graus de uso racional e adequado da terra (os graus econômicos) também excepciona alguns casos em que, mesmo sem ter sido atingido os graus econômicos, a propriedade será considerada produtiva, vejamos: 01) Os imóveis rurais que, por razões de força maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida, devidamente autorizados a funcionar pelo órgão competente, deixar de apresentar anualmente os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie (art. 6º, §7º, Lei 8629/93), incluindo-se nessa proposição os imóveis esbulhados, por tornar impossível o cumprimento do regramento econômico; 02) As áreas que estejam oficialmente destinadas e aprovadas pelo Poder Público à execução e atividades de pesquisa e experimentação que visem o avanço da agricultura, para fins da permissão essas áreas deverão ser compostas de, no mínimo 80% da área total aproveitável (art. 8 da Lei 8629/93); 03) São insuscetíveis aos graus econômicos a pequena e média propriedade rural, desde que o seu proprietário não possua outra propriedade rural, razão pela qual não será permitida a desapropriação do imóvel para fins da reforma agrária (art. 4º, parágrafo único, da Lei 8629/93).

No que pertine ao descumprimento de um ou de ambos os graus econômicos entendo inexistir taxatividade no assunto.

A pertinência temática do uso racional da terra está direcionada pela comprovação da sua efetiva utilização, i.e., desde que observada uma das seguintes alternativas (§ 03º, art. 6º, Lei 8629/93): a) A área tenha sido plantada com produtos vegetais; b) A área seja composta por pastagens nativas e plantadas, observado o índice de lotação por zona de pecuária, fixado pelo Poder Executivo; c) A área seja de exploração extrativa vegetal ou florestal, observados os índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea, e a legislação ambiental; d) A área seja de exploração de florestas nativas, de acordo com plano de exploração e nas condições estabelecidas pelo órgão federal competente; e) A área esteja sob processos técnicos de formação ou recuperação de pastagens ou de culturas permanentes, tecnicamente conduzidas e devidamente comprovadas, mediante documentação e Anotação de Responsabilidade Técnica.

Enfim, comprovada a efetiva utilização da terra, como já relatado, a propriedade necessariamente deverá estar de acordo com os mandamentos da função social da propriedade. Aforante não tenha sido cumprido um dos graus econômicos, a relevância social da propriedade supre essa "omissão".

Caso não bastasse isso, devemos deixar bem claro que atingir o grau de eficiência de 100% é deveras gravoso nos dias atuais. Essa flexibilidade do tema não se protrai sem lastro, ao contrário, se fundamenta na possibilidade de cumprir o modo racional de aproveitamento do imóvel rural, em nível abaixo do imposto, com a implementação de projeto técnico, desde que elaborado por expert, cumpra o organograma físico-financeiro e preveja que, no mínimo, 80% da área total aproveitável do imóvel rural esteja efetivamente utilizada em, no máximo, 03 anos para as culturas anuais e 05 anos para as culturas permanentes, e ainda haja sido aprovada pelo órgão federal competente. (art. 7º da Lei 8629/93).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho foi inspirado em estudo feito em classe durante o período de graduação, ora adaptado para fins de publicação.

Ante essas notas, vê-se que a perspectiva da legislação agrária brasileira está jungida em terreno fértil e fecundo.

A necessidade de se exigir cumprimento da função social da propriedade é assente, principalmente para extirpar os conflitos agrários.

A propriedade, sinônimo de reconhecimento pelo particular do poder de um semelhante, dentro de um conjunto de terras, deve ser tida como um prêmio social, sujeito a normas de utilização racional.

Não se deve diminuir o significado de propriedade a especulação, ao contrário tal conceito deve ser um prisma de produção e também racionalização do espaço.

Por isso, a análise dos graus econômicos (de efetividade e utilização) além de não ser absoluta é parca, devendo ser conglobada com o fator função social da propriedade; que, por si só, bastaria para atender aos ditames do texto constitucional (artigos 185 e 186).

Para efeitos da classificação do imóvel como rural, que se destine à exploração agrária, mesmo não tendo sido atendidos os graus econômicos, a propriedade será considerada produtiva nos seguintes casos: 01) Os imóveis rurais que, por razões de força maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida, devidamente autorizados a funcionar pelo órgão competente, deixar de apresentar anualmente os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie (art. 6º, §7º, Lei 8629/93), incluindo-se nessa proposição os imóveis esbulhados, por tornar impossível o cumprimento do regramento econômico; 02) As áreas que estejam oficialmente destinadas e aprovadas pelo Poder Público à execução e atividades de pesquisa e experimentação que visem o avanço da agricultura, para fins da permissão essas áreas deverão ser compostas de, no mínimo 80% da área total aproveitável (art. 8 da Lei 8629/93); 03) São insuscetíveis aos graus econômicos a pequena e média propriedade rural, desde que o seu proprietário não possua outra propriedade rural, razão pela qual não será permitida a desapropriação do imóvel para fins da reforma agrária (art. 4º, parágrafo único, da Lei 8629/93) e 05) Áreas que mesmo abaixo do nível mínimo econômico, tenham implantado projeto técnico, elaborado por profissional legalmente habilitado, cumpra o organograma físico-financeiro e preveja que, no mínimo, 80% da área total aproveitável do imóvel rural esteja efetivamente utilizada em, no máximo, 03 anos para as culturas anuais e 05 anos para as culturas permanentes, e ainda haja sido aprovada pelo órgão federal competente. (art. 07º e incisos, da Lei 8629/93).

BIBLIOGRAFIA

· ABREU, Bianca Maria da Conceição. A função social do poder judiciário no conflito agrário. Jus Navigandi, Teresina, ano 7, n. 60, nov. 2002. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3476. Acesso em: 24 jan. 2007.

· BORGES, Paulo Torminn. Institutos Básicos de Direito Agrário. São Paulo: Saraiva, 1991. p. 26. Apud FALCÃO, Ismael Marinho. Direito e reforma agrária. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 39, fev. 2000. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1671. Acesso em: 24 jan. 2007.

· CAVALCANTI, Coutinho. Reforma Agrária no Brasil. São Paulo: Autores Reunidos, 1961. Apud ALBUQUERQUE FILHO, Clóvis Antunes Carneiro de. A reforma agrária no Brasil . Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 46, out. 2000. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1672. Acesso em: 24 jan. 2007.

· CHAGAS, Marco Aurélio Bicalho de Abreu. A doutrina da função social da propriedade no Direito Agrário. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 40, mar. 2000. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1669. Acesso em: 23 jan. 2007.

· COLARES, Marcos. Breves notas sobre a função social da propriedade . Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2254. Acesso em: 24 jan. 2007.

· DUARTE, Nestor. Reforma Agrária. Rio de Janeiro: MEC/SD, 1953. Apud ALBUQUERQUE FILHO, Clóvis Antunes Carneiro de. A reforma agrária no Brasil. Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 46, out. 2000. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1672. Acesso em: 24 jan. 2007.

· MARQUES, Benedito Ferreira. Direito agrário brasileiro. 6. ed. Goiânia: AB, 2005. p. 83.


Notas:

* Juari José Regis Júnior, Bacharel em Direito pela Universidade Federal de Mato Grosso, Advogado, trabalhou no Tribunal de Justiça de Mato Grosso no gabinete da Desa. Shelma Lombardi de Kato, atualmente é servidor público federal, cargo de analista em reforma e desenvolvimento agrário-INCRA. [ Voltar ]

1 - MARQUES, Benedito Ferreira. Direito agrário brasileiro. 6. ed. Goiânia: AB, 2005. p. 83. [Voltar]

2 - § 3º. Consideram-se efetivamente utilizadas:

I - as áreas plantadas com produtos vegetais;

II - as áreas de pastagens nativas e plantadas, observado o índice de lotação por zona de pecuária, fixado pelo Poder Executivo;

III - as áreas de exploração extrativa vegetal ou florestal, observados os índices de rendimento estabelecidos pelo órgão competente do Poder Executivo, para cada Microrregião Homogênea, e a legislação ambiental;

IV - as áreas de exploração de florestas nativas, de acordo com plano de exploração e nas condições estabelecidas pelo órgão federal competente;

V - as áreas sob processos técnicos de formação ou recuperação de pastagens ou de culturas permanentes, tecnicamente conduzidas e devidamente comprovadas, mediante documentação e Anotação de Responsabilidade Técnica. (NR) (Redação dada ao inciso pela Medida Provisória nº 2.183-56, de 24.08.2001, DOU 27.08.2001, em vigor conforme o art. 2º da EC nº 32/2001)

§ 4º. No caso de consórcio ou intercalação de culturas, considera-se efetivamente utilizada a área total do consórcio ou intercalação.

§ 5º. No caso de mais de um cultivo no ano, com um ou mais produtos, no mesmo espaço, considera-se efetivamente utilizada a maior área usada no ano considerado.

§ 6º. Para os produtos que não tenham índices de rendimentos fixados, adotar-se-á a área utilizada com esses produtos, com resultado do cálculo previsto no inciso I do § 2º deste artigo.

§ 7º. Não perderá a qualidade de propriedade produtiva o imóvel que, por razões de força maior, caso fortuito ou de renovação de pastagens tecnicamente conduzida, devidamente comprovados pelo órgão competente, deixar de apresentar, no ano respectivo, os graus de eficiência na exploração, exigidos para a espécie.

§ 8º. São garantidos os incentivos fiscais referentes ao Imposto Territorial Rural relacionados com os graus de utilização e de eficiência na exploração, conforme o disposto no artigo 49 da Lei nº 4.504, de 30 de novembro de 1964.

Omissis

Art. 9º. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo graus e critérios estabelecidos nesta Lei, os seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favorece o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.

§ 1º. Considera-se racional e adequado o aproveitamento que atinja os graus de utilização da terra e de eficiência na exploração especificados nos §§ 1º a 7º do artigo 6º desta lei.

§ 2º. Considera-se adequada a utilização dos recursos naturais disponíveis quando a exploração se faz respeitando a vocação natural da terra, de modo a manter o potencial produtivo da propriedade.

§ 3º. Considera-se preservação do meio ambiente a manutenção das características próprias do meio natural e da qualidade dos recursos ambientais, na medida adequada à manutenção do equilíbrio ecológico da propriedade e da saúde e qualidade de vida das comunidades vizinhas.

§ 4º. A observância das disposições que regulam as relações de trabalho implica tanto o respeito às leis trabalhistas e aos contratos coletivos de trabalho, como às disposições que disciplinam os contratos de arrendamento e parceria rurais.

§ 5º. A exploração que favorece o bem-estar dos proprietários e trabalhadores rurais é a que objetiva o atendimento das necessidades básicas dos que trabalham a terra, observa as normas de segurança do trabalho e não provoca conflitos e tensões sociais no imóvel. (grifo nosso) [Voltar]

3 - MARQUES, op cit. pp. 29-31. [Voltar]

4 - COLARES, Marcos. Breves notas sobre a função social da propriedade . Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2254. Acesso em: 24 jan. 2007. [Voltar]

5 - DUARTE, Nestor. Reforma Agrária. Rio de Janeiro: MEC/SD, 1953. Apud ALBUQUERQUE FILHO, Clóvis Antunes Carneiro de. A reforma agrária no Brasil . Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 46, out. 2000. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1672. Acesso em: 24 jan. 2007. [Voltar]

6 - CAVALCANTI, Coutinho. Reforma Agrária no Brasil. São Paulo: Autores Reunidos, 1961. Apud ALBUQUERQUE FILHO, Clóvis Antunes Carneiro de. A reforma agrária no Brasil . Jus Navigandi, Teresina, ano 4, n. 46, out. 2000. Disponível em: http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=1672. Acesso em: 24 jan. 2007. [Voltar]

Palavras-chave: propriedade

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2 Comentários

Dario Nogueira leite Acadêmico de Dieito12/04/2013 10:02 Responder

Parabéns informações de nível como tambem de boa compreenção.

Dario Nogueira Leite Academico de Direito12/04/2013 10:08 Responder

Parabéns trabalho de alto nível e objetividade de comprenssão.

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