A panaceia das privatizações

Se há um caminho central e de equilíbrio para a recuperação brasileira, esse ainda passará por um governo de centro e de equilíbrio fiscal, fazendo contraponto com messianismo, radicalismo, teocracia e terraplanismo.

Fonte: Cássio Faeddo

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Imagem de David Schwarzenberg por Pixabay

De acordo com matéria recente do Jornal El Pais, Joe Biden pretende afastar os EUA do neoliberalismo. Essa corrente econômica, de forte impacto social, foi iniciada com a ascensão ao poder de Ronald Reagan e Margareth Thatcher no final dos anos 70 e início dos anos 80, e espalhou-se pelo mundo no decorrer das décadas posteriores.

Em 1979, China e os Estados Unidos restabeleceram relações diplomáticas, e a China iniciou um processo de crescimento com vistas às oportunidades criadas pelo Consenso de Washington. Isto importava em acelerar processos de desregulamentação, redução de impostos, privatizações, globalização, tendo como máxima o mercado acima de tudo.

A China foi o país que melhor aproveitou as oportunidades criadas pelo neoliberalismo globalizado, ainda que inicialmente tenha passado por cima de patentes e direitos do autor, como é sabido.

O fato é que esse mundo desbalanceado colocou os países emergentes em uma situação difícil, especialmente nas grandes metrópoles, pois estes países centraram-se na produção de commodities agrícolas e de extração mineral, sem resolver o problema do desemprego de seu operariado.

O Brasil ganhou grandes problemas por seguir esse caminho ultraliberal sem ressalvas sociais. Como exemplo, a panaceia da privatização como solução e a desindustrialização como realidade.

Privatização pode ser bom para as contas públicas, mas não é solução para crescimento. Ocorre que a economia nas contas é absorvida pelo aumento de gastos públicos com novos cargos, remuneração e benefícios criados pelos políticos. O político brasileiro parece não conviver muito bem com poupança, e qualquer reserva do país é consumida rapidamente.

A Vale do Rio Doce se foi. Nem por isso o Brasil tornou-se sombra do que é a Alemanha, por exemplo.

Empresas públicas ou privadas podem ser ótimas, desde que bem gerenciadas. Mas, no caso do Brasil, as estatais são habitualmente problemáticas.

O mau uso do potencial de uma estatal tem na Petrobrás um notório exemplo importante - empresa que financiou um partido e inúmeros corruptos.

Empresas de economia mista, ao contrário do que sugeriu Lula há tempos recentes, são muito ruins como solução econômica. Explica-se: por aqui, não atendem nem o acionista, nem o interesse público - basta observar como Bolsonaro lidou com a administração da Petrobrás.

No Brasil, uma empresa deveria ser pública ou ser privada integralmente; não se atende a dois senhores ao mesmo tempo. Estatais, pelo menos por aqui, tem sido caminho para apadrinhamento e para ineficiência.

Por outro lado, o exemplo do apagão de Roraima demonstrou que empresas privadas de péssima qualidade podem gerar sérios problemas quando detém monopólios de serviços públicos essenciais. Todavia, nas telecomunicações, como já previa o falecido ministro Sérgio Motta, demonstrou-se que a privatização bem conduzida pode melhorar a distribuição de serviços importantes.

Porém, o que é essencial ou de interesse público, e mesmo quando não interessa ao setor privado, deve ser preservado aos entes públicos. E mais, investidor não coloca dinheiro em algo que não dá retorno financeiro ainda que exista interesse social importante.

O Brasil amarrou-se muito tempo na doutrina thatcheriana, e aprofundou-se em temas e políticas que desnaturam qualquer objetivo de dar algum bem-estar social para a população. Criminalidade, crendices teocráticas, ignorância, obscurantismo, falta de trabalhadores especializados, são algumas das consequências desta opção.

A política econômica, fundamentada em exportação de commodities, não distribuiu riquezas, ainda que melhorasse as reservas brasileiras. Aliás, consequência de uma tradição secular de excludente de oportunidades e de desigualdades sociais.

Não se trata de criticar o que funciona, no caso a força das commodities brasileiras, mas não é possível desenvolver o país somente com base em commodities e consumo interno.

É muito ruim termos que rediscutir industrialização, tema do Século XX, enquanto o mundo desenvolvido discute tecnologia e economia verde. Estamos muito atrasados.

Se há um caminho central e de equilíbrio para a recuperação brasileira, esse ainda passará por um governo de centro e de equilíbrio fiscal, fazendo contraponto com messianismo, radicalismo, teocracia e terraplanismo.

Sem dúvida, é um ponto de inflexão. O que se fizer daqui para frente ou nos destruirá ou nos fortalecerá, com licença da surrada citação. Ou seremos Mianmar ou seremos Suécia. O primeiro exemplo, em curto prazo; o segundo, fruto de trabalho de longo prazo.

Portanto, esse quadro faz com que seja extremamente importante termos os melhores administradores públicos no comando do país desde já, pois equilibrar o social com os demais interesses dos agentes econômicos exige excelência na gestão, o que não temos no momento na administração do país.

 

Cássio Faeddo. Advogado. Mestre em Direito. MBA em Relações Internacionais – FGV/SP.


Palavras-chave: Privatizações Economia Administradores Públicos

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noticias/a-panaceia-das-privatizacoes-2021-06-15

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