A Justiça no limiar da mudança
Depois de 12 anos de tramitação no Congresso, a reforma do Judiciário foi aprovada ontem em primeiro turno pelo Senado.
Depois de 12 anos de tramitação no Congresso, a reforma do Judiciário foi aprovada ontem em primeiro turno pelo Senado. Medidas como o controle externo dos tribunais, a autonomia do Ministério Público e a federalização de crimes contra os direitos humanos, que darão mais transparência ao Judiciário, estão prestes a entrar em vigor. Em agosto, depois do recesso, o Senado retomará a votação de 175 emendas à reforma e fará o segundo turno de votação. Como o resultado ontem foi de 62 votos a dois, governo e Congresso apostam que a aprovação em segundo turno é certa.
Parte do texto aprovado ainda voltará à Câmara. Mas a essência da reforma poderá ser promulgada com a conclusão das votações no Senado. O relator da proposta, senador José Jorge (PFL-PE), admite que ainda há pontos polêmicos na reforma, mas diz não acreditar que haverá grandes mudanças no texto.
O ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, comemorou:
? A aprovação da reforma do Poder Judiciário é um marco na História do Brasil. A criação do Conselho Nacional de Justiça, órgão que vai fiscalizar o cumprimento dos deveres funcionais e fazer o planejamento orçamentário e executivo de todas as justiças brasileiras, é medida decisiva e fundamental para a criação daquele Poder Judiciário com que todos sonhamos: rápido, acessível e mais próximo do povo.
O governo tinha especial interesse em cinco pontos da reforma, todos contemplados pelo relator e com possibilidade de promulgação em agosto: a instituição do controle externo e da quarentena para que juízes aposentados voltem à advocacia, a autonomia das defensorias públicas, a uniformização de critérios dos concursos públicos para juízes e a federalização dos crimes contra os direitos humanos.
Senador do PFL vota contra ?por vício?
Segundo o líder do governo, Aloizio Mercadante (PT-SP), a assinatura do Brasil em acordos internacionais sobre direitos humanos deixa o país exposto diante de casos como o assassinato do líder seringueiro Chico Mendes ou a chacina de sem-terra em Eldorado dos Carajás, com repercussão no exterior. Com a reforma, o procurador-geral da República pode encaminhar crimes deste tipo ao Superior Tribunal de Justiça para que os processos corram na Justiça Federal:
? O poder local tem muita pressão sobre o Judiciário local em crimes de interesse nacional. Mas só será federalizado aquilo que o procurador solicitar e o STJ aprovar.
Os dois votos contrários à reforma foram dos senadores Geraldo Mesquita (PSB-AC) e Heráclito Fortes (PFL-PI). Este último disse ter votado ?não? por engano:
? Ser oposição vicia. Votei ?não? sem querer ? desculpou-se.
Mesquita apresentou um voto em separado em que critica a reforma. Para ele, o projeto deixa o cidadão à margem das mudanças e não resolve a morosidade do Poder Judiciário.
Entre os pontos da reforma ainda sem consenso estão a adoção da chamada súmula vinculante, que obriga instâncias inferiores a seguir uma decisão do Supremo Tribunal Federal aprovada por oito de seus 11 membros. O presidente do Supremo, ministro Nelson Jobim, por exemplo, defende esse instituto.
José Jorge lembrou que a aprovação da reforma é essencial à retomada do crescimento da economia, porque dará segurança ao investidor, que espera rapidez e algum grau de previsibilidade das decisões judiciais. Ele apresentou dados que mostram a lentidão do Judiciário, como o fato de que a condenação de um homicida a cumprir pena pode levar 1.431 dias. Na Califórnia, estado onde a Justiça dos Estados Unidos é mais lenta, esse prazo é de 282 dias. Com a reforma, o direito à tramitação rápida de um processo judicial passa a ser um princípio da Constituição.